ANTECIPAÇÃO DE TUTELA A LUZ DO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Exames: ANTECIPAÇÃO DE TUTELA A LUZ DO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: • 27/10/2014 • 10.663 Palavras (43 Páginas) • 929 Visualizações
2 CONCEITO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
2.1 Evolução Histórica
A princípio vale ressaltar que bem clara está a situação sufocante da justiça brasileira decorrente de diversas manifestações sociais que vincula ordenamento jurídico do país, tais como o elevado número de ajuizamento de ações, a complexidade das lides derivada da própria complexidade das relações da comunidade, bem como a lentidão em serem julgadas as ações ajuizadas, causando assim uma crise decorrente do mau planejamento judicial para a solução de problemas sociais crônicos.
Salienta José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro (2002, p. 92):
A realização da justiça é a finalidade do processo, e esta se concretiza com o correto pronunciamento do Poder Judiciário acerca da lide, ditando o direito para as pessoas envolvidas. Esse é o escopo do Poder Judiciário quando se defronta com os interesses contrapostos das partes, que buscam saber quem tem razão, ou quem está agindo corretamente em face das circunstâncias, muitas vezes inusitadas, que mascaram o normal procedimento das relações jurídicas estabelecidas. Essa é a motivação das partes quando procuram o Poder Judiciário, atormentadas pelas incertezas e consequências de uma relação de conflito. O pronunciamento do Poder Judiciário estabelecerá a paz e a ordem na vida do querelante, atingindo por reflexo toda a sociedade.
Com a declaração supracitada percebe-se a importância da justiça brasileira em julgar de forma eficaz e segura as lides, garantindo assim que o objeto da ação não se esvai ou se esgote com a duração do processo. Sabe-se que a proteção da tutela deve ser a própria finalidade do Poder Judiciário, sendo imprescindível deixar de esboçar a situação atual deste Poder para iniciar a discussão da própria tutela, ou melhor, da tutela de antecipação como se fará a seguir.
Cumpre examinarmos neste passo que o processo civil brasileiro está intimamente ligado ao sistema romano, em que não eram desconhecidos instrumentos para a proteção do direito almejado nas lides, mesmo que provisoriamente. Nos estudos do doutor João Batista Lopes (2003, p. 44-45) pode-se perceber os institutos usados pelos romanos para assegurar a tutela jurídica, tais como os interditos (interdicta); a mission in possessionem, a cautio damni infecti e a restitutio in integrum, dentre outros; sendo que a cautio damni infecti possuía caráter estritamente cautelar, a fim de evitar danos irreparáveis mediante a prestação de caução. O prezado estudioso afirma que em todas essas figuras é possível localizar o embrião das tutelas de urgência e da tutela antecipada.
No Ordenamento Jurídico Brasileiro a antecipação de tutela não é novidade, porém antes da previsão legal explícita (efetivamente com a Lei nº 8.952, de 13.12.1994), não usufruía de sistematização legal e organizacional, sendo que era aplicada apenas em determinadas circunstâncias. Manifesta seu entendimento o professor, ex-ministro do STJ, José Augusto Delgado (1996):
A produção dos efeitos da tutela antecipada não era totalmente desconhecida do nosso sistema jurídico formal. Na verdade, o exame do Código de Processo Civil em vigor revela que uma forma especial de tutela antecipada produzir efeitos está presente no comando do art. 928, onde se permite a antecipação do mérito da demanda, com a concessão da liminar restauradora da posse, nas ações possessórias de força nova, desde que os requisitos específicos ali exigidos se consolidem. Na legislação extravagante processual, considera-se o art. 12 da Lei n. 7.347, de 24.7.85, a que rege a ação civil pública, como contendo uma permissibilidade dos efeitos do mérito da demanda ser antecipado. O referido dispositivo dispõe: "Art. 12 - Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo." Em face da disposição supra, nas ações civis públicas onde se discutem temas como de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico ou qualquer outro interesse difuso coletivo e por infração da ordem econômica (art. 1º da L. 7.347, de 24.7.85), o mérito pode ser antecipado por via liminar.
Brilhantemente Maércio Falcão Duarte (1999, apud MARIA TEREZA FLOR DA SILVA; TITO COSTA DE OLIVEIRA 2004, p. 6) trás em sua tese breve relato histórico sobre as tutelas antecipadas, onde pode ser percebida a evolução do ordenamento para a concretização da antecipação de tutela no ordenamento:
(...) 1850 - primeira sistematização das ações cautelares com o regulamento n° 737, de 21.11.1850, que disciplinou o processo comercial e tratou, em seu título VII, dos processos preparatórios, preventivos e incidentes.
1869 - o Barão de Ramalho, em sua obra Praxe Brasileira, trata do depósito de anima, como preliminarmente da ação redibitória, da consignação ou depósito do preço como preliminar da ação de retrovendendo, do sequestro e do arresto ou embargo.
1876 - o Conselheiro Antônio Joaquim Ribas, elabora a Consolidação das Leis do Processo Civil, distinguindo nos artigos 883 e seguintes, as ações preparatórias ou incidentes.
1880 - através do decreto n° 763, de 19.9.1880, o Regulamento n° 737 passa a reger também o processo civil.
1939 - com a unificação do processo no âmbito nacional, o CPC de 1939 passa a disciplinar as medidas preparatórias, preventivas e incidentes.
1973 – o atual CPC entra em vigor; estabelecendo os procedimentos cautelares típicos e atípicos; além de medidas liminares facultadas na propositura de ações.
Ainda poderiam ser acrescentadas neste rol as Leis n° 8.952/94 e 10.444/2002 que sistematizou e reorganizou as tutelas de urgência no ordenamento, através principalmente do artigo 273 do Código de Processo Civil inserindo no sistema jurídico a ideia real da efetividade do processo e não apenas resguardando a segurança jurídica, permitindo assim a cognição sumária para análise das lides, provisoriamente, e a posteriori a cognição exauriente.
De acordo com Teori Albino Zavascki (2000, apud ANA PAULA RODRIGUES 2003, p. 1):
Mais do que uma simples alteração de um dispositivo do Código, a nova lei produziu em verdade uma notável mudança de concepção do próprio sistema processual. As medidas antecipatórias, até então previstas apenas para determinados procedimentos especiais, passaram a constituir providência alcançável, generalizadamente, em qualquer processo. A profundidade da mudança – que , como se disse, é mais que da lei, do próprio sistema - se faz sentir pelas implicações que as antecipatórias acarretam, não só no processo de conhecimento, mas também no processo de execução, no cautelar e até nos procedimentos essenciais.
Luiz Rodrigues Wambier suscita que (2005, p. 330):
O fenômeno da antecipação de tutela não é propriamente novo no Direito brasileiro. Novidade é o disposto no art. 273, que em princípio estende a possibilidade de se anteciparem os feitos do provimento jurisdicional final em todo o tipo de processo ou procedimento. Embora conserve seu caráter excepcional, alteram-se, sem dúvida, de modo significativo, as dimensões desta excepcionalidade. Antes já havia, porém, por exemplo, as ações possessórias, em que se antecipavam à parte, que demonstrava fumus, os efeitos da sentença prescindindo-se da prova de periculum in mora. Por meio das ações possessórias, deferentemente do que ocorre com as medidas de índole cautelar, não se protegem os direitos que correm risco.
A fim arrematar o assunto o autor ainda conclui na mesma passagem:
Outras medidas já havia no sistema positivo brasileiro, que, embora tivesse sem como pressuposto o periculum in mora, consistiam efetivamente no adiantamento da própria tutela. Tais já eram, de regra, embora não necessariamente, as liminares no mandado de segurança, na ação declaratória de inconstitucionalidade, na ação civil pública. Essas medidas, pois, consistiam, segundo o que nos parece, em medida mista, já que têm como pressuposto o periculum in mora (risco de ineficácia do provimento final), que é característica tipicamente cautelar, mas que, por outro lado, consubstanciam-se no adiantamento dos efeitos da própria tutela pretendida (...).
Humberto Theodoro Júnior (2001, p. 2) ensina que deverá o cientista do direito “a tarefa, urgente e relevante, de justificar o novo perfil da prestação jurisdicional e de compatibilizá-lo com os princípios da grande conquista da humanidade que se rotulou como o garantia do devido processo legal”. Considera o Professor Alexandre Catharina (2011) expõem a importância da busca de instrumentos para o processo se torne mais célere e efetivo: sobre a evolução da tutela antecipada:
A fase instrumentalista em que se encontra o direito processual contemporâneo tem como escopo maior a concretização dos direitos e a efetividade do processo, valores fundamentais da ciência do processo. É antiga, neste cotejo, a luta permanente e incansável do processualista contra os males do tempo. O Estado deve, através da jurisdição, dar a cada um tudo, exatamente tudo, que se tem direito, na célebre frase de Chiovenda, no menor tempo possível. Para se alcançar tal objetivo o ordenamento processual brasileiro vem, ao longo do tempo, se aperfeiçoando para se alcançar este ideal.
A partir deste ponto o doutrinador citado acima em mesma passagem começa a leciona sobre a evolução da tutela antecipada no ordenamento jurídico brasileiro:
O nosso sistema antes do Código de 1973 já contemplava algumas hipóteses de antecipação de tutela, mas que estavam reguladas em procedimentos especiais, como na Lei 1533/51, revogada pela Lei 12.016/2009, que trata da Liminar no Mandado de Segurança. O Código de Processo Civil de 1973, por sua vez, regulou algumas modalidades de antecipação de tutela em alguns procedimentos especiais como na Reintegração de Posse (art. 920), o Embargo extrajudicial e judicial na Nunciação de Obra Nova (art.935) entre outras hipóteses. O Código de Processo Civil de 1973 criou, ainda, um Livro dedicado ao Processo Cautelar que tem como escopo conservar uma situação de fato para ser efetivada em outro processo denominado principal. Percebe-se que o legislador processual do atual Código não tratou de uma sistemática que permitisse ao jurisdicionado obter, no bojo de um processo de conhecimento, uma tutela de urgência.
Observa-se neste ponto a lacuna que foi criada, em torno das tutelas de urgência em geral, sendo assim acrescenta ainda o professor:
Esta lacuna deu ensejo ao manejo da ação cautelar para obtenção de tutelas de urgência, com fulcro no Poder Geral de Cautela, do art. 798 do Código de Processo Civil, transmudando a natureza do instituto, sem que se ingressasse, após a liminar, com a ação principal dando origem a denominada cautelar satisfativa. (...) Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, com as garantias individuais e coletivas, criou-se um cenário institucional focado na instrumentalidade do processo e no amplo acesso à justiça através do art. 5°, XXXV, que estabeleceu a inafastabilidade da tutela jurisdicional no sentido de evitar lesão ou ameaça ao direito. Surge, então, o que entendemos ser a primeira onda de reformas no direito processual civil brasileiro visando aprimorar a sistemática das tutelas de urgência, com a Lei 8.952/94 que institui a antecipação de tutela no bojo do processo de conhecimento e não mais somente em procedimentos especiais. (...)
Enfim o professor Catharina (2011) conclui sobre a evolução das tutelas antecipadas do seguinte modo
Esta primeira reforma contribuiu muito para a efetividade do processo pois permite que efeitos da sentença de mérito sejam antecipados, em alguns casos sem ouvir a parte contrária, provimento antecipado evitando, desta feita, lesões ao direito. No entanto, ante a semelhança entre a antecipação de tutela e tutela cautelar causou diversas confusões entre os institutos, que perdurou por alguns anos entre doutrinadores e operadores do direito, culminando no que denominamos a segunda onda de reformas processuais visando sistematizar as tutelas de urgência no direito processual civil brasileiro, através da Lei 10.444/2002, que inseriu mais 02 parágrafos ao art. 273, estabelecendo a denominada fungibilidade entre as tutelas de urgência.
Em virtude dessas considerações acrescenta Lopes (2003, p. 52-53):
(...) a tutela antecipada surgiu para privilegiar o polo ativo da ação com o escopo declarado de dividir o ônus da demora processual. Não sendo razoável nem justo obrigar quem ostente condição de provável titular do direito a delongas que poderão frustra o gozo desse direito ou esvaziar seu conteúdo, surge a tutela antecipada para permitir o aditamento de efeitos práticos para a imediata satisfação do autor (...).
Finalmente aborda-se neste passo a estabilização da tutela antecipada com o Projeto de Lei do Senado 166/2010, que será matéria que análise em capitulo vindouro do presente trabalho. A doutora Desirê Bauermann (2010) sintetiza estabilização do seguinte modo:
Quando falamos em estabilização da tutela antecipada nos referimos à possibilidade de o sistema processual permitir conserve a medida antecipada sua eficácia independentemente de confirmação por decisão posterior de mérito, resolvendo de forma definitiva a lide submetida à análise jurisdicional. O processo principal apenas será proposto se as partes tiverem interesse na obtenção de decisão definitiva sobre o direito controvertido, após cognição exauriente. É justificada a opção por limitar a estabilidade apenas às medidas antecipatórias dos efeitos da decisão de mérito, não a estendendo às medidas meramente acautelatórias. A antecipação é da execução da medida que em situação normal apenas seria permitida depois de proferida decisão em processo principal sob rito ordinário.
Conclui assim a doutora citada acima, no mesmo trecho, seu raciocínio da seguinte forma:
Logo, por haver coincidência entre os objetos buscados em ambos os momentos processuais, a decisão do processo principal pode ser dispensada se as partes assim optarem, visto que ela irá apreciar, após cognição plena, a mesma questão analisada quando da apreciação do pedido de concessão de tutela antecipada. (...) A estabilização da tutela antecipada apresenta como primeiro ponto positivo afastar do requerente que demonstrou ab initio ter razão em seu pleito o ônus de propor processo principal dentro do prazo previsto pela legislação processual apenas para garantir que a medida obtida não perca sua eficácia, mesmo que não tenha interesse na cognição plena sobre a matéria e na obtenção de decisão definitiva sobre o mérito, em virtude de a medida antecipada ter satisfeito o seu direito. (...) a estabilização é medida proporcional e razoável, pois desestimula a propositura de processos inúteis, bem como resulta em atendimento ao princípio do processo sem dilações indevidas, positivado no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal (...).
Nota-se assim que a inserção concreta e sistematizada da antecipação da tutela no ordenamento brasileiro se fez necessária na medida em que cresce a demanda de processos no Judiciário e busca-se a efetividade da propositura das lides, considerando que a segurança jurídica jamais poderá se manter afastada, entretanto outros princípios necessitam ser aplicados com mais vigor para se obter o mínimo de satisfação da sociedade perante o ordenamento jurídico brasileiro, frisando apenas que os requisitos para a concessão da prestação jurisdicional antecipada deverá sempre ser observado.
2.2 Elementos Conceituais e Natureza
Analisou-se no tópico anterior a consolidação da antecipação de tutela no ordenamento jurídico, claro está a necessidade do vigor deste instituto para se alcançar a efetividade processual. As tutelas de urgência são divididas entre as cautelares e antecipatórias, aquelas possuem suas características, requisitos, previsões legais e importância, porém no presente trabalho nos apegaremos ao estudo destas.
É entendimento pacífico doutrinário que as tutelas de antecipação possuem caráter interlocutório, ou seja, não coloca um fim no processo, não é a sentença do mérito da lide. O que ocorre é a antecipação dos efeitos da sentença de mérito ao autor da ação com caráter satisfativo, se preenchida os requisitos, provisoriamente a fim de guardar, proteger de maneira eficaz o direito do autor. Entende Eduardo Arruda Alvim (2011):
(...) A antecipação de tutela vem ao encontro da necessidade de transpor dois obstáculos à adequada entrega da prestação jurisdicional, a duração e o custo do processo, que, como é evidente, fazem-se sentir de forma muito mais intensa no caso daqueles economicamente menos favorecidos. Deveras, como teremos oportunidade de expor com mais vagar, duas foi às preocupações do legislador ao disciplinar a antecipação de tutela. Primeiro, teve o legislador que resguardar situações de urgência. Daí porque, por exemplo, o inc. I do art. 273 permite a antecipação de tutela quando houver risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Mas, essa situação não foi o único alvo do legislador ao tratar da antecipação de tutela. Preocupou-se também em ensejar ao autor a obtenção da antecipação da tutela, quando a defesa se mostre abusiva ou reste caracterizado o intuito protelatório do réu (...).
Reza o artigo 273 do Código de Processo Civil:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou; II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
§ 1° Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento;
§ 2° Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado;
§ 3° A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos artigos 588, 461, §§ 4° e 5°, e 461-A;
§ 4° A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada;
§ 5° Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento;
§ 6° A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso;
§ 7° Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.
Entende-se que a tutela antecipada é um instrumento que tem por objetivo assegurar a efetividade da lide com o acesso ao Judiciário, em que pese haja o risco de findar o direito, caso não ocorra a manifestação imediata do estado; tendo suas raízes no artigo 5° da Constituição Federal, inciso XXXV, que trás o princípio da ubiquidade e na ideia do devido processo legal. De acordo com Antônio Joaquim de Oliveira Couto Júnior (2003):
O que o novo texto do artigo 273 do CPC autoriza é, nas hipóteses nele apontadas, a possibilidade de o juiz conceder ao autor (ou réu, nas ações dúplices) um provimento liminar que, provisoriamente, lhe assegure o bem jurídico a que se refere a prestação de direito material reclamada como objeto da relação jurídica envolvida no litígio (...).
Manifesta seu entendimento Lopes (2003, p. 53-54):
(...) A interpretação atrelada à literalidade do artigo 273 do CPC pode conduzirão equívoco de confundir o objeto da tutela antecipada como próprio decisum da sentença de mérito. Com efeito, refere-se o legislador à antecipação dos “efeitos da tutela pretendida no pedido inicial”, sem estabelecer qualquer distinção entre os efeitos principais, secundários, anexos ou reflexos. (...) Assentando que a antecipação da tutela não significa antecipação do julgamento da lide, cabe indagar que efeitos da sentença final podem ser objeto de aditamento da tutela.
Ainda doutrinador Wambier (2005, p. 329) ensina o seguinte:
Hoje, a luz dos valores e das necessidades contemporâneas, se entende que o direito à prestação jurisdicional é o direito a uma prestação efetiva e eficaz. Na verdade, pouco importa se tenha sido concedida por meio de sentença transitada em julgado. É, de fato, interessante observar que um mesmo princípio jurídico possa comportar diferentes leituras, possa ter diversos significados ao longo do tempo. O princípio da inafastabilidade do controle da jurisdição, de que decorre o direito à prestação da tutela jurisdicional, está hoje formulado expressamente no art. XXXV da Constituição Federal. Por isso é que se afirma, com acerto, que a tutela antecipada consiste em fenômeno processual de raízes nitidamente constitucionais, já que, para que seja plenamente aplicado o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, é necessário que a tutela prestada seja efetiva e eficaz. A função da tutela antecipada é a de tornar a prestação jurisdicional efetiva. A necessidade dessa efetividade é a contrapartida que o Estado tem que dar à proibição da auto tutela.
Em suma a tutela estudada tem a função de antecipar o efeito da tutela jurisdicional antes mesmo de se formar a convicção definitiva da lide por parte do juiz, sendo que a sumariedade e provisoriedade da prestação jurisdicional são elementos associados primordiais, pois não há o exame a fundo dos fatos alegados na lide e sim a cognição sumária, própria das tutelas de urgência em geral.
Por cognição sumária da lide entende-se pela superficialidade na análise dos pontos, fatos e direitos alegados no processo pelas partes, sendo assim a prestação jurisdicional antecipada, se forem demonstrados os requisitos descritos no artigo 273 do CPC, será concedida; entretanto vale lembrar que a tutela antecipatória poderá ser mantida ou substituída por outra decisão do magistrado que irá se apoiar na cognição exauriente, ou seja, o estudo aprofundado da lide a fim de exaurir os pontos levantados pelas partes.
Cumpre dizer que a cognição exercida pelo juízo na antecipação de tutela é de caráter sumário, sendo afastado assim o caráter definitivo de sentença e coisa julgada; em que pese constitui a tutela antecipada forma de adiantamento dos efeitos da resolução final da lide provisoriamente e satisfativamente, podendo ser revogável, ou seja, não se cria solução definitiva da lide, sendo que a sentença poderá manter ou revogar seus efeitos.
Por derradeiro é válido pincelar brevemente sobre as diferenças e semelhanças da tutela antecipada e da tutela cautelar, pois mesmo que ambas igualmente estejam classificadas como tutelas de urgência guardam em sua essência diferenças significativas. Entretanto é de suma importância observar que as tutelas cautelares e satisfativas estão intimamente ligadas no Projeto de Lei 166/2010, onde será estudado mais profundamente no último capítulo do presente trabalho. Justifica expor as diferenças entre esses dois institutos pelos ensinamentos de Maurren Cristina Sansana e Bruna Botto Portugal Nogara (2012, p. 95) “(...) essa junção das tutelas de urgência não encontra unânime na doutrina, isso porque é inegável subsistir diferenças claras entre os institutos (...)”.
Ensina José Roberto dos Santos Bedaque (2001, p. 27 apud LUIZ FERNANDO VALLADÃO NOGUEIRA 2011, p. 3):
Distinguem-se, todavia, pelo caráter satisfativo de uma, inexistente na outra. As medidas cautelares exerceriam em nosso sistema apenas a função de assegurar a utilidade do pronunciamento futuro, mas não antecipar seus efeitos materiais, ou seja, aqueles pretendidos pela parte no plano substancial. A diferença fundamental entre ambas residirá, pois, nesse aspecto provisoriamente satisfativo do próprio direito material cuja tutela é pleiteada de forma definitiva, ausente na cautelar e inerente na antecipação.
O posicionamento judicial unanime em torno do assunto arremata a questão:
Tutela antecipada não se confunde com a medida liminar cautelar, eis que nesta a providência se destina a assegurar a eficácia prática da decisão judicial posterior, enquanto que naquela existe o adiantamento do próprio pedido da ação. (Agravo 4.266/1996 - Acordão unanime da 5° câmara do TJRJ de 10.12.1996/ desembargador Miguel Pachá RDTJRJ 32/240)
Para findar as diferenças dos institutos supracitados se faz válido dar ensejo ao entendimento de Antônio Cláudio da Costa Machado (2006, p. 616-617 apud NOGUEIRA 2011, p. 9):
Contrariamente ao posicionamento corrente da doutrina que vem vislumbrando com presente dispositivo apenas a fungibilidade do pedido de tutela antecipada, ousamos divergir para afirmar que este parágrafo 7° significa muito mais que isso, posto que a ideia de Fungibilidade pressupõe o equivoco da parte ao solicitar providência antecipatória em vez o equívoco da parte ao solicitar providência antecipatória em vez da natureza cautelar, quando, na verdade, o que o texto sob enfoque permite á que, a partir de agora, se peça naturalmente providência cautelar da mesma forma como se pede antecipação da tutela, vale dizer, independentemente de propositura da ação cautelar incidental(...). O que queremos salientar é que a parte não precisa errar na qualificação jurídica da providência para que o juiz possa conceder-lhe o provimento acautelatório – se a postulação inadequada ocorrer, sem nenhum problema o juiz poderá compreendê-la, à luz da necessidade real da parte, e conceder a cautela, tendo em conta a fungibilidade, pelo contrário pode deliberada e conscientemente requerer por essa nova forma de tutela cautelar incidental.
Expõem por derradeiro Machado, na mesma passagem a relevância o parágrafo 7° do artigo 273 do Código de Processo Civil sobre o prisma do assunto tratado:
Para que se alcance toda a potência normativa que este novo parágrafo 7° proporciona, destarte, basta que se interprete a locução ‘a título’ como ‘ na forma’ e aí teremos um resultado exegético verdadeiramente significativo para o processo civil. Atente-se, por derradeiro, para o fato de que essa nova regulamentação introduzida no artigo 273 não representa o desaparecimento do processo cautelar, porquanto as cautelares antecedentes (chamadas preparatórias) permanecem intactas no sistema (art. 796, do CPC) e nem mesmo a morte do processo cautelar incidental, na medida em que o art. 796 referido não foi alterado pela Lei n. 10.444/2002(...), de sorte que apenas quando o juiz verifique que o requerimento de cautela (art. 273, parágrafo 7°) se encontra bem instruído, não depende de prova oral e não vai gerar tumulto nos autos do processo cognitivo, então o órgão jurisdicional concede a providência solicitada;
Todavia podem ser verificadas semelhanças entre as tutelas antecipatórias e acautelatórias, ensina Sansana e Nogara (2012, p. 93-94):
a) cognição sumária – Derivada diretamente da necessidade de agilidade no julgamento, a tutela de urgência não permite ao Magistrado a utilização de uma fase instrutória demasiadamente longa. O procedimento cautelar deve ser rápido e ágil coma a finalidade de garantir proteção ao direito ameaçado. Dessa forma o juiz deve julgar as demandas com base em cognição sumária.
b) provisoriedade – Tanto as sentenças cautelares quanto a decisão que concede a tutela antecipada não estão sujeitas à coisa julgada material, assim permitindo ao Magistrado desconstituir o ato primeiramente formado, desde que com a devida fundamentação dos motivos que o levaram a alterar a decisão.
c) revogabilidade – As decisões fundadas em cognição sumária não poderiam, por lógica, acarretar em provimentos definitivos, dessa forma, como ensina Wambier (2006, p. 313), a tutela de urgência é revogável a qualquer momento, desde que o juiz entenda que a situação que fez deferir a medida cesse ou não mais possa resultar em um efeito grave ou de difícil reparação ao requerente. Assim alterados os fatos ou o quadro instrutório em que se tenha embasado a decisão anteriormente proferida, outra deverá ser prolatada em seu lugar.
d) reversibilidade – A revogabilidade é uma característica diretamente ligada ao fato da tutela de urgência ser provisória e baseada em cognição sumária. Como o juiz, ao julgar, não se baseia em cognição plena, a tutela de urgência pode ser revogada a qualquer tempo. Assim sendo, em caso de revogação da medida, deve ser possível o retorno ao status a quo ou, ao menos, pode o juiz, para garantir essa reversibilidade, exigir do requerente da medida de urgência caução a fim de indenizar um possível prejuízo.
Por fim vale salientar que com o Projeto do Novo Código Civil o livro das tutelas cautelares será extinto, sobre este assunto ainda observa Sansana e Nogara (2012, p. 96):
Atribui-se aos potenciais livros os seguintes títulos: Livro I - Parte Geral; Livro II - Do Processo de Conhecimento; Livro III – Do Processo de Execução; Livro IV – Dos Processos nos Tribunais e dos Meios de Impugnação das Decisões Judiciais; por fim, Livro V – Das Disposições Finais e Transitórias. Pontuando e adequando ao que condiz a este estudo, observa-se não mais haver a previsão no Anteprojeto de um Livro como o atual Livro III – Do Processo Cautelar. O que se denota é a inserção das tutelas de urgência na Parte Geral, não havendo, portanto, mais a previsão da tutela antecipada dentro do Livro I referente ao processo de Conhecimento, como também não mais existindo um livro próprio para tratar do processo cautelar (...).
Acrescenta ainda o Prof. Catarina (2011):
O Projeto do Novo Código de Processo Civil trata das tutelas de urgência em seus artigos 277 a 293. O Título IX, Capítulo I dispõe sobre as disposições comuns, da tutela de urgência cautelar e satisfativa, e o Capítulo II dispõe sobre o procedimento para as tutelas de urgência requerida incidentalmente e requerida em caráter antecedente. A primeira grande mudança foi a extinção do processo cautelar. (...) Com efeito, não é mais o autor da demanda que elege a via a ser utilizada, cautelar ou antecipação de tutela, e sim a própria natureza da demanda que irá definir se é hipótese de cautelar ou antecipação. O Código privilegia a sistemática das tutelas de urgência, não dando margens para dúvidas objetivas das partes. Algumas disposições do processo cautelar do Código de Processo Civil foram aproveitadas no Projeto, como a responsabilidade processual do requerente, nos casos em que o deferimento da medida liminar causar dano ao requerido (art.282) e a fixação da competência para o requerimento de tutela de urgência antecedente (art.280), regra disposta no art. 810 do atual CPC.
2.3 Requisitos Essenciais
O artigo 273 do Código de Processo Civil vigente é categórico nos requisitos para a concessão da tutela antecipada; sendo esses: requerimento da parte; identificação total ou parcial da tutela antecipada; existência de prova inequívoca; verossimilhança na alegação; fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou caracterização do abuso do direito de defesa; ou manifesto propósito protelatório do réu e por fim a possibilidade de reversão da medida antecipada. Entretanto para neste trabalho nos apegaremos aos seguintes requisitos:
• Existência de prova inequívoca;
• Verossimilhança na alegação e por fim fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação;
• Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação;
• Manifesto propósito protelatório do réu ou caracterização do abuso do direito de defesa;
Os dois primeiros requisitos estão expostos no caput do artigo 273 do CPC; sendo essenciais para a concessão da antecipação da tutela. Discorre brilhantemente o doutrinador Theodoro Júnior. (2005, p. 448) sobre o primeiro requisito:
Por ser tratar de medida satisfativa tomada ante de completar-se o debate e instrução da causa, a lei a condiciona a certas precauções de ordem probatória. Mas do que a simples aparência de direito (fumus boni iuris) reclamada para as medidas cautelares, exige a lei que a antecipação de tutela esteja sempre fundada em “prova inequívoca” (...) É inequívoca, em outros termos, a prova capaz, no momento processual, de autorizar uma sentença de mérito favorável à parte que invoca a tutela antecipada, caso pudesse ser a causa julgada desde logo. Dir-se-á que, então, melhor seria decidir de vez a lide, encerrando-se a disputa por sentença definitiva. Mas não é bem assim. O julgamento definitivo do mérito não pode ser proferido senão a final, depois de exaurido todo o debate e toda a atividade instrutória. No momento, pode haver prova suficiente para a acolhida antecipada de pretensão do autor. Depois, porém, da resposta e contraprova do réu o quadro de convencimento pode resultar alterado, e o juiz terá de julgar a lide contra o autor.
Kazuo Watanabe (1996, p. 33 apud ELIANE SILVANA DE SOUZA, 2004) observa importante aspecto sobre a prova inequívoca:
(...) Mas um ponto deve ficar bem sublinhado: prova inequívoca não é a mesma coisa que (fumus bonis iuris) do processo cautelar. O juízo de verossimilhança ou de probabilidade, como é sabido, tem vários graus, que vão desde o mais intenso até o mais tênue. O juízo fundado em prova inequívoca, uma prova que convença bastante, que não apresente dubiedade, é seguramente mais intenso que o juízo assentado em simples fumaça, que somente permite a visualização de mera silhueta ou contorno sombreado de um direito.
Já a verossimilhança da alegação tem a equivalência de aparência da verdade, ou seja, quanto ao momento do fato alegado o juízo de verossimilhança deverá ser em relação à alegação do fato e não propriamente sobre o fato, sendo assim faz-se essencial que a parte ao se manifestar nos autor traga a este provas inequívocas para se comprovar a verossimilhança do fato ocorrido, convencendo o juízo que naquele momento à verossimilhança no que foi alegado. Segundo Elpídio Donizetti Nunes (1999, p. 167 apud COUTO JR. 2003):
A verossimilhança guarda relação com a plausividade do direito invocado, com o fumus boni iuris. Entretanto, na antecipação da tutela, exatamente porque se antecipam os efeitos da decisão de mérito, exige-se mais do que a fumaça: exige-se a verossimilhança, a aparência do direito.
Ilustra o desembargador Paulo Afonso Brum Vaz (2002, p. 136-137 apud GEOVANO PRUDENCIO FLOR, 2012) sobre o assunto:
À análise da verossimilhança, que corresponde a um juízo de probabilidade, calcado em cognição sumária, importam duas operações. Num primeiro momento, faz-se um juízo de probabilidade quanto à situação fática refletida na inicial. Positivo este juízo, porque os fatos aparentemente são verossímeis, impõe-se verificar se as consequências jurídicas pretendidas pelo autor são também plausíveis, vale dizer, se a tese jurídica contida na inicial é provida de relevância, tem respaldo na ordem jurídica. Esta aparência verossímil deve apresentar-se de forma inequívoca, ou seja, revestida de contornos tais que permitam ao juiz um convencimento razoável. Deve-se lembrar, no entanto, que não se exige um convencimento pleno, pois a certeza é apanágio da verdade real (utópica), não de mera probabilidade.
Ensina ainda no mesmo trecho sobre a contradição entre a prova inequívoca e a verossimilhança:
A contradição entre as expressões prova inequívoca e verossimilhança (a prova inequívoca transmite muito mais do que a ideia de verossimilhança) é só aparente. Quis o legislador reforçar a necessidade de se contar com algo mais do que mera fumaça do bom direito, contraindicando o provimento antecipado quando a prova apresentada se revela equívoca. Verossimilhança e prova inequívoca são conceitos que se completam exatamente para sinalizar que a tutela somente pode ser antecipada na hipótese de juízo de máxima probabilidade, a quase certeza, mesmo que de caráter provisório, evidenciada por suporte fático revelador de razões irretorquíveis de convencimento judicial.
No que se refere ao terceiro requisito: fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, entende Lopes (2003, p. 71-72) de se tratar “conceitos jurídicos vagos ou indeterminados”, ou seja, são conceitos indeterminados, que não contam com a definição legal cabendo, portanto, ao juízo, a interpretação de acordo com cada caso concreto. Manifesta seu entendimento Francisco Antônio de Oliveira (1997, p. 58 apud COUTO JR. 2003):
O risco de dano irreparável ou de difícil reparação que poderá dar ensejo à tutela antecipada não é aquele que reside em sede subjetiva da parte. O risco deve ser concreto, objetivamente demonstrado, não hipotético. Deverá ser atual, vale dizer que se apresente de imediato no curso do processo. Deverá revestir-se de tal gravidade que poderá prejudicar a parte de forma irreversível. Disso resulta que ainda haja risco revestido de gravidade, mas não seja iminente, não haverá razão para a antecipação de tutela.
José Joaquim Calmon de Passos (1995, p. 17-18 apud RODOLFO PAMPLONA FILHO 2001) expõem que:
Disciplinando o processo cautelar, o artigo 798 do Código de Processo Civil fala em fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação. Espero que, por comodidade ou artimanha, não se tente ver identidade entre as duas situações. Na cautelar, o juiz analisa o risco de ineficácia da futura tutela provável. Na antecipação, o juiz analisa a necessidade de ser executada, de logo, provisoriamente, a decisão de mérito, que proferiu ou vai proferir, em condições normais sem aptidão para constituir-se título legitimador de execução provisória do julgado.
Conclui o autor por fim a necessidade de averiguação do risco de dano para a concessão da antecipação da tutela:
Por isso mesmo, a cautelar requer exista ato da parte e dele derive o risco de dano, ao passo que, na antecipação, isso é de todo irrelevante, devendo o magistrado considerar apenas a necessidade de antecipação da eficácia do julgado porque, se não deferida, haverá risco de ocorrerem, para o autor, danos que serão eliminados, se antecipação houver. Risco objetivo, sem se considerar o comportamento do réu, sua culpa, seu dolo, sua contribuição para que os danos venham a existir. Analisa-se a situação do autor e exclusivamente ela, para, em razão de fatores objetivos, se concluir pela necessidade ou não da antecipação e essa necessidade só se verificará quando houver o fundado receio de que os danos ocorrerão.
Ainda pode ser verificada a importância da análise desses requisitos através de julgados do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. TUTELA ANTECIPADA. VEROSSIMILHANÇA DA ALEGAÇÃO. RECEIO DE DANO DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. 1. (...) 5. Não bastasse a discussão envolvendo tamanho número de provas e essa sabida divergência entre a interpretação pretérita e a atual do Superior Tribunal de Justiça no que concerne aos arts. 15, § 1º, III, "a", e 20 da Lei nº 9.249/95, o que mais chamou a atenção no exame da antecipação de tutela foi a iminente conversão em renda do depósito efetuado pelo autor nos autos do mandado de segurança originário. 6. Com efeito, há urgência no provimento requerido, porquanto consta nos autos manifestação do magistrado de primeira instância, determinando a imediata conversão, sendo igualmente certo que a Caixa Econômica Federal já havia recebido ofício ordenando que tal providência fosse tomada em 10 (dez) dias. 7. Nesse contexto, a razoabilidade e a prudência recomendam que a decisão em causa permaneça suspensa, conferindo-se regular trâmite à demanda que, em uma análise perfunctória, reuniu as condições indispensáveis a sua apreciação. Sob outro ângulo, os contratempos que a conversão em renda poderá gerar, caso a ação rescisória seja julgada procedente, são suficientes para justificar a concessão dessa excepcional medida em nome da cautela, para preservar o resultado útil do processo e a sua efetividade. 8. No mais, a rescisória já se encontra em fase avançada de tramitação - declarado saneado o feito, as partes apresentaram suas razões finais -, de sorte que, após a oitiva do Ministério Público Federal, serão tomadas as providências para seu julgamento definitivo. 9. Agravo regimental não provido. (AgRg na AR 4519 / SC - AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISORIA 2010/0128044-2/ ministro Castro Meira/ S1; STJ)
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. EXTENSÃO DOS EFEITOS ATÉ TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. PREJUDICIALIDADE DO JUÍZO SUMÁRIO DE VEROSSIMILHANÇA. CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. REFORMA AGRÁRIA. LEI 9.394/96 (LEI DAS DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL). AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA. POLÍTICAS AFIRMATIVAS. 1. A tutela antecipada pelo Tribunal a quo, ao julgar Agravo de Instrumento contra decisão interlocutória que indefere a medida, não tem efeitos prolongados até o trânsito em julgado da demanda, tornando-se prejudicada, caso a decisão do juízo monocrático seja de improcedência. 2. A eficácia das medidas liminares – as quais são fruto de juízo de mera verossimilhança e dotadas de natureza temporária – esgota-se com a superveniência de sentença cuja cognição exauriente venha a dar tratamento definitivo à controvérsia. Precedentes do STJ. 3. A efetividade das Políticas Públicas não pode ser frustrada mediante decisões pautadas em mera cognição sumária quando há sentença que exaure o meritum causae por completo. 4. 8. Entre os princípios que vinculam a educação escolar básica e superior no Brasil está a "igualdade de condições para o acesso e permanência na escola" (art. 3°, I, da Lei 9.394/98). A não ser que se pretenda conferir caráter apenas retórico ao princípio de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, deve-se a esta assegurar a possibilidade de buscar formas criativas de propiciar a natureza igualitária do ensino. 9. (...) 11. Recurso Especial provido para determinar a limitação dos efeitos da tutela, antecipada pela Corte de origem, até a sentença de improcedência. (REsp 1179115 / RS - RECURSO ESPECIAL 2010/0020403-6/ ministro Herman Benjamin/ T2; STJ)
Vale salientar sobre o quarto requisito, que o inciso II, do artigo 273 do CPC trás duas hipóteses para a concessão do instituto discorrido, sejam eles “abuso do direito de defesa” ou “manifesto propósito protelatório do réu”, sendo que o primeiro pode ser interpretado pelo abuso do direito garantido que a parte tem de contestar ou recorrer e o segundo diz respeito aos atos que tentam retardar, atrapalhar o curso normal do processo.
Nessa esteira de raciocínio esclarece Calmon de Passos (1995, p. 25 apud SILVA; OLIVEIRA 2004, p. 20):
A par do abuso de direto, também pode fundamentar a antecipação à comprovação nos autos de que há, por parte do réu, manifesto propósito protelatório. (...) Quem postula sem fundamento sério, abusa do direito de mandar; inclusive que, no curso da demanda, provoca incidentes infundados, além do abuso do direito, revela propósito manifestamente protelatório. Também que opõe resistência injustificada ao andamento do processo exterioriza manifesto intuito protelatório. Protelatório é tudo que retarda, sem razão atendível, o andamento do feito. E esse instituto é manifesto quando desprovido do ato, tido como protelatório, de justificação razoável, vale dizer, quando dele não poderá resultar proveito processual lícito para o interessado em sua prática.
Elenca Marcelo Bertoldi (1997, p. 317 e ss. apud LOPES 2003, p. 75) as seguintes situações que pode se encaixar no artigo 273, inciso II:
a) defesa de pontos antagônicos em processos diferentes;
b) defesa conta ato incontroverso;
c) defesa carecedora de consistência;
d) alegação tardia de fato relevante;
e) alegações contrárias a documentos exibidos pela própria parte;
f) interposição de recurso manifestamente incabível.
Em consonância com o acatado pode ser observado à relevância dos requisitos para a concessão dos efeitos antecipados da tutela expostos pelas seguintes ementas:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ISS. ART. 9º, §§ 1º E 3º, DO DECRETO-LEI N. 406/68. NATUREZA DA SOCIEDADE VERIFICADA PELA CORTEDE ORIGEM. ENQUADRAMENTO. REEXAME FÁTICO. REQUISITOS PARA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. SÚMULA 7/STJ. O Tribunal de origem, soberano das circunstâncias fáticas e probatórias da causa, decidiu a questão com base nas provas dos autos, alegando que a empresa recorrente não faz jus ao tratamento diferenciado previsto do Decreto-Lei n. 406/68, bem como alegou que não estão presentes os requisitos processuais para o deferimento da antecipação da tutela. Incidência da Súmula 7/STJ. Agravo regimental improvido. (AgRg no AResp 11305/SP AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL2011/0259571-6 - Ministro Humberto Martins / T2; STJ)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ANÁLISE SOBRE OS REQUISITOS DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. RETENÇÃO DO RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 542, § 3º, DO CPC. AUSÊNCIA DE PERIGO DE DANO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A discussão quanto à existência dos requisitos para a concessão de tutela antecipada, em vista das peculiaridades da causa, demanda o reexame de matéria fática, circunstância obstada pelo enunciado 7 da Súmula desta Corte 2. Em se tratando de decisão interlocutória incapaz de trazer risco de perecimento do direito do recorrente, incide o disposto no artigo 542, § 3º do Código de Processo Civil a obstar a subida do recurso especial. 3. Não tendo o agravante trazido qualquer razão jurídica capaz de alterar o entendimento sobre a causa, mantenho a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos. 4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento, com aplicação de multa prevista no art. 557, § 2º, do CPC. (EDcl no AREsp 57144 - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2011/0159278-9 / RS - Ministro Luis Felipe Salomão/ T4; STJ)
É relevante mencionar a confusão que se faz em relação aos requisitos para a concessão da antecipação de tutela e os requisitos para a aplicação da medida cautelar baseado no Código de Processo Civil vigente. Ocorre que, por exemplo, para a aplicação da medida cautelar será necessária apenas o fumus boni iuris, enquanto a tutela antecipada deverá apoiar-se na prova inequívoca.
Ainda assim este assunto não se trata de matéria pacífica entre os doutrinadores brasileiros, entretanto este trabalho não tem o intuito de se aprofundar neste tema, cabendo aqui à distinção dos requisitos de aplicação dos institutos supramencionados da seguinte maneira: medida cautelar: “fumus boni iuris” e “periculum in mora”; antecipação de tutela: os requisitos trazidos pelo artigo 273 do CPC. Todavia deve ser observada a tendência do STJ nos últimos anos, sobre o assunto através dos seguintes julgados:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. CONCURSO PÚBLICO. EXAME PSICOTÉCNICO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. REVISÃO. SÚMULA N. 7/STJ. 1. Não houve a alegada violação dos arts. 165, 458, e 535, do CPC. O aresto combatido está claro e contém suficiente fundamentação para solver integralmente a controvérsia. O que houve, na verdade, foi mera tentativa de rejulgamento da causa, sob o enfoque desejado pela parte, o que sabidamente não tem lugar entre as hipóteses de cabimento dos embargos declaratórios. O simples fato de não ter sido acatada a tese defendida pela parte embargante não configura omissão, tampouco negativa de prestação jurisdicional, desde que haja fundamentação adequada capaz de sustentar a conclusão da decisão. 3. Não se depreende do acórdão recorrido o necessário prequestionamento do referido dispositivos legal 6º, §1º, da Lei de Introdução ao Código Civil - LICC, nem mesmo da tese defendida pelo recorrente, deixando de atender ao comando constitucional que exige a presença de causa decidida como requisito para a interposição do apelo nobre (art. 105, inc. III, da CR/88). Incidência da Sumula n. 211 desta Corte. 4. Há entendimento firmado nesta Corte no sentido de não ser possível, por meio da via eleita, a verificação da presença ou não dos requisitos necessários para que seja deferida eventual medida liminar em sede de antecipação de tutela (fumus boni iuris e periculum in mora), porquanto tal análise demanda a revisão dos elementos fático-probatórios acostados nos autos, providência expressamente vedada pela Súmula n. 7/STJ. 5. Na espécie, o Tribunal de origem, à luz do contexto fático do caso concreto, expressamente consignou que estão presentes as condições para o deferimento da medida pleiteada. Dessa forma, não há como acolher o pleito da agravante, em virtude da incidência do óbice sumular mencionado. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 9643 / RS - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2011/0064875-7/ ministro Mauro Campbell Marques/ T2; STJ)
RECLAMAÇÃO – DECISÃO DE JUIZ DE PRIMEIRO GRAU QUE DEFERE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA – PRESENÇA CONCOMITANTE NÃO DEMONSTRADA – LIMINAR INDEFERIDA. 1. Cuida-se de reclamação, com pedido de liminar, ajuizada contra decisão - proferida pelo Juiz Federal da 9ª Vara do Juizado Especial Cível de Campina Grande - SJ/PB - que deferiu antecipação dos efeitos da tutela requerida em ação declaratória de inexigibilidade de imposto de renda incidente sobre as verbas referentes ao auxílio pré-escolar. 2. Em juízo perfunctório, no caso do autos, não tenho como presentes, de imediato, os requisitos necessários à concessão da liminar, que é de natureza excepcional, porquanto simplesmente foi alegado que é indispensável o rápido restabelecimento da autoridade e competência desta Corte. Agravo regimental improvido. (AgRg na Rcl 4209 / PB - AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO 2010/0082396-4/ ministro Humberto Martins/ S1; STJ)
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO RESCISÓRIA. TUTELA ANTECIPADA. REQUISITOS. 1. A antecipação de tutela em Ação Rescisória é medida excepcional e depende da presença de prova inequívoca da verossimilhança da alegação e do receio de dano irreparável ou de difícil reparação. 2. Nos termos do art. 489 do CPC, a concessão da medida liminar só poderá ser feita caso presentes os pressupostos legais (art. 273 do CPC) e, ainda, imprescindível a medida (AgRg na AR 3715/PR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 27.6.2007, DJ 27.8.2007, p. 172). 3. Deve ser mantida a decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela, porquanto, antes do contraditório, ausentes os requisitos para a sua concessão. 4. Agravo Regimental não provido. (AgRg na AR 4747 / RS - AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISORIA 2011/0180598-9/ ministro Herman Benjamin/ S1; STJ)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO RESCISÓRIA. TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA ELENCADOS NO ART. 273 DO CPC. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO. I- A tutela antecipada tem como finalidade precípua adiantar os efeitos da tutela de mérito, de sorte a propiciar sua imediata execução. Assim, dada suas implicações na marcha processual, em sede de ação rescisória deve ser vista como regra de exceção, justificável, apenas, em situações que atendam os requisitos ínsitos no art. 273 do CPC, quais sejam, a prova inequívoca da verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. II- A viabilidade da ação rescisória por ofensa à literal disposição, in prima facie, não se visualiza no caso concreto, vez que a decisão recorrida não teria declarado a prescrição dos valores retroativos ao ajuizamento da ação pelo simples fato de tal questão não ter sido apontada por nenhum dos litigantes. III- O fato de ser faculdade do julgador pronunciar, de ofício, a prescrição, não exime o recorrente de alegá-la, em sua defesa, durante a fase de conhecimento do feito. Tendo esse se mantido silente durante toda a formação do título executivo judicial, não é possível o seu reconhecimento, em sede de antecipação de tutela, com o fito de suspender a marcha processual, ora na fase executiva, vez que tal mister ocasionaria danos invertidos ao réu, que já obteve tutela favorável transitada em julgado. IV- É do entendimento desta Corte que o significativo valor da execução, o caráter alimentar da condenação e a iminência de pagamento do precatório não caracterizam, por si sós, situação excepcional a autorizar a suspensão da decisão rescindenda. Precedentes. V- Agravo interno desprovido. (AgRg na AR 4741 / SC - AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISORIA 2011/0170559-0/ ministro Gilson Dipp/ S3; STJ)
Entretanto é imprescindível mencionar as mudanças que ocorrerão em relação aos requisitos das tutelas de urgência em geral com o advento do novo Código de Processo Civil (tema será aprofundado no capítulo IV). Sobre o tema preconiza Catarina (2011):
Os requisitos para a antecipação concessão de tutela de urgência estão dispostos nos artigos 283 e 284 do Projeto. Segundo o comando do art. 283, o juiz somente concederá a medida se estiverem presentes elementos que evidenciem a plausibilidade do direito como também a demonstração do risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Com efeito, verifica-se que o projeto reuniu os requisitos para a tutela cautelar e para antecipação de tutela na referida norma. O Projeto ampliou a possibilidade de concessão de tutela de urgência de ofício. Segundo o art. 284, ‘Em casos excepcionais ou expressamente autorizados por lei, o juiz poderá conceder medidas de urgência de ofício’. A despeito da norma ser um avanço, a praxe forense demonstra que os juízes utilizam com muito parcimônia a concessão das tutelas de urgência de ofício.
Como remate esclarece Sansana e Nogara (2012, p. 98-99):
O Anteprojeto do CPC trás como requisitos autorizadores para a concessão da tutela de urgência a plausividade do direito invocado, bem como a demonstração de risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Esses requisitos condizem com os necessários para a concessão da tutela cautelar do atual CPC. Sendo assim, o novo CPC, se aprovado, como consta no anteprojeto, facilitará a concessão do atual diploma processual, a mera existência do fumus boni iuris e do periculum in mora autorizará o juiz a deferir essas medidas que hoje necessitam de requisitos mais densos, como a verossimilhança, a prova inequívoca e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação. (...) Diante disso, erguem-se vozes para repelir uma teoria unitária, aduzindo serem os requisitos reclamados pelas cautelares mais amenos que os requisitos exigidos pela antecipação de tutela.
3 ANTECIPAÇÃO DE TUTELA COMO INSTRUMENTO DE EFETIVIDADE
3.1 Princípio da Efetividade e o tempo processual
Sabe-se que os princípios jurídicos regem o seguimento do processo, tendo valoração própria e instruindo o aplicador do direito; estes podem ser considerados formulações abstratas, porém que carregam valores jurídicos, econômicos e sociais a fim de orientar o aplicador jurídico dando coesão, amplitude e completude ao direto; Miguel Reali (1980, p. 299 apud CARLA FERNANDA MARCO 2008, p. 2) ainda afirma que os princípios são “os verdadeiros pontos de partida de uma ciência”.
Todo indivíduo que busca a atuação jurídica do Estado em uma causa está eivado de um interesse que lhe toca, ou seja, busca com a tutela jurisdicional e o reconhecimento do direito que lhe seja pertinente, almejando resultados práticos que alcance o plano material, indo além daquele processo. Pode se afirmar que o princípio da efetividade tem em si a função de conceder as partes o direito material almejado, observando seus limites legais. Cláudio Cintra Zarif (2006 apud THEODORO SAZZO AMORIM; AFONSO CLEBER ANGELUCI, 2010) ensina:
Não basta o acesso à justiça, com os meios e ela inerentes, se não se puder também garantir que o resultado desses processos irá realmente dar ao titular do direito tudo aquilo que obteria se não tivesse precisado se socorrer ao Judiciário.
Ilustre é o posicionamento de Theodoro Júnior. sobre o debatido (2012, p. 20):
A garantia de um processo justo, sob o prisma das garantias constitucionais, retrata, além de outros atributos, a ‘eficiência e a celeridade das decisões judiciais’, assim como ‘a efetividade da tutela jurisdicional’. É por essas possibilidades interpretativas da cláusula do devido processo legal, em todos os planos em que seu desenvolvimento reflete, que assume as proporções de um verdadeiro ‘standard de justiça’ capaz de limitar a atuação estatal, proteger os direitos fundamentais e concretizar a democracia. Permanece, pois, sempre atual a lição de Couture que qualifica como inconstitucional a lei processual que atrita com o primado da Constituição no tocante à garantias da tutela jurisdicional, privando o jurisdicionado da possibilidade de propor a ação, de defender-se, de produzir provas, de alegar, de impugnar a sentença, de ser por juízes idôneos e em prazos razoáveis. Há, no ordenamento jurídico, como reconhece a doutrina comprometida com o moderno processo justo uma grande ponte de ligação de um direito fundamental abstrato do texto constitucional com um direito fundamental concreto, ou seja, a transformação do direito declarado pela Constituição em direito efetivo e garantido opera-se pela obra dos Tribunais, por meio do processo.
Nessa esteira de raciocínio Lopes (2003, p. 32-33) afirma que:
No plano processual, indica a consecução do resultado prático objetivando pela atuação da jurisdição. Por outras palavras, é a realização plena dos fins perseguidos pelo processo. Pra se definir efetividade do processo cumpre, pois, antes de tudo, determinar seus fins ou objetivos. Como anota Marcacini é necessário “confrontar os ideais buscados pelo sistema processual - ideais que irão variar no tempo e no espaço – com os resultados alcançados. O vocábulo efetividade contém um significado aberto, a depender do que queremos realizar por meio do processo (...) falar na efetividade do processo implica previamente estabelecer o que queremos obter do sistema processual, para só então podermos aferir com que grau de intensidade estes objetivos foram atingidos”.
A aplicação do princípio da efetividade pode ser observado e consolidado nos julgados da justiça brasileira, observa-se a seguinte ementa do STJ:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL. INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. MEDIDA CAUTELAR. RESGUARDO DO INTERESSE PÚBLICO. EFETIVIDADE PROCESSUAL. ADEQUAÇÃO DO PROVIMENTO JURISDICIONAL ÀS PECULIARIDADES DA DEMANDA. ARTIGO 798 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CLÁUSULA GERAL. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. CONHECIMENTO DE OFÍCIO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO, COM BASE NO PODER GERAL DE CAUTELA. SITUAÇÃO EXCEPCIONALÍSSIMA. POSSIBILIDADE. 1. As medidas cautelares resguardam, sobretudo, o interesse público, sendo necessárias e inerentes à atividade jurisdicional. O artigo 798 do CPC atribui amplo poder de cautela ao magistrado, constituindo verdadeira e salutar cláusula geral, que clama a observância ao princípio da adequação judicial, propiciando a harmonização do procedimento às particularidades da lide, para melhor tutela do direito material lesado ou ameaçado de lesão. 2. A efetividade do processo exige tutela jurisdicional adequada, por isso o poder geral de cautela pode ser exercitado ex officio, pois visa o resguardo de interesses maiores, inerentes ao próprio escopo da função jurisdicional, que se sobrepõem aos interesses das partes. 3. A providência cautelar, ainda que de maneira incidental, pode ser deferida em qualquer processo, não procedendo a assertiva de que a verdadeira cláusula geral consubstanciada no artigo 798 do Código de Processo Civil, mesmo em casos excepcionais, tem limites impostos pelo artigo 739-A do Código de Processo Civil. Ademais, boa parte das matérias suscitadas pelo executado são passíveis de conhecimento, de ofício, pelas instâncias ordinárias, por serem questões de ordem pública 4. A Corte de origem apurou, em juízo sumário, que não há evidência de que o valor exequendo tenha sido disponibilizado ao executado, "podendo a constrição, na forma requerida, impedir que o Clube desenvolva suas atividades", portanto é adequada a suspensão da execução, de modo a suprimir o risco de o exequente obter atos executórios, que ocasionarão danos de difícil reparação ao executado. 5. Orienta a Súmula 07 desta Corte que a pretensão de simples reexame de provas não enseja recurso especial. 6. Recurso especial não provido. (REsp 1241509 / RJ - RECURSO ESPECIAL 2011/0043812-6 - Ministro Luis Felipe Salomão/ T4; STJ)
De acordo com José Carlos Barbosa Moreira (1997, p. 17-18), resume-se em cinco pontos a problemática da efetividade:
a) (...) o processo deve dispor de instrumentos de tutela adequados, na medida do possível, a todos os direitos (e outras disposições jurídicas de vantagem) completados no ordenamento, que resultam de expressa previsão normativa, que se possam inferir no sistema; b) esses instrumentos devem ser praticamente utilizáveis, ao menos em princípio, sejam quais forem os supostos titulares dos direitos (e das outras posições jurídicas de vantagem) de cuja preservação ou reintegração se cogita, inclusive quando indeterminado ou indeterminável o círculo de eventuais sujeitos; c) impendem assegurar condições propícias à exata e completa reconstituição dos fatos relevantes, a fim de que o convencimento do julgador corresponda, tanto quanto puder à realidade; d) em toda a extensão da possibilidade prática, o resultado do processo a de ser tal que assegure a parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus segundo o ordenamento; e) cumpre que se possa atingir semelhante resultado com o mínimo dispêndio de tempo e energias.
Mister se faz ressaltar que o princípio da efetividade não deve ser estudado de forma isolada, pode ser observado no artigo 5° da Constituição Federal/88, inciso LXXVIII: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantem a celeridade de sua trami
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