UMA ANÁLISE COMPLETA DE CONTRATOS FIANÇA MERCANTIL SOB A LUZ DA DISCUSSÃO QUANTO A MORTE DO FIADOR CONTRATO DE FIANÇA MERCANTIL
Por: Daniele Oliveira • 10/6/2019 • Trabalho acadêmico • 14.300 Palavras (58 Páginas) • 314 Visualizações
UMA ANÁLISE COMPLETA DE CONTRATOS FIANÇA MERCANTIL SOB A LUZ DA DISCUSSÃO QUANTO A MORTE DO FIADOR
CONTRATO DE FIANÇA MERCANTIL
CONCEITO E NOÇÕES DE FIANÇA MERCANTIL
Garantia ou caução é o meio pelo qual se assegura o direito de uma pessoa contra o inadimplemento de uma obrigação ou contra lesões decorrentes da inexecução do contrato. Nas palavras de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, a garantia diz respeito a todo negócio jurídico com o objetivo de oferecer ao credor uma segurança de pagamento, além daquela genérica situada no patrimônio do devedor.[106]
Na verdade, a obrigação, que é uma relação jurídica de ordem pessoal, significa algo que uma pessoa deve realizar compulsoriamente (ação, omissão, pagamento, etc.) e, sendo esta de natureza patrimonial, funda-se, evidentemente, no patrimônio do devedor-obrigado (garantia patrimonial do próprio devedor). Ou seja, quem está obrigado deve responder pelo débito com o qual está compromissado e a satisfação de tal débito pode ser dar por transferência voluntária de parte de seu patrimônio ou por transferência involuntária ou forçada (no caso de inadimplemento). Todavia, não raras vezes, o patrimônio de quem deve não é suficiente para satisfazer as suas obrigações. Em tais casos, costuma-se exigir um reforço de garantia, ou seja, além da garantia patrimonial do próprio devedor (garantia genérica), este deve apresentar uma garantia suplementar. Tal garantia pode se referir ao próprio patrimônio do devedor-obrigado, mediante a separação de um determinado bem, móvel ou imóvel, para ficar gravada e com o encargo de responder ele ou o seu rendimento pela satisfação da obrigação (bem que é destacado do patrimônio para ficar reservado ou com ônus como garantia de execução da dívida), ou, quando isto não for possível, se referir a segurança pessoal oferecida por um terceiro estranho à relação principal, que, voluntariamente, se propõe a satisfazer a obrigação (compromisso de solver pro debitore – solver o débito), no caso de o devedor-obrigado não cumprir o que foi acertado no tempo e forma ajustados em contrato.
A garantia é, de um modo geral, uma obrigação acessória visando melhor proteger o cumprimento de uma obrigação principal. Como vimos em capítulos anteriores, as garantias podem ser reais (quando ela se funda num direito real, como por exemplo, penhor, hipoteca, anticrese e direito de retenção) e pessoais ou fidejussória (quando ela se funda não numa coisa mas na responsabilidade pessoal de pessoa que não é parte contratante principal, como por exemplo, aval, fiança e o del credere).
Nesse sentido, ORLANDO GOMES DOS SANTOS esclarece que a garantia do cumprimento de uma obrigação, em reforço do vínculo originário, pode ser oferecida pelo próprio devedor ou por terceiro. Acrescenta ele que, quando o devedor vincula um bem ao pagamento da dívida, concedendo ao credor o direito de obtê-lo com o valor daquele, há garantia real, mas se a obrigação originária é reforçada por outra, assumida por terceiro, diz-se que há garantia pessoal. Uma vez oferecida esta garantia, haverá 2 (duas) obrigações: a) a obrigação principal; e b) a obrigação fidejussória. A obrigação fidejussória pode derivar-se: a) da lei; b) de uma declaração de vontade; ou c) de um contrato. Inclusive, quando contrato é fonte da garantia fidejussória, diz-se existir uma garantia convencional.[107]
Não é de hoje que se exige garantias suplementares para o bom e fiel cumprimento das obrigações. Por exemplo, JOSÉ XAVIER CARVALHO DE MENDONÇA relata que, no Direito romano, a garantia pessoal de um terceiro, que, voluntariamente, ligava-se acessoriamente ao débito principal, por ele responsabilizando-se, se o devedor não o realizar, no tempo e forma ajustados, denominava-se “caução” (Digesto, Título I, Livro 46; Institutas, Título 20, Livro 3°). Inclusive, como vimos antes, a fiança no Direito romano tinha por característica a gratuidade; qualidade esta que veio desaparecendo no Direito moderno. Outrossim, este instituto romano foi lentamente transformado pelo Direito canônico, o qual lhe retirou o cunho real para dar- lhe um sentido moral (caráter pessoal) até chegar ao juramento e à caução fidejussória.[108]
De maneira que, até o final da Idade Média, surgiram duas concepções distintas de garantia: a) a do Direito romano, sob o adágio: plus cautionis est in re, quam in persona (caução a mais se dá tanto sobre coisa quanto sobre pessoa ― Livro 25, Digesto de reg. juris); a partir de então se deu um caráter real à caução; e b) a do Direito canônico, que considera a caução sob o aspecto moral (cunho pessoal).
O Direito germânico, por sua vez, seguiu a corrente romana. Tanto é que o art. 232 do Burgerliches Gesetzbuch - B.G.B., depois de enumerar várias modalidades de garantias reais, dispõe, in fine, que, se a segurança não pode ser fornecida desta maneira, a constituição de uma outra caução suficiente pode ser admitida. Por outro lado, o Código Civil francês (art. 2.011) e o Código Civil italiano (art. 1.936) adotaram a orientação canônica. Por sinal o art. 1.936 do Código Civil italiano prescreve que se considera fiador aquele que, obrigando-se pessoalmente em face de um credor, garante o adimplemento de uma obrigação de outrem.
Todavia, MIGUEL MARIA DE SERPA LOPES destaca que a diferença entre a concepção romana e a concepção canônica não se encontra no conceito de fiança, ou de caução, senão do fato da caução real, no Direito germânico, atuar como elemento principal, enquanto a caução fidejussória toma um aspecto supletivo, o que não ocorre nos sistemas legislativos de caráter canônico.[109]
Segundo ORLANDO GOMES DOS SANTOS, há contrato de fiança quando uma pessoa assume, para com o credor, a obrigação de pagar a dívida, se o devedor não o fizer. De maneira que, quem contrai essa obrigação chama-se fiador, que é o devedor da obrigação fidejussória. O devedor da obrigação principal, a seu turno, denomina-se afiançado. Daí dizer-se que o contrato de fiança é um contrato de garantia suplementar ajustado entre o fiador e o credor do afiançado. Tem tal contrato, pois, a natureza de contrato subsidiário, já que sua execução está condicionada à inexecução do contrato principal. Todavia, tal condição pode ser eliminada por ajuste dos interessados, ao estipular a solidariedade entre o fiador e o afiançado (o fiador se torna um segundo devedor principal), como, via de regra, se procede na prática.[110]
Para CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, o contrato de fiança é o contrato por via da qual uma pessoa se obriga para com o credor de outra a satisfazer a obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.[111] Por sinal, sua definição toma por base a disposição contida no art. 818 do Código Civil de 2002.[112]
Nas palavras de HENRI DE PAGE, o contrato de fiança constitui um contrato acessório por força do qual uma pessoa se obriga para com um credor a garantir a execução de uma dívida contratada por outra pessoa, vinculando-se ela própria, se o devedor não a satisfizer.[113]
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