A OPRESSÃO É TANTA QUE O OPRESSOR ESCOLHE O QUE LHE OFENDE: UMA ANALISE SOBRE INSULTOS RACIAIS NO FACEBOOK
Por: Cíntia Frazão • 17/6/2018 • Artigo • 2.263 Palavras (10 Páginas) • 181 Visualizações
A OPRESSÃO É TANTA QUE O OPRESSOR ESCOLHE O QUE LHE OFENDE:
UMA ANALISE SOBRE INSULTOS RACIAIS NO FACEBOOK.
CINTIA MARIA FRAZÃO
Universidade Federal Fluminense – Departamento de Sociologia –Sociologia
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RESUMO
Nos últimos anos é possível perceber uma mobilização dos vários grupos sociais no intuito de buscarem igualdade de direitos, bem como, o respeito às suas especificidades, ocorre que com o avanço das redes sociais, como o Facebook, os embates virtuais sobre as questões raciais ganham muita visibilidade em um curto período de tempo. Com a ideia de impunidade, diante dos crimes cometidos, que domina as interações através das diversas redes sociais, seja pela dinâmica legal, ou antes, as barreiras encontradas para que os crimes dessa natureza sejam analisados pelo Poder Judiciário.
Palavras-chave: Racismo. Injuria Racial. Insultos Raciais. Facebook.
Inúmeras vezes nos deparamos com postagens ou noticias nas mídias mais “tradicionais”, como jornal e televisão de casos de Injuria Racial ou Racismo sofridos nos cyber espaço. Com a fluidez que a internet proporciona, além da aparente cortina de proteção criada pela sensação de “um não lugar”.
Partilhando das ideias de Marc Augé o não lugar tem como uma das suas características a não identitariedade, tratando-se de um jogo de construção dos espaços e na própria vivencia que permite uma nova dinâmica de tempo e a virtualização dos espaços. Essa noção nos permite ver que essa relação não é determinista, mas ela existe.
Antes do advento da Lei 12.737/2012 sobre crimes na internet apelidada de "Lei Carolina Dieckmann", que alterou o Código Penal para tipificar como infrações uma série de condutas no ambiente digital, as redes sócias mantinham ainda mais a sensação de “terra de ninguém”, daí a relação com o não lugar de Augé.
Apesar de existirem leis que tratam da questão racial no Brasil, eles são elaborados de forma pela qual a sensação de justiça não se faz presente, com a difícil tipificação dos casos como racismo resta o crime de injuria racial para dar conta dos inúmeros casos que aparecem diariamente nas redes, bem como fora da mesma, vele ressaltar que muitos desses casos só são registrados e levados à apreciação do poder judiciário em razão da divulgação e exposição que é dado aos mesmos. Mostrando como sem a atenção da mídia os negros enfrentam uma dificuldade enorme para ter acesso a resolução dos seus litígios de cunha racial.
O reconhecimento da existência do racismo no âmbito geral das relações não é o maior desafio que nos deparamos, mas sim o reconhecimento íntimo do preconceito racial. Questionados sobre o preconceito nas redes as pessoas esquivam-se para o discurso de liberdade de expressão ou usam como base o senso comum de que é “minha opinião”, discurso muito utilizado nas redes sócias que traz uma ideia, para quem usa, de isenção da pratica de injuria racial.
Faz-se presente a necessidade de uma conceituação de Racismo e de Injuria racial nos termos legais para entendermos os meandros da discriminação nas redes sociais e sua punição fora da rede. O marcador da diferença entre os crimes é que na injúria racial, o agente atribui qualidade negativa à vítima, no racismo o agente segrega a vítima do convívio social em razão de sua cor, raça etc. Seria exemplo o dono de estabelecimento comercial que nega a entrada de cliente em razão de sua cor, ou um dono de empresa que não fornece equipamentos para seu empregado em razão da sua cor.
Para analisar os insultos raciais no Facebook no presente artigo, trataremos o racismo nos termos de Da Matta onde o mesmo diz que o racismo em nosso sistema funciona para por cada coisa em seu lugar, tratando-se de um meio de hierarquização. Segundo o autor:
Apresento o caso do “racismo à brasileira‟ como prova desta dificuldade de pensar socialmente o Brasil e ainda como uma tentativa de especular sobre as razões que motivam as relações profundas entre credos científicos supostamente eruditos e divorciados da realidade social e as ideologias vasadas na experiência concreta do dia-a-dia. Observo, então, nesta parte, como o nossos sistema hierarquizado está plenamente de acordo com os determinismos que a0cabam por apresentar o todo como algo concreto, fornecendo um lugar para cada coisa e colocando, complementarmente, cada coisa em seu lugar” (p. 58-59)
Partindo do conceito de insulto pensando a luz das ideias de Charles Flynn que define o insulto como “um ato, observação ou gesto que expressa uma opinião bastante negativa de uma pessoa ou grupo.
Guimarães afirma que a função ou a intenção do insulto podem variar, mas estão sempre ligadas a uma relação de poder. Sejam eles feitos dentro de um grupo aonde os sujeitos põem em pratica um domínio verbal e o controle emocional dos participantes ou os que são tentativas de legitimar uma hierarquia social baseada na ideia de raça.
No Facebook diariamente encontramos exemplos de insultos raciais que evidenciam o racismo aflorado nas redes, seja por meio de mensagens privadas da própria rede enviadas para a pessoa alvo do racismo, ou em comentários públicos nas postagens em geral, existem os chamados “grupos de ódio”, aonde diversas pessoas combinam uma data especifica para atacar os negros através de insultos dos mais variados tipos, esses grupos ganharam grande visibilidade no casa da jornalista da rede Globo “ Maju”.
Os grupos dominantes estigmatizam os dominados através de uma dinâmica que é reforçada pelas relações de poder que os levam a crer e fazem que os sujeitos alvos das ofensas acreditem que os estigmas são ou podem ser verdade. Comumente são usados como meio de insultos os estigmas sociais e pessoais, como afirma Goffman que classificou em três tipos, anomalias corporais; defeitos de caráter e estigmas tribais ligados a raça, nação, religião, e mesmo classe.
Norbert Elias ao descrever a dinâmica do estigma ele narra que o mesmo serve para reforçar a “normalidade” dos estabelecidos, por sua vez, o negativamente estigmatizado é encarado como pessoa que está inabilitada para a aceitação social. O estigma limita as possibilidades de agir do sujeito e torna verossímil todas as características negativas atribuídas ao estigmatizado.
A conduta dos seres considerados normais perante o indivíduo estigmatizado é discriminatória e excludente, utilizando-se, ainda, de termos pejorativos para referenciá-lo. Assim, visando a adequar-se ao padrão de normalidade social, o estigmatizado pode esforçar-se para ser aceito pelo grupo; em outros casos, em contrapartida, pode ele assumir uma postura de fuga da realidade, que é a ele tão desfavorável, ou comportar-se de modo combativo.
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