Evolução Histórica da Questão Habitação no Brasil
Por: Claudilson Sampaio • 2/7/2021 • Relatório de pesquisa • 5.818 Palavras (24 Páginas) • 178 Visualizações
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA QUESTÃO HABITAÇÃO NO BRASIL
O enfrentamento do Estado brasileiro com as questões de moradia e habitação remonta ao final do século XIX, tendo, à época, um recorte sanitarista pois, visava estabelecer um controle da propagação de doenças e epidemias comuns em centros urbanos, por meio de códigos sanitários e de posturas que pudessem regular e estabelecer padrões para a construção de moradias para a crescente classe operária.
Não se vislumbrava qualquer ação promocional da moradia, enquanto direito autônomo, quando muito, uma tentativa de correção da precariedade da moradia disponibilizada para os segmentos mais carentes, sem tratar, contudo, da disponibilização de espaços adequados para a construção de novas moradias.
O tema moradia como parte integrante do dever estatal apenas veio a ser parte dessa plêiade de direitos após a I Guerra Mundial, quando países europeus começavam a discutir a questão habitacional em uma Europa que precisava ser reconstruída. No Brasil, durante a Ditadura Vargas, começou a ser desenhada a estrutura que daria suporte ao tratamento da questão moradia/habitação.
Primeiro foi preciso construir um sistema que financiasse a linha de produção de moradias. A solução encontrada à época foi direcionar os recursos arrecadados do Estado, dos empregados e dos empregadores de diversas categorias para os Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs), permitindo que esses IAPs atuassem como empreendedores imobiliários privados, trabalhando toda a cadeia de produção: compra da terra urbana, construção e venda. Não havia interferência estatal no desígnio da distribuição dos desenvolvimentos habitacionais.
Pode-se observar que esse mecanismo passou a acentuar as diferenças sociais, pois, assim como em todo empreendimento privado, o lucro torna-se um fim necessário. Exatamente por não haver intervenção estatal as terras precisavam ser adquiridas particularmente, o que tinha um reflexo direto no preço final, o que levava aqueles empreendimentos habitacionais com a melhor localização a apresentar melhor resultado nas vendas. O consectário lógico foi um melhor desenvolvimento de áreas urbanas já estruturadas, longe das periferias, e com valor acima da realidade econômica das classes trabalhadoras.
Importante observação a esse respeito foi feita por Renato Cymbalista e Isadora Tami Lemos Tsukumo[1]:
“A entrada do IAPs como grande players do mercado imobiliário certamente colaborou para o encarecimento das terras urbanas após a década de1940. A profissionalização e industrialização da construção civil aumentaram a velocidade da verticalização de trechos das grandes cidades, resultando em aumento dos preços das terras mais bem localizadas e maior segregação sócio-espacial. Por outro lado, a crescente adoção de transporte sobre pneus – automóveis para os mais ricos, ônibus para os mais pobres – viabilizou a abertura de imensas frentes de expansão urbana nas periferias das grandes cidades, onde os mais pobres acabaram por assentar-se, em locais longínquos e sem infra-estrutura, durante toda a metade do século XX. Dessa forma, a periferia autoconstruída significou a oferta de terra e moradia possível para a grande parte dos mais pobres nas cidades, não atendidos pelas políticas habitacionais.”
A tentativa de desenvolver a questão moradia através da iniciativa privada mostrou-se incapaz de solucionar o problema, ao mesmo tempo que acabou gerando mais um: assimetria entre os centros urbanos que atendia a classe média e as periferias sem infraestrutura mínima condizente com qualquer conceito de dignidade, que acabou servindo como depósito da classe trabalhadora.
Novos passos foram dados na tentativa de aperfeiçoar o sistema, o governo da Ditadura Militar decidiu trazer o gerenciamento dos recursos destinados ao financiamento de moradias para a tutela do Estado. Foi criado então o Banco Nacional de Habitação (BNH) que seria abastecido com recursos vindo do recém criado Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e, algum tempo depois, também pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Habitação (SBPH), juntos, constituíam o núcleo básico do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) que viria a ser o principal agente de financiamento habitacional.
O BNH foi o caminho encontrado para democratizar o acesso ao crédito para o financiamento de moradia, porém, quando da sua implementação, faltou a discussão acerca da oferta de terras para moradia de interesse social. O Banco, ao mesmo tempo que financiava o desenvolvimento de moradia de interesse social, que eram desenvolvidas pelo setor público, também viabilizava recursos para a iniciativa privada o que aumentou a disponibilidade de crédito da indústria da construção civil, consequentemente, aumentando a concorrência nas terras urbanas disponíveis, afetando seu preço, e por consequência, o custo da habitação nas áreas urbanas.
O efeito foi que as terras urbanas com melhor localização, consequentemente melhor infraestrutura, passaram a ser alcançadas, primordialmente, pelas classes que podiam pagar mais pelo produto final.
Com o crescente aumento no custo total da produção habitacional, devido ao encarecimento da terra urbana, o Estado, durante a Ditadura Militar, reelaborou o modo dos empreendimentos de interesse social destinados a moradia objetivando diminuir o custo final por unidade, passando a adotar o ganho por escala. Dessa forma aumentava-se o número de unidades construída por empreendimento possibilitando reduzir o preço final de cada unidade, porém, ganhando na quantidade.
O resultado foi o aparecimento de gigantescos conjuntos habitacionais que, pelo tamanho, necessitava de grandes áreas, o que por sua vez, só eram encontradas fora dos centros urbanos.
A década de 80 trouxe a luta pela redemocratização e com ela a discussão da elaboração de uma nova constituição alcançada pela eleição de uma Assembleia Constituinte em 1985. Uma inovação vista no processo de elaboração da nova constituição foi a possibilidade da participação da sociedade civil por meio das emendas populares cujas propostas seriam submetidas a debates público e assinada por um grande numero de cidadão para que fossem apreciadas pela Assembleia Constituinte.
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