A INVEÇÃO DO NORDESTE
Por: Pedro Silva • 23/4/2021 • Resenha • 2.148 Palavras (9 Páginas) • 692 Visualizações
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
CAMPUS MINISTRO PETRÔNIO PORTELA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS - CCHL
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS - DCIES
DISCIPLINA: HISTÓRIA REGIONAL
PEDRO HENRIQUE SOARES DA SILVA[pic 2]
RESENHA CRÍTICA: A INVENÇÃO DO NORDESTE E OUTRAS ARTES ARTES - DURVAL MUNIZ ALBUQUERQUE JUNIOR
TERESINA-PI
2021
INTRODUÇÃO:
A Invenção do Nordeste e Outras Artes é resultado da tese de doutorado de Durval Muniz de Albuquerque Júnior “O engenho anti-moderno: a invenção do Nordeste e outras artes” defendida em 1994 na UNICAMP e posteriormente publicada como livro em 1999. Partindo de uma abordagem foucaultiana com requinte de Certeau acerca dos espaços enquanto construção social, o autor se propõe a entender como se deu a criação do arranjo político-teórico-cultural que resultou na “invenção” do nordeste. Segundo Durval Muniz, o Nordeste é uma construção imaginária, discursiva e em grande medida reacionária que tem uma data de nascimento, fundação e invenção. O objetivo da obra com isso é demonstrar as implicações desse conceito para o entendimento do que seria o Nordeste e por sequência o nordestino, partindo do pressuposto que tais noções são arraigadas de preconceitos, estereótipos e um saudosismo em relação ao passado colonial e monárquico do país (antimodernidade), com isso Durval busca uma dissolução dessa ideia de “nordeste” a fim de situá-lo enquanto algo que foge a estes estereótipos, claro que o nordeste tem seca, fome, pobreza, miséria, porém não é só isso. Não é intenção do autor defender o nordeste, e sim atacá-lo, ele não quer sua salvação e sim a dissolução dessa maquinaria imagético-discursiva de reprodução das relações econômico-sociais de poder. A abordagem de Durval é importantíssima para o entendimento acerca da “nordestinidade” o todo de sua obra (não somente este livro) figura como altamente relevante para a debate do que seria esse nordeste e entender claro às reações que esse conceito de nordeste desencadeiam, o tema nordeste figura-se enquanto um dos mais estudados atualmente pela a ciências sociais brasileira e a obra de Durval Muniz não é única, porém é uma das que mais tem ganhados os holofotes para além da academia.
DESENVOLVIMENTO:
O objetivo da obra como mencionei é situar a ideia de nordeste enquanto algo construído(no sentido discursivo) e com data de nascimento, o final da década de 1920. O nordeste começou a ser pensado como uma forma de se contrapor às transformações políticas e econômicas pelas quais passava o país com o processo de modernização capitalista. O nordeste além de data de nascimento segundo Durval tem um pai, este seria Gilberto Freyre junto ao movimento regionalista. Com o livro O Nordeste (1937) formula definitivamente o conceito de nordeste, um conceito obviamente em benefício das oligarquias nordestinas fruto da decadência de um sistema canavieiro, construído numa visão saudosista e nostálgica da casa-grande. Durval Muniz vai dividir sua obra em três momentos distintos e bem separados que vão se intercalar a fim de mostrar os percalços com os quais a empreitada do “nordeste” se figurou enquanto um dos projetos mais exitosos da história do país.
O primeiro capítulo intitulado Geografia em ruínas vai deter-se a espacialidade da região visto enquanto um desmembramento das relações “Norte vs Sul” que figuravam os primeiros anos da república, a palavra nordeste nem mesmo existia na “páginas históricas”, o conceito nordeste vai aparecer primamente em documento de atuação da IFOCS(Inspetoria Federal de Obras Contra a Seca) em 1919, que destinava política, recursos e atenção federal a questão da seca na parte nordeste oriental do país, nesse documento era definido a área de atuação da IFOCS, que não abarcava nem todos os nove estados atuais que fazem parte da região. Abarcando somente os estados de Alagoas, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará, estados como Bahia, Maranhão, Piauí e Sergipe ficaram de fora. O nordeste com isso surge como desmembramento do Norte, porém nunca deixando o status de “outro” em relação a São Paulo. Com advento dos discursos regionalistas basicamente é instituída aquela realidade de outro, exótico, de pobreza, miséria e fome disseminadas pelo Sul. A “identidade” nordestina vai surgindo a partir daí, da relação dos indivíduos com a seca, violência, fome, pobreza, banditismo, messianismo entre outras, servindo de prato cheio para as “outras artes”, a exemplo a literatura. O nordeste enquanto espaço surge de uma reformulação do antigo norte.
Em Espaço da Saudade o nordeste vai surgir de forma reacionária as políticas de modernização e as estratégias de nacionalidade implementadas durante o início do século XX. O nordeste aqui é filho das secas e dos produtos imagéticos-discursivos produzidos pela literatura em razão das secas, é justamente as secas que chamam atenção da mídia e do país para aquela região, flagelo este que pela primeira vez “aproximou” o Sul dos seus “irmão do norte”. Com a institucionalização da seca montou-se o aporte de interesse político individual de políticos dos demais estados. Nordeste também era um espaço de medo da revolta dos pobres, do cangaço, do messianismo entre outros, é o espaço onde vai surgir também os intelectuais do nordeste advindos das elites de Pernambuco e localidades, entre eles estavam o “pai” gestor dessa ideia de nordeste segundo a visão de Durval Muniz que foi Gilberto Freyre. O regionalismo e tradicionalismo figuram como movimentos importantes na construção desse nordeste, surgindo em oposição ao movimento modernista com um saudosismo as tradições e culturas tidas como nordestinas. “Para Gilberto Freyre, o Nordeste voltaria a ser uma região criadora, desde que recuperasse suas tradições e praticasse o verdadeiro regionalismo, não o estadualismo.”(p.104). O nordeste representaria naturalmente o verdadeiro Brasil, fruto da mestiçagem entre as três raças, o que resultaria em um povo valente e temente a Deus, muito diferente dos paulistas endossados enquanto “europeus dos trópicos”. A construção sociológica do Nordeste, por Freyre, é presidida, pois, por uma estratégia política, o regionalismo freyriano, em grande parte apoiado pelo movimento literário de trinta, funcionava como uma nova forma de dizer e conhecer a realidade. Os romances de trinta operam sob personagens que carregam o arquétipo típico nordestino em confronto a decadência do sistema açucareiro, tem aí o nordeste mítico, de saudades, o espaço que os romances de trinta dotará de visibilidade a um nordeste de saudades, dimensão essa que se expandia aos temas regionais como o beatismo, banditismo, decadência do engenho, os retirantes e a seca. Nordeste é espaço de tradição, saudade do império, da escravidão, das glórias passadas onde era o centro econômico e cultural do império, este é o nordeste de apego aos códigos sociais e valores patriarcais, nordeste em favor de suas memórias passadas por isso segundo Durval deveria ser dissolvido.
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