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A situação dos curdos na Turquia e no Iraque: uma análise comparativa

Por:   •  16/11/2016  •  Artigo  •  5.493 Palavras (22 Páginas)  •  623 Visualizações

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A situação dos curdos na Turquia e no Iraque: uma análise comparativa

Alexandre Spohr Luiza Andriotti Josuá Gihad Soares

RESUMO: A situação dos curdos, o maior povo sem Estado no mundo, sempre foi de grande relevância para a dinâmica da Turquia e do Iraque. Para melhor compreender o manejo dessa minoria étnica transfronteiriça, este artigo analisa ambos os casos, comparando-os através de quatro abordagens: estudo dos partidos políticos curdos, análise estrutural, escolha racional e análise cultural. Dessa forma podemos entender os distintos desfechos da situação do povo curdo nos dois países. A partir da análise podemos compreender mais aprofundadamente a importância do poder estatal na manutenção do controle sobre as minorias, uma vez que as diferenças entre os casos decorrem desse elemento. PALAVRAS-CHAVE: Curdos, Turquia, Iraque, Minorias Étnicas, Partidos Políticos, Oriente Médio.

Introdução O processo de formação dos Estados nacionais iniciado na Europa Ocidental no século XII foi fruto da luta armada entre diferentes povos e de processos sócioeconômicos profundos. As disputas por delineação de fronteiras formaram, em alguns casos, Estados sob os quais coexistem diferentes povos. Essa coexistência nem sempre é pacífi ca: embora a pluralidade de povos seja reconhecida e abarcada pelas instituições políticas de alguns países; em outros, o confl ito entre as diferentes nações é constante e refl ete-se na estrutura governamental. Geram-se, a partir disso,

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fenômenos, como genocídios, guerras civis, regimes de sobreposição de uma etnia sobre as demais, etc. O presente artigo procura analisar um caso em que a formação de Estados nacionais contíguos separou geografi camente porções de um pretenso grupo étnico. Esse processo levou ao surgimento de uma questão intrincada que acabou por determinar padrões de interação política e social interna e regional. Embora essa confi guração se aplique a diversos casos, como os bascos, os hutus e os armênios, o caso escolhido é o dos curdos. Os curdos são considerados a maior nação sem Estado próprio no mundo. Contudo, sua defi nição como uma etnia é constantemente criticada, havendo diversas diferenças elementares entre os indivíduos, como idioma, religião e forma de organização da sociedade (BRUINESSEN, 1992). Além disso, são vários os casos em que os indivíduos não mais reconhecem a ideia de união entre os curdos dos diversos países que possuem cidadãos de tal etnia. Sua disposição geográfi ca em uma região historicamente marcada por confl itos armados com grandes números de baixas, associada a sua posição geoestratégica como corredor entre três diferentes continentes, aumenta a relevância da questão. Adicionalmente, a existência de vastas reservas de petróleo, bem como a presença das nascentes de dois importantes rios, Tigre e Eufrates, aumenta a tensão entre as diferentes forças políticas regionais. A relevância da presença curda na Turquia e no Iraque torna a análise desses casos bastante interessante para a melhor compreensão de sua situação. Para melhor entender as diferenças e as semelhanças entre a situação dessa minoria nos dois países, escolhemos alguns níveis de análise a partir de métodos estudados, com grande relevância da abordagem teórica de David Romano (2006). Portanto, dividimos a comparação em quatro abordagens: partidos políticos, análise estrutural, escolha racional, análise cultural.

Partidos Políticos A presença de partidos políticos que defendiam o nacionalismo curdo é uma constante nos dois casos analisados, sua importância para o desenvolvimento da situação curda nos dois países nos leva a estudar mais aprofundadamente essas organizações. Dois comentários que devem ser feitos antes de se iniciar a elencar as semelhanças e as diferenças entre os dois processos de evolução política do movimento curdo são: a diferença de poder de cada Estado e a quantidade de partidos curdos que desempenharam um papel relevante na articulação do movimento curdo. O processo de politização curda na Turquia, embora tenha suas origens na mesma época do surgimento do Partido Democrático do Curdistão Iraquiano (KDP), passa por um período de quase completa ausência entre os anos 1940 e

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1960. Após esse período, percebe-se uma mudança tão drástica nas características dos partidos que só se faz necessário analisar os partidos políticos que surgiram após esse período (ÖZCAN, 2006). Dessa forma, a análise dos partidos curdos na Turquia se centra no Partido dos Trabalhadores Curdos, enquanto que no Iraque ela se concentra no KDP e na União Patriótica do Curdistão (PUK). No entanto, a principal semelhança que pode ser apontada entre os dois movimentos está na formulação de seus objetivos. Embora ambos já tenham buscado resultados mais fortes, sua atual luta é pela autonomia da região por eles ocupada em cada país, se distanciando muito da ideia da criação de um Curdistão unifi cado (NACHMANI, 2003; YILDIZ, 2004). O diferente modo de formação dos partidos representa um dos principais pontos de diferenciação entre os movimentos curdos iraquiano e turco. No Iraque, a formação do KDP se deu através da reunião de tribos com diversos interesses e ideologias e teve como elemento unifi cador o interesse dos chefes tribais e as punições infl igidas aos que não aderissem. Assim, não havia uma grande coesão, o que explica a posterior divisão do partido com a criação do PUK (YILDIZ, 2004). Enquanto isso, na Turquia, a criação do PKK se centrou na elaboração de uma ideologia única, o que foi intensifi cado com o golpe de 1980, pois nessa época são eliminados os outros partidos curdos da Turquia. Desse modo, a única opção de defesa dos curdos passou a ser o PKK (ÖZCAN, 2006). Portanto, os processos históricos de criação do movimento nacionalista curdo em cada país levaram a um diferente grau de homogeneidade interna dos partidos. Enquanto o PKK conseguiu se desenvolver sobre bases ideológicas fortes e unifi cadas, a evolução do KDP levou ao agravamento das diferenças internas entre os grupos que o formaram no início, culminando na divisão do partido. A competição pelo apoio dos curdos entre PUK e KDP no Iraque, principalmente no período de isolamento dos curdos1, acrescenta um elemento à análise que não possui paralelo com a Turquia. Apesar da força que a união do movimento curdo possa parecer ter no caso turco, a situação dos dois grupos de curdos nos revela a importância de outros elementos para a confi guração dos resultados da luta entre o grupo insurgente e o governo central. Isso se comprova, uma vez que a união e a homogeneidade do PKK não foram sufi cientes para vencer o confl ito com o Estado turco, enquanto a desunião curda no Iraque obteve resultados extraordinários com o desenrolar da história iraquiana.

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