Análise e Comparação entre Max Weber e Franz Kafka
Por: Edudorado • 29/6/2017 • Ensaio • 2.011 Palavras (9 Páginas) • 724 Visualizações
Analisando algumas obras selecionadas de Franz Kafka e Max Weber, pode-se perceber que, para ambos, a lei/burocracia é um assunto de extrema relevância, e então, a partir disso, construiremos uma comparação e uma junção acerca deste tema; a qual será feita separadamente, relacionando o pensamento dos autores, Weber e Kafka, que viveram em um momento em que estados europeus experimentavam o desenvolvimento cultural e artístico ao mesmo tempo em que se preparavam para uma guerra de disputa por territórios fornecedores de matéria prima e mercado consumidor.
Em um trecho da obra "O Processo ", de Franz Kafka, nos é apresentado uma parábola ( intitulada “Diante da Lei”), na qual se relata a busca de um homem simples pela Lei, e como ele é impedido até seu último suspiro de ter acesso à ela. Ao final da parábola é possível chegar a diversas conclusões, isso porque o porteiro, que impediu o homem simples de entrar, havia dito em seu (do homem simples) último suspiro que “aquela porta só estava destinada a ele”, e, mesmo o porteiro sabendo disso desde o princípio, não o deixou adentrar. Com isso pode-se pensar que aquele homem poderia ser a representação de toda a sociedade e que, os “detentores” das leis não querem que os indivíduos participem da mesma. Ou ainda a questão não seria tanto quem enganava quem, se o homem simples enganava o porteiro, ou era o contrário. O importante, pode ser que a porta estava aberta ao camponês para que o mesmo a passasse, embora formalmente isso não fosse permitido. A lei, como proibição é mostra de um poder arbitrário, logo, deveria ser subvertida.
Enfim, com essa parábola é possível se chegar à diversas conclusões, o que talvez seja a real intenção do autor.
Em um dos textos de Weber (WEBER, Max. "Parlamentarismo e governo numa Alemanha reconstruída" (p. 7-59 e p. 72-91). In: Os Pensadores. São Paulo: Abril, 1974 (1918).) nos é mostrado mudanças ocorridas no contexto histórico da Primeira Guerra Mundial, relatando fatos ocorridos durante a reconstrução da Alemanha. Na obra, o autor diz que a mudança ocorrida naquele país (a vida parlamentar da Alemanha) foi alcançada graças ao Príncipe Bismarck, que, como chanceler, foi capaz de fazer a nação sacrificar as convicções da população e ainda provocar orgulho em toda a nação.
A seguir Weber discorre sobre como deveria ser o Estado, e como isso está presente na Alemanha. Segundo o autor, em um Estado Moderno é onde a burocracia verdadeiramente governa, isso através da administração da mesma. E essa burocracia está presente até mesmo no exército, é colocado pelo autor que a burocracia presente no país avança na administração municipal e desta forma há um avanço geral sobre toda a sociedade. Esse tipo de estado é refletido nas empresas capitalista que se utilizam dos mesmos meios de (administração e burocracia).
Weber entendia que o processo de burocratização era resultado da necessidade de um Estado manter e garantir o controle sobre um território, processo o qual tornou-se cada vez mais necessário com o advento da “Era Moderna”. Trata-se de uma forma de organização racional de tarefas a serviço do poder político, com a finalidade de economia de tempo e eficácia na execução das leis, afinal, a burocracia possui como um dos aspectos fundamentais a ideia de “dominação”.
A dominação seria, então, uma das representações de poder. O funcionamento e a manifestação de qualquer dominação se dão sob forma de governo, cujas tarefas, exigem um aumento crescente de treinamento e experiência, criando assim, uma dominação mediante a organização. Weber entendeu que existiam três tipos de dominação, baseados em sua forma de legitimação, isto é, conforme a natureza dos princípios e crenças que dão estabilidade à dominação: a tradicional (crença na justiça, em como os problemas foram resolvidos no passado), a carismática (crença em qualidades “excepcionais”) e a dominação legal (crença na justiça, na lei e no burocrata, que garante a aplicação das regras que têm força de lei).
Tudo em uma burocracia ocorre por meio de contratos e protocolos. Papéis, processos e departamentos com funções especializadas que visam garantir um maior controle, através de mecanismos legítimos, sobre um território e sobre as pessoas que nele habitam Assim, funcionários (profissionais especializados), que são representantes do Estado, mas não membros do governo, levam a burocracia, as regras que têm poder de lei, por toda a extensão territorial controlada por um Governo. Em determinado momento, tão grande ficou essa estrutura burocrática, que ela se tornou independente do poder que a criou, ganhando uma autonomia que pode até mesmo boicotar as decisões da autoridade. O Estado tornou-se dependente da máquina burocrática.
Essa burocracia ramificou-se por várias esferas do Estado, um exemplo disso seria a burocracia presente nos partidos políticos. A burocracia nos partidos se desenvolve da mesma forma de que no Estado. Para a campanha política membros do partido se unem de forma hierárquica para obter o financiamento para campanha, o qual é feito por “ patrocinadores”.
Um pouco mais adiante na obra, o autor discorre sobre a burocracia estatal. Segundo Weber com o fim do capitalismo privado a burocracia estatal iria predominar na sociedade. Essa mudança causaria mudança na relação entre burocracia privada e pública, elas que, por vezes trabalham lado a lado e também são contrárias acabariam por fundir-se. Sobre como tudo isso viria a se disseminar no Estado e nos indivíduos o autor diz o seguinte:
"Uma máquina inanimada é a mente (mind) concretizada. Somente este fato proporciona à máquina o poder de forçar os homens a operá-la, e o poder de dominar suas vidas de trabalho diário tão completamente como ocorre em realidade na fábrica. A inteligência concretizada é também uma máquina animada, a da organização burocrática, com sua especialização no adestramento de habilidades, sua divisão de jurisdição, seus regulamentos e relações hierárquicas de autoridade. Juntamente com a máquina inanimada, a inteligência concretizada ocupa-se em construir a concha da servidão que os homens serão talvez forçados a habitar algum dia. " (WEBER, Max. "Parlamentarismo e governo numa Alemanha reconstruída" . In: Os Pensadores. São Paulo: Abril, 1974 (1918)(p. 25)).
Já quando fazemos uma análise, dos textos selecionados, de Kafka em relação às formas de dominação descrita por Weber teremos uma nova forma avaliar a fábula.
Na parábola, presente em “O Processo”, o porteiro mostra uma postura de autoridade, ele segue ordens de, no caso, não deixar o homem entrar, essa figura poderia estar representando o contrato, visto que para Weber, a vida se baseia em um contrato, talvez este estivesse ali com o intuito de legitimar o contrato e garantir a obediência do homem a cumpri-lo. Lembrando que para Weber legitimidade e legalidade aparecem em seu texto muitas vezes como sinônimos. Vamos além, poderíamos pensar na figura do porteiro como uma figura divina, assim o mesmo apareceria, aos olhos do simples homem do campo, como um poder superior, mas mesmo assim o homem não o teme, e questiona o porteiro diversas vezes, afinal, o acesso às leis, a entrada à porta da lei, deveria ser um direito de todos. Talvez o porteiro fosse um simples porteiro e por um motivo patológico o homem tenha se deixado acreditar em sua figura como divina, apesar de não adentrar, talvez temendo os outros porteiros.
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