FETICHISMO
Seminário: FETICHISMO. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: • 17/12/2014 • Seminário • 10.282 Palavras (42 Páginas) • 280 Visualizações
Segundo o Minidicionário da Língua Portuguesa Aurélio, o termo fetiche significa “objeto animado ou inanimado, feito pelo homem ou produzido pela natureza, ao qual se atribui poder sobrenatural e se presta culto” (Holanda, 1993), foi este significado conferido ao fenômeno da atribuição de valor simbólico aos produtos (manufaturas) que o sociólogo por Karl Marx (1818 – 1883) observou em meio aos seus estudos sobre o mundo do trabalho na modernidade.
Marx em sua obra máxima intitulada “O Capital”, nota que a mercadoria (manufatura) quando finalizada, não mantinha o seu valor real de venda, que segundo ele era determinado pela quantidade de trabalho materializado no artigo, mas sim, que esta, por sua vez adquiria uma valoração de venda irreal e infundada, como se não fosse fruto do trabalho humano e nem pudesse ser mensurado, o que ele queria denunciar com isto é que a mercadoria parecia perder sua relação com o trabalho e ganhava vida própria.
Karl Marx denomina este fenômeno como sendo um “Fetiche da mercadoria”, para isto ele se baseia na história do personagem bíblico Moisés, que após vagar quarenta anos com o povo escolhido por Deus (Judeus) atrás da terra prometida se depara com a crescente descrença dos seus seguidores, que já estavam cansados de se deslocar errantemente por vários lugares, dado esta insatisfação Moisés, deixa o seu povo em uma terra fértil e se retira temporariamente para meditar e procurar algum sinal que indique a existência real deste Deus, a localização da terra prometida e que com isto possa recuperar a fé do seu povo que ia se perdendo rapidamente.
Moisés sobe ao monte Sinai e fica por muito tempo lá a meditar, o povo ao sentir o sumiço de seu “guia”, se reorganiza politicamente e espiritualmente naquele lugar onde fixaram sua vida material, elegendo a partir disto novas lideranças e novos deuses em que acreditar e orar. Muito tempo se passa em cima do monte Sinai, onde está Moises a meditar até que após vários dias e quem sabe meses os céus se abrem e deles surgem o sinal tão esperado pelo povo Judeu, as tabuas da salvação, onde estavam contidos os “Dez Mandamentos”. A partir deste sinal Moises, desce o monte Sinai e vai de encontro ao seu povo para lhes contar e mostrar a boa nova, ao chegar nota que estes haviam se reorganizado em sua ausência e que possuíam novas lideranças e principalmente que haviam juntado todo o ouro e jóias que carregavam consigo e fundiram estas para fazer uma imagem, um novo Deus, que segundo a bíblia seria a imagem de um animal (possivelmente um bezerro) que havia se tornado objeto de adoração e glorificação pelo povo, o nome atribuído a esta imagem era “Fetiche”.
Marx se utilizou desta parábola bíblica e principalmente do nome atribuído à imagem citada para exemplificar na modernidade como o homem estava tratando as mercadorias (sapatos, bolsas, etc.), estas, que com o tempo deixaram de ser um produto estritamente humano para tornarem-se objeto de adoração, a mercadoria deixa de ter a sua utilidade atual e passa a atribuir um valor simbólico, quase que divino, o ser humano não compra o real, mas sim a transcendência que determinado artefato representa.
Este tema infelizmente não foi suficientemente esgotado por Marx que faleceu prematuramente em 1883, porém outros filósofos e sociólogos Neo-Marxistas da pós-modernidade como Max Horkheimer, Theodor Adorno, Walter Benjamin, Bernard Stiegler, Gilles Lipovetsky, Antonio Negri, Alain Badiou, se ocuparam deste assunto, assim criando uma tradição rica de analise deste fenômeno da fetichisação da mercadoria, como esta se dá objetivamente e subjetivamente no ser humano e principalmente propondo encaminhamentos para a resolução deste problema.
Fetichismo da mercadoria é um conceito da economia marxista, segundo o qual, nas condições da produção mercantil baseada na propriedade privada dos meios de produção, desenvolve-se a ilusão ou representação ideológica de que as mercadorias são dotadas de propriedades inatas, forças extra-humanas que terminam por influir no destino das pessoas. Trata-se, portanto, de algo análogo ao fetichismo religioso, no qual o homem religioso diviniza os objetos por ele mesmo produzidos. Segundo Marx, esse fenômeno ocorre porque, numa economia em que a divisão social do trabalho alcançou grande complexidade e na qual os produtores (trabalhadores) não têm nenhum controle sobre o produto de seu trabalho, os vínculos entre os indivíduos e entre os grupos sociais aparecem sob a forma de troca de coisas-mercadorias e não claramente como relações sociais entre classes. Nesse contexto, as mercadorias não se apresentam como resultado do trabalho humano, apropriado pelo capitalista, mas como coisas dotadas de vida própria, sujeitas às oscilações das leis da oferta e da procura. As relações entre objetos, coisas, mercadorias mascaram as relações sociais, as formas de propriedade, a alienação real que existe entre o trabalhador e os objetos por ele criados. O fetichismo da mercadoria revela-se com maior intensidade no dinheiro, que se apresenta nas relações sociais, dotado de uma força sobrenatural que proporciona poder a seus possuidores. Supõe-se que a capacidade de tudo poder comprar é uma propriedade natural da moeda, do ouro, quando na realidade essa força estranha é determinada não pelo dinheiro em si (ele também é uma mercadoria), mas pelas relações sociais entre produtores de mercadorias.
Secção 4
O Fetichismo da Mercadoria e o Seu Segredo
A primeira vista, uma mercadoria parece uma coisa trivial e que se compreende por si mesma. Pela nossa análise mostrámos que, pelo contrário, é uma coisa muito complexa, cheia de subtilezas metafísicas e de argúcias teológicas. Enquanto valor-de-uso, nada de misterioso existe nela, quer satisfaça pelas suas propriedades as necessidades do homem, quer as suas propriedades sejam produto do trabalho humano. É evidente que a actividade do homem transforma as matérias que a natureza fornece de modo a torná-las úteis. Por exemplo, a forma da madeira é alterada, ao fazer-se dela uma mesa. Contudo, a mesa continua a ser madeira, uma coisa vulgar, material. Mas a partir do momento em que surge como mercadoria, as coisas mudam completamente de figura: transforma-se numa coisa a um tempo palpável e impalpável. Não se limita a ter os pés no chão; face a todas as outras mercadorias, apresenta-se, por assim dizer, de cabeça para baixo, e da sua cabeça de madeira saem caprichos mais fantásticos do que se ela começasse a dançar.24
O carácter místico da mercadoria não provém, pois, do seu valor-de-uso. Não provém tão pouco dos factores determinantes do valor. Com efeito, em primeiro lugar, por mais variados que sejam os trabalhos úteis ou as actividades produtivas, é uma verdade fisiológica que eles são, antes de tudo, funções do organismo humano e que toda a função semelhante, quaisquer que sejam o seu conteúdo e a sua forma, é essencialmente um dispêndio de cérebro, de nervos, de músculos, de órgãos, de sentidos, etc., do homem. Em segundo lugar, no que respeita àquilo que determina a grandeza do valor - isto é, a duração daquele dispêndio ou a quantidade de trabalho -, não se pode negar que essa quantidade de trabalho se distingue claramente da sua qualidade. Em todas as épocas sociais, o tempo necessário para produzir os meios de subsistência interessou necessariamente os homens, embora de modo desigual, de acordo com o estádio de desenvolvimento da civilização.25 Enfim, desde que os homens trabalham uns para os outros, independentemente da forma como o fazem, o seu trabalho adquire também uma forma social.
Donde provém, portanto, o carácter enigmático do produto do trabalho, logo que ele assume a forma-mercadoria? Evidentemente, dessa mesma forma. A igualdade dos trabalhos humanos adquire a forma [objectiva da igualdade] de valor dos produtos do trabalho; a medida do dispêndio da força de trabalho humana, pela sua duração, adquire a forma de grandeza de valor dos produtos do trabalho; finalmente, as relações entre os produtores, nas quais se afirmam as determinações sociais dos seus trabalhos, adquirem a forma de uma relação social dos produtos do trabalho.
[O carácter misterioso da forma-mercadoria consiste, portanto, simplesmente em que ela apresenta aos homens as características sociais do seu próprio trabalho como se fossem características objectivas dos próprios produtos do trabalho, como se fossem propriedades sociais inerentes a essas coisas; e, portanto, reflecte também a relação social dos produtores com o trabalho global como se fosse uma relação social de coisas existentes para além deles.] É por este quiproquó que esse produtos se convertem em mercadorias, coisas a um tempo sensíveis e suprasensíveis (isto, é, coisas sociais) .Também a impressão luminosa de um objecto sobre o nervo óptico não se apresenta como uma excitação subjectiva do próprio nervo, mas como a forma sensível de alguma coisa que existe fora do olho. Mas, no acto da visão, a luz é realmente projectada por um objecto exterior sobre um outro objecto, o olho; é uma relação física entre coisas físicas. Ao invés, a forma mercadoria e a relação de valor dos produtos do trabalho [na qual aquela se representa] não tem a ver absolutamente nada com a sua natureza física [nem com as relações materiais dela resultantes]. É somente uma relação social determinada entre os próprios homens que adquire aos olhos deles a forma fantasmagórica de uma relação entre coisas. Para encontrar algo de análogo a este fenómeno, é necessário procurá-lo na região nebulosa do mundo religioso. Aí os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, entidades autónomas que mantêm relações entre si e com os homens. O mesmo se passa no mundo mercantil com os produtos da mão do homem. É o que se pode chamar o fetichismo que se aferra aos produtos do trabalho logo que se apresentam como mercadorias, sendo, portanto, inseparável deste modo-de-produção.
[Este carácter fetiche do mundo das mercadorias decorre, como mostrou a análise precedente, do carácter social próprio do trabalho que produz mercadorias.]
Os objectos úteis só se tornam em geral mercadorias porque são produtos de trabalhos privados, executados independentemente uns dos outros. O conjunto destes trabalhos privados constitui o trabalho social [global]. Dado que os produtores só entram em contacto social pela troca dos seus produtos, é só no quadro desta troca que se afirma também o carácter [especificamente] social dos seus trabalhos privados. Ou melhor, os trabalhos privados manifestam-se na realidade como fracções do trabalho social global apenas através das relações que a troca estabelece entre os produtos do trabalho e, por intermédio destes, entre os produtores. Daí resulta que para estes últimos, as relações [sociais] dos seus trabalhos privados aparecem tal como são, ou seja, não como relações imediatamente sociais entre pessoas nos seus próprios trabalhos, mas antes como [relações materiais entre pessoas e] relações sociais entre coisas.
Somente pela troca é que os produtos do trabalho adquirem, como valores, uma existência social idêntica e uniforme, distinta da sua existência material e multiforme como objectos úteis. Esta cisão do produto do trabalho, em objecto útil e objecto de valor, só teve lugar na prática a partir do momento em que a troca adquiriu extensão e importância bastantes para que passassem a ser produzidos objectos úteis em vista da troca, de modo que o carácter de valor destes objectos é já tomado em consideração na sua própria produção. A partir desse momento, os trabalhos privados dos produtores adquirem, de facto, um duplo carácter social. Por um lado, como trabalhos úteis [determinados], devem satisfazer uma determinada necessidade social, afirmando-se portanto como partes integrantes do trabalho global, isto é, do sistema de divisão social do trabalho que se forma espontaneamente; por outro lado, só satisfazem as diversas necessidades dos próprios produtores, na medida em que cada espécie de trabalho privado útil é permutável - isto é, é equivalente a - qualquer outra espécie de trabalho privado útil. A igualdade de trabalhos que diferem toto coelo (**) uns dos outros só pode consistir numa abstracção da sua desigualdade real, na redução ao seu carácter comum de dispêndio de força humana, de trabalho humano abstracto, e é somente a troca que opera esta redução, pondo em presença uns dos outros, num pé de igualdade, os produtos dos mais diversos trabalhos.
O duplo carácter social dos trabalhos privados apenas se reflecte no cérebro dos produtores sob as formas em que se manifestam no tráfico concreto, na troca dos produtos; [o carácter socialmente útil dos seus trabalhos privados, no facto de o produto do trabalho ter de ser útil, e útil aos outros; e o carácter social de igualdade dos diferentes trabalhos" no carácter comum de valor desses objectos materialmente diferentes os produtos do trabalho.]
Quando os produtores relacionam os produtos do seu trabalho a título de valores, não é que eles vejam neles um simples invólucro sob o qual se esconde um trabalho humano idêntico; pelo contrário, ao considerarem iguais na troca os seus diversos produtos, pressupõem com isso que os seus diferentes trabalhos são iguais. Eles fazem-no sem o saber 26. Portanto, o valor não tem, escrito na fronte, o que ele é. Longe disso, ele transforma cada produto do trabalho num hieroglifo [social]. Somente com o tempo o homem procurará decifrar o sentido do hieroglifo, penetrar nos segredos da obra social para a qual contribui, pois a transformação dos objectos úteis em valores é um produto da sociedade, tal como o é a linguagem.
A recente descoberta científica, de que os produtos do trabalho, enquanto valores, são [objectiva] pura e simplesmente a expressão do trabalho humano gasto na sua produção, marca uma época na história do desenvolvimento da humanidade, mas não dissipou de modo algum a fantasmagoria que faz aparecer o carácter social do trabalho como uma qualidade das coisas, dos próprios produtos. O que é verdadeiro apenas para esta forma particular de produção, a produção mercantil —; a saber, que o carácter [especificamente] social dos mais diversos trabalhos [privados, independentes uns dos outros], consiste na sua igualdade como trabalho humano, e reveste uma forma objectiva, a forma-valor dos produtos do trabalho -, isso parece aos olhos dos homens imersos nas engrenagens das relações da produção de mercadorias, hoje como antes daquela descoberta, tão definitiva e tão natural como a forma gasosa do ar que permaneceu idêntica mesmo depois da descoberta dos seus elementos químicos.
O que na prática interessa em primeiro lugar aos que trocam produtos é saber que quantidade [de produtos alheios] é que obterão em troca dos seus produtos, isto é, as proporções em que eles se trocam. A partir do momento em que estas proporções passaram a ter uma certa fixidez, produzida pelo hábito, elas parecer-lhe-ão provir da própria natureza dos produtos do trabalho. Parece existir nessas coisas uma propriedade de se trocarem em proporções determinadas, tal como as substâncias químicas se combinam com proporções fixas [;por exemplo, uma tonelada de aço e duas onças de ouro têm igual valor, tal como uma libra de ouro e uma libra de ferro têm igual peso, apesar das suas diferentes qualidades físicas e químicas] .
De facto, o carácter de valor dos produtos do trabalho só se fixa quando eles se determinam como grandezas de valor. Estas últimas mudam sem cessar, independentemente da vontade e das previsões [e das acções] daqueles que trocam mercadorias, aos olhos de quem o seu próprio movimento social toma assim a forma de um movimento de coisas, movimento que os dirige em vez de serem eles a dirigi-lo. É necessário que a produção mercantil se tenha completamente desenvolvido, para que da própria experiência decorra esta verdade científica: - que os trabalhos privados executados independentemente uns dos outros, mas inteiramente interdependentes como ramificações espontâneas do sistema da divisão social do trabalho, são constantemente reduzidos à sua medida socialmente proporcional. E porquê? Porque nas relações de troca, acidentais e sempre variáveis, dos seus produtos, o tempo de trabalho social necessário à sua produção impõe-se forçosamente como lei reguladora natural, tal como a lei da gravidade se faz sentir a qualquer pessoa quando a sua casa desaba sobre a sua cabeça.27 A determinação da grandeza de valor pela duração do trabalho é, portanto, um segredo escondido sob o movimento aparente dos valores [relativos] das mercadorias; mas a sua descoberta, mostrando embora que a grandeza de valor não se determina ao acaso, como poderá parecer, não faz com isso desaparecer a forma que representa esta quantidade como uma relação de grandeza entre as coisas, entre os próprios produtos do trabalho.
A reflexão sobre as formas da vida social, e por conseguinte a sua análise científica, segue um caminho completamente oposto ao do movimento real. Começa depois dos factos consumados, já com os resultados do processo de desenvolvimento. As formas que imprimem aos produtos do trabalho a marca de mercadorias e que por isso são pressuposto da sua circulação, possuem, também elas, já a fixidez de formas naturais da vida social, antes que os homens procurem dar-se conta, não do carácter histórico destas - que, pelo contrário, se lhes apresentam já como imutáveis -, mas do seu sentido último. Assim, foi somente a análise do preço das mercadorias que conduziu à determinação da grandeza do valor, e somente a comum expressão das mercadorias em dinheiro levou à fixação do seu carácter de valor. Ora, é precisamente esta forma acabada do mundo das mercadorias, a sua forma-dinheiro, que, em vez de revelar, dissimula o carácter social dos trabalhos privados e as relações sociais entre os produtores. Quando digo que o trigo, um fato, botas se relacionam com o tecido como incarnação geral do trabalho humano abstracto, a falsidade e o absurdo desta expressão salta logo à vista. Mas quando os produtores destas mercadorias as relacionam ao tecido - ou ao ouro ou à prata, o que vem a dar no mesmo -, como equivalente geral, as relações entre os seus trabalhos privados e o conjunto do trabalho social [global] aparecem-lhes precisamente sob esta forma absurda.
[São formas destas que constituem as categorias da economia burguesa.] As categorias da economia burguesa são formas de pensamento que têm uma verdade objectiva, enquanto reflectem relações sociais reais, mas estas relações pertencem somente a esta época histórica determinada, em que a produção mercantil é o modo de produção social. Se encararmos outras formas de produção, logo veremos desaparecer todo este misticismo [,sortilégio e magia] que obscurece os produtos do trabalho no período actual.
Uma vez que a economia política gosta das robinsonadas, visitemos então Robinson na sua ilha.28 Embora naturalmente modesto, nem por isso tem menos necessidades diferentes a satisfazer, sendo-lhe necessário executar trabalhos úteis de várias espécies, por exemplo, fabricar móveis, fazer utensílios, domesticar animais, pescar, caçar, etc. Acerca das suas orações e outras bagatelas semelhantes nada temos a dizer, pois que o nosso Robinson encontra nisso o seu prazer, considerando essas actividades como uma distracção tonificante. Apesar da variedade das suas funções produtivas, ele sabe que elas são apenas as diversas formas pelas quais se afirma o próprio Robinson, isto é, são simplesmente modos, diversos de trabalho humano. As próprias necessidades obrigam-no a dividir o seu tempo pelas diferentes ocupações. O facto de uma ocupar um maior, e outra um menor lugar no conjunto dos seus trabalhos, depende da maior ou menor dificuldade que tem de vencer para conseguir o resultado útil que tem em vista. É a experiência que lho ensina, e o nosso homem que salvou do naufrágio relógio, livro-razão, pena e tinta, não tarda, como bom inglês que é, a anotar todos os seus actos diários. O seu inventário contém a descrição dos objectos úteis que possui, dos diferentes modos de trabalho que a sua produção exigiu e, finalmente, do tempo de trabalho que lhe custaram, em média, determinadas quantidades destes diversos produtos. Todas as relações de Robinson com as coisas, que formam a riqueza que ele próprio criou, são de tal modo simples e transparentes que qualquer pobre de espírito as poderia compreender sem grande esforço intelectual. E, no entanto, estão aí contidas todas as determinações essenciais do valor. Passemos agora da ilha luminosa de Robinson para a sombria Idade Média europeia. Em vez do homem independente, todos aqui se encontram dependentes: servos e senhores, vassalos e suseranos, leigos e clérigos. Esta dependência pessoal caracteriza tanto as relações sociais da produção material, como todas as outras esferas da vida assentes sobre ela. E é precisamente porque a sociedade se baseia na dependência pessoal que todas as relações sociais nos aparecem como relações entre pessoas. Por isso, os diversos trabalhos e os seus produtos não têm necessidade de assumir uma figura fantástica distinta da sua realidade. Surgem [no mecanismo social] como serviços e prestações em espécie. É também a forma natural do trabalho, a sua particularidade e não a sua generalidade, o seu carácter abstracto, como na produção mercantil -, que é aqui a sua forma [directamente] social. A corveia, tal como o trabalho que produz mercadorias, é igualmente medida pelo tempo; mas todo o camponês sabe muitíssimo bem - sem necessidade de recorrer a um Adam Smith - que é uma quantidade determinada da sua força de trabalho pessoal que ele dispende ao serviço do seu senhor. O dízimo a pagar ao cura é bem mais claro que a bênção deste. Como quer que julguemos os papéis que os homens desempenham nesta sociedade [uns perante os outros], as relações sociais das pessoas nos seus trabalhos respectivos afirmam-se com toda a nitidez como as suas próprias relações pessoais, não se dissimulando em relações sociais das coisas, dos produtos do trabalho.
Para encontrarmos o trabalho comum [,directamente social] , ou seja, a associação imediata, não precisamos de nos reportarmos à sua forma natural primitiva [,espontânea], tal como nos aparece no limiar da história de todos os povos civilizados.29 Temos um exemplo bem perto de nós, na indústria rural e patriarcal de uma família de camponeses que produz, para as suas próprias necessidades, gado, trigo, tecido, linho, vestuário, etc. Estes diferentes objectos apresentam-se à família como os produtos diversos do seu trabalho, não se apresentando reciprocamente como mercadorias. Os diferentes trabalhos que criam estes produtos - agricultura, criação de gado, tecelagem, confecção, do vestuário, etc. - são, desde logo, na sua forma natural, funções sociais, pois que são funções da família que, tal como a produção, de mercadorias, tem a sua [espontânea] divisão do trabalho. São as condições naturais, variáveis com a mudança das estações, bem como as diferenças de idade e de sexo, que regulam na família a distribuição do trabalho e a sua duração para cada membro da família. O dispêndio das forças de trabalho individuais medido pelo tempo da sua duração aparece aqui directamente como carácter social dos próprios trabalhos, uma vez que as forças de trabalho individuais funcionam [naturalmente] apenas como órgão da força [de trabalho] comum da família.
Figuremos finalmente uma reunião de homens livres, trabalhando com meios de produção comuns, e dispendendo, de acordo com um plano concertado, as suas numerosas forças [de trabalho] individuais como uma única força de trabalho social. Tudo o que dissemos do trabalho de Robinson repete-se aqui; mas agora socialmente e não individualmente. Todos os produtos de Robinson eram seu produto pessoal e exclusivo e portanto objectos de utilidade imediata para ele. O produto total da referida reunião de trabalhadores é um produto social. Uma parte serve de novo como meio de produção, permanecendo social ; mas a outra parte é consumida [ como meio de subsistência] , devendo, por isso, repartir-se entre todos. O modo de repartição variará segundo o organismo de produção da sociedade e o [correspondente] nível de desenvolvimento histórico dos trabalhadores. Suponhamos, apenas para estabelecer um paralelo com a produção mercantil, que a parte a repartir por cada trabalhador seja proporcional ao seu tempo de trabalho. O tempo de trabalho desempenhará assim um duplo papel. Por um lado, a sua distribuição [socialmente planificada] na sociedade regula a justa relação das diversas funções com as diversas necessidades; por outro lado, serve de medida à parte individual de cada produtor no trabalho comum e, ao mesmo tempo, à porção que lhe compete na parte do produto comum reservada ao consumo. Neste caso, as relações sociais dos homens com os seus trabalhos e com os produtos do trabalho permanecem simples e transparentes, tanto na produção como, na distribuição [25] .
O mundo religioso não é mais do que o reflexo do mundo real. Uma sociedade em que o produto do trabalho toma geralmente a forma de mercadoria e em que, portanto, a relação mais geral entre os produtores consiste em comparar os valores dos seus produtos e, sob esta forma material, em comparar entre si os seus trabalhos privados a título de trabalho humano igual, uma tal sociedade encontra no cristianismo, com o seu culto do homem abstracto - e sobretudo nos seus tipos burgueses, protestantismo, deísmo, etc. -, o complemento religioso mais conveniente. Nos modos-de-produção da antiga Ásia, e da antiguidade em geral, a transformação do produto em mercadoria [e, portanto, a existência do homem como produtor de mercadorias] desempenha apenas um papel secundário que, no entanto, adquire tanto mais importância quanto as comunidades se aproximam da dissolução. Povos mercadores, propriamente, apenas se encontram nos interstícios do mundo antigo, à maneira dos deuses de Epicuro [26], ou como os judeus nos poros da sociedade polaca. Aqueles antigos organismos sociais são, sob o ponto de vista da produção, infinitamente mais simples e mais transparentes do que a sociedade burguesa; mas eles têm por base, ou a imaturidade do homem individual - por assim dizer, a história ainda não cortou o cordão umbilical que o liga à comunidade natural de uma tribo primitiva -, ou condições de despotismo e de esclavagismo. O baixo nível de desenvolvimento das forças produtivas do trabalho que as caracteriza e que por isso impregna toda a esfera da vida material, a estreiteza das relações dos homens, quer entre eles quer com a natureza, reflectem-se idealmente nas velhas religiões nacionais. Dum modo geral, o reflexo religioso do mundo real só poderá desaparecer quando as condições do trabalho e da vida prática apresentarem ao homem relações transparentes e racionais com os seus semelhantes e com a natureza. A vida social cuja base é formada pela produção material e pelas relações que ela implica só se libertará da nuvem mística que a envolve, no momento em que ela se apresente como o produto de homens livremente associados, agindo conscientemente [,segundo um plano,] e senhores do seu próprio movimento social. Mas isto exige um conjunto de condições de existência material [,uma base material] da sociedade, que por sua vez só pode ser produto [espontâneo] de um longo e penoso desenvolvimento.
É certo que a economia política, embora de uma forma muito imperfeita, analisou o valor e a grandeza do valor [e descobriu o conteúdo escondido nessas formas].30 Mas nunca pôs a questão de saber [porque é que esse conteúdo reveste essa forma,] por que é que o trabalho se representa no valor, e a medida do trabalho pela sua duração na grandeza do valor dos produtos.31 Fórmulas, que logo à primeira vista mostram pertencer a uma formação social em que a produção e as suas relações comandam o homem em vez de serem por ele comandadas, surgem à sua consciência burguesa como uma necessidade tão natural como o próprio trabalho produtivo. Nada de espantar que as formas de produção social que precederam a produção burguesa sejam tratadas da mesma maneira que os Padres da igreja tratam as religiões que precederam o Cristianismo.32
O que, entre outras coisas, mostra a ilusão produzida sobre a maior parte dos economistas pelo fetichismo inerente ao mundo mercantil ou pela aparência material dos atributos sociais do trabalho, é a longa e insípida querela travada a propósito do papel da natureza na criação do valor-de-troca. Ora, dado que o valor-de-troca é apenas uma determinada maneira social de exprimir o trabalho empregue na produção de um objecto, ele não pode conter mais, elementos materiais do que, por exemplo, a cotação dos câmbios.
Na nossa sociedade, a forma económica mais geral e mais simples que se liga aos produtos do trabalho - a forma-mercadoria - é tão familiar a toda a gente que ninguém vê mal nisso. Consideremos outras formas económicas mais complexas [29]. Donde provinham, por exemplo, as ilusões do sistema mercantilista? Evidentemente do carácter fetiche que a forma-dinheiro imprime aos metais preciosos [;segundo esse sistema, o ouro e a prata na sua função de dinheiro não representavam uma relação social de produção, antes eram objectos naturais com peculiares propriedades sociais]. E a economia moderna que se tem em alta conta e não se cansa de zombar, insipidamente, do fetichismo dos mercantilistas, será ela menos vítima das aparências? O seu primeiro dogma não consiste em considerar que estas coisas (instrumentos de trabalho por exemplo) são, por natureza, capital, e que, pretender despojá-las deste carácter puramente social, é cometer um crime contra a natureza? Finalmente, os fisiocratas, tão superiores em tantos aspectos, não imaginaram que a renda fundiária não é um tributo arrancado aos homens, mas um presente feito pela própria natureza aos proprietários?
Mas não nos antecipemos e contentemo-nos com mais um exemplo a propósito da própria forma-mercadoria. Se pudessem falar, as mercadorias diriam: "Pode o nosso valor-de-uso interessar ao homem, que para nós, enquanto, objectos, isso é-nos indiferente. O que nos interessa é o nosso valor. Demonstra-o a nossa relação recíproca como coisas de venda e de compra. Só nos relacionamos umas com as outras como valores-de-troca". O economista parece exprimir a própria alma das mercadorias, quando diz: "o valor [valor-de-troca] é uma propriedade das coisas; a riqueza [valor-de-uso] é uma propriedade do homem. O valor, neste sentido, pressupõe necessariamente a troca, a riqueza, não".33 "A riqueza [valor-de-uso] é um atributo do homem; o valor, um atributo das mercadorias. Um homem ou uma comunidade são ricos, uma pérola ou um diamante possuem valor (...) Uma pérola ou um diamante possuem valor enquanto pérola ou diamante".34 Até hoje nenhum químico descobriu ainda valor-de-troca numa pérola ou num diamante. Os economistas que descobriram ou inventaram substâncias químicas deste género e que se reclamam da sua profundidade, acham que o valor-de-uso das coisas lhes pertence, independentemente das suas propriedades materiais; enquanto que o valor lhes pertence na sua qualidade de coisas. O que lhes vem confirmar esta opinião, é a circunstância particular de o valor útil das coisas se realizar para o homem sem troca, quer dizer, numa relação imediata entre a coisa e o homem, enquanto que, ao invés, o seu valor apenas se realiza na troca, isto é, numa relação social. A quem é que isto não faz lembrar o bom Dogberry e a lição que deu ao guarda nocturno Seacoal: [30] "(Ser um homem bem parecido, é um dom da fortuna; mas saber ler e escrever é um dom da natureza".35
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Notas Originais:
1 Karl Marx, Zur Kritic der politischen Oekonomie, 1859, p. 3. (Contribuição para a Crítica da Economia Política, 1971, p. 35.) (retornar ao texto)
2 "O desejo implica a necessidade; é o apetite do espirito, que lhe é tão natural quanto a fome para o corpo (...) A maior parte [das coisas] retiram o seu valor do facto de satisfazerem as necessidades do espirito" (Nicholas Barbon, A Discourse on coining the new Money lighter 1696, pp. 2 e 3). (retornar ao texto)
3 "As coisas possuem uma virtude intrínseca" (virtude é a designação especifica de Barbon para o valor-de-uso) "que tem a mesma qualidade em toda a parte, tal como, por exemplo, a do íman de atrair o ferro" (l. c. p. 16). A propriedade que o íman tem de atrair o ferro apenas se tornou útil quando, por seu intermédio, se descobriu a polaridade magnética. (retornar ao texto)
4 "O que constitui o valor natural de uma coisa é a propriedade que ela tem de satisfazer as necessidades ou as conveniências de vida humana" (John Locke, Some considerations…, 1691, in Works. Londres, 1777, vol. II, p. 28). No séc. XVII encontra-se ainda muitas vezes nos autores ingleses a palavra Worth por valor-de-uso e a palavra Value por valor-de-troca, perfeitamente de acordo com o espírito de uma língua que gosta de exprimir a coisa imediata em termos germânicos e a coisa reflectida em termos românicos. (retornar ao texto)
5Na sociedade burguesa "a ignorância da lei a ninguém aproveita". Em virtude de uma fictio juris económica, qualquer comprador é considerado como possuindo um conhecimento enciclopédico das mercadorias. (retornar ao texto)
6 "O valor consiste na relação de troca entre uma certa coisa e outra, entre uma certa medida de uma produção e uma certa medida de outra" (Le Trosne, De l’intérêt social, in Physiocrates, Ed. Daire, Paris, 1846, p. 889). (retornar ao texto)
7 "Nada pode ter um valor-de-troca intrínseco" (N. Barbon, l. c., p. 6) ; ou como diz Butler:
The value of a thing
Is just as much as it will bríng*.
* O valor de uma coisa é precisamente aquilo que ela proporciona. (retornar ao texto)
8 "One sort of wares are as good as another, if the value be equal. There is no difference or distinction in things of equal value". Barbon acrescenta: "Cem libras esterlinas de chumbo ou de ferro têm tanto valor como cem libras esterlinas de prata ou de ouro" (N. Barbon, l. c., p. 53 e 7). (retornar ao texto)
9 "O valor deles [dos objectos de uso] quando se trocam uns pelos outros é determinado pela quantidade de trabalho necessariamente exigida e ordinariamente gasta na sua produção" (Some Thougnts on the Interest of money in general..., Londres, pp. 36, 37). Este notável escrito anónimo do século passado não tem qualquer data. De acordo com o seu conteúdo, é evidente que terá aparecido no tempo de Jorge II, por alturas de 1739 ou 1740. (retornar ao texto)
10 "Todas as produções de um mesmo género formam propriamente apenas uma massa, cujo preço se determina genericamente e sem atender às circunstâncias particulares" (Le Trosne, l. c., p. 893) . (retornar ao texto)
10a [Karl Marx, l. c., p. 6 e passim. (Ed. port. cit., p. 38) .] (retornar ao texto)
10b [Nota à 4.a edição. O trecho que intercalei destina-se a evitar o erro, muito frequente, de que, para Marx, seria mercadoria qualquer produto desde que consumido por alguém diferente do produtor. F. E.] (retornar ao texto)
11 Karl Marx, l c., p. 12, 13 e passim. (Ed. port. p. 43, 44). (retornar ao texto)
12 "Todos os fenómenos do universo, sejam produzidos pela mão do homem ou pelas leis gerais da física, não nos dão a ideia da criação nova, mas somente de uma modificação da matéria. Reunir e separar, eis os únicos elementos que o espirito humano acha, ao analisar a ideia da reprodução; e é também uma reprodução de valor" (valor-de-uso, se bem que aqui o próprio Verri, na sua polémica contra os fisiocratas, não saiba de que espécie de valor fala) "e de riqueza, se a terra, o ar e a água se transformam, nos campos, em cereal, ou se a mão do homem converte a secreção de um insecto em seda, ou se alguns bocados de metal se organizam de modo a formar um despertador" (Pietro Verri: Meditazioni sulla Economia politica, impresso pela primeira vez em 1773 na edição dos economistas de Custodi, parte moderna, t. XV, p. 21, 22). (retornar ao texto)
13 cf. Hegel, Philosophie des Rechts,§ 190. (retornar ao texto)
14 O leitor deve notar que não se trata aqui do salário ou do valor que o operário recebe por um dia de trabalho, mas do valor da mercadoria na qual se traduz o seu dia de trabalho. Aliás, a categoria do salário ainda não existe nesta fase da nossa exposição. (retornar ao texto)
15 Para demonstrar que "somente o trabalho é a medida definitiva e real com ajuda da qual o valor de todas as mercadorias pode ser avaliado e comparado em todos os tempos", diz A. Smith: "iguais quantidades de trabalho devem ter, em todos os tempos e em todos os lugares, o mesmo valor para o próprio trabalhador. No seu estado normal de saúde, de força e de actividade, e com o grau médio de habilidade que possua, ele tem sempre de ceder a mesma porção do seu repouso, da sua liberdade e da sua felicidade" (Wealth of Nations, Liv. I, C. V., p. 104, 105). Por um lado, A. Smith confunde aqui (embora nem sempre) a determinação do valor da mercadoria através da quantidade de trabalho gasto na sua produção com a determinação do seu valor através valor do trabalho, procurando portanto demonstrar que iguais quantidades de trabalho têm sempre o mesmo valor. Por outro lado, é certo que pressente que o trabalho, na medida em que se representa no valor das mercadorias, é apenas um dispêndio de força humana de trabalho; mas concebe este dispêndio exclusivamente como uma abnegação, como sacrificio do repouso, da liberdade e da felicidade, e não, ao mesmo tempo, como afirmação normal da vida. Mas também é certo que ele tem em vista o trabalhador assalariado moderno. Um dos predecessores de A. Smith, já por nós citado, afirma muito mais acertadamente: "Um homem ocupou-se durante uma semana em fornecer uma coisa necessária à vida (...) Quem lhe der uma outra em troca dela, não pode avaliar melhor qual seja o seu equivalente exacto do que calculando o que lhe custou exactamente o mesmo trabalho e o mesmo tempo: o que, de facto, não passa da troca do trabalho de um homem gasto numa coisa durante um certo tempo pelo trabalho de um outro homem gasto numa outra coisa durante o mesmo tempo" (Some Thoughts on the Interest of money in general p. 39). [Nota à 4.. edição: A língua inglesa tem a vantagem de possuir duas palavras diferentes para estes dois aspectos distintos do trabalho. O trabalho que cria valores-de-uso e é qualitativamente determinado chama-se "work", em oposição a "labour"; o trabalho que cria valor e que só é avaliado quantitativamente chama-se "labour", em oposição a "work", F. E.] (retornar ao texto)
16 Os poucos economistas que, como S. Bailey, procuraram fazer a análise da forma-valor, não podiam chegar a nenhum resultado: primeiramente, porque confundiam sempre o valor com a sua forma; em segundo lugar, porque, sob a influência grosseira do burguês prático, se preocuparam desde o inicio exclusivamente com o aspecto quantitativo. "O poder de dispor da quantidade (...) é o que faz o valor" (S. Bailey, Money,..., 1837, p. 11). [14] (retornar ao texto)
16ª [Um dos primeiros economistas que, depois de William Petty, se apercebeu da natureza do valor, o famoso Benjamin Franklin, diz: "Uma vez que o comércio nada mais é que a troca de um trabalho por outro trabalho, é pelo trabalho que se avalia mais exactamente o valor de todas as coisas" (The Works of B. Franklin, ed. Sparks, Boston, 1836, Vol. II, p. 267). Ao avaliar o valor das coisas "pelo trabalho", Franklin não se apercebeu do facto de ter abstraído da diversidade dos trabalhos permutados, e que, portanto, os reduziu ao mesmo trabalho humano. Diz o que não entende. Fala primeiro de "um trabalho", depois de "outro trabalho", finalmente de "trabalho", simplesmente, como substância do valor de todas as coisas.] [15] (retornar ao texto)
17 De certo modo, passa-se com o homem o mesmo que com a mercadoria. Como não vem ao mundo com um espelho, nem como um filósofo fichtiano, cujo Eu de nada tem necessidade para se afirmar [:"eu sou eu"], ele vê-se e reconhece-se somente num outro homem. Também este último lhe parece, em carne e osso, a forma fenomenal do género humano. [Somente pela sua relação com o homem Paulo, como seu semelhante, é que o homem Pedro se vê a si mesmo como homem. Desse modo, também o Paulo de carne e osso, na sua materialidade paulina, surge para Pedro como a forma de manifestação do género homem.] (retornar ao texto)
18 O termo valor é utilizado aqui, como já aconteceu algumas vezes atrás, por [valor quantitativamente determinado, isto é, por] grandeza de valor (retornar ao texto)
19 [Esta discordância entre a grandeza do valor e a sua expressão relativa tem sido explorada pelos economistas vulgares com a habitual sagacidade.] Num escrito dirigido principalmente contra a teoria do valor de Ricardo lê-se: "Não podeis deixar de admitir que, permanecendo constante o trabalho necessário à sua produção, A baixa porque B, com o qual se troca, sobe, caindo assim o vosso principio geral a respeito do valor (...) Admitindo que B baixa relativamente a A, quando o valor de A sobe relativamente a B, é o próprio Ricardo que destrói a base do seu grande axioma segundo o qual o valor de uma mercadoria é sempre determinado pela quantidade de trabalho nela incorporado; pois que se uma mudança nos custos de A altera não somente o seu valor relativamente a B, com o qual se troca, mas também o valor de B relativamente a A, embora não se tenha verificado nenhuma mudança na quantidade de trabalho exigida para a produção de B, então cai não somente a doutrina que faz da quantidade de trabalho aplicado num artigo a medida do seu valor, mas também a doutrina que afirma que o valor se regula pelos custos de produção" (J. Broadhurst, Political Economy, 1842, pp. 11. 14). Mestre Broadhurst podia, do mesmo modo, dizer: considerando-se as fracções 10/20, 10/50, 10/100, o número 10 permanece constante, decrescendo no entanto constantemente o seu valor proporcional, porque a grandeza dos denominadores aumenta. Assim cai por terra o grande principio segundo o qual a grandeza dos números inteiros é "regulada" pela quantidade das unidades que contêm. (retornar ao texto)
20 O mesmo acontece em outros domínios. Um homem, por exemplo, só é rei porque outros homens se consideram seus súbditos e se comportam como tais. Mas, ao contrário, eles acreditam que são súbditos porque ele é rei. (retornar ao texto)
21 F. L. A. Ferrier (sub-inspector das alfândegas): Du Gouvernement considéré dans ses raports avec le commerce, (1805) e Charles Ganilh: Des Sistemes d’Economte politique, (2ª ed., 1821). (retornar ao texto)
21ª [Homero, por exemplo, exprime o valor de uma coisa numa série de coisas diferentes.] (retornar ao texto)
22 Esta a razão por que se fala do valor-fato do tecido quando se exprime o seu valor em fatos, do seu valor-trigo quando se exprime em trigo, etc. Cada expressão deste género dá a entender que é o seu próprio valor que se manifesta nesses diversos valores-de-uso. "Como o valor de uma mercadoria denota a sua relação de troca, podemos assim falar do seu valor-trigo, do seu valor-fato, conforme a mercadoria com a qual é comparado; sendo assim, existem milhares de espécies de valor, tantas quantos os géneros de mercadorias, sendo todas igualmente reais e igualmente nominais" (S. Bailey, A Critical Dissertation on the Nature. Measure and Cause of value: chiefly in reference to the writings of Mr. Ricardo and his followers..., 1825. p. 39). S. Bailey, o autor deste escrito anónimo, que na altura deu muito que falar em Inglaterra, supôs ter liquidado qualquer conceito positivo de valor com esta enumeração das variadas expressões relativas do valor de uma mesma mercadoria. Apesar da estreiteza do seu espírito, não é menos verdade que por vezes pôs a nu as deficiências da teoria de Ricardo. Prova-o a animosidade com que ele foi atacado pela escola ricardiana, por exemplo na Westeminster Review. (retornar ao texto)
23 A forma de permutabilidade imediata e universal não deixa transparecer de modo algum que se trata de uma forma polarizada, [da mercadoria], contendo em si contradições, tão inseparável da forma contrária, sob a qual não é possível a troca directa, quanto o positivo de um dos pólos de um íman o é do negativo do outro pólo. Por isso, imaginar que se podem tornar imediatamente permutáveis todas as mercadorias, seria o mesmo que imaginar que todos os católicos podem ser feitos papas ao mesmo tempo. Mas na realidade, a forma-valor relativa geral e a forma-equivalente geral são os dois pólos opostos, que se pressupõem e se repelem reciprocamente, da mesma relação social das mercadorias. Esta impossibilidade de troca directa entre as mercadorias é um dos principais inconvenientes ligados à forma actual da produção, na qual, todavia, o economista burguês vê o nec plus ultra da liberdade humana e da independência individual. Inúmeros, inúteis e utópicos esforços foram tentados para vencer este obstáculo. Fiz ver algures que Proudhon tinha sido precedido nesta tentativa por Bray, Gray e outros mais. [A ilustração dessa utopia filistina é constituída pelo socialismo de Proudhon, que, como já noutra altura mostrei[19], nem o mérito da originalidade possui; muito antes dele, Gray, Bray e outros tinham feito o mesmo muito melhor. Isto não impede que hoje em dia tal sabedoria grasse em certos círculos com o nome de "ciência". Jamais uma escola abusou tanto da palavra "ciência" como a proudhoniana, pois "onde faltam os conceitos introduz-se oportunamente uma palavra."] [20] (retornar ao texto)
24 Recorde-se que, enquanto o resto do mundo parecia estar tranquilo, a China e as mesas começaram a dançar .- pour encourager les autres. [21] (retornar ao texto)
25 Entre antigos germanos, a grandeza de uma jeira de terra calculava-se pelo trabalho de um dia, e daí o seu nome Tagewerk, Mannewerk, etc. (jurnale ou jornalis, terra jurnalis ou diurnalis). [Ver Georg Ludwig von Maurer, Einleitung zur Geschichte der Mark -, Hof -, etc. Verfassung, Munique, 1854, p. 129 s.]. De resto, a expressão "journal" de terre subsiste ainda em certas regiões da França[22](retornar ao texto)
26 Portanto, quando Galiani diz que o valor é uma relação entre pessoas - "da Richezza é una ragione tra due persone" (Galiani, Della moneta, t. III da recolha de Custodi dos Scritori classici Italiani di Economia politica, Parte Moderna, 1803, p. 220) -, deveria ter acrescentado: "uma relação escondida sob a capa das coisas". (retornar à nota)
27 "Que se há-de pensar de uma lei que só pode impor-se através de revoluções periódicas? É simplesmente uma lei natural, assente sobre a inconsciência daqueles que a suportam" (Friedrich Engels: Umrisse zu einer Kritik der Nationaloekonomie, p. 103 nos Deutsch-Französische Jahrbücher, editados por Arnold Ruge e Karl Marx, Paris, 1844). (retornar ao texto)
28 O próprio Ricardo não dispensa a sua robinsonada. "Segundo ele, o caçador e o pescador primitivos são mercadores que trocam o peixe e a caça à razão da duração do trabalho contido nesses valores-de-troca. Aqui comete o singular anacronismo de pôr o caçador e o pescador a consultarem as tabelas de anuidades usadas em 1817 na bolsa de Londres, a fim de avaliarem os seus instrumentos de trabalho. "Os paralelogramas do Snr. Owen parecem ser a única forma de sociedade que ele conhecia além da sociedade burguesa." [23] [Karl Marx, Zur Kritik..., pp. 38, 39 (Contribuição..., p. 64).] [24] (retornar ao texto)
29 "Considerar que a forma primitiva da propriedade comum é uma forma especialmente eslava ou exclusivamente russa é um preconceito ridículo em voga nestes últimos tempos. É a forma primitiva que se encontra entre os Romanos, os germanos, os celtas, e de que, aliás, ainda hoje se pode encontrar um mostruário completo com diversos exemplares, ainda que, em parte arruinados, na Índia. Um estudo aprofundado das formas asiáticas da propriedade comum, sobretudo da Índia, mostraria como das várias formas da propriedade comum primitiva resultaram diversas formas da sua dissolução: Assim, por exemplo, os diferentes tipos originais da propriedade privada romana e germânica podem ser derivados das diversas formas da propriedade comum indiana" [Karl Marx, Zur Kritik..., p. 10 (Contribuição..., p. 67 sq.).] (retornar ao texto)
30 Um dos primeiros economistas que depois de William Petty identificou o verdadeiro conteúdo do valor, o célebre Franklin, pode servir-nos de exemplo da maneira como a economia burguesa procede na sua análise. Diz ele: "Uma vez que o comércio nada mais é que troca de um trabalho por outro trabalho, é pelo trabalho que se avalia mais exactamente o valor de todas as coisas" (The Works of Benjamin Franklin..., ed. cit., t. II, p. 267). Franklin acha tão natural que as coisas tenham valor, como os corpos peso. A seu ver, trata-se simplesmente de achar a maneira de avaliar o mais exactamente possível esse valor. Nem sequer nota que ao dizer que "é pelo trabalho que se avalia mais exactamente o valor de todas as coisas", está a abstrair da diferença dos trabalhos trocados, reduzindo-os a um trabalho humano igual. De outro modo, deveria dizer: uma vez que a troca de botas ou de sapatos por mesas não é mais que uma troca de trabalho de sapateiro por trabalho de marceneiro é pelo trabalho do marceneiro que se avaliará com maior exactidão o valor das botas Servindo-se da palavra "trabalho", em geral, ele abstrai do carácter útil e da forma concreta dos diversos trabalhos [27]. Quanto à insuficiência da análise de Ricardo acerca da grandeza do valor -e é a melhor -, será demonstrada nos livros III e IV desta obra. No que respeita ao valor em geral, a economia política clássica jamais distinguiu claramente ou expressamente entre o trabalho enquanto representado no valor, e o mesmo trabalho enquanto representado no valor-de-uso do produto. É certo que ela faz de facto esta distinção, uma vez que considera o trabalho tanto do ponto de vista da qualidade, como do da quantidade. Mas não lhe ocorre que uma diferença meramente quantitativa dos trabalhos pressupõe a sua unidade ou a sua igualdade qualitativa, ou seja, a sua redução ao trabalho humano abstracto. Por exemplo, Ricardo declara-se de acordo com Destutt de Tracy quando este diz: "Uma vez que é certo que as nossas faculdades físicas e morais são a nossa única riqueza originária, que o emprego destas faculdades - um qualquer trabalho - é o nosso único tesouro primitivo, e que é sempre deste emprego que nascem todas as coisas que chamamos bens (...) também é certo que todos estes bens representam apenas o trabalho que os criou, e que se eles têm um valor, ou mesmo dois valores distintos, só podem extrair estes valores do valor do trabalho de que emanam". (Destutt de Tracy, Éléments d’idéologie, partes IV e V, Paris, 1826, p. 35, 36) .[Ricardo, The Principles of Political Economy, 3.a ed. Londres, 1822, p. 334.] Acrescentemos apenas que Ricardo atribui às palavras de Destutt, um sentido mais profundo do que elas contêm. É certo que Destutt diz, por um lado, que as coisas que constituem a riqueza "representam o trabalho que as criou"; mas, por outro lado, entende que elas retiram os seus "dois valores diferentes" (valor-de-uso e valor-de-troca) do "valor do trabalho". Cai assim no lugar comum da economia vulgar, que pressupõe como dado o valor de uma mercadoria (do trabalho, por exemplo) a fim de determinar o valor das outras. Ricardo interpreta-o como se ele dissesse que o trabalho (e não o seu valor) se representa quer no valor-de-uso quer no valor-de-troca. Mas o próprio Ricardo distingue tão pouco claramente o duplo carácter do trabalho, que em todo o seu capitulo Valor e Riqueza, é obrigado a debater-se laboriosamente com as trivialidades dum J. B. Say. Por isso, no final, fica também muito espantado por se encontrar de acordo com Destutt quanto ao trabalho como fonte de valor, quando este por sua vez está de acordo com Say sobre o conceito de valor. (retornar ao texto)
31 Uma das falhas principais da economia política clássica é nunca ter conseguido deduzir da sua análise da mercadoria, e especialmente do valor dessa mercadoria, a forma[-valor] sob a qual ela se torna valor-de-troca. São precisamente os seus melhores representantes, tais como Adam Smith e Ricardo, que tratam a forma-valor como qualquer coisa de indiferente ou sem qualquer relação intima com a natureza da própria mercadoria. Não se trata somente de a sua atenção ser absorvida pelo valor como grandeza. A razão disso é mais profunda. A forma-valor do produto de trabalho é a forma mais abstracta e mais geral do actual modo-de-produção, [burguês], que adquire, por isso mesmo, um carácter histórico, o carácter de um modo particular de produção social. Se se comete o erro de a tomar pela forma natural, eterna, de toda a produção em todas as sociedades, perde-se necessariamente de vista o lado especifico da forma-valor, logo, da forma mercadoria e, em maior grau, da forma-dinheiro, da forma-capital, etc. É isto que explica a razão por que se encontram em economistas, completamente de acordo entre si sobre a medição de grandeza do valor pela duração do trabalho, as ideias mais diversas e mais contraditórias sobre o dinheiro, ou seja, sobre a forma acabada do equivalente geral. Nota-se isto sobretudo quando se trata de questões como a dos bancos, por exemplo; é então um nunca mais acabar de definições do dinheiro e de lugares-comuns constantemente debitados a este propósito. [Por isso surgiu em sentido contrário um sistema mercantilista restaurado (Ganilh, etc.) que vê no valor apenas a forma social, ou melhor, apenas a sua aparência desprovida de substância.] Aproveito para chamar a atenção, uma vez por todas, que entendo por economia política clássica toda a economia que, a partir de Willlam Petty, procura penetrar no conjunto real e intimo das relações de produção na sociedade burguesa, por oposição à economia vulgar, que se contenta com as aparências, rumina sem cessar, por necessidade própria e para vulgarização dos fenómenos mais notórios, os materiais já elaborados pelos seus predecessores, limitando-se a erigir pedantemente em sistema e a proclamar como verdades eternas as ilusões com que os burgueses gostam de povoar o seu mundo, para eles o melhor dos mundos possíveis. [28] (retornar ao texto)
32 "Os economistas têm uma maneira singular de proceder . Para eles existem apenas duas espécies de instituições, as artificiais e as naturais. As instituições feudais são instituições artificiais; as da burguesia são instituições naturais. Nisto assemelham-se aos teólogos, que também distinguem duas espécies de religiões: qualquer religião que não seja a sua é uma invenção dos homens, enquanto que a sua própria religião é uma emanação de Deus. Deste modo, houve história, mas já não há" (Karl Marx, Misere de la Philosophie. Réponse à la Philosophie de la Misere de M. Proudhon, 1837, p. 113). O mais divertido é Bastiat, que imagina que os gregos e os romanos viviam apenas da rapina. Mas para se viver da rapina durante vários séculos, é necessário que tenha existido sempre qualquer coisa para roubar ou que o objecto das rapinas continuas se reproduza constantemente. É de crer, pois, que os gregos e os romanos tivessem também o seu processo de produção, e portanto uma economia que constituía tanto a base material da sua sociedade, quanto a economia burguesa constitui a base da sociedade actual. Ou pensará Bastiat que um modo-de-produção assente no trabalho dos escravos é um sistema de roubo? Coloca-se então num terreno perigoso. Quando um gigante do pensamento como Aristóteles pode enganar-se na sua apreciação do trabalho escravo, por que é que um economista anão como Bastiat haveria de acertar na sua apreciação do trabalho assalariado? Aproveito esta oportunidade para responder sucintamente a uma objecção que me foi feita por um jornal germano-americano a propósito da minha obra: Zur Kritik der Politischen Ökonomie, publicada em 1859. Segundo ele, a minha opinião de que o modo-de-produção determinado e as relações sociais que dai derivam, numa palavra, "a estrutura económica da sociedade, é a base real sobre a qual se eleva o edifício jurídico e político", de tal maneira que "o modo-de-produção da vida material domina em geral o desenvolvimento da vida social, política e intelectual", segundo ele, esta opinião seria justa para o mundo moderno, dominado pelos interesses materiais, mas não para a Idade Média, onde dominava o catolicismo, nem para Atenas e Roma, onde dominava a política. Desde logo, é estranho que alguém se disponha a crer que alguém ignora estas trivialidades sobre a Idade Média e a antiguidade. O que é evidente e que nem a primeira podia viver do catolicismo, nem a segunda da política. Pelo contrário, as condições económicas de então explicam a razão por que, no primeiro caso o catolicismo e no segundo a política, desempenhavam o papel principal. De resto, um mínimo de conhecimentos sobre a história da república romana, por exemplo, basta para ver que o segredo da sua história é a história da propriedade fundiária. Por outro lado, ninguém ignora que já D. Quixote teve que se arrepender por ter acreditado que a cavalaria andante era compatível com todas as formas económicas da sociedade. (retornar ao texto)
33 "Value is a property of things, riches of man. Value, in this sense, necessarily implies exchanges, riches do not" (Observation on some verbal Disputes in Pol. Economy..., 1821. p. 16). (retornar ao texto)
34 "Riches are the attribute of man, value is the atribute of commodities: A man or a community is rich. a pearl or a diamond is valuable (...) A pearl or a diamond is valuable as a pearl or a diamond" (S. Bailey, l. c., pp. 165 sq.). (retornar ao texto)
35 O autor das Observations e S. Bailey acusam Ricardo de ter transformado o valor-de-troca, de coisa puramente relativa em algo de absoluto. Ao contrário, ele reduziu a relatividade aparente que estes objectos (tais como a pérola e o diamante, por exemplo) possuem como valor-de-troca, à verdadeira relação escondida sob esta aparência, à sua relatividade como meras expressões de trabalho humano. Se os partidários de Ricardo só souberam responder a Bailey de forma grosseira e nada concludente, isso só aconteceu porque não encontraram no próprio Ricardo nada que os esclarecesse acerca da relação íntima que existe entre o valor e a sua forma, ou seja, o valor-de-troca. (retornar ao texto)
Notas dos Tradutores:
(*) Contradição nos termos. (retornar ao texto)
(**) Completamente, inteiramente. (retornar ao texto)
(…)
[9] Na ed. alemã: "O Processo de Acumulação do Capital". (retornar ao texto)
[9a] Como o próprio Marx diz no prefácio à 1ª ed. alemã, os três capítulos que constituem esta 1ª Secção de O Capital reproduzem o conteúdo do seu livro anterior Zur Kritik der politischen ökonomie (1859), para o qual frequentemente remete e que muitas vezes transcreve. Contudo, não foram incluídos em O Capital nem os anexos históricos A, B e C, nem a secção IV "Os metais preciosos" daquela obra. Nas remissões para essa obra utilizámos a ed. portuguesa, publicada em Lisboa em 1971, alterando a tradução quando isso nos pareceu necessário.
[10] Este parágrafo não existe na ed. definitiva alemã. Passou parcialmente da 1ª ed. alemã para a ed. francesa. (retornar ao texto)
[11] Redacção diferente no alemão: "Para simplificar, na nossa exposição consideraremos que toda a espécie de força de trabalho é, directamente, força de trabalho simples, o que nos poupa apenas a tarefa da redução de um ao outro". Na verdade, Marx nunca chegou a desenvolver o importante problema da redução do trabalho complexo ao trabalho simples. (retornar ao texto)
[12] Redacção diferente deste período no alemão: "Força produtiva é sempre, naturalmente, a força produtiva de um trabalho útil, concreto, e, de facto, apenas determina o grau de eficácia de uma actividade produtiva, com objectivo determinado, durante um certo espaço de tempo." Este texto apenas define mais claramente a força produtiva (ou produtividade) do trabalho. (retornar ao texto)
[13] Cfr. Shakespeare, Henrique IV, I parte, III acto, cena III. (retornar ao texto)
[14] Na ed. francesa esta nota vem manifestamente deslocada, no inicio do§ 3º. (retornar à nota)
[15] O texto desta nota, que não consta da ed. francesa, é a reprodução, resumida, da primeira parte de outra nota da ed. francesa. Incluímos os dois textos. Ver infra, nota 30. (retornar à nota)
[16] Estes dois últimos períodos têm redacção diferente no alemão: "Na relação de valor do tecido, o fato figura como qualitativamente igual àquele, como coisa da mesma natureza, dado que é um valor. Ele figura aqui, pois, como uma coisa na qual o valor se manifesta ou que na sua forma natural, palpável, representa valor". (retornar ao texto)
[17] "Paris vale bem uma missa". teria dito Henrique IV em 1583 ao converter-se ao catolicismo. (retornar ao texto)
[18] Na análise que precede, Marx refere-se à obra de Aristóteles, Ética a Nicómaco, livro V. Cap. V. (retornar ao texto)
[19] Cfr. de Marx: Miséria da Filosofia-Resposta à Filosofia da Miséria de Proudhon (1847). Cap. 1 e Contribuição para a Crítica da Economia Política, ed. portuguesa (Lisboa 1971) p.73 (nota 44) e pp. 91 seg. (retornar à nota)
[20] Cfr. Goethe, Fausto, 1ª. Parte "Quarto de estudo". (retornar à nota)
[20a] Na ed. francesa: "Forme monnaie ou argent". Em nota justlfica-se: "A tradução exacta das palavras alemãs Geld e Geldform apresenta uma dificuldade. A expressão "forme-argent" pode aplicar-se indistintamente a todas as mercadorias, salvo os metais preciosos [pois argent significa dinheiro e prata]. Não se poderá dizer, por exemplo, sem provocar confusão no espirito dos leitores: "forme-argent de l'argent", ou "l'or devient argent". De resto, a expressão "forme-monnaie" apresenta um outro inconveniente, pois em francês a palavra monnaie é frequentemente utilizada no sentido de moedas (…) ". Evidentemente, tal perigo não existe no português. Por isso traduziremos sempre Geld, etc, por dinheiro, etc, e utilizaremos o termo moeda para traduzir o alemão Münze (no francês traduzido, segundo os casos, por numeraire ou espèces). (retornar ao texto)
[21] "Para encorajar os outros". - Depois da derrota das revoluções de 1848-49 na Europa e durante o período de reacção e de "acalmia" que se lhe seguiu, houve um grande entusiasmo, nos círculos das classes altas, pelo espiritismo, incluindo o jogo da "mesa dançante". Ao mesmo tempo, na China, a partir de 1850, dava-se o levantamento dos camponeses, conhecido pela Revolta dos Tai-ping. (retornar à nota)
[22] Também em Portugal as palavras jeira e jornal designaram medidas da terra, quantidade de terra trabalhada durante um dia por um homem ou por uma junta de bois. O seu uso subsiste em muitas regiões do pais. (retornar à nota)
[23] "Paralelogramos de Owen". Owen, "socialista utópico" inglês (m. em 1858) propugnava a criação de colónias segundo os seus planos de reforma social, e tentou provar que a forma mais conveniente para elas seria a do paralelogramo ou a do quadrado. (retornar à nota)
[24] Na ed. francesa esta nota e a seguinte estão traduzidas mais ou menos livremente e sem referência à Contribuição. Aproximámos o texto do original. (retornar à nota)
[25] Este parágrafo contém uma das poucas passagens em que Marx esboça os traços da sociedade futura, e mesmo assim não como antecipação mas apenas como hipótese de trabalho. Note-se, contudo, a refer
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