Homem e mangue: Conflitos em Torno da Reprodução Social dos Catadores de Caranguejo do Manguezal de Maria Ortiz
Por: Rodolfo Kinupps Neto • 24/8/2018 • Ensaio • 3.099 Palavras (13 Páginas) • 229 Visualizações
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“Homem e mangue”: conflitos em torno da reprodução social dos catadores de caranguejo do manguezal de Maria Ortiz.
06 de julho de 2018
RESUMO
Nesta pesquisa etnográfica abordamos a cata do caranguejo no manguezal do bairro Maria Ortiz no município de Vitória, Estado de Espírito Santo, o objetivo dessa etnográfica foi conhecer um pouco do catador de caranguejo, o seu trabalho, o seu relacionamento com a vida existente no manguezal, a coleta do caranguejo como meio de sustento das famílias, e a preservação do espaço de trabalho como meio de onde se tira o sustento. Os dados etnográficos são resultantes de trabalho de campo, realizado no bairro de Maria Ortiz em abril de 2018.
Palavras-Chave: Etnografia; Maria Ortiz; Manguezal; Catador; Caranguejo.
Introdução:
No livro Homens e Caranguejos, Josué de Castro (1967) constrói uma imagem da infância, com a coleta desses crustáceos, nos mangues de sua terra, no Recife, pode ser de algum modo, considerada uma interpretação nativa:
A impressão que eu tinha era que os habitantes dos mangues - homens e caranguejos nascidos à beira do rio - à medida que iam crescendo, iam cada vez se atolando mais na lama. Parecia que a vegetação densa dos mangues, com seus troncos retorcidos, com o emaranhado de seus galhos rugosos e a densa rede de suas raízes perfurantes os tinha agarrado definitivamente como um polvo, enfiando tentáculos invisíveis por dentro de sua carne, por todos os buracos de sua pele: pelos olhos, pela boca, pelos ouvidos. (p.13).
Por outro lado, pesquisamos os processos de transformação da cata e dos catadores do caranguejo a partir de categorias como tempo e espaço, tal como essas noções são percebidas e ativadas nas experiências cotidianas dos agentes sociais.
Para Wagner (1975), começa dizendo da relação da cultura com o antropólogo e que para que consiga entender o seu objeto de estudo o antropólogo tem que realizar seu trabalho de forma objetiva de forma realista e que o objetivo da Antropologia que é estudar o homem, ou seja, o fenômeno do homem como um todo, ou seja, se tratando do estudo das culturas.
Uma vez que toda cultura pode ser entendida como uma manifestação especifica ou um caso do fenômeno humano, e uma vez que jamais se descobriu um método infalível para ‘classificar’ culturas diferentes e ordená-las em seus tipos naturais, presumimos que cada cultura, como tal, é equivalente a qualquer outra. Essa pressuposição é denominada ‘relatividade cultural’. (p. 29)
Para Geertz (1989), a cultura é constituída por símbolos e esses símbolos são articulados uns com os outros são as teias que o próprio homem constrói, e que, são socialmente compartilhados e passiveis de interpretação, porque praticadas e vivenciadas pelos atores sociais, dão sentido à existência humana, em cada uma de suas formas particulares.
A interação dialógica junto aos atores sociais no bairro de Maria Ortiz foi orientada por conversas informais.
Historia:
O bairro de Maria Ortiz, em Vitória, teve origem no final da década de 1960 e inicio da década de 1970, a partir de uma ocupação de parte do mangue no município.
A ocupação dá área se deu por famílias pobres vindas em busca de trabalho na construção dos grandes projetos industriais aqui implantados. Pessoas vindas principalmente de outros estados do Brasil, e do interior do estado do Espirito Santo, oriundas do período do êxodo rural devido à erradicação do café no estado e a falta de perspectiva para o pequeno agricultor no estado.
Nos anos de 1970, com o crescimento da população na cidade de Vitória, e sem saber como lidar com o lixo produzido na cidade. A prefeitura da capital criou na região do manguezal um aterro sanitário com lançamento diário de todo tipo de lixo. Que devido a isto acabou tendo uma extensa parte aterrada, e propiciou a ocupação do solo por mais famílias em local insalubre e ocasionando um impacto altamente negativo no ambiente natural. O lugar ficou conhecido como “lixão do bairro Maria Ortiz” e os forasteiros que chegavam à região metropolitana da capital de Vitória, e não tinha perspectiva de moradia acabavam empurrados para estes modelos de ocupação com a permissão do poder publico.
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Foto: Localização do bairro de Maria Ortiz- Vitoria /Reprodução Internet
A chegada:
O inicio da coleta de dados foi realizada no bairro Maria Ortiz, na residência do senhor José Silva “Zé Índio” na Av. Jeronimo Vervloet n° 590, situado no município de Vitória ES.
Residência simples de alvenaria, ainda faltando acabamento de reboco, piso e pintura em alguns pontos internos. Tem dois pavimentos e na entrada da residência um pequeno portão de ferro sem cadeado, um pequeno espaço para armazenagem e venda do caranguejo, tem um ponto de comércio anexo à entrada da casa que pertencente a sua nora que vende biscoitos industrializados.
A conversa se deu pelo período da manhã em um sábado por volta das 10h30min de um dia chuvoso.
O senhor Zé Índio tem 68 anos, natural de Santa Cruz distrito de Aracruz ES. Aposentado como pescador, casado e pai de cinco filhos sendo três mulheres e dois homens em sua fala se orgulha da sua ancestralidade indígena e dos aprendizados que ela o proporcionou na vida. É bem falante, e alegre no trato com as pessoas, faz questão de ser chamado de “Zé Índio”, pois é assim que todos o conhecem no bairro, e este apelido ele afirma que carrega desde novo. E faz parte do grupo dos catadores mais antigos em atividade na região. Pudemos observar que o tempo em que conversamos em frente da sua residência, as pessoas que transitavam pela rua o saudavam com um cumprimento de respeito e amizade, é bem estimado e bastante conhecido entre os moradores da região.
Segundo o relato de Zé Índio, foi iniciado na atividade de catador aos oito anos de idade, influenciado pelo tio paterno, neste mesmo manguezal de Maria Ortiz, antes do período da ocupação desordenada do local, o tio era a referência para o Zé Índio, que quando criança sempre acompanhava o tio nas andanças e rodas de conversa. E foi quem lhe transmitiu os primeiros conhecimentos de mangue bem como a catar caranguejo. Nesta época era retirado do buraco (hoje são utilizadas armadilhas que em parte facilita a cata).
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