Sociologia no Ensino Médio
Por: lofelin • 9/12/2016 • Ensaio • 3.090 Palavras (13 Páginas) • 301 Visualizações
Ensaio Reflexivo
(Lourenço Brito Felin)
Pensar a condição do jovem nas escolas públicas brasileiras e sua relação com o fracasso/sucesso escolar, bem como, discutir o desempenho escolar e o alcance das políticas educacionais brasileiras, são aspectos fundamentais para compreensão das desigualdades sociais e por isso recebem atenção e esforço de diferentes instituições e pesquisadores. Observa-se inúmeras produções relacionadas à estrutura organizacional da escola, configurações das políticas públicas no setor educação, qualificação de professores, perfil dos alunos, avaliação docente/discente, violência no contexto escolar, entre outros aspectos que conformam o tema. No entanto, ainda é tímida e tangencial, para não dizer inexistente, a reflexão relativa aos diferentes tempos/ritmos que se (des)encontram na escola.
Dentre as muitas possibilidades de definição do termo tempo, destacamos o que consta no dicionário LUFT (2009): “1. Medida de duração dos fenômenos. 2. Período; época. (...) 4. Momento ou ocasião própria; ensejo”. Estas referências condizem com nossa intenção de complementá-lo com a expressão ritmo ao longo deste texto, para aproximar da acepção de um jeito específico de ordenar a ocorrência dos eventos a partir do significado atribuído pelos próprios sujeitos que o percebem. Nesse sentido, a noção de tempo/ritmo que adotamos está mais próxima de Kairós (momento certo, oportuno, supremo, portanto um tempo existencial) do que de Chronos (tempo cronológico, sequencial e linear), ou seja, voltado mais para a natureza qualitativa do que quantitativa de sua definição. Trata-se da referência às lógicas de percepção e condução do cotidiano, ao momento e projeto de vida, à trajetória dos sujeitos (dinâmica de seu deslocamento), movimento, contemplando uma abrangência cultural, de classe, gênero e geração.
Este tempo/ritmo que nos referimos possui relação com o poder (disputa pela sua definição/velocidade na interação), com os capitais (possibilidade de acumulação e valorização), movimentos sociais (construção de resistência ao longo da história – reunião de condições objetivas e subjetivas que configuram um bloco histórico), democracia (convivência/ legitimidade de tempos/ritmos distintos), entre outras dimensões socioculturais. Para nossa reflexão situaremos a discussão do tempo/ritmo no contexto escolar. Assim, o objetivo deste ensaio reflexivo é analisar o impacto causado pela convivência de diferentes tempo/ritmos no contexto escolar na trajetória do jovem-aluno e sua repercussão no planejamento docente para as aulas no ensino médio.
Inicialmente é importante explicitarmos a premissa de que há um tempo/ritmo “da” escola, que convive com outros tempos (“dos” professores e “dos” jovens-alunos) “na” escola. Estes tempos/ritmos concorrem cotidianamente e podem ser observados, por exemplo, em uma aula que o professor desejaria planejar para ocorrer em uma hora, mas cujo período normatizado pela escola é estabelecido em 45 minutos e cujo desenvolvimento pelos alunos é realizado em dois períodos de 45 minutos. O perverso nesse dilema não é apenas a adequação de duas categorias dos sujeitos envolvidos a um determinado tempo/ritmo “necessário”, mas sim a recorrente perspectiva que reconhece como legítimo exclusivamente o tempo/ritmo estabelecido pela escola e que, portanto, prevalece sobre os demais conduzindo a uma hierarquização (reforço dela) que reitera o papel subalterno dos demais sujeitos.
Se considerarmos que o desenvolvimento de uma aula requer minimamente que se apresente a proposta da atividade, motivem-se os envolvidos a participarem, ocorra o engajamento, a realização das tarefas e por fim a conclusão/finalização, é possível que este processo para ter sucesso deva compreender o tempo/ritmo do jovem-aluno. No entanto, o que se observa é uma crítica à inadequação dos alunos ao tempo/ritmo do professor/escola. Confesso que ao realizar as observações na escola para o estágio de Sociologia tornei-me “vítima” dessa armadilha. Ao acompanhar uma turma do segundo ano do ensino médio durante a aula de inglês me chamou atenção que a atividade proposta pela professora, do meu ponto de vista, era plausível de ser realizada na metade (se tanto) do tempo previsto para aula. No entanto, os jovens-alunos não conseguiram resolver o exercício proposto sequer no período inteiro. Inicialmente atribui a responsabilidade à condução da professora (“não soube combater as distrações que concorriam com o foco de sua aula”). Sobrou também para os próprios jovens-alunos que na minha percepção eram “morosos”, “lentos propositalmente”, na gíria do futebol estavam “fazendo cera” para “ganhar tempo” o que corresponde a fazer o menor número de tarefas possível.
Foi somente mais tarde, quando comecei a execução do planejamento das aulas de sociologia que havia construído que reconheci a existência e pude perceber a dificuldade de relacionar e contemplar os três tempos/rimos (professor, escola e aluno). Quando o plano elaborado para uma aula necessitou de três vezes o tempo previsto para se realizar reavaliei minhas observações da aula de inglês e comecei a compreender as escolhas de uma professora experiente acostumada ainda que inconscientemente a lidar com essas referências temporais.
Mais que isso, identifiquei a tendência nas escolas que pude observar na minha trajetória escolar e de formação, de organizarem-se a partir da referência a um único tempo/ritmo: o da própria instituição. Há uma invisibilidade dos tempos/ritmos que atinge, sobretudo, o reconhecimento da condição existencial do jovem-aluno, anulando-a ou, pelo menos, construindo uma distância abismal entre ela e a lógica escolar. Isto pode ser observado em Freitas e Filho (2013) quando apontam que nas escolas públicas brasileiras
“existe um descompasso entre os anseios dos jovens e as lógicas institucionais que enquadram as escolas. (...) De um lado, jovens que desejam reconhecimento e espaço para a expressão das suas pertenças e gostos no ambiente escolar. De outro, escolas que teimam em fechar os olhos para os jovens que existem por trás da farda dos alunos” (p. 122).
No mesmo sentido, Camacho (2004) refere que os sujeitos focalizados, além de alunos, são, acima de tudo, jovens. Vivem, portanto, um período de permissividade e legitimidade (moratório social) e sensação de imortalidade, falta de temeridade, exposição a excessos e superdoses (moratória vital).
Claudia Fonseca (1994), referindo-se a adolescência, observa a distinção entre as classes médias e populares na definição dessa fase da vida. Em seus
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