Comentário sobre o livro "Sobre a Televisão", de Pierre Bourdieu
Por: Gabriela Schmalfuss Borges • 26/6/2017 • Resenha • 944 Palavras (4 Páginas) • 1.198 Visualizações
Pensando a mídia através de Bourdieu
Escrito em 1997 pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu, conhecido por seus estudos na área de dominação, o livro “Sobre a Televisão” tem como objetivo trazer uma análise crítica sobre o meio. Apesar de se restringir somente ao modelo jornalístico adotado na televisão de forma específica, a obra permite que conceitos sejam pensados no fazer jornalístico de modo geral.
No texto, o autor valoriza uma problemática mais ampla, de ordem sociocultural, onde o jornalismo pode ser entendido como uma peça-chave nos processos de construção simbólica do cotidiano. Ele afirma que a busca do meio por audiência coloca em perigo não só as diferentes esferas de produção cultural, como também a política e a democracia, e espera que aquilo “que poderia ter se tornado um extraordinário instrumento de democracia direta não se converta em instrumento de opressão simbólica”.
O primeiro capítulo, intitulado “O Estúdio e Seus Bastidores”, aborda o discurso e o formato dos programas jornalísticos televisivos e a fina cortina, quase imperceptível, da censura presente nos mesmos. Em seu estudo, elaborado a partir de uma análise de noticiários europeus e americanos, o autor propõe uma reflexão sobre o tempo gasto na televisão com temas desimportantes. O fato se deve à sua percepção sobre uma constante padronização dos programas e a tendência à busca por temas leves, geralmente de entretenimento, que agradem uma grande parcela do público, ao invés de estimular o senso crítico da população. Este seriam os “fatos-ônibus”, “são fatos que, como se diz, não devem chocar ninguém, que não envolvem disputa, que não dividem, que formam consenso, que interessam a todo mundo, mas de um modo tal que não tocam em nada de importante”. Para ele, segundos que seriam preciosos são gastos com fatos de relevância nula, a partir de um agendamento que busca por temas clichês, como o trânsito ou visitas de chefes de Estado, por exemplo. Ele ainda cita os “pseudo-eventos”, eventos que só ocorreram por causa da veiculação na televisão e caso houvesse uma filmadora, não teriam acontecido.
Podemos perceber esses tópicos também nos noticiários brasileiros. Em busca de um consenso geral ou venda de uma ideia pronta, que não propicie o debate, os telejornais vagam por um lugar-comum, elaborando constantemente as mesmas pautas. Um exemplo é o Jornal do Almoço, telejornal veiculado ao meio-dia pela RBS, afiliada da Rede Globo. Buscando um tema de interesse geral, voltado ao entretenimento, na semana de Páscoa foi apresentada pelo terceiro ano consecutivo a matéria de colheita de macela no interior do Rio Grande do Sul, com o argumento de que é uma “tradição gaúcha”. Apesar da possível riqueza cultural do ato, a justificativa da tradição poderia ficar mais evidente. Além disso, a mesma pauta e a mesma abordagem em três anos caracteriza a perda de tempo hábil do próprio jornal para o desenvolvimento de temas de maior relevância e criticidade.
No mesmo capítulo, Bourdieu fala que o meio pode ocultar mostrando, fazendo com que um assunto se torne irrelevante a partir de sua angulação, ou seja, quando mostra uma coisa diferente do que deveria mostrar, de um jeito insignificante ou mesmo com outro sentido. Além disso, aponta que as mediações entre a televisão e seus patrocinadores é um exemplo de fator que pode influenciar a cobertura jornalística sobre a informação. Outro ponto relevante é o papel do próprio jornalista e funcionário de uma empresa de comunicação. Bourdieu cita que cada pessoa usa “óculos”, com os quais enxerga seu próprio mundo. As lentes, ou a própria subjetividade,
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