BREVE QUADRO DA FORMAÇÃO CULTURAL EUROPEIA E O PROBLEMA DO MAL EM SANTO AGOSTINHO
Por: nubodeno • 6/2/2019 • Trabalho acadêmico • 2.378 Palavras (10 Páginas) • 227 Visualizações
A formação cultural da Europa primitiva
O início da cultura ocidental pode ser observado na nova comunidade espiritual que surgiu das ruínas do
Império Romano, em razão da conversão dos bárbaros do norte à fé cristã. O colapso da organização política
do Império Romano deixara um vácuo que nenhuma autoridade poderia preencher. Ele foi preenchido,
contudo, pela Igreja, que assumiu a função de tutora e legisladora dos novos povos. Os padres latinos –
Ambrósio, Agostinho, Leão e Gregório – foram os pais fundadores da cultura do Ocidente, na medida em
que, os distintos povos do Ocidente puderam ser incorporados à comunidade espiritual da cristandade,
adquirindo, dessa forma, uma cultura comum.
No Ocidente, a Europa primitiva não preservou nenhum centro comum ou tradição unificada de cultura
espiritual. Os povos do norte não possuíam conhecimento de escrita e desconheciam a vida urbana. Foi
somente por meio do cristianismo e de um ethos de uma vida de sacrifício e de santidade transmitidos pela
ação da Igreja, que a Europa ocidental adquiriu sua unidade e forma. Foi apenas nesse mundo de mitologia
cristã – no culto dos Santos e às relíquias e os milagres associados a ambos – que a aglutinação da ética e da
fé cristãs com a tradição desses povos bárbaros do Ocidente pôde ser alcançada.
Era impossível que povos sem nenhuma tradição de filosofia ou mesmo de uma incipiente literatura escrita
pudessem assimilar de forma direta a profunda e sutil metafísica teológica. A conversão da Europa ocidental
foi realizada menos por meio do ensinamento de uma nova doutrina e muito mais por meio da manifestação
de um novo poder a se impor e conquistar os bárbaros do Ocidente.
Dessa forma, assim como os mártires haviam sido os heróis da conquista cristã do Império, os monges se
fizeram confessores e apóstolos dessa fé entre os bárbaros. Aqui, a relação entre religião e cultura não é de
assimilação e permeação, mas de contradição e contraste. A vida dos santos e dos ascetas impressionava tão
fortemente os bárbaros porque expressava a manifestação de um modo de vida e de uma escola de valores
inteiramente opostos aos deles. O contraste não era entre a civilização do mundo romano-cristão e o
barbarismo dos pagãos, mas entre dois mundos espirituais ou dois planos de realidade. Por trás do contraste
ético entre a vida do santo e o barbarismo se encontra o dualismo escatológico entre o mundo presente e o
mundo que virá. Temos aí o pano de fundo da visão medieval cristã.
Assim, deu-se o aparecimento de uma cultura cristã autônoma, centrada na vida monástica, que permeava a
Igreja e a vida das pessoas graças à sua influência educacional e religiosa. Não era mais uma questão de
bárbaros conquistadores afetados pela religião e cultura dos conquistados, como se deu com os francos e os
godos; tratava-se de uma nova criação, gerada pelo enxerto da tradição latino-cristã nas raças bárbaras
nativas, de forma que todo o processo foi internamente assimilado por esses povos.
É impossível compreender o cristianismo sem o estudo da história do cristianismo. E isso, encerra muito mais que o
estudo da história eclesiástica no sentido tradicional. Inclui o estudo de dois processos diferentes que agem,
simultaneamente, na humanidade ao longo do tempo. De um lado, temos o processo de formação e mutação da cultura
que é objeto da antropologia, da história e de disciplinas afins; e, de outro, temos o processo da Revelação e da ação
da Graça divina, que criou uma sociedade espiritual e uma história sagrada, embora isso só possa ser estudado como
parte da teologia e em termos teológicos. Na cultura cristã esses dois processos ocorrem em conjunto, numa unidade
orgânica, de modo que seu estudo requer a cooperação íntima da teologia e da história. É óbvio que essa é uma tarefa
difícil, mas muito necessária, já que não há outra maneira de estudar o cristianismo como uma força viva no mundo
dos homens e é da essência do cristianismo ser uma força e não uma ideologia abstrata ou um sistema de ideias.
(DAWSON, Christopher. Criação do Ocidente)
A Patrística
A Patrística se desenvolveu em um ambiente altamente influenciado pela filosofia grega e dela se valeu
para esclarecer e defender a fé cristã. O Neoplatonismo teve grande ascendência sobre os primeiros
escritores cristãos. Encontramos duas tendências opostas: de um lado, os padres da Igreja grega, que
pretendiam harmonizar o pensamento grego com a religião cristã; de outro, os padres da Igreja Latina, que
combateram a cultura pagã.
A mensagem evangélica suscitou uma série de problemas: textuais (fixação do cânon); de coerência
(Antigo Testamento x Novo Testamento) e teológicos (o problema trinitário). Sobre a base desses problemas
era claro o esforço de definir a identidade do cristão. Assim, podemos definir três momentos: o dos padres
apostólicos do século I, que tiveram interesses no campo moral e ascético; o dos padres apologistas do século
II, que tentaram uma defesa do cristianismo contra os ataques dos adversários pagãos e gnósticos; e por fim,
o momento da Patrística (a partir do século III) que usou de modo sistemático a filosofia para dar uma base
teórica para a Revelação.
Padres da Igreja, portanto, são todos aqueles homens que contribuíram de modo determinante para
construir o edifício doutrinário do cristianismo. O texto básico para a mediação racional e a sistematização
da doutrina e da filosofia cristã foi o prólogo do Evangelho de João (e as cartas de Paulo), que fala do Verbo
ou Logos divino, e fala de Cristo precisamente em termos de Logos:
...