Artigo Acadêmico Trabalho
Por: Agda Lima Brito • 8/10/2018 • Trabalho acadêmico • 6.199 Palavras (25 Páginas) • 252 Visualizações
Trabalhadoras das matas: o trabalho feminino nos seringais do Amazonas (1940-1950)
Agda Lima Brito[1]
Resumo: Buscamos investigar como foi à participação das mulheres nos espaços de trabalho dos seringais dentro da região do Estado do Amazonas, naquele período da II Guerra Mundial. Se no primeiro surto da borracha (1870-1912), o seringal era um ambiente em sua maioria masculino, durante 1940 a presença das mulheres em maior número, modificou os modos de trabalho nestas localidades, modificando as formas de sobreviver nas colocações.
Palavra Chave: trabalho, mulheres, seringais.
Abstract: We sought to investigate how women participated in the workplaces of the rubber plantations within the region of the State of Amazonas, during that period of World War II. If in the first rubber outbreak (1870-1912), the rubber tree was a predominantly masculine environment , during 1940 the presence of women in greater numbers, modified the ways of working in these localities, modifying the ways of surviving in the placements.
Keyword: work, women, rubber trees.
Na década de 1940 a Amazônia se torna alvo de interesse do governo, tendo em vista que o Brasil entrou na Segunda Guerra Mundial, sendo necessário colaborar para o esforço de guerra dos Aliados. Com os Estados Unidos inserido na Segunda Guerra Mundial, e também com os países asiáticos produtores de borracha, afetados pela invasão do Japão, ocorreu uma preocupação com os rumos que a produção da borracha tomaria. Os Estados Unidos passaram a se preocupar com o desenvolvimento do comércio da borracha na Amazônia, levando em consideração a grande importância do produto para a fabricação de artigos para a guerra (GARFIELD, 2009, 20).
O recorte temporal escolhido busca propriamente tentar trazer à tona a história dessas trabalhadoras, buscando entender como essas mulheres, que durante algum tempo ficaram invisibilizadas dentro das matas, se articulavam e traçavam estratégias de sobrevivência dentro das colocações, principalmente através da produção de gêneros alimentícios para consumo.
Nos Relatórios do comércio do Amazonas[2] da década de 1940, podemos destacar alguns indicativos de que o governo preocupava-se em produzir borracha, mas também existia incentivos para que fossem produzidos outros alimentos. Através do andamento da pesquisa percebemos como a mulher estava bastante ligada ao trabalho de roça, não que não esteja inserida em outras atividades, mas a atenção para o serviço de agricultora como uma possibilidade de sobrevivência e venda daquela produção, parece ser bem maior.
Através das entrevistas de homens e mulheres, percebemos como muitas famílias iram permanecer sobre o mesmo sistema de trabalho, mesmo após a Segunda Guerra Mundial, trabalhando para os patrões dentro desse regime de exploração. Posteriormente com o avançar da crise da borracha, à medida que o comercio fica insustentável e os patrões abandonam seus barracões, essas famílias que já estão acostumadas à vida na mata, encontraram nela meios de sobreviver. Não excluímos aqueles que se retiraram cansados da vida na mata, do trabalho pesado na agricultura e ainda àquelas que buscaram nas comunidades vizinhas ao redor do Amazonas, melhores condições de vida e estudo para seus filhos.
Importante ressaltar que o ponto de partida dessa pesquisa tem como base a história de vida de minha avó Altina Lopes, que migrou do Ceará ainda muito jovem para trabalhar no barracão localizado no Pauini, partindo juntamente com sua família em uma embarcação onde se encontravam mais oito famílias, dispostas a ir trabalhar nos seringais do Amazonas.
A partir de muitas histórias que eram contadas por Dona Altina, se despertou o meu interesse pela presente pesquisa, percebendo que seria possível através da história oral, entender não só os trabalhos que eram realizados por essas mulheres, mas também seu cotidiano, dificuldades de viver e sobreviver nas matas Amazônicas.
É importante ressaltar que a história das mulheres, como uma temática própria da História, tem seu período de ebulição por volta de 1970, com o crescimento dos movimentos feministas, que contribuíram para o crescimento deste campo de estudos:
“Apoiada a explosão do feminismo e articulada ao crescimento da antropologia e da história das mentalidades, incorporando as contribuições e dos aportes das novas pesquisas sobre memória popular. Esse foi período chave dessa produção intelectual: as militantes dos movimentos feministas fazem a história das mulheres antes mesmo que as próprias historiadoras a façam (DAUPHIN, FARGE, PERROT, 2000, 8) [3]”.[a]
Nos anos 1980 já passa a contar com um número crescente de publicações, contribuindo consideravelmente com a discussão acerca da formação da temática história das mulheres e das relações de gênero.
Soihet e Pedro (SOIHET & PEDRO, 2007, 282) evidenciam como o campo histórico citado acima vem se consolidando, passando por modificações e enfrentamentos, ao passo que identificam o empenho de uma gama de pesquisadoras que realizaram suas contribuições na década de 1980 em diante, preocupadas em problematizar a discussão dentro das academias através de eventos, publicações em revistas, dentre outros meios utilizados que foram, no decorrer do tempo, modificando-se e agora inserindo outros estudos de gênero, fazendo emergir essas questões, até o tempo presente[4].
Vale a pena citar algumas autoras que contribuíram para os avanços dos estudos de gênero na região Norte.
Uma das pioneiras nas pesquisas sobre relações de gênero na região Norte, Cristina Wolff (WOLFF, 1999) com seu trabalho voltado para as mulheres na região do Alto Juruá, buscando dar visibilidade as vivências e presença dessas mulheres nos seringais do Acre. Também são importantes os estudos de Maria Luiza Ugarte que em sua tese de doutorado analisa a presença das mulheres através dos periódicos do Amazonas. No mesmo já trazia discussões importantes não só sobre as mulheres no espaço da cidade, como também nos seringais que são em regiões mais afastadas, chamando atenção para questões como:
“Embora explícita nos seringais do interior amazônico, onde se via acobertada pela truculência do mandonismo local, a redução da mulher à condição de mercadoria interferia igualmente na condição feminina no interior das cidades. Com a expansão gumífera, Manaus adquiriu características de cidade cosmopolita, mas isso incluía também, embora pouco se falasse, a ampliação do meretrício para níveis alarmantes (UGARTE, 2001, 225).[5]”[b]
Dito isso sabemos que nesse período, segundo Cristina Wolff boa parte das mulheres que eram enviadas como mercadorias para os seringais do Amazonas, vinham da cidade de Manaus, em meados do século XIX as regiões onde vão se encontrar os seringais tinham em sua maioria trabalhadores homens. Devido a isto a mulher era usada como mercadoria, uma vez que os seringueiros que adquirissem os serviços de uma meretriz contraiam uma dívida enorme junto aos barracões (WOLFF, 1999).
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