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O Brasil de Montaigne

Por:   •  15/6/2018  •  Trabalho acadêmico  •  1.241 Palavras (5 Páginas)  •  236 Visualizações

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

Victória da Silva Almeida Bezerra – 135.278 – Noturno

LESTRINGANT, Frank. ‘’O Brasil de Montaigne’’. Revista de Antropologia, 49 (2006). Pp. 515-556.

        Especialista em literatura das Guerras Religiosas e em viagens francesas ao Novo Mundo durante o século XVI, Frank Lestringant é nascido em 1951, filho de livreiros em Rouen, no noroeste da França. Desde 1999 é professor de literatura francesa do Renascimento na Universidade de Paris-Sobornne.

        Embora o texto aqui analisado ostente uma linguagem complexa, com uma leitura atenta e introspectiva é possível absorver o conteúdo que ele pretende expressar. É importante ressaltar que se trata de uma obra contemporânea acerca de acontecimentos de um passado um tanto distante. A obra é composta por uma análise que contrasta ao mesmo tempo em que procura tornar semelhante, o Velho e o Novo Mundo, sobre as perspectivas analíticas antropológicas e sociológicas.

  1. O mundo em movimento

        O autor inicia a obra nos fazendo refletir em relação à concepção do fim da Idade Média e início da Idade Moderna, que é uma ideia concebida posteriormente à época dos descobrimentos, do Renascimento, da Reforma Protestante e etc. Ressalta também como o julgamento do mundo estava instável e confuso, já que não havia escritos bíblicos acerca da América, o Novo Mundo, portanto, era uma dúvida que martelava na cabeça dos europeus dos séculos XV e XVI, comparando essa instabilidade aos pensamentos de Montaigne.

        ‘’Ao mundo em movimento do século XVI corresponde o movimento incessante da investigação, saltando de uma singularidade para outra, de um momento para outro’’. (pp.517).

        É interessante salientar a afirmação que o autor faz a respeito do apelo que Montaigne possui pelos mitos, que pretendem justificar a existência desse Novo Mundo, que antes de tudo, são estratégias eurocêntricas, etnocêntricas, e que desejam exprimir a singularidade do desconhecido, o tornando conhecido, familiar, como algo perdido, algo que foi desviado, mas que agora será ‘’salvo’’.

  1. A experiência brasileira de Montaigne

        Neste tópico, o autor evidencia a descrição que Montaigne faz dos índios Tupinambás, os retratando como inferiores, desprovidos de certas características que constituíam a sociedade europeia da época, consideradas como de extrema importância para classificá-la como superior/não-primitiva. Entretanto, Montaigne reconhece alguns aspectos que compõem aquelas sociedades indígenas e elabora uma espécie de quadro, sempre mantendo-se fora dele, como sendo apenas o relator daquele cenário, que embora manifeste-se interessante, é visto como primitivo, em uma etapa ‘’inicial’’ da evolução humana.

        Contudo, embora fale detalhadamente sobre o Brasil em um relato que assemelha-se à carta de Pero Vaz de Caminha, Montaigne estava distante do Novo Mundo, de modo espacial e cronológico, pois não o visitou. Seu relato é baseado somente em relatos de viajantes franceses e cronistas espanhóis, assim como em objetos que lhe foram enviados. Na casa de Montaigne havia um criado que dissera já ter visitado o Brasil, e Montaigne não hesitava em questioná-lo sobre os detalhes, dizendo que o homem não detinha preconceitos, sendo assim, seu relato seria provavelmente ‘’mais verdadeiro’’.

  1. A ‘’declamação’’ dos Canibais

        O termo declamação ganha relevância significativa na obra de Montaigne por deter o sentido da oralidade como algo mais espontâneo que as obras escritas. Ao tratar dos canibais, adquire ainda mais destaque por assemelhar os antropófagos a loucos. Declamação nesse sentido adquire o equivalente ao que hoje entendemos como ‘’heterologia’’ através de Michel de Certeau. Mas também existe um contraponto que avalia a introdução dos ideais dos espanhóis no Novo Mundo, um ato equivocado e ruim, já que anteriormente à descoberta aquela terra era um lugar ‘’abençoado pelos deuses’’, passando o discurso para os indígenas em questão, quando lhes é apresentado os costumes e o modo de vida predominante na Europa.

        ‘’ A palavra já não pertence à Loucura nem a Platão, mas ao Canibal’’. (pp.524).

        Duas das três respostas que os ‘’canibais’’ deram ao rei, tratam-se da indignação deles diante da servidão voluntária dos homens ao rei, que era um adolescente de 12 anos. E como tantos homens obedecem a um só homem. Assim como a desigualdade social que era absurdamente contrastante, e a ausência de revoltas populares contra essas condições de extrema fome e pobreza que havia de um lado e a fartura e abundância de recursos e conforto que havia do outro.

        Embora Montaigne vivesse em uma época marcada pelo eurocentrismo e pela predominância do catolicismo como a religião verdadeira, ele expressa uma comparação entre o ato antropofágico e a crucificação, antecedendo uma afronta à Igreja, mesmo que não intencional, antes mesmo dos protestantes, com o intuito de exaltar a existência do prisioneiro.

        ‘’ Montaigne, ao contrário, insiste na presença real do sacrificante-sacrificado, que coincidem no Cristo e, em larga medida, também no prisioneiro tupinambá, enfatizando assim a proximidade das substâncias. ’’ (pp.529).

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