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OS IMPACTOS DO PASSADO ESCRAVOCRATA BRASILEIRO NO PROCESSO DE INSERÇÃO SOCIAL DA POPULAÇÃO INDÍGENA E AFRO-BRASILEIRA

Por:   •  14/11/2021  •  Artigo  •  3.470 Palavras (14 Páginas)  •  266 Visualizações

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FACULDADE BATISTA DE MINAS GERAIS

SANTINA DOS SANTOS IVO RODRIGUES

OS IMPACTOS DO PASSADO ESCRAVOCRATA BRASILEIRO NO PROCESSO DE INSERÇÃO SOCIAL DA POPULAÇÃO INDÍGENA E AFRO-BRASILEIRA

BELO HORIZONTE – MG

2021

SANTINA DOS SANTOS IVO RODRIGUES

OS IMPACTOS DO PASSADO ESCRAVOCRATA BRASILEIRO NO PROCESSO DE INSERÇÃO SOCIAL DA POPULAÇÃO INDÍGENA E AFRO-BRASILEIRA

Artigo apresentado à Faculdade Batista de Minas Gerais como pré-requisito para obtenção do título de especialista em: História.

BELO HORIZONTE – MG

2021

RODRIGUES, Santina dos Santos Ivo. Os impactos do passado escravocrata brasileiro no processo de inserção social da população indígena e afro-brasileira. Belo Horizonte: Faculdade Batista de Minas Gerais, 2021. Especialização em História.

RESUMO

Este trabalho propõe-se a apresentar um estudo acerca dos impactos do processo escravocrata brasileiro sobre a inserção social da população indígena e afro-brasileira. O objetivo foi analisar os efeitos predatórios do sistema escravista adotado pelos colonizadores portugueses, iniciado no processo de efetiva ocupação do território brasileiro, na vida dos escravos fugitivos e alforriados e na das populações autóctones. Para tal, foram realizadas pesquisas analíticas em fontes históricas confiáveis enunciadoras do Período Colonial brasileiro, como a obra “História do Brasil”, do autor Boris Fausto, e por meio delas, traçaram-se paralelos com a atual situação dessas populações tradicionais nacionais. Observa-se que, mediante a outorgação da Lei de Terras em 1850, anteriormente a Lei Áurea de 1888, teve-se a inibição institucional da inserção social dos autóctones, alforriados e sobreviventes, culminando, pois, em uma continuidade da marginalização de seus direitos na contemporaneidade. O trabalho se preocupa em demonstrar as vicissitudes da dívida escravista histórica do país com as suas populações tradicionais, as quais, ainda hoje, permanecem sem reparações efetivas pelos danos físicos e culturais causados ao longo da história.

Palavras-chave: Escravidão; Marginalização social; Populações tradicionais.

SUMÁRIO

  1. INTRODUÇÃO...........................................................................................................04

  2. DESENVOLVIMENTO.............................................................................................05

2.1. A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA ESCRAVISTA BRASILEIRO.....................05

2.2. O LEGADO ESCRAVOCRATA PARA A POPULAÇÃO INDÍGENA: MARGINALIZAÇÃO E GENOCÍDIO...................................................................................07

2.3. O LEGADO ESCRAVOCRATA PARA A POPULAÇÃO AFRO-BRASILEIRA: VIOLÊNCIA E FAVELIZAÇÃO.............................................................................................09

3. CONCLUSÃO.....................................................................................................................12

4. REFERÊNCIAS..................................................................................................................14

  1. INTRODUÇÃO

O longo período escravista brasileiro, iniciado em 1540 com a escravidão indígena e findado constitucionalmente em 1888, deixou impactos inexoráveis na vida das populações autóctones brasileiras e nas que se formaram a posteriori, como a comunidade afro-brasileira.

Por meio de uma pesquisa bibliográfica, fundamentada nos princípios do teórico historiográfico Robin George Collingwood, enunciador de que “Na história, não são hipóteses, são factos, que se apresentam à observação do historiador.” (COLLINGWOOD, 1981, p. 309), foi feito um estudo investigativo na obra “História do Brasil”, do autor Boris Fausto, na busca pela compreensão da formação social nacional. A partir dele, foram refletidos os efeitos do sistema escravista para as populações tradicionais brasileiras, com base nos estudos presentes em mapas e relatórios divulgados pelo IBGE, pela FCP e pela FUNAI acerca da condição contemporânea da população indígena e negra.

A justificativa para a realização desse trabalho é a necessidade de recuperar, fundamentando academicamente, o débito histórico brasileiro com esses povos, que ainda hoje permanecem vítimas das vicissitudes impostas pelo sistema escravocrata português.

Os objetivos com esse estudo são os de investigar e os de compreender a influência de decisões históricas arbitrárias para os agrupamentos humanos e como elas podem exercer influências anacrônicas quando envolvem temáticas sociais.

Para isso, na parte I, será feita uma análise geral da constituição do processo escravocrata brasileiro, partindo da ocupação litorânea portuguesa no início do século XVI, até a outorgação da Lei Áurea no século XIX, e do desenvolvimento das relações entre o português, o indígena e o escravo. Nas partes II e III, serão feitas análises mais aprofundadas e fundamentadas acerca das implicações da escravidão na formação, ocupação e consolidação dessas populações no passado e no presente.

  1. DESENVOLVIMENTO

2.1.  A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA ESCRAVISTA BRASILEIRO

A chegada dos portugueses no Brasil em 1500 não pressupôs uma imediata colonização do território. Isso pois, durante cerca de três décadas após o achamento, as relações entre os portugueses e a população autóctone permaneceram estritamente comerciais, baseadas na exploração do Pau-Brasil por meio do sistema de escambo e de feitorias. Com isso, a relação entre o colonizador e as tribos indígenas encontradas em território brasileiro foi, de início, baseada no pacifismo, ainda que houvesse, da parte de ambos, um estranhamento motivado pelo distanciamento cultural entre eles.

Entretanto, frente às invasões de outros povos europeus no litoral brasileiro, como os franceses e os holandeses, que não reconheciam o acordo feito entre Portugal e Espanha, pioneiros da navegação marítima, houve uma necessidade, por parte dos portugueses, de efetivarem a colonização do Brasil para que pudessem defender de forma mais efetiva o território encontrado. Nesse ínterim, o método utilizado por Portugal foi o de introduzir no litoral brasileiro diversas plantações de cana-de-açúcar.

Esse novo cenário foi ratificado por diversos fatores, tais como a convergência de interesses dos agricultores que necessitavam de mão de obra e da burguesia metropolitana que lucrava com o tráfico negreiro. No final do governo de Mem de Sá, em cerca de 1570, a substituição do escravo indígena pelo africano foi impulsionada e tornada irreversível a partir de 1630, ainda que indígenas fossem utilizados em algumas regiões como São Paulo.

A partir desse contexto, consolidou-se o denominado “sistema escravista colonial”, uma macroestrutura formada por dois pilares: o tráfico negreiro e a escravidão. Nele, o escravo passa a ser considerado uma mercadoria e produtor de novas mercadorias, sendo a cor da pele um fator de diferenciação social. Formam-se, então, três novas camadas sociais no Brasil: escravos, senhores de engenho e burguesia metropolitana (mercadores de escravos). Esse sistema é mantido, pois atende tanto aos interesses dos senhores de engenho, como do Estado metropolitano, uma vez que este arrecada impostos com o tráfico e com a posterior venda desses escravos em solo brasileiro. Ademais, como os escravos eram comprados, sobretudo, por produtos como tabaco e aguardente, de baixo valor agregado, e posteriormente vendidos a altos preços, o lucro exorbitante arrecadado manteve o comércio escravista como uma das bases da economia brasileira por séculos.

Ao longo dessa transformação, a Inglaterra, com extrema influência sobre Portugal e a colônia brasileira, passou a pressionar gradativamente D. Pedro I e, posteriormente D. Pedro II, pela abolição da escravatura na colônia brasileira. Isso pois, nesse contexto de industrialização, era fulcral para a potência inglesa a difusão da lógica capitalista com o estabelecimento de mercados consumidores ao longo do globo por meio do assalariamento do trabalhador, indo de embate, portanto, com o regime escravocrata. Entretanto, com a ascensão do ciclo do café ao longo do século XVIII, o sistema escravocrata foi reforçado e o tráfico negreiro crescia apesar das objeções inglesas. Isso fez com que a Inglaterra, em 1845, instaurasse a Lei Bill Aberdeen, que garantia a ela o direito de aprisionar qualquer navio negreiro. Como consequência imediata, houve o aumento do preço dos escravos. Porém, somente em 1850 o governo brasileiro promulgou a extinção do tráfico pela Lei Eusébio de Queirós.

Isso tornou a abolição da escravatura um processo inevitável, fomentando, por parte do governo, a adoção de medidas de transição. A primeira delas, cujas consequências são visíveis até hoje por serem de fundamental importância para a concentração agrária brasileira e para a consequente marginalização da população negra e indígena no que tange a posse de terras, foi a Lei de Terras. Ela pôs fim ao UTI Possidets, que estabelecia o dono da terra como aquele que a ocupava, e promoveu a compra como único meio de aquisição de terras devolutas. Por conseguinte, escravos alforriados, que nunca haviam recebido pagamento pelos seus serviços e, portanto, não possuíam meios de adquirir propriedades, foram totalmente excluídos. Com isso, a chegada à efetiva abolição em 1888, por meio da Lei Áurea, foi uma garantia constitucional de liberdade aos escravos, entretanto, esteve muito longe de inserir esse novo contingente populacional na estrutura social brasileira.

2.2.  O LEGADO ESCRAVOCRATA PARA A POPULAÇÃO INDÍGENA: GENOCÍDIO E MARGINALIZAÇÃO

A princípio, destaca-se que o grupo indígena que mais influenciou na formação do povo brasileiro é o tupi-guarani, sobretudo devido às suas ramificações tribais e à sua vasta distribuição costeira. Entre os tapuias, destaca-se o grupo “jês”, designado como o mais genuíno grupo indígena brasileiro por estar situado exclusivamente em território nacional, diferentemente do povo tupi, o qual também era encontrado dentro das fronteiras da Argentina, Paraguai, Uruguai, Peru e Bolívia. Nas palavras de Boris Fausto:

        Quando os europeus chegaram à terra que viria a ser o Brasil, encontraram uma população ameríndia bastante homogênea em termos culturais e linguísticos (...) Podemos distinguir dois grandes blocos que subdividem essa população: os tupis-guaranis e os tapuias. (FAUSTO, 1994, p. 29)

De modo geral, pode-se afirmar que, a partir do primeiro contato entre o europeu e o indígena, o processo de aculturação e o de etnocentrismo iniciaram-se paralelamente. Com isso, fez-se transparecer de imediato os interesses comerciais dos portugueses com a terra, ainda que às custas da hecatombe de toda a população nativa. Nas palavras de Boris Fausto, a chegada dos portugueses representou para os índios uma verdadeira catástrofe (FAUSTO, 1994, p. 32).

É necessário destacar que a invasão europeia não foi assistida de forma passiva pelos ameríndios. Como enunciado por Boris Fausto, tudo isso [meios intensivos de exploração e subjugação] não quer dizer que os índios não tenham resistido fortemente aos colonizadores, sobretudo quando se tratou de escravizá-los (FAUSTO, 1994, p. 40). Após a mudança de relações, os indígenas passaram a se organizar como podiam no intuito de defender sua tribo, seja aliando-se aos franceses, que desejavam expulsar os portugueses do Brasil, seja pela vantagem de conhecerem bem o território ou, em último caso, fugindo para o interior do território brasileiro, o que é descrito por Boris Fausto na obra “História do Brasil” como:

Uma forma excepcional de resistência dos índios consistiu no isolamento, alcançado através de contínuos deslocamentos para regiões cada vez mais pobres. Em limites muito estreitos, esse recurso permitiu a preservação de uma herança biológica, social e cultural. Mas, no conjunto, a palavra “catástrofe” é mesmo a mais adequada para designar o destino da população ameríndia. (FAUSTO, 1994, p. 41)

As Leis do Diretório Pombalino, vigentes a partir de 1750, procuraram “amenizar” esse processo de genocídio a partir da defesa de que, aos índios, a melhor opção era a integração à “sociedade civilizada” brasileira. A busca, nesse sentido, era a de sumir com os costumes de origem do povo nativo, o que, em outras palavras, visava transformar o genocídio em um etnocídio, tão ruim quanto o primeiro.

Com isso, foi decretada a liberdade dos índios, tornou-se obrigatório o uso da língua portuguesa, favoreceu-se o casamento interétnico e a mestiçagem e, por fim, transformou-se os antigos aldeamentos indígenas em vilas administradas por um diretor. Para os índios, isso deveria ser a garantia a posse das terras desses aldeamentos, entretanto, em termos efetivos, ela não foi realizada integralmente com todas as vilas, uma vez que muitas vezes esses diretores facilitavam a concessão dessas propriedades a fazendeiros ou exploravam e depois expulsavam os nativos.

A partir da independência do Brasil, conquistada em 1822, a questão indígena ganhou destaque, uma vez que buscava-se formar um Estado nacional centralizado e forte e, para isso, havia a necessidade de constituir-se uma identidade de povo brasileiro. Em 1850, com a Lei de Terras, criada para marginalizar os imigrantes e os negros recém-libertos, houve o aspecto positivo da garantia legal da posse de terras pelos indígenas. No entanto, novamente os setores dominantes usaram de artifícios arbitrários para tomá-las, alegando que não existiam mais índios e, sim, um povo brasileiro miscigenado, logo essas terras poderiam ser ocupadas também por fazendeiros.

Na segunda metade do século XIX, a ascensão do ciclo da borracha impactou também de forma negativa os nativos, uma vez que a Amazônia, devido a sua difícil penetração, matinha as tribos remanescentes isoladas e possibilitava a sua sobrevivência sem os impactos do homem branco. Novamente, ocorreram assassinatos, violência, doenças e exploração dos nativos. Contudo, com a crise da borracha a partir de 1911, diminuiu-se a pressão sob os grupos indígenas remanescentes.

Por fim, no século XX, os milhões de indígenas do século XVI foram reduzidos a milhares, que estavam extremamente interiorizados e marginalizados, tanto espacialmente como legalmente, para sobreviverem. Outros indígenas estavam integrados à sociedade, entretanto da pior forma possível: morando em periferias, sendo alvos de preconceito e exercendo ofícios mais desvalorizados socialmente.

A partir da proclamação da república, ocorrida em 1889, retomou-se a preocupação de integrar o indígena à sociedade civil. Para isso, em 1910, criou-se a SPI sob direção do marechal Cândido Mariano da Silva Rondon. O lema de sua diretoria era o de “morrer se preciso for, matar nunca”, o que representou uma inovação no tratamento com os nativos. Entre suas medidas, destacam-se a proteção e a assistência médica e alimentar. Contudo, sua prioridade ainda era a de integrar os índios a sociedade, garantido condições para que eles se tornassem futuros trabalhadores, o que se justifica pelas suas medidas de alfabetização e formação de telegrafistas e artífices entre as tribos.

Após a passagem da Comissão Rondon, alguns povos indígenas passaram a se aproximar dos seringueiros, pensando que também seriam tratados pacificamente como fora feito a priori. No entanto, o resultado foi diferente, difundindo ainda mais a exploração e o genocídio. A frente agrícola também contribuiu para esse processo, com a atuação dos “bugreiros”, indivíduos que queimavam aldeias e assassinavam tribos indígenas inteiras. Por fim, os índios que sobreviveram a esses massacres ficaram sob proteção do SPI, no entanto, a eles, eram destinadas terras com solos ruins, pouca caça, coleta e pesca, motivando, muitas vezes, o seu suicídio e o seu alcoolismo, pois já era impossível que eles mantivessem o seu modo de vida tradicional.

2.3. O LEGADO ESCRAVOCRATA PARA A POPULAÇÃO AFRO-BRASILEIRA: VIOLÊNCIA E FAVELIZAÇÃO

O Brasil foi o último país da América Latina a abolir a escravidão. Isso significa que, em cerca de 400 anos de escravidão, o país possui mais tempo da sua história sob o horror escravocrata do que à luz do abolicionismo. Segundo cálculos do americano Edgar Conrad, foram introduzidos no país mais de 5 milhões de escravos. Por esse motivo, muitas das visões preconceituosas existentes no período escravocrata brasileiro ainda permanecem arraigadas no ideário coletivo e somente por meio de um estudo histórico embasado elas serão descontruídas.

Em 1870, fazia vinte anos desde a abolição do tráfico negreiro, contudo a escravidão ainda resistia frente a todas as transformações no cenário brasileiro. Isso se deve ao fato de que passou a vigorar no país o comércio interno de escravos, sobretudo de latifúndios decadentes que vendiam os cativos para outros em ascensão. A adoção do gradualismo por parte do governo brasileiro no que tange ao processo de abolição, já considerado inevitável à época, possibilitou com que fossem pensadas e postas em práticas medidas que marginalizassem o negro alforriado.

Uma prova disso é que, no mesmo ano em que a Lei Eusébio de Queirós foi assinada, houve também a criação da Lei de Terras, responsável pela implementação da compra como único meio de obtenção de terras devolutas. Isso excluiu os ex-escravos, uma vez que esses foram libertos sem qualquer processo de inserção social ou garantia de seus direitos civis e não possuíam meios de pagar por essas propriedades.

Nesse sentido, destaca-se que a Lei de 13 de maio de 1888 representou, na prática, a consolidação de uma garantia constitucional, entretanto, não teve qualquer preocupação por parte do Estado de consolidar sua aplicação substancialmente. Ademais, destaca-se as condições arbitrárias em que estes homens foram alforriados. Nas palavras de Boris Fausto:

        Dados recentes revelam que a expectativa de vida de um escravo do sexo masculino, ao nascer, em 1872, era de 18,3 anos, enquanto a da população como um todo era de 27,4 anos. (FAUSTO, 1997, p.54)

Por conseguinte, o destino dos escravos recém-libertos foi a busca por moradias em locais afastados dos centros urbanos, os quais muitas vezes exibiam condições precárias de subsistência. Nas palavras de Gilberto Maringoni:

        A campanha abolicionista, em fins do século XIX, mobilizou vastos setores da sociedade brasileira. No entanto, passado o 13 de maio de 1888, os negros foram abandonados à própria sorte, sem a realização de reformas que os integrassem socialmente. Por trás disso, havia um projeto de modernização conservadora que não tocou no regime do latifúndio e exacerbou o racismo como forma de discriminação. (MARINGONI, 2011)

O avanço do capitalismo no século XIX, que exigia a demanda de produtos por parte de uma massa assalariada, tornava o negro cativo uma peça obsoleta. Caio Prado Jr, na obra “História Econômica do Brasil” diz:

        O escravo corresponde a um capital fixo cujo ciclo tem a duração da vida de um indivíduo; assim sendo, (...) forma um adiantamento a longo prazo do sobre trabalho eventual a ser produzido. O assalariado, pelo contrário, fornece este sobretrabalho sem adiantamento ou risco algum. Nestas condições, o capitalismo é incompatível com a escravidão. (JÚNIOR, 1945)

Isso, portanto, representa as vicissitudes da escravidão para a população negra: uma continuidade da marginalização de direitos, fruto da falta de esforço ou demanda da sociedade do século XIX pela correta inserção dos ex-escravos, o que, hoje, culmina na desigualdade racial e no preconceito que ainda vigoram no cotidiano brasileiro. Nas palavras de Florestan Fernandes, em sua obra “A integração do negro na sociedade de classes”:

A preocupação pelo destino do escravo se mantivera em foco enquanto se ligou a ele o futuro da lavoura. Ela aparece nos vários projetos que visaram regular, legalmente, a transição do trabalho escravo para o trabalho livre, desde 1823 até a assinatura da Lei Áurea. (...) Com a Abolição pura e simples, porém, a atenção dos senhores se volta especialmente para seus próprios interesses. (...) A posição do negro no sistema de trabalho e sua integração à ordem social deixam de ser matéria política. Era fatal que isso sucedesse. (FERNANDES, 1964)

  1. CONCLUSÃO

No início desse trabalho, a pesquisa tinha o intuito de resgatar, por meio de uma análise histórica embasada por obras clássicas e reconhecidas internacionalmente, o legado do longo período de escravidão vigente no Brasil para as populações indígenas e quilombolas na contemporaneidade. Isso demandou, pois, uma análise do passado, no que tange a formação dessas comunidades e as experiências vividas por elas durante o processo escravocrata, e uma análise de seu presente, as quais, juntas, permitiram a fusão de horizontes enunciada pelo filósofo Hans-Georg Gadaimer, enunciador de que por meio da história pode-se inferir ativamente sobre os processos vigentes, o que é fundamental para mantê-los vivos na memória.

A diversidade de referências consultadas também auxiliou nesse processo de elucubração histórica, sendo a obra “História do Brasil”, do historiador Boris Fausto, a de embasamento fundamental para a realização dessa monografia, sobretudo devido à complexidade de fatores atrelados às vicissitudes do período escravocrata brasileiro.

A princípio, buscou-se apresentar de forma didática e sequencial a construção do modelamento escravocrata português, que sucumbiu ambas as populações em estudo. Destaca-se nele a tentativa de simplificar, apresentando um panorama geral tanto do contexto histórico global quanto brasileiro, um processo de raízes seculares.

Posteriormente, buscou-se aprofundar, com documentos iconográficos e bibliográficos, desde a formação étnica dos nativos indígenas encontrados pelos europeus em 1500 até a sua atual situação no Brasil. Para eles, o legado foi o da marginalização de direitos e de terras e, sobretudo, o genocídio de inúmeras tribos, um processo que precisa ser mantido vivo na memória nacional para que, hoje, a sociedade se organize no intuito de estimular a preservação das terras remanescentes e do respeito ao isolamento de comunidades que lutaram durante séculos para sobreviverem.

Além disso, buscou-se demonstrar a origem dos povos africanos trazidos como cativos ao Brasil, bem como a sua vida antes e depois de serem escravizados pelos europeus. Para eles, o legado foi o da violência e o da favelização contemporânea, destacando-se a construção dos quilombos, símbolo do passado de resistência desses povos, como um patrimônio histórico fulcral para o entendimento do processo escravocrata em vigor durante o Brasil Colônia e Imperial.

Por fim, destaca-se que a pesquisa foi realizada com muita leitura, empenho e dedicação, com a intenção de deixar o registro histórico de um passado de horror que precisa a todo custo ser lembrado para que não seja repetido. A enorme existência de estudos e fontes, que não foram exploradas nesta pesquisa, permite e estimula a continuidade do trabalho de resgate histórico do legado escravocrata para indígenas e afro-brasileiros.

  1. REFERÊNCIAS

DONATO, Hernani. Os índios do Brasil. São Paulo: Melhoramentos: 1995.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. 12ª ed. São Paulo: EDUSP, 1994.

FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Editora Globo, 1965.

Índios do Brasil. Secretaria de Educação a Distância, Secretaria de Educação Fundamental – reimpressão. Brasília MEC, SEED SE, 2001.

JÚNIOR, Caio Prado. Evolução Política do Brasil e Outros Estudos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1945.

MARINGONI, Gilberto. O destino dos Negros após a abolição. São Paulo: IPEA, 2011.

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