APROPRIAÇÃO CULTURAL: O USO DE OBJETOS E SÍMBOLOS COMO ELEMENTOS DA MODA
Por: Ana Caroline Dantas • 21/2/2018 • Artigo • 2.233 Palavras (9 Páginas) • 289 Visualizações
APROPIAÇÃO CULTURAL: O USO DE OBJETOS E SÍMBOLOS COMO ELEMENTOS DA MODA
Ana Caroline Dantas da Silva1
José Humberto R. Dos Anjos2
INTRODUÇÃO
Compreender os diferentes conceitos relacionados as palavras: apropriação e cultura é de extrema importância para uma reflexão sobre o tema. No dicionário o significado de apropriação se refere a: acomodar, atribuir, apossar-se, tornar seu uma coisa alheia. A palavra cultura é arraigada de conceitos e definições que nos âmbitos antropológicos e sociológicos são discutidos de acordo com a inserção do individuo na comunidade. Conforme Botelho:
Vale nesta linha de continuidade a incorporação da dimensão antropológica da cultura, aquela que, levada às últimas consequências, tem em vista a formação global do indivíduo, a valorização dos seus modos de viver, pensar e fruir, de suas manifestações simbólicas e materiais, e que busca, ao mesmo tempo, ampliar seu repertório de informação cultural, enriquecendo e alargando sua capacidade de agir sobre o mundo. O essencial é a qualidade de vida e a cidadania, tendo a população como foco (BOTELHO, 2007, p.110).
Os conceitos de cultura são vastos e remete não somente ao ambiente ao qual se insere o indivíduo, mas as suas relações interpessoais, meios de convivência, educação e moral. A cultura brasileira é vinculada a sua historia desde a colonização, essa marcada por um período de retaliação dos colonizadores sobre os povos nativos que para fugir das constantes agressões utilizou-se de diferentes elementos criativos. Esses são observados na fome suprimida com a adição de tempero e ervas aos restos de alimentos, e assim, nasceu-se a feijoada, o samba com seu ritmo contagiante surgiu na Bahia com palmas e hinos cantados em rodas para alegrar e relembrar as origens africanas, e por fim, a capoeira que como forma de defesa usava a batida das músicas para disfarçar as práticas de luta.
A conscientização da necessidade de se valorizar esses elementos, como forma de expressão e de identidade nacional, pela população brasileira é observada na música Aquarela do Brasil,
Brasil, meu Brasil brasileiro
Meu mulato inzoneiro
Vou cantar-te nos meus versos
O Brasil, samba que dá
Bamboleio que faz gingar
O Brasil do meu amor
Terra de Nosso Senhor
Brasil pra mim
Pra mim, pra mim
Ah! Abre a cortina do passado
Tira a mãe preta do cerrado
Bota o rei congo no congado
Brasil, pra mim
Deixa cantar de novo o trovador
A merencória luz da lua
Toda canção do meu amor
Quero ver essa dona caminhando
Pelos salões arrastando
O seu vestido rendado
Brasil pra mim
Pra mim, pra mim! [...] (BARROSO, 1939, grifo nosso).
A música possui elementos próprios da cultura brasileira, como o mulato fruto da relação entre o negro e o branco, além de, usar os diletos regionais para exaltar as belezas no país. Esta canção foi escrita em uma época de intensa busca por patriotismo, já que em 1939 se estabeleceu a ditatura de Getúlio Vargas. Nos versos, o negro é visto como um elemento de identidade a ser valorizado. Para Munanga (1994, p. 177-178), “Qualquer grupo humano, através do seu sistema axiológico sempre selecionou alguns aspectos pertinentes de sua cultura para definir-se em contraposição ao alheio”. Com base nessas definições observa-se que a valorização da cultura brasileira é realizada de forma gradativa, o sentimento de nacionalismo é suprimido pelas consequências advindas do processo de colonização sendo reflexo até os dias atuais uma exclusão social do negro e do índio. Para romper essa barreira o uso de elementos próprios característicos fez-se necessário como garantia de pertencimento, de firmar uma identidade étnico-cultural no país que na atualidade está sendo utilizados de diferentes formas.
DESENVOLVIMENTO
Nos últimos dois anos observa-se debates sobre o uso de elementos de diferentes culturas como forma de expressão de um estilo, elemento da moda e, ou do capital. No Brasil, o mês de fevereiro é caracterizado pela realização do Carnaval, uma festa do cristianismo que antecede a quaresma, essa é considerada uma das maiores festividades populares no mundo. Sendo assim, é um momento de intensa busca por novos elementos icnográficos que irão surpreender os espectadores e foliões nas diversas cidades brasileiras. Sendo assim, um paralelo entre os últimos eventos que marcaram argumentações sobre a apropriação cultural faz-se necessário.
No final do ano de 2016, o estilista Marc Jacobs foi acusado de apropriação cultural por realizar um desfile com modelos brancas usando dreadlock, esses são elementos da cultura rastafári que se popularizou após o fim da escravidão norte-americana. Os cabelos cilíndricos reverenciam ensinamentos bíblicos do livro de Levítico 21:5 “não farão calva na sua cabeça, e não rasparam os cantos da barba, nem na sua carne”. É uma comunidade com intensas relações religiosas, sociais e culturais. O uso nas passarelas foi através de uma confecção de dreads em lã coloridos, e o número de modelos negras era ínfimo em relação as brancas, o que demonstrou uma falta de conhecimento sobre o significado do mesmo.
No ano de 2017, o Carnaval trouxe como elementos o uso de turbantes, tranças e dreadlock, do qual, uma parcela da população brasileira foi de encontro e levantou a voz sobre o assunto. Sendo o turbante um elemento de forte caracterização da mulher negra, o sentimento de pertencimento o acompanha, este sentimento remete o conceito de negritude: “a negritude é o simples reconhecimento do fato de ser negro, a aceitação de seu destino, de sua história, de sua cultura” (MUNANGA, Apud. 1988, p. 44). E isso se observa nas mulatas e negras que compõe as religiões afro-brasileiras, e na pequena parcela da população que possui o orgulho latente em suas atitudes e raízes. Contudo, o ato de um famoso, não negro, usa-lo como ornamentação sem sua essência real e carga histórica descaracteriza o poder simbólico do mesmo. Conhecer a historia do continente africano é de fundamental importância para compreender enfaticamente o uso de símbolos, Figueiredo faz a seguinte reflexão:
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