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Análise dos Poemas "Nós" e "Humilhações", de Cesário Verde

Por:   •  18/6/2018  •  Trabalho acadêmico  •  1.812 Palavras (8 Páginas)  •  1.802 Visualizações

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UNIVERSIDADE FFEDEREAL DE OURO PERTO – ICHS

LET 814 – Literatura Portuguesa

Avaliação II

Vitor Aparecido Apolinario

15.2.3212

Atividade: Fazer uma análise dos poemas Humilhações e Nós, de Cesário Verde, sempre evidenciando as influências de Charles Baudelaire em seus poemas.

Cesário Verde foi um poeta português cujas características principais de suas poesias são: tratar da mulher, Campo x Cidade, Questão Social, etc. Ao ler suas obras, logo percebe-se que o poeta leu os poemas de Charles Baudelaire, já que é notório a presença de influências e oposições (que não deixam de ser caracterizadas como influência).

Um de seus poemas, Humilhações, possui várias características marcantes e interessantes. É um poema no qual é tratada a visão do eu lírico quanto à mulher amada que é indiferente aos seus sentimentos. Essa obra é trata-se também de temas como a agressão, evidenciada na guarda espancando povo, no próprio povo que é o ponto de interrogação do poema e do cotidiano da cidade.

No primeiro verso nota-se uma marca do Cesário Verde, uma espécie de variação do “Femme Fatale” (a amada como figura distante, indiferente, fria e letárgica), tão presenciado em poemas baudelairianos. Esta aborrece quem é pobre.

Esta aborrece quem é pobre. Eu, quase Jó,

Aceito os seus desdéns, seu ódios idolatro-os;

E espero-a nos salões dos principais teatros,

Todas as noites, ignorado e só.

Diferentemente de várias obras de Charles Baudelaire, a mulher não é uma figura idealizada por todos. Nessa estrofe observamos que, pacientemente, o eu lírico aceita a indiferença da amada, ou seja, a princípio e aparentemente, a idealiza. Ao longo do poema nota-se que tal idealização por parte do eu lírico não é total. Tal afirmação é evidenciada no fato de o poema não ser focado apenas na mulher. As mudanças de foco ocorrem em cada cena, fazendo alusão à rotina da cidade (modernidade), na qual ocorrem vários acontecimentos ao mesmo tempo ou um decorrente de outro.

Uma semelhança do poema Humilhações com vários poemas de Baudelaire é a mulher sendo figurada como “blasé” (indiferença) e o jogo entre paixão e frieza. Porém mesmo isto sendo marcas de semelhança entre os dois, é também aquilo que os diferenciam. Enquanto em Humilhações, a mulher, que se mostra indiferente, não é o único foco do poema, em A uma Passante, de Baudelaire, por exemplo, a mulher é o foco do início ao fim.

A rua ia gritando e eu ensurdecia.

Alta, magra, de luto, dor tão majestosa, 

Passou uma mulher que, com mãos sumptuosas,

Erguia e agitava a orla do vestido;

Nobre e ágil, com pernas iguais a uma estátua. 

Crispado com um excêntrico, eu bebia, então, 

Nos seus olhos, céu plúmbeo onde nasce o tufão, 

A doçura que encanta e o prazer que mata.

 

Um raio… e depois noite! – Efêmera beldade 

Cujo olhar me fez renascer tão de súbito, 

Só te verei de novo na eternidade? 

Noutro lugar, bem longe! é tarde! Talvez nunca! 

Porque não sabes onde vou, nem eu onde ias, 

Tu que eu teria amado, tu que bem sabias! (Charles Baudelaire)

 Nessa obra de Baudelaire, o jogo entre paixão e frieza ocorre entre o eu lírico (paixão) e a amada (frieza), enquanto na obra de Cesário Verde este embate ocorre também dentro do próprio eu lírico. Na segunda estrofe, o eu lírico, por exemplo, prefere analisar as peças no cartaz a continuar idolatrando a amada.

Lá cansa-me o ranger da seda, a orquestra, o gás;

As damas, ao chegar, gemem nos espartilhos,

E enquanto vão passando as cortesãs e os brilhos,

Eu analiso as peças no cartaz. (Cesário Verde)  

Nota-se que há também vários contrastes entre o que é escrito no poema e como o poema é estruturado, o que é escrito e o que não é escrito. A própria estrutura do poema auxilia no seu entendimento. Há contrariedades entre a explicitude e a implicitude, o dito e o não dito (ou o que é dito e o que o eu lírico queria dizer). Tais contrastes são evidenciados no fato de a amada ser, até certo ponto, idealizada, porém não ser o único foco do poema. Também no fato de a guarda estar espancando o povo aparentando uma alusão à superioridade sobre o povo, porém o povo que é o enigma do poema, o desconhecido. Esse povo é metaforizado pela figura da velhinha suja que pede um cigarro. Mas se o povo é o enigma do poema, por que uma velhinha suja seria a representação desse enigma. O poema termina com a velhinha fazendo o pedido, é dela a voz final. O fato de ela pedir um cigarro a coloca em “pé de igualdade” com os demais. Ela poderia ter pedido dinheiro alegando que iria comprar outra coisa, porém alegou diretamente que queria um cigarro. Isso dá a velhinha um caráter de imprevisibilidade, e, como a velhinha representa o povo, torna esse povo o enigma do poema. O povo é imprevisível.

Outra diferença entre Baudelaire e Cesário Verde, encontra-se no fato de que, como em vários poemas do primeiro o foco é sempre a mulher amada, existe um efeito de hipnose na leitura. Nas poesias do primeiro, inclusive em Humilhações, tal efeito não acontece. Ocorre, até mesmo, um fenômeno denominado parataxe, notada pela constante ausência de conjunções, o que evidencia a não existência de uma ordem hierárquica nas orações. Tal evidência salienta que no poema de Cesário Verde, assim como não há hierarquia de orações, também não há uma hierarquia de focos. A ocorrência desse fenômeno (parataxe) impossibilita a manifestação de um efeito hipnótico.

Outros pontos de suma importância estão nos tempos verbais e na estrutura das rimas. Ocorre uma mudança no que tange aos tempos dos verbos. Essas mudanças podem ser comparadas com o efeito de estar com uma câmera na mão. Quando o tempo está no presente, é como se a câmera tivesse parada, já quando o tempo está no passado e/ou futuro é como se a câmera estivesse indo para trás e/ ou para frente, respectivamente. Tal metaforização faz com que nos atentemos à figura da cidade, onde muitos acontecimentos ocorrem simultaneamente, onde é difícil manter o foco em apenas uma ocorrência. Quanto às rimas, em vários poemas de Baudelaire e Cesário Verde ocorre sua presença. Outra semelhança decorrente é que ambos os poetas usavam de versos alexandrinos (12 sílabas) em várias de suas poesias (inclusive em Humilhações) Porém em várias obras do segundo, as rimas ocorrem de modo diferente, com um grau maior de complexidade, como na segunda estrofe de Humilhações, onde a rima ocorre nas palavras idolatro-os e teatro, rimando um verbo procedido de pronome oblíquo com um substantivo, respectivamente. Tal característica põe em evidência o quanto Cesário Verde era imprevisível, porém apesar de sua tamanha imprevisibilidade e da regularidade vista nos poemas de Baudelaire, nota-se que Cesário Verde tinha como intenção metaforizar um eu lírico que tentara fugir de uma doutrina (Baudelaire como um clichê), porém essa fuga não é totalmente efetuada, já que ainda há a utilização de rimas e versos alexandrinos.

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