O QUE AS CRIANÇAS DE UMA ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL DIZEM SOBRE AS RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO POR MEIO DE BRINCADEIRAS COM O JOGO DE MONTAR?
Por: Nakson • 14/3/2020 • Pesquisas Acadêmicas • 1.346 Palavras (6 Páginas) • 228 Visualizações
“EU INVENTO TUDO COM O MONTA MONTA”: O QUE AS CRIANÇAS DE UMA ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL DIZEM SOBRE AS RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO POR MEIO DE BRINCADEIRAS COM O JOGO DE MONTAR?
Nakson Willian Silva Oliveira[1]
Silvia Regina Marques Jardim[2]
Introdução
Este trabalho é parte de uma pesquisa mais ampla que está vinculada a uma dissertação de mestrado em andamento, intitulada “PENSANDO AS RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO POR MEIO DE CRIANÇAS: um estudo em uma escola de educação infantil em Vitória da Conquista –BA”, do Programa de Pós-Graduação em Ensino, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Neste estudo, tivemos como objetivo geral identificar os mecanismos acionados na constituição de gêneros em uma instituição de educação infantil em Vitória da Conquista-BA e, ao mesmo tempo, analisar como as crianças compreendem e lidam com essas experiências de gênero. Como objetivos específicos, buscamos identificar e analisar, a partir da ótica da categoria gênero, os mecanismos acionados para a constituição de comportamentos esperados para meninas e meninos. Procuramos analisar as concepções das crianças sobre as diferenças entre sexo/gênero e dos lugares e papéis atribuídos a meninos e meninas.
Para o desenvolvimento da pesquisa, buscamos uma escola de educação infantil por entendê-la como uma das principais instâncias no que diz respeito aos processos de formação dos indivíduos, e por configurar-se como um agente que pode reforçar estereótipos ou contribuir para o questionamento de comportamentos normatizados que atribuem papéis sociais a partir da diferença sexual. Assim, optamos em fazer observações participantes durante um semestre letivo nesse espaço, a fim de perceber como as crianças se posicionam no cotidiano da escola no que diz respeito às manifestações das diferenças, em especial, às diferenças de gênero.
Para a presente comunicação, compartilhamos uma das categorias que fazem parte da dissertação que foi produzida a partir de observações realizadas sobre as brincadeiras das crianças por meio do jogo de montar ou “monta monta”, assim como as crianças se referem ao brinquedo.
Metodologia
Foi realizado um trabalho de campo com duração de um semestre letivo completo em uma escola de educação infantil do município de Vitória da Conquista-BA. As interlocutoras da pesquisa são crianças de uma turma de “Educação Infantil V”, com idades entre 5 e 6 anos.
Para tanto, a pesquisa fundamentou-se numa abordagem de natureza qualitativa, tendo como base as contribuições de Minayo (2009), Ludke e André (2013), Bogdan e Biklen (1994), visto que a nossa proposta de pesquisa se aproximou de um nível de realidade que não poderia/deveria ser quantificado. Ou seja, nas palavras de Minayo (2009), tal proposta lida com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Buscamos, ainda, com esta natureza de pesquisa, seguir as recomendações dadas por Bogdan e Biklen (1994) que informam que: na investigação qualitativa, a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o (a) investigador (a) o instrumento principal; a investigação qualitativa é descritiva; os (as) investigadores (as) interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produtos; os (as) investigadores (as) tendem a analisar os seus dados de forma indutiva; o significado é de importância vital na abordagem qualitativa.
Além disso, no processo da pesquisa, para a coleta e produção dos dados, utilizamos as seguintes técnicas: observação participante e registros em diário de campo.
Cabe destacar que foi necessário tomarmos como base algumas leituras que focalizam as especificidades metodológicas para realização de pesquisas com crianças, pois, de acordo com Corsaro (2011), o processo de pesquisa com crianças reflete uma preocupação direta em capturar as vozes infantis, suas perspectivas, seus interesses e direitos como cidadãos. Em outras palavras, as/os pesquisadoras/es têm seguido um movimento que, em vez de apenas realizar pesquisas sobre crianças, tem feito pesquisas com crianças. Para Delalande (2011), de uma escolha a outra, as investigações levam o pesquisador a questionar as maneiras de recolher o ponto de vista das crianças, reduzindo o tanto quanto possível os efeitos da sua ligação hierárquica com os adultos. Atualmente, quando se trata de especificidades metodológicas em pesquisas com crianças, dar voz a elas e escutá-las tem sido a principal orientação. Foi, portanto, através dessas orientações que buscamos observar e estudar as crianças em seus processos de formação, de modo a melhor compreender seus posicionamentos face às questões que envolvem as relações sociais de gênero.
Informamos ainda que as bases teóricas de toda discussão apresentada ao longo do trabalho estão alicerçadas nos estudos históricos e sociológicos sobre criança e infância e nos estudos feministas e de gênero.
Resultados e discussões
Através das brincadeiras com o “monta monta”, múltiplos estereótipos de gênero emergiram através das brincadeiras e brinquedos criados com essas peças. Foram mostrados pelas crianças, de forma muito delimitada, os lugares e papéis que homens, mulheres, meninos e meninas ocupam, devem ocupar e desempenhar.
Em relação às cenas familiares, cargos/funções e aptidões, as crianças, mesmo fazendo parte ativamente do contexto social e assistindo às distintas transformações e avanços em relação às posições que atualmente mulheres vem conquistando, acabaram por colocá-las, na grande maioria das vezes, em posições inferiores quando comparadas com os homens.
Sobre os modos como atribuíram significados ao feminino quando brincaram com o “monta monta”, suas reproduções interpretativas evidenciaram como as “dóceis, submissas, dedicadas e incapazes” mulheres e meninas (representadas através das peças de monta monta) foram mostradas na grande maioria das situações, por exemplo, como aquelas que: não possuíam habilidades para dirigirem carros, tratores, aviões. Quando desenvolviam algum trabalho, apareciam sempre limpando ou arrumando a casa e também cuidando dos filhos; quando trabalhavam fora de casa, seus cargos/funções estiveram sempre ligados ao cuidar. Em oposição às mulheres, os homens e os meninos, foram representados como: bons motoristas e pilotos; provedores e chefes de família; aqueles que trabalhavam fora de casa.
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