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Cinco Modelos Psicopatologicos Segundo Lacan

Por:   •  13/3/2017  •  Artigo  •  3.430 Palavras (14 Páginas)  •  617 Visualizações

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Para compreender estruturas clínicas: Cinco modelos psicopatológicos Lacanianos

Ilka Franco Ferrari[1]

De acordo com Álvarez, Esteban e Sauvagnat, há seis modelos de psicopatologia, pós-freudianos: a Psicologia do ego, a teoria das relações objetais, a corrente da introjeção e contratransferência, os modelos psicodinâmicos, os modelos cientificistas e o modelo lacaniano.

Este texto está dedicado ao sexto movimento, que se refere a Lacan, de modo a favorecer a compreensão das estruturas clínicas neurose, psicose e perversão, e seus tipos clínicos.

Na verdade o modelo lacanaino não se encaixa bem no campo dos pós-freudianos, já que Lacan deu sua contribuição indo além do ensino de Freud. Sua posição não está isenta de dificuldades e sofreu muitas interpretações e usos inadequados. Os autores mencionados dividem o período lacaniano em cinco modelos, diferenciados entre si, mas, diacronicamente articulados. Lacan conhecia os modelos anteriores e sua obra mostra os ecos da maioria das correntes pós-freudianas.

A psicogênese

Psicogênese ou causalidade psíquica aparece em dois momentos e duas concepções teóricas diferentes: em sua tese de doutorado em medicina, intitulada Da psicose paranóica e suas relações com a personalidade (1932) e em Proposição sobre a causalidade psíquica (1947).

Em Da psicose paranóica... , tese em que Lacan apresenta o caso Aimée (Marguerite Pantaine) e desenvolve a noção de paranóia de autopunição, o psicogênico é um sintoma, físico ou mental, cujas causas se expressam em função dos mecanismos complexos da personalidade, cuja manifestação os reflete e cujo tratamento pode depender deles. Esse é o caso de um acontecimento causal determinado somente pela história vivida pelo sujeito, pela concepção que ele tem de si mesmo e de sua situação vital na sociedade. É também quando o sintoma reflete em sua forma um acontecimento ou um estado da história psíquica, quando expressa os conteúdos possíveis da imaginação, do querer, do desejo do sujeito e quando tem valor demonstrativo que aponta outra pessoa. É, ainda, quando o tratamento pode depender de uma modificação da situação vital correspondente, seja nos fatos mesmos, na relação afetiva do sujeito diante deles e na representação objetiva que tem deles.

Nessa época a paranóia era pouco estudada, a ênfase estava na esquizofrenia e isto já mostra a posição lacaniana de não recuar diante dos desafios. Lacan afirma que a causalidade psíquica que opera na paranóia mostra um “processo”, por um lado, já que ocorre uma ruptura com o anteriormente vivido e, por outro, “reações” frente aos acontecimentos, tal como propunha Karl Jaspers. Sua contribuição não se limitou à etiologia e patogenia, mas, colocou em destaque a dimensão terapêutica do tratamento psíquico para estes casos.

Ele tomou posição contrária à teoria kraepeliana e concepções francesas de degenerescência, segundo as quais a paranóia evidencia um “desenvolvimento” enfermo e contínuo. A psicose era explicada a partir de concepções do Supereu sádico pré-genital, elaborada pela escola psicanalítica francesa (Laforgue, Hesnard e Odier). Mas, estava também de acordo com H.Ey, de que o automatsmo desenvolvido na psicose deve ser entendido como processo que inclui dados compreensíveis (diferentemente da idéia de processo jasperiano), mais complexos, sem dúvida, que aqueles resultantes de automatismo característico dos sintomas neurológicos.

Este modelo lacaniano foi até 1936 e centrado na psicose, objeto privilegiado da psiquiatria. O outro momento em que a psicogênese é focada é após a Segunda Grande Guerra, quando rompe com as influências jasperianas. Suas idéias estão bem apresentadas no Colóquio de Bonneval, em setembro de 1946. Nele criticou a teoria organicista e o organodinamismo de H. Ey, que era presidente do Congresso... Se na época anterior criticava o automatismo mental de Clérambault, agora o reconhece como seu mestre. A sua questão inquietante era: se a chave da psicose é uma lesão cerebral, que distingue a esse enfermo [neurológico] de um louco?

A loucura agora aparece como um fenômeno do pensamento. Já não fala em desenvolvimento ao modo jasperiano e nem em paranóia de autopunição. A alucinação como um erro, como se falava desde Esquirol e sustentava H. Ey, também é criticada, assim como a idéia de subjetividade que H. Ey defendia: ela residia nos mecanismos superiores de consciência e controle, que deviam inibir os mecanismos automáticos inferiores. Com estas condições é que o indivíduo podia se dizer em liberdade. A loucura, então, era o limite da liberdade. Para Lacan a consciência era nada mais nada menos que uma ilusão necessária e também fonte de desconhecimento, que o ideal de liberdade humana é insensato e que a aplicação sem limites da liberdade é característica, isto sim, da psicose. O desencadeamento da psicose agora é visto de dois modos: peça do destino que engana o sujeito em direção à liberdade que não conquistou (alusão à questão da liberdade, mas referencia a uma primeira descompensação, após a fase pré-psicótica) ou uma insondável decisão do ser.

O caso Aimée é revisitado em três tempos: a etapa de equilíbrio, fase pré-psicótica, a peça do destino que leva ao desencadeamento, a passagem ao ato em que Aimée ataca a atriz Huguette Duflot com uma faca. As modificações na apresentação dos transtornos estão determinados por atos psíquicos ou acontecimentos exteriores que provocam mudanças massivas de posição na paciente. O fenômeno da loucura não pode ser separado, conforme pensava Lacan, do problema da significação, ou seja, da importância da linguagem para o ser humano que está atravessado por sua verdade e sua mentira. A verdadeira causalidade da loucura está na insondável decisão do ser. Tal causalidade é fixada nas determinações da imago.

O estádio do espelho

Esse segundo modelo pode ser retirado do texto que Lacan apresentou, ainda em 1936, no XIV Congresso Psicanalítico de Marienbad, sobre o estádio do espelho. Ernest Jones era o coordenador da mesa e interrompeu Lacan aos 10min de apresentação. A primeira publicação que dispomos, se encontra no extenso artigo intitulado A família, publicado na Encyclopédie française, em 1938. O texto original se perdeu.

O texto apresenta um estudo das relações inter-humanas em termos “imaginários” gestaltistas e considera que toda relação inter-humana permanece relativizada pelo problema de sua constituição enquanto forma. As relações humanas se apresentam, de início, como relações de dependência, escravidão (inspiração na dialética do senhor e do escravo, de Hegel) e alienação, até o ponto que se pode dizer “ou um ou o outro”. No texto A família Lacan distingue três fases críticas particularmente importantes no desenvolvimento da criança: complexo de desmame, complexo de intrusão e complexo de Édipo. A resolução está calcada em modelos de identificação imaginários (imago).

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