Conselho Nacional de Educação
Tese: Conselho Nacional de Educação. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: • 6/10/2014 • Tese • 2.080 Palavras (9 Páginas) • 282 Visualizações
Para começar, reflita sobre as seguintes questões: negros e brancos são tratados
igualmente em nossa sociedade? Negros e brancos possuem as mesmas oportunidades
de acesso à educação, emprego, saúde e outros direitos sociais? Afinal, somos um povo
racista ou não? Por que precisamos de uma lei que afirme que “o racismo é crime
inafiançável”? E como podemos realizar uma educação das relações étnico-raciais?
E então? Percebeu como questões complexas estão envolvidas nas relações étnicoraciais?
Essa será nossa preocupação nesta disciplina, desvendar os porquês da
permanência do racismo, suas causas e consequências, bem como as múltiplas
implicações na promoção da igualdade racial na escola e na comunidade.
A partir da aprovação da Lei Federal 10.639/2003, que inclui no currículo oficial da rede
de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-brasileira, o interesse pela
questão das relações étnico-raciais e afrodescendência aumentouconsideravelmente.
Nesse sentido, poder público, sociedade civil, movimentos sociais, enfim, toda a
sociedade deve estar envolvida no projeto de uma educação pela igualdade étnico-racial
no Brasil. Leia o que afirma o Parecer do Conselho Nacional de Educação, CNE-CP
3/2004 com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-
Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana:
(...) um equívoco a superar é a crença de que a discussão sobre a questão racial se limita ao Movimento
Negro e a estudiosos do tema e não à escola. A escola, enquanto instituição social responsável por
assegurar o direito da educação a todo e qualquer cidadão, deverá se posicionar politicamente, como já
vimos, contra toda e qualquer forma de discriminação. A luta pela superação do racismo e da discriminação
racial é, pois, tarefa de todo e qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial,
crença religiosa ou posição política. O racismo, segundo o Artigo 5º da Constituição Brasileira, é crime
inafiançável e isso se aplica a todos os cidadãos e instituições, inclusive, à escola. (BRASIL, 2004, p. 7)
Nesse sentido, prossiga seus estudos e envolva-se pessoalmente nesse projeto.
1.1 Raça
A palavra raça será tomada a partir de uma perspectiva sócio-histórica, segundo
preconizam as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnicoraciais
e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, aprovadas em
junho de 2004 pelo Ministério da Educação:
É importante destacar que se entende por raça a construção social forjada nas tensas relações entre
brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver com o conceito biológico
de raça cunhado no século XVIII e hoje sobejamente superado. Cabe esclarecer que o termo raça é
utilizado com frequência nas relações sociais brasileiras, para informar como determinadas características
físicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o
destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira (Brasil, 2004).
Portanto, podemos assumir o uso do termo raça quando quisermos nos referir aos
aspectos físicos (à aparência exterior herdada e transmitida hereditariamente), que
mostram repercussões negativas nas relações entre brancos e negros, ou seja, quando
for necessário demonstrar as tensões existentes a partir das diferenças na cor de pele,
olhos, tipos de cabelo etc., a partir de um padrão estético branco e europeu, que
estabelece também relações de dominação.
1.2 Etnia
Trata-se de um conceito que compreende as relações sociais estabelecidas entre sujeitos
que, entre outras coisas, se reconhecem possuidores de uma origem comum, em
contraste com outros, integrantes de grupos diferentes, na sociedade abrangente.
Vejamos o verbete “etnia” apresentado no Dicionário de Relações Étnicas e Raciais (apud
Cashmore, 2000, p. 196):
Um grupo possuidor de algum grau de coerência e solidariedade, composto por pessoas conscientes, pelo
menos em forma latente, de terem origens e interesses comuns. Um grupo étnico não é mero agrupamento
de pessoas ou de um setor da população, mas uma agregação consciente de pessoas unidas ou
proximamente relacionadas por experiências compartilhadas.
Fica claro, portanto, que etnia implica, por um lado, posicionamento, pertencimento,
opção, escolha, autodenominação do sujeito tendo por referência determinado grupo
étnico. Nesse sentido, a atribuição de pertença de determinada pessoa a determinado
grupo étnico é, em primeiro lugar, endógena, ou seja, parte do próprio sujeito, devendo
ser necessariamente a decisão de pertencimento da própria pessoa que se afirma como
parte daquele grupo étnico. Entretanto, a definição da identidade étnica não é somente
endógena, mas diz respeito também aos significados atribuídos por outros grupos, ou
seja, é na mesma medida exógena.
Leitura obrigatória:
SANTOS, H. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. São
Paulo: Editora Senac, 2001 (Texto 1A:Preleção antes do embarque, p. 23-37).
MUNANGA, Kabengele (org.). Superando o Racismo na escola. 2. ed. rev. Brasília:
Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade, 2005. (Texto 1B: Algumas definições, conceituações básicas sobre o
racismo e seus derivados, p. 60-65). Disponível em:
<http://dominiopublico.qprocura.com.br/dp/86779/superando-o-racismo-na-escola.html>
LIMA, Marcus Eugênio Oliveira; VALA, Jorge. As novas formas de expressão do
preconceito e do racismo. Estudos de Psicologia(Natal), dez. 2004, v.9, n.3, p.401-411.
(Texto 1C) Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
294X2004000300002>
ZENAIDE, Maria de Nazaré, et al. Direitos Humanos: capacitação de
educadores. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2008. (Texto 1D: FLORES, Elio
Chaves. Nós e Eles: etnia, etnicidade, etnocentrismo, p. 21-40). Disponível em:
<http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/edh/redh/03/03_elio_etnicidade.pdf>
Leitura para aprofundamento:
BRASIL. Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003. Ministério da Educação e Cultura:
Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.
BRASIL. MEC – Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Conselho
Pleno. Parecer CNE/CP 3/2004 – Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
Brasília, MEC, 2004.
Filmes e músicas sugeridos para atividades complementares:
Filme: Olhos Azuis. Dir.: Jane Elliott. EUA, 1985.
Filme: A Cor Púrpura. Dir.: Steven Spielberg. EUA: 1985.
Filme: Hotel Ruanda. Dir.: Terry George. Canadá / Reino Unido / Itália / África do
Sul, 2004.
Filme: Um Grito de Liberdade. Direção: Richard Attenborough. Inglaterra: 1987.
Música: Lavagem Cerebral, Gabriel, o Pensador.
Música: A Mão da Limpeza, Gilberto Gil.
Música: Flor da Bahia, Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro.
Exercício comentado:
As afirmações abaixo apresentam definições adequadas para o termo etnia, exceto:
A) As relações sociais entre sujeitos que se denominam de uma origem comum, em
contraste com grupos diferentes dentro de uma sociedade abrangente.
B) Um grupo possuidor de algum grau de coerência e solidariedade, composto por
pessoas conscientes, pelo menos em forma latente, de terem origens e interesses
comuns.
C) Carrega conteúdos significativos definidos pelo sujeito a partir de suas experiências
subjetivas, ou seja, suas práticas cotidianas.
D) A atribuição étnica pode ser endógena, que parte do próprio sujeito, ou exógena,
quando é atribuída por outros grupos.
E) Agrupamento de pessoas ou de um setor da população, com aspectos físicos comuns.
Comentário: Alternativa correta (E):
O termo etnia não diz respeito apenas a um agrupamento de pessoas ou setor da
população, mas uma agregação consciente de pessoas unidas ou proximamente
relacionadas por experiências compartilhadas. Também não importam os aspectos físicos
comuns, mas a origem e interesses comuns.
MÓDULO 2 - RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL: O RACISMO CIENTÍFICO, O
RACISMO À BRASILEIRA E O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL
2.1 O racismo científico e as ideias eugenistas no Brasil
Foi no século XIX que a ciência, através da teoria positivista, produziu uma ampla
explicação que colocava os seres humanos organizados hierarquicamente, partindo do
princípio de que há diferenças entre as raças que os colocam naturalmente uns
superiores aos outros. É importante frisar que a palavra “naturalmente” é tomada aqui no
seu sentido mais estrito, trazendo para o plano da natureza a lógica e a organização dos
grupos sociais. A esse respeito, afirmam Lima e Vala (2004, p. 402):
O racismo constitui-se num processo de hierarquização, exclusão e discriminação contra um
indivíduo ou toda uma categoria social que é definida como diferente com base em alguma marca
física externa (real ou imaginada), a qual é ressignificada em termos de uma marca cultural
interna que define padrões de comportamento. Por exemplo, a cor da pele sendo negra (marca
física externa) pode implicar a percepção do sujeito (indivíduo ou grupo) como preguiçoso,
agressivo e alegre (marca cultural interna). É neste sentido que (...) o racismo é uma redução do
cultural ao biológico, uma tentativa de fazer o primeiro depender do segundo.
Portanto, uma vez que a ciência passou a definir uma ordem natural da realidade social,
todas as diferenças dos traços exteriores, como cor de pele, cabelo, fisionomias, serviriam
a partir de então para colocar homens e mulheres “naturalmente” uns superiores aos
outros e, contra essa “verdade inquestionável”, nada nem ninguém poderia se contrapor
ou fazer alguma coisa a respeito.
O estudo detalhado sobre a eugenia no Brasil encontra-se no livro de Pietra Diwan.
Tratava-se de uma ciência para o “aprimoramento da raça humana”, a partir da qual
várias políticas foram implantadas no Brasil, visando o “branqueamento da população” e a
“cura da fealdade” do povo brasileiro.
Para esses intelectuais, médicos, escritores, juristas e políticos pertencentes às
sociedades eugênicas fundadas no Brasil, a miscigenação era impedimento para o
desenvolvimento do país, pois provocava loucura, criminalidade e doenças. A cura para
os males do Brasil seria “civilizar a herança indígena roubada pelos portugueses e
branquear nossa herança negra”, segundo estudos da autora. As soluções para o
“problema da miscigenação” no Brasil, encontradas pelo Estado Republicano na
passagem para o século XX, foi a implantação no país de várias medidas eugenistas, a
saber: a) branqueamento pelo cruzamento; b) controle da imigração; c) regulação
casamentos; d) segregacionismo e esterilização.
É muito importante que você leia o texto completo de Pietra Diwan, a fim de compreender
profundamente o significado da eugenia, uma das questões mais controversas em nossa
história recente, que se torna praticamente um tabu, tendo em vista a forma como se deu
o banimento desse assunto em todos os livros de história e biografias no Brasil e no
mundo (a autora também usa a expressão “amnésia”). É como se a eugenia nunca
tivesse existido, ficando a impressão de que somente os nazistas alemães teriam sido
“desumanos” o bastante para levar adiante um projeto eugenista daquela envergadura.
Tomados como “bodes expiatórios” da ciência eugenista mundial, ficam conhecidos como
os “grandes vilões da história”, por terem praticado o holocausto contra 6 milhões de
judeus na II Guerra Mundial.
2.2 O racismo à brasileira e o mito da democracia racial
O racismo que surge e se preserva na história do Brasil tem uma configuração muito
própria, conforme chamaremos neste módulo de “racismo à brasileira”
Roberto DaMatta é um dos autores que nos chama a atenção para o nosso passado
extremamente ambíguo, uma vez que vivíamos uma condição social fortemente
hierarquizada e, ao mesmo tempo, precisávamos nos colocar no cenário internacional
como uma nação dita moderna, democrática, de iguais. Voltaremos a essas questões
históricas nos próximos módulos. Neste ponto de nossa reflexão, queremos enfatizar o
aspecto contraditório que até hoje não foi resolvido em nosso meio, o chamado “mito da
democracia racial”. A esse respeito, vejamos o que nos diz DaMatta (1987, p. 69):
Pode-se, pois, dizer que a “fábula das três raças” se constitui na mais poderosa força cultural do
Brasil, permitindo pensar o país, integrar idealmente sua sociedade e individualizar sua cultura.
Essa fábula hoje tem a força e o estatuto de uma ideologia dominante: um sistema totalizado de
ideias que interpenetra a maioria dos domínios explicativos da cultura.
Portanto, durante muito tempo, negamos o racismo em nossa sociedade, apoiados
nesses argumentos sobre a cordialidade do brasileiro e a fábula das três raças, atrasando
em muitas décadas a inclusão de grupos excluídos ao longo de nossa história. Somente a
partir do final dos anos de 1990 é que passamos a adotar medidas legais de ações
afirmativas para acelerar o acesso de grupos afrodescendentes aos direitos sociais
fundamentais.
Leitura obrigatória:
DIWAN, P. Raça Pura. São Paulo: Contexto, 2007 (Texto 2A: Introdução: Eugenia, o
último tabu do século XX, passados que não passam. O Paradoxo Tupiniquim: a
intelectualidade brasileira embriaga-se com as ideias eugenistas, p. 9-13; p. 87-121).
SANTOS, H. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. São
Paulo: Editora Senac, 2001 (Texto 2B: O arco-íris brasileiro, p. 39-59).
Leitura para aprofundamento:
DAMATTA, Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? Rio de Janeiro, Rocco, 1986 (Texto: A
ilusão das relações raciais, p. 29-40).
Filmes e músicas sugeridos para atividades complementares:
· Filme: Cobaias. Dir.: Joseph Sargent. EUA: 1997.
Filme: O fio da memória. Dir.: Eduardo Coutinho. Brasil, 1991.
Filme: Quase Dois Irmãos. Dir.: Lucia Murat. Brasil, 2005.
· Música: A Carne, Seu Jorge, Marcelo Yuca e Ulisses Cappelletti.
Música: Preconceito de cor, Bezerra da Silva.
Música: Não Existe Pecado ao Sul do Equador, Chico Buarque.
Exercício comentado:
As explicações abaixo referem-se ao que se definiu como racismo científico:
I - Ideologia construída no século XIX, que procurou diferenciar os indivíduos e grupos
sociais em hierarquias, sendo uns superiores aos outros.
II - Doutrina científica que passou a definir uma ordem natural da realidade social.
III - Teoria que assume a igualdade entre todos os seres humanos, independente de cor,
origem, gênero, idade, classe social etc.
IV - Suas explicações associam as características físiológicas, como cor de pele, de
cabelo e traços exteriores, ao status social determinado a cada grupo.
V - Vertente que trouxe para o plano da natureza a lógica e a organização dos grupos
sociais.
VI - Foi uma doutrina que serviu de base para a publicação da Declaração Universal dos
Direitos do Homem.
Assinale apenas as afirmações corretas:
A) I, III, IV, V e VI.
B) I, II, IV e V.
C) I, II, III, IV e V.
D) III e VI.
E) III, IV, V e VI.
Comentário: Alternativa correta (B):
O racismo científico não concebe a vida social
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