RESENHA DO TEXTO URGÊNCIA SUBJETIVA
Por: Paul Tyler • 5/12/2019 • Tese • 1.997 Palavras (8 Páginas) • 344 Visualizações
RESENHA DO TEXTO URGÊNCIA SUBJETIVA
CALAZANS, Roberto ; BASTOS, Angélica. Urgência subjetiva e clínica psicanálitica. Revista latinoamericana de psicologia fundamental: Saúde mental, São Paulo, v. 11, n. 4, p. 640-652, dezembro 2008.
O conceito de urgência subjetiva traz consigo uma dimensão que convoca um questionamento aquém de seu significado estabelecido seja pelo conceito em si seja pela modalidade clínica. É por esse viés que o artigo "Urgência subjetiva e clínica psicanalítica*”, escrito por Roberto Calazans e Angélica Bastos, abre uma importante contribuição para a compreensão do dispositivo de urgência elucidada no título do seu artigo.
Em um primeiro momento do texto, é importante pontuar em termos gerais o que os autores apontaram sobre o que é este dispositivo de urgência subjetiva, orientado pela clínica psicanalítica. De acordo com os autores, entendemos por urgência subjetiva um dispositivo de acolhimento aos sujeitos em crise, que são levados a instituições a partir de demandas variadas (familiares, vizinhos, bombeiros, policiais, guardas municipais, SAMU etc.), com o pedido de acolhimento emergencial do sofrimento psíquico (CALAZANS; BASTOS, 2008, p. 641).
Ao dizermos que o dispositivo em si abrange certa especificidade, a urgência subjetiva, pontuaremos o modo como se efetiva ao expor uma das premissas básicas da psicanálise: o poder da palavra. É nessa instância que o acolhimento abre a margem para o sujeito fazer uma elaboração psíquica que, por muitas vezes, acaba sendo inviabilizada pela subtração da palavra, como consequência surge um momento de intenso embaraço na qual a sua posição o impede de fazer uma leitura sobre o que lhe acomete propiciando a passagem ao ato. É por este viés que “Esse dispositivo sustenta a aposta no compromisso, do sujeito com o seu padecimento, isto é, a aposta de que a palavra do paciente produza enigmas que suscitem demanda para a continuidade do tratamento” (CALAZANS; BASTOS, 2008, p.641).
Ao introduzirmos a dimensão da palavra à subjetividade se complexifica, se revela para mais dos campos da farmacopeia e das medicalizações psicotrópicas, é a palavra, em sua potência, capaz de traçar os caminhos que levam ao aparecimento do sujeito, pois sem ela não o há. É por essas trilhas que o dispositivo caminha em direção a restituição do lugar de sujeito às pessoas em urgência subjetiva.
Importante colocarmos que a sua funcionalidade efetiva não é a única possível para trabalhar a saúde mental, e sim, se apresenta como uma das funcionalidades dentro do leque de medidas que se propõe a trabalho neste campo. Um outro fator importante desta modalidade clínica é a de ser engendrada junto ao contexto institucional. Nesse âmbito, os autores apontam o “Instituto Municipal Philippe Pinel”, localizado no Rio de Janeiro, e instalado no ano de 2006, para demonstrar um dos efeitos desse dispositivo. De acordo com os autores:
Em 2008, enquanto dezesseis casos encontram-se em atendimento na equipe de urgência e nas oficinas, contam-se quatro internações, dentre as quais uma data do ano anterior, uma corresponde a uma reinternação e duas a casos novos (Dias; Pinheiro, 2008). Sem o dispositivo, presume-se que alguns casos teriam sido encaminhados para internação em outras instituições, caso dispusessem de vagas. Na presença do dispositivo, esses dois leitos frequentemente estão desocupados [...] (CALAZANS; BASTOS, 2008, p.642).
Tomado este exemplo e aos demais aspectos aqui descritos, os autores levantaram em seu artigo questionamentos que não apenas eliciam respostas, mas nos convidam a uma maior reflexão sobre o dispositivo da urgência.
1. Qual a especificidade de uma urgência subjetiva que leva à necessidade de estabelecer um dispositivo de atendimento com o mesmo nome? O que podemos chamar, em termos fenomênicos, de urgência subjetiva?
2. Esse dispositivo institucional tem qual tipo de estrutura: a de determinação de um diagnóstico e encaminhamento para o tratamento ou a de uma modalidade de tratamento que segue a orientação psicanalítica?
3. Tratando-se de clínica analiticamente orientada, a urgência subjetiva corresponde a uma modalidade peculiar de entrevista preliminar ou a uma variação do atendimento psicanalítico em instituição? (CALAZANS; BASTOS, 2008, p.643).
Para falarmos da urgência subjetiva devemos considerar esse dispositivo em três momentos, na qual Sotello e Seldes (2007) citados por Calazans e Bastos (2008), explicitam que:
O momento da precipitação que leva o sujeito à instituição; o momento da recepção do caso na instituição; e o momento do encaminhamento para a condução do tratamento. Ou seja, quando estamos às voltas com a urgência subjetiva devemos estar atentos a essas variações da expressão. (CALAZANS; BASTOS, 2008, p. 643).
Dado alguns aspectos sobre a urgência subjetiva como dispositivo, perguntar-se o que é uma “urgência” se torna necessário para costurar o sentido dessa modalidade clínica. E afinal, o que é uma urgência? Como explicita os autores, “É preciso saber, em primeiro lugar, em torno de que há urgência. Em torno de que questões podemos dizer que uma resposta urge?” (CALAZANS; BASTOS, 2008, p.643).
As respostas frente ao que há urgência, se atrelam a dois conceitos que se fazem necessários para entender a sua dinâmica: O tempo e o Outro. Ao que se refere ao tempo, a urgência já revela em si algo que deve ser cumprido rapidamente, impelindo um achatamento na concepção temporal. Por esse viés, as questões que surgem frente à urgência, conforme Calazans e Bastos (2008), citam que “No caso das questões levantadas por Lacan, são questões que não se pode adiar e para as quais não se tem uma resposta determinada para dar”. A concepção do Outro aparece se remetendo à dimensão daquilo que convoca a alteridade em três maneiras distintas, como citam os autores, “A urgência advém em torno das questões colocadas por Lacan na abertura do Seminário sobre os escritos técnicos de Freud – o pai, a sexualidade e a morte – [...] (1953-1954/1986, p. 10)” (CALAZANS; BASTOS, 2008, p.642).
São essas vertentes que orientam o manejo no dispositivo de urgência. Ao passo que as respostas frente à urgência requisitam um adiantamento e elas não são pré-estabelecidas, precisam ser inventadas, é que o encontro com o Outro, abarcando toda a sua dimensão, possibilita o alargamentos das fronteiras do eu, permite a inclusão de um tempo para a criação dessas respostas. Por essas coordenadas, se torna essencial à importância do diagnóstico diferencial e a seguinte questão elucidada pelos autores Calazans e Bastos (2008): “[...] como definir uma urgência a partir de conceitos psicanalíticos?”.
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