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Resenha do filme “Nise: O coração da loucura”

Por:   •  18/9/2022  •  Resenha  •  1.420 Palavras (6 Páginas)  •  197 Visualizações

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Resenha do filme “Nise: O coração da loucura”

“Nise: O coração da loucura” é uma obra cinematográfica que conta parte da vida e obra da psiquiatra alagoana Nise da Silveira, representada na tela pela atriz Glória Pires. O filme aborda em suma a experiência que a psiquiatra teve ao trabalhar no Centro Psiquiátrico Nacional Dom Pedro II, localizado no bairro do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro. Mostrada no filme como a única médica mulher daquela instituição, esse fato era vivenciado por ela desde a universidade, na qual era a única mulher numa classe formada por 157 alunos. Sendo mulher num ambiente dominado por homens, é notável como a psiquiatra precisou ter pulso firme e insistência para que fosse ouvida dentro da psiquiatria. Esse jeito de ser foi notado desde a primeira cena em que Nise chega ao Centro Psiquiátrico pela primeira vez batendo no portão com vigor até ser atendida.

O filme aborda questões que são pouco discutidas e traz reflexões sobre procedimentos que ocorriam com naturalidade há pouco tempo e são chocantes. Essa chegada de Nise à instituição, nos anos 40, ocorre após um período de afastamento dela em relação a psiquiatria. Chegando no novo hospital que trabalharia, Nise, ao se reunir com os colegas psiquiatras percebeu duas coisas imediatamente: a dificuldade que teria em trabalhar só com homens, pois naquela época ter mulheres entre eles era, no entender deles, uma afronta e além disso o fato de que os métodos empregados naquela instituição eram terrivelmente violentos, onde as agressões físicas, eletrochoques e lobotomia eram utilizados com naturalidade sem nenhum constrangimento moral, ético ou humano e Nise demonstra seu descontentamento com essas práticas desde o início.

Assim, Nise se recusa a participar das práticas psiquiátricas normatizadas no hospital e então foi empregada no setor de Terapia Ocupacional do Hospital, que era considerado um lugar de pouca importância e que nada produzia de fato, servindo inclusive como um depósito. Foi aí que ela organizou o local onde iria trabalhar com os pacientes, que chamava de cliente e passou a cobrar que seus colaboradores também assim o fizessem. No começo os clientes estavam ressabiados, sem muito interesse em realizar qualquer atividade, mas aos poucos começaram a gostar do que ali lhes era oferecido, principalmente através da forma afetuosa com que Nise os tratava, em contraste com o tratamento oferecido pelos outros. E assim, com muita tinta, papel, lápis, telas, respeito, carinho e liberdade eles podiam começar a se expressar.

Através do filme, pudemos refletir sobre alguns conceitos aprendidos na disciplina de Psicopatologia. Por exemplo a noção de nosografia, que se trata da descrição da patologia e que era meramente a única preocupação dos outros psiquiatras, que só tratavam aquelas pessoas como doentes e a partir disso prescreviam tratamentos sem comprovações científicas, sendo que aquelas deveriam ser olhadas como sujeitos com transtornos mentais. Conseguimos perceber também a semiotécnica sendo aplicada quando Nise utiliza técnicas e maneiras específicas de observação dos sinais e sintomas de cada cliente levando em conta suas subjetividades, sendo cuidadosa nessas observações, inclusive levando muito em conta o que eles mesmos e seus familiares diziam. Além disso, é possível perceber como Nise faz a semiogênese, pois através das obras que os clientes produziam investigou a possível origem dos mecanismos, significados e importância dos sinais e sintomas apresentados.

O filme mostra como os pacientes com transtornos mentais eram estigmatizados na época, repetindo uma tendência que vem desde a Idade Média na qual aquele que é tido como louco não tem voz, pois sua palavra não era levada em conta e eles não eram vistos como responsáveis por si. Nesse sentido, Nise da Silveira, mesmo antes da Reforma Psiquiátrica, adotou métodos que humanizam os pacientes, tratando-os como sujeitos que possuem histórias e vontades. Além disso, a própria forma de tratar os internados recusando chamá-los de pacientes e adotando a palavra “clientes”, como retratado no filme, mostra sua postura e preocupação em tratá-los de maneira mais humana.

Nise da Silveira foi audaciosa e corajosa ao inovar no tratamento oferecido para as pessoas com problemas mentais, principalmente para aquelas com esquizofrenia. Ela trouxe uma proposta de alternativas de cuidados fazendo uso da arte, do afeto e do convívio com animais para substituir os métodos agressivos, antiquados que podiam ser comparados à tortura.

Ao se rebelar contra os tratamentos psiquiátricos vigentes na época, a forma como Nise da Silveira aborda a loucura constitui uma mudança fundamental no tratamento da doença mental. É notável no filme como ela vai buscando formas de se comunicar com os pacientes e acaba encontrando na comunicação não verbal da arte a possibilidade de se conectar com eles e perceber o mundo interno de cada um. Através das pinturas e desenhos, ela começa a estabelecer uma relação que leva em conta o inconsciente.

Essa noção de inconsciente, conceito cunhado por Freud, ocupa um lugar de destaque no trabalho proposto por Nise da Silveira, pois é possível tanto como método de investigação para entender o que sentiam e pensavam os pacientes como método de terapia pois produziu transformações no comportamento de cada um, melhorando o convívio social e o bem-estar.

Nise da Silveira recebeu influência da psicologia analítica de Carl Gustav Jung, segundo o qual as expressões artísticas

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