A EDUCAÇÃO E PROJETOS DE CLASSES NA CONSTRUÇÃO ÉTICO-POLÍTICA: elementos para a formação em Serviço Social.
Por: brunacrdz • 11/12/2022 • Artigo • 3.245 Palavras (13 Páginas) • 115 Visualizações
EDUCAÇÃO E PROJETOS DE CLASSES NA CONSTRUÇÃO ÉTICO-POLÍTICA: elementos para a formação em Serviço Social.
RESUMO: O presente artigo propõe uma reflexão sobre a educação e formação profissional enquanto expressão da luta de classes e consubstanciação de um projeto de sociedade. Expõe a relação entre educação e manutenção de valores na disputa por hegemonia na sociedade e o papel de intelectuais vinculados à classe trabalhadora. Conclui que os fundamentos que envolvem o debate de projetos de educação são basilares para uma formação ético-política em Serviço Social.
Palavras-chave: Educação; Projeto; Serviço Social.
ABSTRACT: This article proposes a reflection on education and vocational training as an expression of the class struggle and the consubstantiation of a society project. It exposes the relationship between education and maintenance of values in the dispute for hegemony in society and the role of intellectuals linked to the working class. It concludes that the fundamentals that involve the debate on education projects are basic for an ethical-political formation in Social work.
Keywords: Education; Project; Social Work.
1 INTRODUÇÃO
Este artigo pretende analisar a educação enquanto instrumento de manutenção ou construção de valores e consequentemente do ethos de uma classe dominante, considerando a importância da formação dos seres humanos no contexto de socialização. Apresenta-se elementos conceituais para compreensão do papel da educação na sociedade, bem como dos intelectuais, enquanto expressão de uma questão ético-política. Nesse contexto situa a formação em Serviço Social enquanto parte do referido processo, considerando sua potencialidade dentro da divisão social do trabalho.
2. A EDUCAÇÃO ENQUANTO PROJETO CLASSISTA: uma concepção ético-política.
Como as normas morais correspondem ao período histórico e relações sociais dominantes existentes, na modernidade podemos identificar um enaltecimento da propriedade privada e uma redução do trabalho apenas como um modo de realização das necessidades pessoais, subtraindo o seu caráter social. No “mundo da produção industrial em que temos o desenvolvimento da privatização dos meios de produção, distribuição, consumo e a divisão social e técnica do trabalho” (NETTO; BRAZ, 2006), parece-nos que vivemos em um modelo de sociabilidade em que é cada vez mais ilegítimo exigir a sobreposição dos interesses coletivos sobre os interesses individuais. Tais fatores rebatem sobre a moral, que no sistema capitalista se configura como funcional à reprodução da moral e do ethos da classe dominante burguesa. Tal ethos é mantido com a contribuição de uma ampla produção intelectual que reverbera a ideologia e o valores da burguesia afim de conquistar e manter sua hegemonia e dominação na sociedade:
[...]um grupo social, que tem sua própria concepção do mundo, ainda que embrionária, que se manifesta na ação e, portanto, de modo descontínuo e ocasional – isto é, quando tal grupo se movimenta como um conjunto orgânico -, toma emprestado a outro grupo social, por razões de submissão e subordinação intelectual, uma concepção que não é a sua, e a afirma verbalmente, e também acredita segui-la, já que a segue em “épocas normais”, ou seja, quando a conduta não é independente e autônoma, mas sim submissa e subordinada. É por isso, portanto, que não se pode separar a filosofia da política; ao contrário, pode-se demonstrar que a escolha e a crítica de uma concepção de mundo são, também elas, fatos políticos.
Gramsci também analisou que a compreensão de si mesmo e das contradições da sociedade acontecem pela inserção ativa dos embates hegemônicos. Por isso, aprofunda a estreita ligação entre intelectuais, política e classe social, mostrando que a filosofia, tal como a educação, deve tornar-se “práxis política” para continuar a ser filosofia e educação (Gramsci, 1975, p. 1066). E é diante da luta por hegemonia que o autor reconhece a importância dos intelectuais vinculados às classes subalternas, valorizando com singularidade o saber popular, defendendo a socialização do conhecimento e recriando a função dos intelectuais, conectando-os às lutas políticas dos “subalternos” (GRAMSCI, 1975, p. 1505; 1506). Produzir conhecimento que seja expressão dos valores e princípios – e assim possibilitar espaço para a ética – de emancipação para a classe trabalhadora, no bojo da luta de classes, se torna tarefa fundamental em uma disputa de consensos.
Assim, veremos que apesar de haver um conjunto moral dominante que se refere aos valores e concepções da classe dominante em vigor, há outros códigos morais na sociedade em contraposição ao individualismo exacerbado. É preciso considerar o surgimento de paradigmas alternativos, fruto da elaboração das classes subalternas, que buscam valorizar a dimensão coletiva da vida, sem negar a importância da individualidade no mundo dos valores, fomentando uma ligação orgânica entre ética, história e política. Neste movimento dialético consiste uma disputa por hegemonia ideológica e política proveniente e necessária à luta de classes, que exploraremos melhor a seguir.
Tais paradigmas ressaltam a necessidade de que o agir ético se concretize numa ordem política historicamente constituída, criando um campo de possibilidades de realização dos valores que seja ao mesmo tempo individual e coletivo. A construção do indivíduo social é, inclusive, uma das preocupações teórica de Marx (1999), compreendendo que a ordem social que pode oferecer a verdadeira materialização da ética é aquela em que “o livre desenvolvimento de cada um é a condição necessária pra o livre desenvolvimento de todos”.
Sem cair em um niilismo, em que a transformação da realidade parece impossível, consideramos que mesmo dentro do atual modelo de sociabilidade existe um espaço para ações em direções diferentes da moral dominante, isto é, na direção da contestação, de constituição de crítica e de adoção de outras práticas, de defesa e busca de realização de outras formas de objetivação moral. É este espaço que se constitui em um campo de possibilidades para construção de conhecimento e práxis que contribua para a emancipação da classe trabalhadora, na qual os intelectuais políticos expressem a ótica dos defraudados, se revestindo de sua energia revolucionária para fazer parte do “movimento real que supere o estado de coisas existente” (Marx, 2009, p. 173). Neste ponto é importante destacar que a concepção de intelectual que adotamos é a amplamente elaborada a partir de Marx e principalmente Gramsci. Assim, em seus escritos encontra-se uma interpretação original do que seriam as funções dos intelectuais, rompendo com o lugar comum que os entendia como um grupo em si solto no ar, “autônomo e independente” (GRAMSCI, 2001, p. 15). Deixando de considera-los de maneira abstrata e separada dos outros, o autor apresenta os intelectuais intimamente entrelaçados nas relações sociais, pertencentes a uma classe, grupo social, vinculado a determinado modo de produção:
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