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ORDENAMENTO JURÍDICO - MIGUEL REALE - LIÇÕES PRELIMINARES DO DIREITO

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Por:   •  13/10/2013  •  4.413 Palavras (18 Páginas)  •  919 Visualizações

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4. ORDENAMENTO JURÍDICO - MIGUEL REALE – LIÇÕES PRELIMINARES DO DIREITO

EXPERIÊNCIA JURÍDICA E DIREITO OBJETIVO - Estruturas Sociais e Modelos Jurídicos

A análise das diferentes fontes de direito permite-nos completar o estudo da experiência jurídica, a qual é constituída pelas fontes apontadas e suas naturais projeções, dentre as quais sobressaem os modelos jurídicos.

Que é que significam as fontes de direito? Elas se desenvolvem em normas e "situações normadas", por serem estruturas objetivas, que ou disciplinam classes de comportamentos possíveis, ou instituem entidades e ordens de competência; e, concomitantemente, determinam ou possibilitam situações subjetivas constituídas sob a garantia daquelas estruturas. Quando estudarmos os direitos subjetivos cuidaremos das situações subjetivas. Concentremos, por ora, nossa atenção nas estruturas objetivas que compõem o Direito Objetivo.

Das fontes de direito resulta toda uma trama ordenada de relações sociais que, em virtude das matrizes de que se originam, são dotadas de garantia específica, ou sanções. Opera-se, desse modo, através da história, o processo de "modelagem jurídica" da realidade social, em virtude de sempre diversas e renovadas "qualificações valorativas" dos fatos. Repetimos que onde há norma há sempre sanção, isto é, uma forma de garantia acrescentada à regra para assegurar o seu adimplemento, podendo haver, consoante já foi explicado, sanções penais e premiais. O que não há são modelos jurídicos desprovidos de sanção. É a razão pela qual entendemos que os modelos de Direito, elaborados pela doutrina, não são "modelos jurídicos", no sentido técnico deste termo.

Pois bem, à medida que as fontes de direito desenvolvem e ordenam os fatos, vão surgindo distintos modelos normativos, correspondentes às diversas estruturas sociais e históricas. No fundo, a história do Direito é sobretudo a história de seus modelos, de seus institutos, instituições e sistemas de normas.

O termo "modelo jurídico" foi por nós proposto, em nosso livro O Direito como Experiência, como complemento necessário à teoria das fontes de direito. O conceito de modelo, em todas as espécies de ciências, não obstante as suas naturais variações, está sempre ligado à idéia de planificação lógica e à representação simbólica e antecipada dos resultados a serem alcançados por meio de uma seqüência ordenada de medidas ou prescrições. Cada modelo expressa, pois, uma ordenação lógica de meios segundo afins, ou uma ordem lógica e unitária de relações. Assim acontece, por exemplo, com o "modelo arquitetônico", ou projeto, que antecipa e condiciona a construção de um edifício.

Coisa análoga ocorre com os modelos mecânicos ou os matemáticos. Conforme já foi lembrado à pág. 176, há duas espécies de modelos do Direito: uns são de caráter puramente teórico (modelos dogmáticos); outros, os modelos jurídicos (estrito senso), além de resultarem também de uma elaboração doutrinária, muito embora pressuponham uma elaboração doutrinária, constituem a principal modalidade do conteúdo das fontes de direito.

O que distingue, em suma, os modelos doutrinários, ou dogmáticos, dos modelos jurídicos, prescritivos, é que aqueles não são obrigatórios, enquanto que nestes existe a previsão ou a prefiguração de uma "ordem de competências", ou, então, de uma "ordem de conduta", estando sempre predeterminadas as conseqüências que advêm de seu adimplemento, ou de sua violação.

Observo, desde logo, que um modelo jurídico pode ser expresso por uma única regra de direito, ou por um conjunto de regras interligadas, conforme a amplitude da matéria: em ambos os casos, porém, há sempre uma unidade de fins a serem atingidos, em virtude da decisão tomada pelo emanador do modelo através da respectiva fonte.

É preciso notar, outrossim, que, quando empregamos a expressão modelo jurídico, não pensamos em nenhum protótipo ideal, em algo que se ponha como alvo superior a ser atingido. Os modelos jurídicos correspondem antes às modelagens práticas da experiência, e a formas do viver concreto dos homens, podendo ser vistos como estruturas normativas de fatos segundo valores, instauradas pelas fontes de direito em virtude de um ato concomitante de escolha e prescrição.

A Ciência do Direito adquiriu feição mais precisa e madura com os jurisconsultos romanos, exatamente porque eles foram os primeiros a descobrir que há comportamentos humanos que obedecem a certas condições de fato (pressupostos fáticos) assim como a certas finalidades ou exigências axiológicas, razão pela qual são dotados de certa regularidade ou constância. Verificaram, em suma, que, dadas certas circunstâncias, é possível prever-se certo tipo de comportamento, e, mais ainda, que a vida social, apesar de sua contínua mudança, apresenta relações estáveis e regulares, permitindo uma representação antecipada do que vai ocorrer. Se não houvesse na sociedade tendências ou inclinações mais ou menos estáveis, condicionando modos de ser e de agir com relativa "regularidade" ou "normalidade", não teria sido possível sequer a formação do Direito. Podemos dizer que o Direito surgiu como ciência quando os jurisconsultos romanos, com sabedoria empírica, quase intuitiva, vislumbraram na sociedade "tipos de conduta" e criaram, como visão antecipada dos comportamentos prováveis, os estupendos "modelos jurídicos" do Direito Romano.

Pois bem, sendo as relações sociais dotadas de certa estrutura ou consistência, tal fato não só possibilita o seu estudo objetivo como permite que toda uma série de atos da mesma natureza seja considerada lícita ou ilícita. Não nos referimos apenas às estruturas sociais básicas, como a família ou a propriedade, mas às diversas formas de comportamento que, através da história, embora variando de época para época, apresentam inegável estabilidade, sendo consideradas necessárias ou úteis à convivência humana nos quadros, por exemplo, das sociedades grega, romana, inglesa ou brasileira.

Foi observando essas "constantes sociais", repetimos, que os jurisconsultos romanos inferiram a conseqüência fundamental de ser possível discriminar e classificar, como lícitos e ilícitos, facultativos ou obrigatórios etc. os comportamentos dos homens enquanto membros do grupo social. Quando os juristas romanos, valendo-se dos estudos de Lógica dos filósofos gregos, previram e disciplinaram a conduta possível dos homens, subordinando-a a classes, gêneros, espécies e tipos de comportamento, nasceu

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