A Crise do direito administrativo
Por: Bruno Lavôr • 22/11/2017 • Trabalho acadêmico • 2.057 Palavras (9 Páginas) • 243 Visualizações
A crise dos paradigmas do direito administrativo
Descrição romântica do surgimento do direito administrativo – O Parlamento, como veiculo de expressão da vontade geral, caberia o primado na elaboração das normas jurídicas, que não só limitariam como preordenariam a atuação dos órgãos administrativos. Assim, à Administracao Publica cabe agir tão-somente de acordo com o que lei prescreve ou faculta (idéia de legalidade como vinculação positiva à lei).
Tal descrição seria esclarecedora se não fosse FALSA.
Na verdade, o surgimento do direito administrativo representou antes uma forma de reprodução e sobrevivência das praticas administrativas próprias do Antigo Regime que a sua superação. A juridicizacao embrionária da Adm. Publica não logrou subordiná-la ao direito, ao revés, serviu-lhe apenas de revestimento e aparato retórico para a sua perpetuação fora da esfera de controle dos cidadãos.
A conhecida origem pretoriana do direito administrativos traz em si essa contradição: a criação de um direito especial da Adm. Publica resultou não da vontade geral, expressa pelo Legislativo, mas sim de decisão autovinculativa do próprio Executivo.
Assim, a idéia clássica de que o Revolução Francesa comportou a instauração do principio da legalidade administrativa, tornando o Executivo subordinado à vontade da Parlamento expressa através da lei É UM MITO.
Tal circunstancia histórica subverte, a um so golpe, os dois postulados básicos do Estado de Direito em sua origem liberal: principio da legalidade e o principio da separação dos poderes. Pois, a atribuição da função de legislar sobre direito administrativo a um órgão da jurisdição administrativa, intestino do Poder Executivo, não se coaduna com legalidade nem muito menos com separação dos poderes.
A segunda contradição na gênese do direito administrativo: a criação de jurisdição administrativa.
Se baseou na desconfiança dos revolucionários franceses nos tribunais judiciais. Assim, a invocação do principio da separação dos poderes foi mero pretexto, visando a atingir o objetivo de alargar a esfera da liberdade decisória da Administracao, tornando-a imune a qualquer controle judicial. – continuidade do Antigo Regime.
Isso revela o quanto o direito administrativo, em seu nascedouro, era alheio a qualquer propósito garantistico. Ao contrario, seu intuito primeiro foi o de diminuir as garantias de que os cidadãos disporiam caso pudessem submeter o controle da atividade administrativa a um poder eqüidistante, independente e imparcial – Judiciario. Note que a separação dos poderes serviu, de forma contraditória, a essa processo de imunização decisória dos órgãos do poder executivo. Os donos do poder criam o direito que lhes é aplicável e o aplicam às situações litigiosas com carater de definitividade.
Entao se algum sentido garantistico norteou e inspirou o surgimento e o desenvolvimento da dogmática administrativa este foi em favor da Adm, e não dos cidadãos.
Dessa maneira, pouco a pouco o direito administrativo vai deixando de ser o direito dos privilégios especiais da Adm, para se tornar no direito regulador das relações jurídicas administrativas.
Se, em sua origem, o direito administrativo se traduzia em uma normatividade marcada pelas idéias de parcialidade e desigualdade, sua evolução histórica revelou um incremente significativo daquilo que se poderia chamar de vertente garantistica, caracterizada por meios e instrumentos de controle progressivo da atividade administrativa pelos cidadãos. Constituida pelo trabalho desses dois vetores contraditórios, a dogmática administrativa reflete esse carater ambíguo em inúmeros dos seus institutos e na fragilidade de sua estrutura teórica.
Processo de descolamento do direito constitucional – devido a própria descontinuidade das constituições em contraste com a continuidade da burocracia, contribuiu para que o direito administrativo se nutrisse de categorias, institutos, princípios e regras PROPRIOS, mantendo-se de certa forma alheio às sucessivas mutações constitucionais.
Outra contradição do direito administrativo é a fuga para direito privado, constituído por um conjunto de adaptações e recriações de institutos do direito civil, assim, a administração conserva suas prerrogativas, despindo-se das restrições por meio da constituição de entidades administrativas com personalidade de direito privado. (Privatizacao da atividade administrativa – crise de identidade).i
Por fim, resta uma alusão à problemática das transformações recentes no modelo de organização administrativa. O surgimento e proliferação das chamadas autoridades administrativas independentes subverteu a idéia de unidade da Adm, substituindo-a pela noção de uma Adm policentrica.
Tais contradições – CRISE DOS PARADIGMAS DO DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO.
Essa crise não se constitui apenas do novo, mas também de alguns vicios de origem. Nesta toada, é possível identificar 4 paradigmas clássicos do direito administrativo que fizeram carreira no Brasil e que se encontram em xeque na atualidade:
- O dito principio da supremacia do interesse publico sobre o interesse privado, que serviria de fundamento e fator de legitimação para todo conjunto de privilégios de natureza material e processual que constituem o cerne do regime jurídico-administrativo.
- A legalidade administrativa como vinculação positiva a lei, traduzida numa suposta submissão total do agir administrativo à vontade previamente manifestada pelo Poder Legislativo. Tal paradigma constuma ser sintetizado na negação formal de qualquer vontade autônoma aos órgãos administrativos, que so estariam autorizados a agir de acordo com o que a lei rigidamente prescrevesse ou facultasse.
- A intangibilidade do mérito administrativo, consistente na incontrolabilidade das escolhas discricionárias da Adm, seja pelos órgãos do contencioso administrativo, seja pelo poder judiciário (em países, como Brasil que adotam o sistema de jurisdição una), seja pelos cidadãos, através de mecanismos de participação direta na gestao da maquina administrativa;
- A idéia de um Poder executivo unitário, fundada em relações de subordinação hierárquica entre burocracia e os órgão da cúpula do governo.
Na tarefa de desconstrução dos velhos paradigmas e proposição de novos, a tessitura constitucional assume papel condutor determinante, funcionando como diretriz normativa legitimadora das novas categorias. A premissa básica a ser assumida é a de que as feições jurídicas da Adm estão alicerçadas na própria estrutura da Constituição.
A historia demonstra a emergência de determinadas formas de se conceber a ciência e a realização cientifica, que se afirmam como paradigmas por um dado período de tempo. Tais paradigmas definem o objeto da empreitada cientifica, as questões que serão admissíveis. Assim, os paradigmas definem os contornos de um modelo cientifico e delimitam a lógica que permitira o seu aprimoramento e a obtenção de respostas a questões problemáticas. Em um certo sentido, os paradigmas exercem uma eficácia bloqueadora, subtraindo determinados pressupostos à duvida, cuja legitimidade é simplesmente aceita como premissa.
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