A Propósito da Ideia de um Sistema de Direito
Por: Ana Amaral • 9/10/2016 • Trabalho acadêmico • 8.367 Palavras (34 Páginas) • 285 Visualizações
Chaïm Perelman[1]
§ 30. A propósito da ideia de um sistema de direito
A ideia de um sistema de direito, análogo a um sistema de lógica ou de matemática, é tão oposta à ideia de um direito consuetudinário ou de um direito emanante de uma autoridade soberana que só pode ser concebida como uma ideia tardia, pressupondo um longo trabalho teórico prévio.
A história nos ensina que nas sociedades primitivas, regidas pelo costume e pela religião, é bem difícil distinguir o direito da moral e da religião. Quando as regras e as instituições estabelecidas não impedem o nascimento de controvérsias e de conflitos, quando se quer impedir que estes não se resolvam pela violência, recorre-se a uma autoridade reconhecida – seja essa autoridade de origem política ou religiosa –, a fim de dirimir os litígios e de restabelecer a paz social. Nesta primeira etapa, o que caracteriza o direito é a existência de uma autoridade judiciária, que sana as insuficiências das regras consuetudinárias e trata de impor uma solução aceitável aos conflitos que se arriscam a degenerar. Para prevenir que nasçam novos conflitos a propósito de caso da mesma espécie e para evitar a arbitrariedade, é importante que a decisão do juiz forme um precedente ao qual todos se amoldarão no futuro, e que se torne conhecida a regra mediante a qual ele decidiu. Daí nasce certa concepção da justiça, como regularidade, como uniformidade, como o tratamento igual de casos essencialmente semelhantes. É essa igualdade perante a lei que garante a imparcialidade dos juízes e assegura a manutenção da ordem social. É óbvio que, para impor-se, a regra de decisão deverá ter uma força de convicção suficiente, que não seja considerada nem iníqua nem desarrazoada pelo meio ao qual ela deve aplicar-se. A pressão social, acompanhada de eventuais sanções, imporá a regra de direito aos membros do grupo. Assim é que, pouco a pouco, em consequência das decisões que se impõem e constituem precedentes, se elaborará, em cada comunidade, um direito distinto das usanças, dos costumes e das práticas religiosas.
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