TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

Resenha - O Urbanismo em Questão - Françoise Choay

Por:   •  25/11/2019  •  Resenha  •  1.500 Palavras (6 Páginas)  •  765 Visualizações

Página 1 de 6

O urbanismo em questão

Esta resenha refere-se ao texto O urbanismo em questão, de autoria de Françoise Choay, que aborda o surgimento do urbanismo como ciência e faz uma síntese das principais correntes de pensamento relativo à cidade desde o século XIX até meados do século XX.

A origem da necessidade de se estudar e entender o funcionamento das cidades está no crescimento demográfico sem precedentes pelo qual passaram núcleos urbanos europeus a partir da Revolução Industrial. A drenagem da mão-de-obra do campo ocasionou problemas para os quais as cidades não estavam preparadas. Choay cita como exemplo o caso de Londres, que possuía 864.845 habitantes em 1801, passando a ter 1.873.676 habitantes em 1841 e 4.232118 em 1891. O inchaço das cidades prejudicou o acesso à moradia pelos trabalhadores, as condições de higiene física do ambiente e a circulação viária, entre outros itens. Uma nova ordem foi criada e a cidade precisava adaptar-se à nova sociedade que a habitava, segundo Choay.

Assim, o estudo da cidade durante o século XIX dividiu-se em duas linhas de ação: a descritiva, representada pelos franceses Levasseur e Legoyt, com o objetivo de entender o fenômeno da “urbanificação” e formular leis de crescimento urbano; e a polêmica, com a denúncia das condições morais, físicas e higiênicas do proletariado urbano, o choque da realidade da cidade, encabeçado por nomes como Matthew Arnold, Fourier, Proudhon, Carlyle e Ruskin. Choay diz que, com exceção de Marx e Engels, a maioria dos estudiosos da cidade não admitiam o estabelecimento de uma nova ordem urbana a partir da Revolução Industrial. Imperava o conceito de “desordem”. Para o ordenamento urbano foram feitas propostas de modelos de cidade ideal para serem implantadas do zero, sem “poder dar uma forma prática ao questionamento da sociedade, a reflexão situa-se na dimensão da utopia”. Houve dois modelos: o progressista, orientado para o futuro; e o culturalista, orientado para o passado. O urbanismo ainda não é praticado por especialistas (arquitetos, principalmente) e é bastante politizado, razão pela qual os estudiosos do período são chamados de pré-urbanistas.

Choay conta que os pré-urbanistas progressistas identificam o “indivíduo humano com tipo, independente de todas as contingências e diferenças de lugares e tempo, e suscetível de ser definido em necessidades-tipos cientificamente deduzíveis”. Assim, a partir de uma análise racional, poder-se-ia determinar uma ordem-tipo urbana passível de ser estabelecida a qualquer agrupamento humano em qualquer época e lugar, já que os homens teriam um mesmo modo de vida, as mesmas necessidades, os mesmos anseios e talvez os mesmos gostos. A corrente progressista prioriza os espaços abertos e verdes, indispensáveis para a higiene e defende a setorização da cidade a partir da análise das funções humanas, reservando diferentes locais para o habitat, para o trabalho, para a cultura e o para o lazer. A estética é muito importante, havendo recusa dos padrões artísticos do passado. Na cidade progressista praticamente tudo seria pré-determinado, desde alinhamentos, gabaritos de vias e tipos de muros até os modelos de edifícios, como o modelo de habitação coletiva, o falanstério de Fourier, o modelo de escola de Owen e o modelo de hospital e lavanderia municipal de Richardson. Havia um grande interesse na habitação, com dois modelos diferentes, porém concebidos a partir de um protótipo: o da solução coletiva de Fourier, já mencionado; e também o de Proudhon, solução individual.

Os pré-urbanistas culturalistas, segundo Choay, consideram que “o indivíduo não é uma unidade intermutável (...) por suas particularidades e sua originalidade própria”, sendo insubstituível na sua comunidade. Afirmam que a cidade perdeu sua “antiga unidade orgânica” frente à industrialização. São feitas análises, comparações e paralelos entre a civilização industrial e as do passado, possibilitado pelos estudos históricos e a arqueologia. É defendida um retorno às formas do passado, a colocação das necessidades espirituais acima das materiais, refletindo em um planejamento do espaço urbano feito com “modalidades menos rigorosamente determinadas”. O modelo culturalista prevê a cidade circunscrita em limites precisos, para contraste entre meio cultural e meio natural, sendo o último preservado. Não se admitem cidades gigantescas e sim, modestas, nos moldes medievais. Como marca da ordem orgânica, o traçado não-geométrico, a irregularidade e a assimetria. Cidades ortogonais são para Ruskin “sepulturas para a alma”. A estética é igualmente importante, com retorno a uma concepção de arte inspirada na Idade Média. A arte é um meio de afirmar uma cultura. Na construção, “nada de protótipos ou padrões”, umas diferentes das outras, exprimindo sua individualidade.

Choay apresenta também no pré-urbanismo o pensamento de Marx e Engels, que fazem a crítica da cidade industrial “sem recorrer ao mito da desordem nem propor sua contra-partida, o modelo da cidade futura”. Para eles, não adianta propor modelos exatos frente à um futuro indeterminado, “cujos contornos só aparecerão progressivamente, na medida em se desenvolver a ação coletiva” de derrubar a ordem vigente. A visão de futuro é uma cidade-campo, mas no sentido de não existir diferenças sócio-econômicas, culturais e demográficas entre as zonas urbana e rural. Ainda é incluso o “antiurbanismo americano”, crítica à cidade e defesa da restauração de uma espécie de estado rural nos Estados Unidos, na época muito mais caracterizado pela natureza virgem.

Como obra de especialistas e despolitizado, o urbanismo propriamente dito não permanece somente na utopia, dando uma “tarefa prática” a seus técnicos. Os dois modelos do pré-urbanismo encontram-se modernizados. O pioneiro do novo modelo progressista é Tony Garnier e sua obra La cité industrielle, influenciando a primeira geração dos arquitetos racionalistas.

Há a idéia de modernidade através da arte de vanguarda e da era industrial, concebida como momento de ruptura histórica radical. O foco dos urbanistas propriamente ditos é a técnica e a estética, e, não mais, a estrutura sócio-econômica. A cidade do século XX é vista como fora do contexto e necessita realizar a revolução industrial: utilizando materiais novos e métodos de estandartização e de mecanização para alcançar eficácia. O ideal universal reafirma o conceito do homem-tipo do pré-urbanismo progressista: “idêntico em todas as latitudes e no seio de todas as culturas”. Os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (C.I.A.M.s) são os principais veículos de difusão da corrente, formulando em 1933 a Carta de Atenas, que “analisa as necessidades humanas universais no quadro de quatro grandes funções: habitar, trabalhar, locomover-se cultivar o corpo e o espírito”. Novamente, a proposta de setorização da cidade. A topografia não é mais limitante, pois há novas máquinas, a arquitetura do “Bull-dozer (retro-escavadeira)”, podendo a cidade idealizada ser implantada em qualquer lugar do mundo, a exemplo dos planos de Le Corbusier para cidades na França, no Japão, nos Estados Unidos, na África do Norte e até mesmo no Rio de Janeiro. A preocupação com a eficácia é diretamente relacionada à higiene. A idéia é desdensificar a cidade, eliminar as ligações entre edifícios, torná-los autônomos e abolir a rua, estigma da barbárie e símbolo da desordem circulatória. A estética rejeita os padrões do passado e retoma a ortogonalidade. Retorno aos poucos modelos de edifícios, concebidos para o homem-tipo: a unidade de habitação de Le Corbusier, como exemplo de imóvel coletivo gigante ou as casas baixas, defendidas por alguns membros da Bauhaus.

...

Baixar como (para membros premium)  txt (10 Kb)   pdf (72.1 Kb)   docx (10.8 Kb)  
Continuar por mais 5 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com