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A SUPERAÇÃO DA TEORIA DA COCULPABILIDADE ATRAVÉS DA CULPABILIDADE PELA VULNERABILIDADE DO AGENTE

Por:   •  9/3/2016  •  Artigo  •  6.759 Palavras (28 Páginas)  •  482 Visualizações

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A SUPERAÇÃO DA COCUPABILIDADE PELA TEORIA DA VULNERABILIDADE: CULPABILIDADE PELA VUNERABILIDADE

Felipe César Santos Porto[1]

 Marcus Vinícius Aguiar Faria[2]

RESUMO

O presente artigo busca, de maneira despretensiosa, analisar os erros e os acertos da “teoria da coculpabilidade”, melhor desenvolvida pelo jurista argentino Eugenio Raúl Zaffaroni, e identificar sua superação pela “teoria da vulnerabilidade”. O Poder Judiciário brasileiro, de há muito, decide pela não aplicação da teoria da coculpabilidade, sob o argumento de que o crime não está genuinamente ligado à pobreza. Entrementes, a teoria da vulnerabilidade, ainda não analisada pelo Poder Judiciário pátrio, propõe-se a contornar os equívocos teóricos da teoria da coculpabilidade, a fim de apontar a parcela de culpa da sociedade no evento delituoso e a justificar a mitigação da punibilidade do agente com reduzida autodeterminação.

PALAVRAS-CHAVE: Coculpabilidade. Vulnerabilidade. Autodeterminação. Dosimetria da Pena. Atenuante Inominada.

1. INTRODUÇÃO

Não é de hoje que o sistema penal, em todo o mundo, encontra-se em crise de legitimação, revelando-se aético.

A isso se deve a três fatores, como ensina o insigne jurista italiano LUIGI FERRAJOLI (in Direito e Razão, trad. Luiz Flávio Gomes e outros, pela Editora RT, 2008): i) a seletividade do sistema penal, bastando olhar para dentro dos estabelecimentos penais e verificar o perfil da grande maioria dos aprisionados; ii) o simbolismo do sistema penal, ou seja, o investimento na edição de “legislação do terror”, sem nenhuma eficácia prática no combate da criminalidade e; iii) arbitrariedades dos agentes públicos operadores do sistema penal, revelando tendências “neoabsolutistas” do atuais Estados Democráticos de Direito.

Noutro giro, a partir das incursões do jurista argentino EUGENIO RAÚL ZAFFARONI (in Manual de Direito Penal brasileiro, Vol. 1, pela editora RT, 2007), a não efetivação dos direitos fundamentais prometidos constitucionalmente, pelo Estado, e a marginalização de pessoas com determinados estereótipos, pela Sociedade, são causas preponderantes da redução da autodeterminação de indivíduos que, em algum momento no tempo e no espaço, cometeram crimes.

Nessa linha de intelecção, erigiu-se a teoria da coculpabilidade, a partir das idéias de MARAT (in Plano de Legislação Criminal, editora Quartier Latin,  2008), com o festejado jurista argentino ZAFFARONI, quem se propôs a apontar a parcela de culpa do Estado e da Sociedade na realização de crimes por indivíduos pobres financeiramente.

Entrementes, os tribunais brasileiros ao analisarem a tese da coculpabilidade, majoritariamente, decidiram pela impossibilidade do reconhecimento da coculpa do Estado e da Sociedade, sob o argumento de que a prática de crime não está genuinamente relacionada à pobreza.

Sendo esta apenas uma das críticas à polêmica teoria da coculpabilidade, o jurista argentino ZAFFARONI (in Em busca das Penas Perdidas...), recentemente, reconheceu os equívocos apontados pela dogmática e política criminais e propôs uma nova roupagem à teoria desenvolvida: a culpabilidade pela vulnerabilidade.

O Ministro do Supremo Tribunal Argentino defende que determinadas pessoas são mais vulneráveis do que outras a serem selecionadas pelo sistema penal.

A problemática do presente artigo cinge-se em analisar juridicamente se aquelas pessoas mais vulneráveis à seletividade do sistema penal merecem uma atenuação da punibilidade, enquanto que as pessoas menos vulneráveis poderão até merecer uma agravação da pena.

Justifica-se o presente estudo pela relevância jurídica e social do tema, sem olvidar da importância econômica, já que, caso haja uma mudança na jurisprudência em benefício de acusados e já condenados, poderá retroagir (e ser aplicada doravante), a teor de uma analogia do art. 5º, inc. XL, da Constituição Federal, e, via de efeito, desabastecer os superlotados estabelecimentos penais brasileiros.

O principal objetivo do presente artigo é reconhecer os equívocos da teoria da coculpabilidade e, inclusive, o acerto da jurisprudência brasileira em não aplicá-la, e, em ato contínuo, apontar sua superação pela teoria da vulnerabilidade, demonstrando a viabilidade da aplicação de uma atenuante genérica, com supedâneo no art. 66, do Código Penal, àquelas pessoas vulneráveis à seletividade do sistema penal pátrio.

A metodologia empregada fundamentou-se em pesquisa bibliográfica, jurisprudencial e comparada. O presente artigo emergiu de fecundas discussões e estudos realizados no I Laboratório de Pesquisa Científico-Jurídica da Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB –, no eixo Direito Penal, na exploração da linha de pesquisa (Des)acertos da teoria da coculpabilidade, realizado no mês de março de 2011.

2. A COCULPABILIDADE DA SOCIEDADE NO EVENTO DELITUOSO

2.1. A teoria da coculpabilidade

Tendo em vista a sociedade brasileira contemporânea e suas deficiências no que diz respeito ao cenário penal e o sistema penal tido como falido em demasiados aspectos, procuram-se alternativas a todo instante que possam sanar essas lacunas estridentes. O sistema prisional brasileiro, assim como outros, tem características que o descreve como seletivo e discriminador, os indivíduos que o sistema capta e sofrem o ajuizamento da mão punitiva do Estado a partir de seu “ius puniendi” são dotados, na maioria das vezes, de realidades semelhantes.

A realidade penal brasileira, através de seus códigos e artigos, muitas vezes não consegue compreender as múltiplas analises que se tem de fazer num caso concreto e material.

As decisões tomadas pelas pessoas necessitam independentes da situação, de uma determinada autodeterminação do individuo, o que não é diferente no âmbito penal, os conceitos do que é certo ou errado dentro de uma sociedade é eminente a todos, sem restrições, os atos ilícitos e lícitos são de conhecimento unânime, porém o coeficiente de autodeterminação de certos indivíduos podem fazer com que este seja mais propício a tomar decisões dentro de uma ilicitude fora do âmbito normativo e jurídico brasileiro, e este fator deve ser analisado ao valorizar o caso em tela.

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