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Algumas Consequências Da Reprodução Assistida Para O Direito De Família

Por:   •  31/10/2023  •  Artigo  •  4.033 Palavras (17 Páginas)  •  43 Visualizações

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ARTIGO ORIGINAL

SILVEIRA, Marcela Vergna Barcellos [1]

SILVEIRA, Marcela Vergna Barcellos. Algumas consequências da reprodução assistida para o direito de família. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 10, Vol. 02, pp. 85-99. Outubro de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/consequencias-da-reproducao, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/consequencias-da-reproducao

RESUMO

O surgimento e a popularização das técnicas de reprodução assistida trouxeram muitas questões para o Direito de Família que, por sua vez, também passa por transformações decorrentes da existência de um novo paradigma constitucional: a “família socioafetiva”, em que o afeto substitui a consanguinidade. O entrelaçamento entre os dois temas – a reprodução assistida e a família socioafetiva -, assim como suas consequências jurídicas, são o objeto desse trabalho.

Palavras-chave: Reprodução assistida, Direito de família, Família socioafetiva.

1. INTRODUÇÃO

A complexidade e as dificuldades relacionadas à reprodução humana nos trazem questões existenciais, sanitárias, éticas e jurídicas.

Não há dúvida, por um lado, de que reproduzir-se é um desejo muitas vezes, até mais do que isso, um verdadeiro imperativo existencial, reconhecido pela sociedade e pelo Direito, integrando-se ao conjunto de aspirações que nos identificam como seres humanos.

Apesar disso, o que em geral se observa é que dificuldades relacionadas à fecundação e a à fertilidade constituem um tema pouco comentado socialmente, despertando alguma reflexão e questionamentos apenas quando as pessoas se encontram diretamente envolvidas numa situação concreta de infertilidade e/ou de incapacidade reprodutiva. Como regra, as discussões sobre reprodução assistida são muito mais raras e menos acaloradas do que aquelas que percebemos quando se fala de aborto, tema que não só desperta um debate apaixonado, mas em relação ao qual praticamente todas as pessoas têm uma opinião …

E, isso, mesmo atualmente, quando a Organização Mundial da Saúde – OMS, estima que cerca de 1/6 – um sexto!!! da população mundial sofre com alguma questão relacionada à fertilidade.

Neste contexto, e como tentaremos demonstrar ao longo desse trabalho, além dos aspectos sociais e jurídicos que lhe dizem respeito intrinsecamente, a busca e a realização de procedimentos clínicos de reprodução assistida trazem muitas e variadas consequências para as famílias, com efeitos jurídicos também múltiplos e diversos.

O reconhecimento e o exame de ao menos parte dos efeitos jurídicos resultantes do advento dos procedimentos de reprodução assistida no Direito das Famílias é o objetivo deste trabalho, notadamente no que diz respeito a sua repercussão junto ao Poder Judiciário. Evidentemente, não se tem aqui qualquer pretensão de esgotar tema tão complexo: a miríade de situações e consequências resultantes da mera possibilidade de a fertilidade sofrer algum abalo, mas, ao mesmo tempo, estar ao alcance de todos, é infinita, cabendo-nos, neste momento, apenas apontar alguns aspectos que nos pareceram mais relevantes.

Do ponto de vista metodológico, o assunto foi examinado de forma dedutiva, eis que, a partir da premissa adotada – contexto atual das famílias e da reprodução – chegamos a conclusões específicas acerca de suas consequências para o direito de família. Dito isso, o tema foi examinado mediante a revisão bibliográfica de artigos, livres e teses acadêmicas sobre o assunto, bem como da análise da jurisprudência dos Tribunais brasileiros, notadamente o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça. Também foram considerados os apontamentos das aulas de Bioética e Biodireito, inseridos no Curso de Filosofia Do Direito.

2. UMA NOVA REALIDADE: A REPRODUÇÃO ASSISTIDA E A FAMÍLIA SOCIOAFETIVA

2.1 O QUE É “REPRODUÇÃO ASSISTIDA”?

Costuma-se conceituar a ‘reprodução assistida’ como todo e qualquer método, tratamento ou procedimento de natureza médica, que venha facilitar ou mesmo viabilizar a reprodução humana, na imensa confluência de situações em que esta não ocorre ou dificilmente ocorreria de forma espontânea. O objetivo das técnicas de “reprodução assistida” é, sempre, iniciar uma gravidez[2].

O advento e o aprimoramento dos métodos de reprodução assistida buscam mitigar esse sofrimento, ampliando significativamente as possibilidades da realização de ter filhos. Se, até o final dos anos 70, a única alternativa àqueles que não podiam conceber espontaneamente era a adoção, a partir de 1978, quando nasceu Louise Brown, o primeiro bebê de proveta, as opções médicas para a “reprodução assistida” passaram a se popularizar, até o estágio em que nos encontramos hoje, quando praticamente todas as pessoas já podem, ao menos em teoria e mediante a ajuda que se fizer necessária, gerar, gestar e parir seus filhos.

Na ausência de legislação federal sobre o assunto – lacuna grave, mas que será apenas apontada neste momento, já que não constitui o objeto deste trabalho – o Conselho Federal de Medicina – CFM, tenta, por sua vez, disciplinar a matéria por intermédio de suas Resoluções, dentre as quais destaca-se, por sua atualidade, O Preâmbulo da Resolução CFM de n. 2.320/2022[3]

De acordo, ainda, com os itens 1 e 2 do Anexo da Resolução CFM 2.320/2022, as técnicas de reprodução assistida – RA – têm o papel de auxiliar no processo de procriação[4], podendo revestir-se de menor ou maior complexidade, do ponto de vista clínico.

O surgimento e a popularização das técnicas de reprodução assistida têm muitas repercussões no Direito das Famílias. O objetivo deste trabalho é tratar de ao menos uma parte delas que nos pareceu relevante, como se observa a seguir.

2.2 A ALTERAÇÃO DO PARADIGMA DE FAMÍLIA NO BRASIL: A FAMÍLIA SOCIOAFETIVA

A família é a base da sociedade no Brasil e, exatamente por isso, deve ser especialmente protegida pelo Estado.

Se, inclusive nas famílias que podemos chamar de “tradicionais”, o advento das técnicas de reprodução assistida provocou e provoca muitas consequências, nas inúmeras novas formações familiares, reconhecidas como tal

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