Judicialização de políticas públicas
Por: vanepinzon • 11/4/2016 • Projeto de pesquisa • 4.205 Palavras (17 Páginas) • 267 Visualizações
A Judicialização das Políticas Públicas em direitos fundamentais e o Princípio da Reserva do Possível
Com a elaboração da Constituição Federal de 1988 passou a existir uma nova norma jurídica no Brasil, tendo a ótica para os direitos e a dignidade humanos em uma sociedade mais justa e igualitária. Desta forma, surgem os direitos fundamentais, afirmados no Artigo 5º, que abrangem as garantias individuais essenciais ao ser humano, como o direito à vida, à liberdade, à igualdade, dentre outros. (BRASIL,1988, p. 22)
De acordo com Barroso (2007), a dignidade da pessoa humana é o centro de irradiação dos direitos fundamentais, e os mesmos abrangem:
“a) a liberdade, isto é, a autonomia da vontade, o direito de cada um eleger seus projetos existenciais; b) a igualdade, que é o direito de ser tratado com a mesma dignidade que todas as pessoas, sem discriminações arbitrárias e exclusões evitáveis; c) o mínimo existencial, que corresponde às condições elementares de educação, saúde e renda que permitam, em uma determinada sociedade, o acesso aos valores civilizatórios e a participação esclarecida no processo político e no debate público. Os três Poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário – têm o dever de realizar os direitos fundamentais, na maior extensão possível, tendo como limite mínimo o núcleo essencial desses direitos.” (p.03)
No Artigo 6º da Carta Constitucional os direitos sociais são “[...] a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e a infância, a assistência aos desamparados [..]” (BRASIL,1988, p. 22). Estes direitos visam segurar o mínimo de dignidade ao cidadão e sua participação no Estado Social através do sufrágio.
De acordo com Lênio Luiz Streck, este Estado do Bem-Estar Social trouxe uma importante mudança na forma de se conceber as necessidades básicas dos cidadãos: “[...] desaparece o caráter assistencial, caritativo da prestação de serviços, e estes passam a ser vistos como direitos próprios da cidadania.” (STRECK, 2004, p.56).
Krell (2002) disserta que o Estado mediante leis parlamentares, atos administrativos e a criação real de instalações e serviços públicos, deve definir, executar e implementar, conforme as circunstâncias, as chamadas ‘políticas públicas sociais’ (de educação, saúde, assistência, previdência, trabalho, habitação) que facultem o gozo efetivo dos direitos constitucionalmente protegidos”. (p. 19-20)
O mesmo autor reitera que o artigo 5°, §1°, impõe aos órgãos estatais a tarefa de ‘maximizar a eficácia’ dos Direitos Fundamentais Sociais e criar as condições , materiais para sua realização.A efetividade, por sua vez, significa o desempenho concreto da função social do Direito, representa a materialização, no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social.
No entanto, nem sempre o Estado assegura os Direitos ditos fundamentais devido a inúmeros fatores, um deles seria o neoliberalismo afirmado por Keller:
[...] o cidadão brasileiro não chegou a ver cumpridas as normas constitucionais instituidoras dos Direitos Sociais, sendo surpreendido pela transferência do campo de produção do Direito, que está saindo do político para o econômico. E o econômico está sendo mais privilegiado do que o social. (KELLER,2001, p.51-52).
A teoria da reserva do possível surgiu na Alemanha no ano de 1972 como resultado da manifestação de alunos que contestavam o direito a ingresso em um curso de medicina na universidade pública. A justificativa para a reivindicação desse direito pelos alunos foi baseada no artigo 12, I da Lei Fundamental Alemã, na qual se propõe que, todos os cidadãos alemães tem o direito de escolha de sua profissão, local para exercê-la, bem como a sua formação.
O Tribunal compreendeu a possibilidade de restrição de acesso aos cursos de medicina, pois de acordo com a Constituição Alemã os direitos sociais estão sob a reserva do possível para propor o que cada cidadão pode exigir do Estado. Portanto, segundo Farsarella, “[...] foi empregada a expressão reserva do possível para se sustentar que não é possível conceder aos indivíduos tudo o que pretendem, pois há pleitos cuja exigência não é razoável.” (FARSARELLA,2012, p.3)
A doutrina entende razoabilidade como um princípio outorgado por Lei que visa impedir os abusos de poder provocados por seus agentes, ou seja, objetiva garantir que nenhuma das partes envolvidas, sejam indivíduos ou Estado, possam abusar de seu poder circunstancial em detrimento de outrem.
Ana Paula de Barcellos relaciona a reserva do possível e a disponibilidade financeira, afirmando que “a expressão reserva do possível procura identificar o fenômeno econômico da limitação dos recursos disponíveis diante das necessidades quase sempre infinitas a serem por eles supridas”. (BARCELLOS, 2011, p. 276). Em sua teoria a autora classifica a reserva do possível em fática e jurídica. A primeira se relaciona com os recursos financeiros. Já, a segunda diz respeito a previsão orçamentária.
Todavia, há autores que veem a reserva do possível não somente relacionada com a existência de recursos para a efetivação dos direitos fundamentais:
[...] em uma constituição como a brasileira, que conhece direitos fundamentais numerosos, sociais generosamente formulados, nasce sobre esse fundamento uma forte pressão de declarar todas as normas não plenamente cumpríveis, simplesmente, como não vinculativas, portanto, como meras proposições programáticas. A teoria dos princípios pode, pelo contrário, levar a sério a constituição sem exigir o impossível. Ela declara as normas não plenamente cumpríveis como princípios que, contra outros princípios, devem ser ponderados e, assim, estão sob uma “reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo pode requerer de modo razoável da sociedade. (ALEXY, 2011, p.69).
Em concordância com o autor acima citado, Sarlet (2008) define a teoria como uma espécie de limite jurídico e fático dos direitos fundamentais. E também afirma, que em determinadas circunstâncias, por exemplo, na hipótese de conflitos de direitos, quando se cuidar da invocação da indisponibilidade de recursos com intuito de salvaguardar o núcleo essencial outro direito fundamental.
De acordo com a literatura pesquisada, entende-se que o Supremo Tribunal Federal enfrenta alegações estatais e que não poderia prestar certos serviços devido as limitações da reserva do possível. Dessa forma, Farsarella afirma que “[...]o Tribunal tem se posicionado pelo afastamento desse argumento, que não poderia justificar o descumprimento pelo Estado de seus deveres na área dos direitos sociais, especialmente nos casos em que o direito pleiteado integra o mínimo existencial”. (FARSARELLA, 2012, p.03).
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