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O CHEQUE NO DIREITO ADMINISTRATIVO

Por:   •  20/6/2020  •  Trabalho acadêmico  •  44.213 Palavras (177 Páginas)  •  196 Visualizações

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Capítulo XIII

CHEQUE

I.NOÇÃO GERAL

1. Disciplina legal. O cheque é disciplinado atualmente pela Lei nº 7.357, de 2-9-85, que entrou em vigor em 3 de setembro de 19951. Entretanto, o legislador não teve liberdade absoluta para dispor sobre o instituto do cheque, em razão de o governo brasileiro ter ratificado as Convenções de Genebra de 1931, que aprovaram a lei uniforme relativa ao cheque. As normas genebrinas foram introduzidas no direito brasileiro pelo Decreto nº 57.595, de 4-1-1966. Assim, o legislador brasileiro só pôde dispor sobre as matérias que não foram regradas pela LUG e quanto às normas genebrinas não necessárias que foram objeto de reservas adotadas pelo governo brasileiro2. O legislador, no entanto, teve de respeitar as normas genebrinas necessárias, porque imprescindíveis ao objetivo da uniformização da legislação sobre cheque (vide cap. II, item III, sobre a cláusula da reserva nas Convenções de Genebra). Considerando que a adoção da reserva confere mera faculdade às Partes Contratantes da Convenção de Genebra, a Lei nº 7.357/85 deixou de exercitar algumas faculdades contidas em determinadas reservas, preferindo manter o sistema uniforme. Assim, por exemplo, o legislador não exercitou a faculdade contida na reserva do art. 18 do Anexo II da LUG, que lhe permitiria optar pela introdução em nosso direito do cheque cruzado ou do cheque para levar em conta, tendo o legislador preferido manter o sistema da LUG e disciplinar as duas cláusulas nos arts. 44 a 46. A Lei nº 7.357/85 consolidou os princípios da lei uniforme e da legislação anterior sobre o cheque, corrigiu erros de tradução e linguísticos, bem como aperfeiçoou a redação do texto do Decreto nº 57.595/66. Tendo em vista o art. 903 da Lei nº 10.406, de 10-1-2002, não se aplicam ao cheque as normas no novo Código Civil, que, assim, continua sendo regrado por sua lei especial.

O art. 69 da LC ressalvou a competência do Conselho Monetário Nacional, nos termos e nos limites da legislação específica, para expedir normas relativas à matéria bancária relacionada com o cheque. O parágrafo único do art. 69 fixou a competência do CMN para: a) determinação das normas a que devem obedecer as contas de depósitos para que possam ser fornecidos os talões de cheques aos depositantes; b) determinação das consequências do uso indevido do cheque, relativamente à conta do depositante; c) disciplina das relações entre o sacado e o opoente, na hipótese do art. 36 da lei.

2. Função econômica. Todos os autores que escreveram sobre o cheque já ressaltaram a sua importância para a economia moderna, pelas inúmeras vantagens que proporciona ao Estado e aos particulares. Em primeiro lugar, o cheque corresponde a meio de pagamento à vista, viabilizando a retirada de fundos pelo emitente ou terceiro junto a banco ou instituição financeira a ele assemelhada por lei, como verdadeiro título bancário. Além do mais, o cheque permite que sejam efetuados pagamentos a distância pelo envio do título sacado em uma praça para ser pago em outra praça. Em segundo lugar, o cheque funciona também como instrumento de compensação de débitos e créditos, extinguindo diariamente múltiplas obrigações através das Câmaras de Compensação, mediante lançamentos recíprocos de débitos e créditos nas contas do sacador e do beneficiário do cheque. Assim, o emprego do cheque evita a circulação da própria moeda fiduciária3, acarretando economia de tempo e gastos e afastando os riscos do transporte de dinheiro. Em terceiro lugar, o cheque pode servir de instrumento de comprovação de pagamentos, como previsto no parágrafo único do art. 28 da LC. Finalmente, não se pode esquecer que as funções do cheque são mais limitadas que as da cambial, em razão das normas que visam a impedir que o cheque degenere em instrumento de crédito4. Hodiernamente, em decorrência da evolução da informática, o emprego do cheque como instrumento de retirada de fundos vem sendo substituído pelo cartão magnético, de utilização mais rápida e prática.

3. Controle estatal. A relevante função econômica do cheque faz com que o Estado procure fomentar a sua utilização pelo público, mas, em contrapartida, também se preocupe em aumentar a segurança dessa utilização. Desse modo, o cheque é objeto de controle estatal para regular seu aspecto formal (padronização), controlar seu uso para evitar abusos que gerem prejuízos para terceiros, punindo administrativa e penalmente a emissão de cheques sem fundos e a frustração de seu pagamento (CP, art. 171, § 2º, VI, e § 3º), e regular a abertura, movimentação e encerramento da conta-corrente bancária. Esse controle corresponde, na realidade, à intervenção do Estado nas funções dos serviços bancários. O cheque não é papel de curso forçado, porque ninguém é obrigado a recebê-lo contra a sua vontade, mas enquanto vigorou a Lei nº 8.002, de 14-3-1990, era vedada a recusa da venda de mercadoria diretamente a quem se dispusesse a adquiri-la mediante pronto pagamento, e, assim, os cheques visado e bancário eram considerados como pagamento em moeda corrente (art. 1º, § 2º, I). O art. 39, IX, do Código do Consumidor (Lei nº 8.078/90) prescreve: “Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...) IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais”. O cheque não pode ser considerado como “pronto pagamento”, pois traduz apenas ordem de pagamento que o emitente dá ao banco com base nos fundos que se supõe disponíveis em sua conta. Mas pode ocorrer de o banco não poder efetuar o pagamento ao fornecedor de produtos ou serviços, seja por ausência ou insuficiência de fundos, seja pela divergência de assinatura do emitente ou, ainda, pelo encerramento da conta.

4. Conceito e características do cheque. A lei não define o instituto do cheque, porque essa tarefa não é de competência do legislador, e, por isso, cabe à doutrina conceituá-lo. Tomando-se por base a Lei nº 7.357/85, cheque é o título cambiário abstrato, formal, resultante de mera declaração unilateral de vontade, pelo qual uma pessoa, designada emitente ou sacador, com base em prévia e disponível provisão de fundos em poder de banco ou instituição financeira a ele assemelhada por lei, denominado sacado, dá contra o banco, em decorrência de convenção expressa ou tácita, uma ordem incondicional de pagamento à vista, em seu próprio benefício ou em favor de terceiro, intitulado tomador ou beneficiário, nas condições estabelecidas no título (LC, arts. 1º, 2º, 3º c/c 67, 4º, 9º e 32).

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