O Direito Administrativo da Regulação
Por: Thales Rossato • 4/11/2021 • Resenha • 2.360 Palavras (10 Páginas) • 120 Visualizações
Departamento de Direito Público e Filosofia do Direito
Direito Administrativo da Regulação
Prof. Rafael Maffini
Alunos: Diogo Trasel Bernardes – 116622
Thales Bevilaqua Rossato – 324851
I – Relatório
O presente trabalho irá tratar sobre o julgamento da ADI 4874/DF pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que teve como relator a Ministra Rosa Weber. A ADI foi posposta pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em face do Presidente da República e do Congresso Nacional. Foi julgado pelo Tribunal Pleno do STF no dia 01/02/2018.
Em apertada síntese, o objeto dessa ADI foi questionar a legalidade do art. 7º, III e XV, parte final, da Lei nº 9.782/1999 e da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) da ANVISA nº 14/2012, por suposta ofensa aos Arts. 1º, caput e IV, 2º, 5º, II, XXIX, XXXII e LIV, 37, caput, 84, IV, e 170, parágrafo único, da Constituição da República.
No que tange à Lei nº 9.782/1999, a CNI argumenta que o seu art. 7º, XV, parte final, possui abertura semântica em demasia, o que estaria levando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) a atuar de modo incompatível com a ordem constitucional, inflacionando o próprio poder normativo ao ponto de “proibir, em caráter genérico e abstrato, a fabricação e a comercialização de produtos e insumos submetidos à fiscalização sanitária”.
Para fundamentar essa tese, a CNI argumenta que os arts. 2º, 5º, II, e 37, caput da Constituição da República vedam a delegação de poder normativo desacompanhada de critérios claros e obrigatórios para o seu exercício, a caracterizar a chamada delegação legislativa “em branco”; e, também, a restrição ao princípio da livre iniciativa pressupõe que, a teor dos arts. 1º, IV, e 170, parágrafo único, da Lei Maior, qualquer proibição de uma atividade econômica, em caráter geral e abstrato, só pode ser legitimada por lei em sentido formal, competência esta que cabe ao Congresso Nacional.
Em relação à Resolução nº 14/2012, a CNI argumenta que a ANVISA a editou com fulcro no dispositivo legal impugnado anteriormente. Explicita ainda que tal Resolução se trata de um ato normativo de caráter genérico e abstrato, que proíbe a importação e a comercialização de produtos fumígenos derivados do tabaco que contenham “qualquer substância ou composto, que não seja tabaco ou água, utilizado no processamento das folhas de tabaco e do tabaco reconstituído, na fabricação e no acondicionamento de um produto fumígeno derivado do tabaco, incluindo açúcares, adoçantes, edulcorantes, aromatizantes, flavorizantes e ameliorantes”.
Noutro giro, a Presidência da República defendeu a improcedência da ação, sustentando, em síntese, que “as normas guerreadas são idôneas, necessárias e proporcionais, e que não violam o princípio da isonomia ou da liberdade na ordem econômica”.
O Senado Federal assevera que “não há (…) qualquer irregularidade na
Lei Federal 9.782/99, se mostrando atual ao seu tempo”. Referiu inviável,
ainda, a impugnação autônoma da RDC 14/2012 pela via da presente
ação direta.
O Advogado-Geral da União (AGU) manifestou-se pelo conhecimento
parcial da ação direta e, no mérito, pela improcedência do pedido
deduzido pela requerente, “devendo ser declarada a constitucionalidade do
inciso XV do artigo 7º da Lei Federal nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, bem como da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) da ANVISA nº 14, de 15 de
março de 2012”.
O AGU argumenta que o poder normativo atribuído à ANVISA abrange a edição de “atos infralegais dotados das características de generalidade e
abstração”, por se tratar de “importante mecanismo técnico-jurídico para a
Administração desempenhar seu papel constitucionalmente reservado”. Pontua
que a RDC nº 14/2012, “ao controlar e regulamentar um produto
comprovadamente nocivo”, não consubstancia inovação de conteúdo legal,
tampouco abuso de poder regulamentar, uma vez lastreada na premissa
constitucional da proteção da saúde.
O Procurador-Geral da República opina pela improcedência da
ação direta de inconstitucionalidade. Ele afirma que é “possível a elaboração de
normas com caráter geral e abstrato pelas agências reguladoras, inovando no
ordenamento jurídico, intervindo nos diversos setores da economia e atuando de
maneira criativa, e não, simplesmente, reproduzindo os comandos legais, desde
que pautada no conjunto de princípios, diretrizes e standards destinados à sua
área de atuação pelo legislador ordinário e pela Constituição da República”
Quanto ao julgamento, entre os Ministros venceu a tese de que se insere no poder geral de polícia da Administração sanitária a competência para editar atos normativos visando à organização e à fiscalização das atividades reguladas. Copio parte do voto da relatora: “Qualifica-se, a competência normativa da ANVISA, pela edição, no exercício da regulação setorial sanitária, de atos: (i) gerais e abstratos, (ii) de caráter técnico, (iii) necessários à implementação da política nacional de vigilância sanitária e (iv) subordinados à observância dos parâmetros fixados na ordem constitucional e na legislação setorial.”
Os Ministros também elucidam que a liberdade de iniciativa (arts. 1º, IV, e 170, caput, da Lei Maior) não impede a imposição, pelo Estado, de condições e limites para a exploração de atividades privadas tendo em vista sua compatibilização com os demais princípios, garantias, direitos fundamentais e proteções constitucionais, individuais ou sociais, destacando-se, no caso do controle do tabaco, a proteção da saúde e o direito à informação. O risco associado ao consumo do tabaco justifica a sujeição do seu mercado a intensa regulação sanitária, tendo em vista o interesse público na proteção e na promoção da saúde.
Nesse diapasão, a maioria do plenário reconheceu a competência específica da ANVISA para regulamentar os produtos que envolvam risco à saúde (art. 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999) e que isso necessariamente inclui a competência para definir, por meio de critérios técnicos e de segurança, os ingredientes que podem e não podem ser usados na fabricação de tais produtos. Nessa linha, reconhecem o suporte legal à edição do RDC nº 14/2012, no que proíbe a adição, nos produtos fumígenos derivados do tabaco, de compostos ou substâncias destinados a aumentar a sua atratividade.
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