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O Fichamento Genealogia da Moral - Nietzche

Por:   •  13/5/2019  •  Ensaio  •  2.455 Palavras (10 Páginas)  •  329 Visualizações

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DFD 0312 | Filosofia do Direito II

Prof. Ari Solon

Aula 08 – Dostoievski e Nietzsche (06/10/2017)

Relatoria (Ana Carolina Guiname Santos, Eric Imbimbo, Isabella Scuotto, Rafaela Marsola)

NIETZSCHE, Friedrich. Genealogia da moral. Segunda dissertação – “Culpa”, “má consciência” e coisas afins

  1. Homem/Sujeito (consciente) como aquele capaz de fazer asserções normativas, dotadas de autoridade e/ou responsabilidade.
  1. Responsabilidade como qualidade daquele capaz de fazer promessas (fazer disposições sobre o futuro).
  2. Para tornar o homem dotado de responsabilidade, foi necessário um longo processo para torna-lo confiável, processo este conduzido pela moralidade e pela camisa de força social 
  1. Responsabilidade como fim de um processo de inscrição no homem de um novo instinto (o de ser responsável), processo este conduzido sob a forma da mnemotécnica
  1. Instrumento de criação deste novo instinto, instrumento capaz de gravar na memória, através da dor, a necessidade do agir responsável e confiável, ou, em outras palavras, do agir racional este é o local onde resta o direito
  1. Agora, qual a origem dos conceitos contrários ao de consciência e responsabilidade, isto é, da “má-consciência” e da “culpa”?
  1. Nada tinha a ver com uma punição que se volta contra uma ação de um homem dotado de livre-arbítrio, mas estava relacionada a uma relação retributiva, quase de causa e efeito, entre um dano causado e uma retribuição equivalente.
  2. Essa relação de causa e efeito entre dano e retribuição não possui sua origem em qualquer conceituação de justiça, mas sim na de dívida, origina-se, isso sim, da relação entre credor e devedor.
  3. Punição (ou melhor, a possibilidade de uma punição em caso de não adimplemento da dívida) como forma prévia de inscrever na memória do devedor a promessa feita ao credor (mnemotécnica).
  4. Qual a lógica da punição como forma de reparação da promessa (dívida) não cumprida? Substituir-se a vantagem relacionada ao dano (o dinheiro emprestado e não restituído, por exemplo) por uma satisfação intíma por parte do credor, satisfação esta que nada mais é a de poder fazer sofrer o devedor, poder maltrata-lo e feri-lo
  1. Os conceitos de “dever” e “culpa” (e de “sacralidade do dever” e de “consciência”), portanto, tem origem na esfera das obrigações legais. Origem está sangrenta e violenta, pois se deu pela compensação do dano pelo prazer de fazer sofrer
  2. Hoje, há de se ver com maus olhos tal prazer oriundo do fazer sofrer e da crueldade. Trata-se de concepção negativa sobre os efeitos da moralidade, como forma de supressão dos instintos naturais do homem.
  3. A estrutura da “culpa”, oriunda da relação entre credor e devedor, foi, posteriormente, transposta para a relação entre a comunidade e seus membros.
  4. Justiça como imposição dos fortes (dos homens de ação, ativos, agressivos) sobre os fracos e reativos. O direito (e a justiça) como a imposição de uma ordem que visa inibir os sentimentos reativos (reações essas contra a atuação agressiva dos homens de ação, os próprios que instituem o direito) e impor um acordo.
  5. No que concerne a origem do castigo, há algo duradouro, isto é, o ato de castigar, o procedimento (uma sequencia de atos) pelos quais se realiza o castigo, e há algo fluído, o sentido que se atribui ao procedimento de castigar, o fim almejado com este procedimento. Reconhece-se, também, que o procedimento é mais antigo do que o sentido a ele atribuído.
  1. Talvez o principal sentido atribuído ao castigo é o de despertar no ofensor o sentimento de culpa, isto é, criação da mà-consciência e do remorso. Trata-se, porém, de concepção bastante distante da realidade, pois endurece, torna frio, distancia e aumenta a força de resistência, e tem como resultado a intensificação do medo.
  2. A má-consciência, portanto, deve ter outra origem. Sua origem é a ruptura, o afastamento dos homens de seus instintos naturais a partir do momento que se inseriu em uma sociedade pacífica regulada pela moral dos costumes.
  3. Tal ruptura não foi um processo gradual ou voluntário, mas resultado de coerção, que teve início e foi conduzida de forma violenta. O surgimento do antigo Estado, assim, nada mais foi que uma tirania, capaz de moldar e amansar o homem, suprimindo seus instintos
  1. A já citada relação de direito privado entre credor e devedor se manifestou também em outra espécie de relação humana, a saber, entre os vivos e seus antepassados. Criou-se um sentimento de dívida dos vivos para seus antepassados, que, por seus sacrifícios e realizações tornaram possível a existência da comunidade onde os vivos se encontram. Em troca, isto é, a dívida dos vivos para com seus antepassados se apresenta na obediência aos costumes e tradições 
  1. A lógica de endividamento, e, portanto o sentimento de culpa em relação em relação a seus antepassados/divindades (equivalência feita no ponto anterior), tornou-se cada vez maior com o passar do tempo, culminando no surgimento do Deus cristão, cujo “advento (...) trouxe também ao mundo o máximo sentimento de culpa”. O homem cristão vive assolado pelo sentimento de uma dívida para com Deus, e seus instintos naturais, os quais busca reprimir, são formas pelos quais viola seu acordo com Ele, causando a culpa e a má-consciência.

DOSTOIEVSKI, Fiódor. Memórias do Subsolo. Parte I – O subsolo

  1. O personagem se define como um homem doente, que sofre do fígado, imagina, porque sente amargura o tempo todo. Percebe-se que o homem do subsolo é um ser extremamente repulsivo, amargurado e autodestrutivo, e que se vangloria de ter uma consciência hipertrofiada.
  2. Pode-se conceber a doença desse personagem como característica de uma época em que o homem é tido como fraco, pois nele não vibram mais as forças vitais autênticas, somente uma debilidade marcada por exagero, desproporção e desarmonia.
  3. Enquanto funcionário público, conta que sempre que lhe solicitavam informações ele respondia “com um ranger de dentes” e sentia prazer em magoar os solicitantes.  De acordo com a personagem, a despeito deste prazer em magoar, nunca foi mau e nunca conseguiria ser, sempre guardou o sentimento dentro de si.
  4. Para ele, uma pessoa inteligente deve ser impreterivelmente sem caráter. E nesses exemplos, sua narração é repleta de contradições. Em um momento orgulha-se de possuir um intelecto acima da média; em outro expõe claramente possuir uma baixíssima autoestima.
  1. E esse sentimento de inferioridade faz nascer um desejo compensatório de superioridade, que pode se tornar patológico. O caso do personagem, sem dúvida alguma é esse, afinal ele insiste que seu rosto deveria demonstrar sobretudo inteligência, que seria uma maneira de se impor aos outros. Quando não há realização do desejo de se impor, resta então o reino da imaginação, e está aberto o caminho para as neuroses. Uma delas é a disputa imaginária com o oficial e seu sabre, que é contado apenas de passagem no início do livro. Prosseguindo, o narrador escreve que o que mais lhe atormentava era ter completa consciência que no fundo não é uma pessoa má, e isso, novamente, serve como combustível para enraivecê-lo mais ainda…
  1. Ele crê que o ser humano não conhece a si próprio e não consegue definir claramente seus objetivos, regozijando-se mais com o caminho que com o propósito de fato alcançado, pois, no fim das contas, ele teme encontrar aquilo que busca.
  2. Conta o personagem, então, que quanto mais tomava consciência do bom, do belo, do sublime, mais se enraizava em seu rancor e negatividade. O curioso é que tudo isso parecia, para ele, como algo destinado, como se fosse necessário que assim ocorresse. Assim, quase chegou a acreditar que seu estado natural era esta antipatia.
  1. Em termos subterrâneos, a fuga do personagem em tudo aquilo que é belo e sublime representa apenas um caso da desorganização dos valores, ou das pulsões, caso esse expresso pela situação paradoxal de alguém capaz de desempenhar o “último dos papéis. Herói ou imundice”
  1. Ainda que se culpasse e castigasse um pouco pelas infâmias que cometia, este sentimento ruim logo se transformava em prazer. Este prazer era resultado justamente da consciência que ele tinha da própria degradação.
  2. A personagem admite ter grande amor-próprio, e se considera extremamente inteligente. Afirma ter, por isso, consciência de que generosidade é inútil, em conformidade com as próprias leis da natureza. Mas não renunciaria ser generoso, pois não ousaria ser vingativo.
  1. Esses momentos denunciam extrema contradição interna na personagem, a ponto de chafurdar na imundice os momentos em que melhor aprecia todas as sutilezas do belo e do sublime.
  2. Essa existência de estados interiores contraditórios ocorre em estado normal, em um homem marcado pela doença, em que a multiplicidade de impulsos constituíam uma natureza débil.
  1. Para o autor o homem “normal”, estúpido, (os homens de ação), se deixam levar pela vingança e apenas objetiva isso. A personagem, que não é um homem de ação, inveja esta burrice.
  2. A vingança para os homens de ação é um ato de justiça, mas, para o autor não se trata de um ato de justiça, mas uma soma de torpezas justificadas por fatos inverossímeis que os homens de ação criam para si.
  1. A vingança, conclui, é mais negativa para o que a faz, trazendo mais males para o que a conduz do que à vítima, pois aquele irá se lembrar das atrocidades em seu leito de morte. Homens de ação não percebem a sutileza disto e, portanto, se vingam.
  2. Não há como se romper o “muro de pedra”, as leis da natureza e da matemática, de modo que há contra quem ter rancor, contra quem se vingar.
  3. O personagem sem nome, infeliz, planeja crimes de vingança, mas volta atrás por culpa ou covardia, não consumando o crime. É a evidente arrogância silenciosa e incapacidade para agir.
  1. Retomando a vingança, explica que se vingam porque acham justiça na ação, e o fazem porque estão tranquilizados. Se o autor se vingasse seria puramente por maldade – mas ele sequer consegue ser mau.

DOSTOIEVSKI, Fiódor. Os demônios. Apêndice: Com Tíkhon

  1. Marcado pela moral cristã e pelo debate acerca de ateísmo e deísmo, essa presença se faz especialmente importante no capítulo de leitura obrigatória.
  2. “Os Demônios” nasce com a missão de ser um alerta contra a violência praticada por idealistas que acreditam que é justificável qualquer meio para se alcançar um fim, ou até mesmo, quaisquer meios mesmo que não haja um fim.
  3. Rapidamente, as coisas começam a desandar, ficando pesadas, sombrias e nefastas e a duplicidade dos personagens começa a se mostrar.  As motivações das personagens, quando surgem, não são facilmente aceitáveis, e às vezes, não são aceitáveis de forma alguma, causando horror.
  4. No capítulo em questão, ”com Tíkhon”, incluído nesta edição como apêndice (originalmente projetado para ser o capítulo VIII da segunda parte) Nikolai vai visitar o bispo Tíkhon, que se encontra recolhido num mosteiro situado nos arredores da cidade, e faz sua famosa confissão, que é na verdade, a leitura dos panfletos que Nikolai desejava divulgar pela cidade.
  5. Nikolai Stavróguin, o personagem principal, é tido como dono de personalidade sombria, e seu nome suscitam rumores em qualquer lugar que passe; há boatos de que ele já teria cometido assassinato, de que levava uma vida devassa em São Petersburgo e de que teria destruído a vida de muitas pessoas.
  6. “Com Tíkhon”, Nikolai Stavróguin busca o conselho do bispo Tíkhon, pois diz estar sendo atormentado por visões de Demônios durante a noite, e pergunta ao bispo se alguém já teria confidenciado coisa parecida a ele. Tíkhon afirma que sim, que aconteceu somente uma vez e numa ocasião muito específica. Inicialmente, Nikolai fica irritado e receoso de se abrir com Tíkhon, chegando a pensar que o bispo estaria bêbado, mas acaba não aguentando e retira um panfleto do bolso, panfleto esse que descreve minuciosamente as inúmeras atrocidades cometidas por ele mesmo.
  7. A que atormente o personagem, porém, é a ocasião em que Nikolai estuprou Matryosha, uma menina de apenas 10-14 anos, que apanhava muito dos seus pais e vivia no mesmo prédio que ele na época dos fatos, sendo que já havia prestado serviços manuais a ele antes. A menina, doente, foi vítima do crime hediondo praticado por Nikolai, e sem aguentar o tormento de sua vida, sofrendo na mão dos seus pais e do trauma provocado por Nikolai, cometeu suicídio, enforcando-se. Tal evento marcou para sempre o personagem, de forma muito mais profunda do que outros fatos em sua vida.
  8. Apesar disso, Nikolai parece ser movido por uma necessidade de infligir tormento, não somente aos outros, mas também a si mesmo, sendo algo que lhe desperta um prazer extremo, mas também, uma ira extrema. Os sentimentos descritos por Nikolai são contraditórios e beiram o sadomasoquismo.
  9. O personagem sente um prazer grande ao ter consciência de que as coisas que ele faz são erradas, sentindo um prazer especialmente grande em crimes. Porém, é após o estupro e morte de Matryosha, que a consciência de Nikolai parece pesar, passando a infligir crueldades em si mesmo.
  10. Tíkhon diz que o panfleto, contando com a confissão dos piores atos de Nikolai, consiste numa necessidade de um coração que está ferido de morte, uma necessidade natural de confessar.
  11. Tíkhon entende profundamente o caráter de Nikolai, percebendo que este busca não o perdão das pessoas, mas sim, o arrependimento, o horror e desprezo de todos, e que o perdão do bispo o faria feliz, mas que a humilhação do povo traria grande prazer.
  12. Nikolai reconhece que a visão dos seus demônios apenas desaparecerá quando um sofrimento desmedido acometer-lhe e que ele mesmo o procura esse sofrimento, vide os panfletos que planeja distribuir, confessando seus pecados e dando seu nome ao final.
  13. O capítulo mostra como Stavróguin acredita que está além do alcance de Deus, por isso ele não sente remorso de suas ações. Nikolai diz que ele não conhece e não sente nem o bem, nem o mal, e que ele não apenas perdeu a capacidade de sentir ambas as coisas, mas que sabe que não existe nem o bem, nem o mal. Por isso, quando Nikolai confronta Tíkhon, é como se dois polos opostos se tocassem, pois Tíkhon acredita em Deus e que acredita que há perdão até mesmo para pessoas como Nikolai, e ao ouvir sua confissão, percebe que Nikolai apenas quer tornar seus pecados públicos porque deseja se sentir humilhado, ato que lhe traria imensurável prazer.  
  14. O capítulo é um dos mais impressionantes e escancarados retratos de uma consciência que tortura a si mesma pela própria inexistência, sendo considerado um capítulo filosófico e voltando para questões como niilismo, justiça e consciência.

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