O RACISMO E A INTERPRETAÇÃO DA CORTE CONSTITUCIONAL
Por: rodrigopunp • 13/9/2018 • Trabalho acadêmico • 1.583 Palavras (7 Páginas) • 201 Visualizações
Rodrigo Lima Guedes
Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-PR
1. INTRODUÇÃO
Siegfried Ellwanger, escritor e editor, foi condenado pelo crime de anti-semitismo e por divulgar material anti-semita. Nos termos da norma do artigo 20 da Lei 7.716/89 praticar, induzir ou incitar a discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional é crime punido com pena de reclusão de 1 à 3 anos e multa.
Durante o julgamento, é posto em análise qual o melhor entendimento sobre o que pode ser considerado racismo, fugindo do método usual, e quais são os limites da liberdade de expressão.
2. O CASO
Ellwanger foi denunciado pelo crime de racismo contra judeus em 1991, porém foi absolvido em primeira instância. No dia 31 de Outubro de 1996, o TJ/RS prosseguiu com o caso e impôs a pena de 02 anos de reclusão com suspensão condicional da execução da pena. O fundamento da denuncia era de que o escritor teria feito apologias a ideais preconceituosos contra o povo judeu, com a publicação de diversos livros como ‘’Holocausto: Judeu ou Alemão?’’.
A defesa do réu fez um pedido de Habeas Corpus, o argumento seria que judeus não eram uma raça, portanto não poderia ser configurado racismo. O debate consistia, também, na argumentação de que, se houvesse crime, sobre este ocorrera a prescrição da pretensão punitiva, visto que o prazo já havia se esgotado.
No entanto, de acordo com a Constituição Federal, artigo 5º XLII explicita que “a prática de racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”, ainda assim, restava discorrer se o caso podia ou não ser considerado racismo para a aplicabilidade da lei.
O plenário do Tribunal, ao debater se o suposto crime cometido por Ellwanger, anti-semitismo (em outras palavras, o preconceito e a hostilidade contra os judeus), enquadra-se como racismo, tendo em vista que judeus não são classificados como uma raça, considerou que não existem subdivisões biológicas na espécie humana, e que qualquer separação do tipo, seria meramente derivado de um âmbito político-social. O tribunal sustenta, ainda, que a discriminação contra os judeus, tem como fonte o pensamento do nacional-socialismo que caracteriza judeus como uma raça inferior, sendo os arianos a raça que prevalece. Faz-se um paralelo com o Brasil, explicitando que esse tipo de pensamento é inadmissível e burla os padrões éticos e morais da Constituição do Brasil, e até mesmo do mundo.
O STF conclui ainda que, como qualquer direito individual, a liberdade de expressão tem limites, e pode ser deixada de lado a partir do momento em que ultrapassa os limites da moral. Dessa forma, houve o afastamento dessa garantia de liberdade de expressão, colocando acima disso, de acordo com os ministros do supremo, a dignidade humana.
3. VOTOS
Ministro Moreira Alves:
Em seu voto, o ministro entende que “os judeus não podem ser considerados uma raça”, assim não se enquadra no art. 5º, XLII. Para fundamentar isso, explicita que diversos antropólogos judeus não consideravam estes como uma raça. Dessa forma, o magistrado decide deferir o Habeas Corpus.
Ministro Mauricio Corrêa:
Diferente de Moreira Alves, nega o HC argumentando que os conceitos de raça não estão mais presos a um conceito biológico, e sim de um processo politico-social, e esse se origina da “intolerância dos homens”.
Ainda cita os livros publicados pelo réu, que ao seu ver incita a prática de discriminação contra os judeus, pois em seu conteúdo procuram negar o holocausto e rebaixar os judeus. Por fim, o ministro cita diversas fontes que comprovam que o holocausto e a perseguicao ao povo judeu de fato aconteceu, contrariando o pensamento de Ellwanger, optando por indeferir o HC.
Ministro Celso de Mello:
Acompanhando o voto anterior, o ministro ressalva que é impossível esquecer os danos causados pelo partido nacional socialista, e mostra que com o término da guerra a sociedade ganhou em vários aspectos, tendo como principal a Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana.
Além disso, relembra que a liberdade de expressão, embora seja uma garantia individual, se limita ao ponto que infrinja a lei. De tal modo, Celso de Mello decide por indeferir o HC e condenar o réu.
Ministro Gilmar Mendes:
O ministro também acompanha o voto, no mesmo entendimento do Ministro Mauricio Corrêa por entender que o racismo é caracterizado por conceitos históricos e culturais, e que nisso estava incluso o anti-semitismo.
Constata também, que não há duvidas de que o livro tem possibilidade de ser um instrumento de discriminação.
Ministro Carlos Velloso:
Também negou o pedido de Habeas Corpus, usando a mesma lógica dos ministros anteriores, considerando anti-semitismo uma forma de racismo, e como fundamento, cita os livros do próprio Sigfried Ellwangern (que em sua defesa nega que judeus são uma raça), onde constam trechos que judeus são classificados como raça, como ˜inclinação racial e parasitária dos judeus”.
Ao caracterizar racismo como não apenas uma agressão contra raças, mas sim como qualquer comportamento preconceituoso e discriminatório a um determinado grupo, o Magistrado destaca que a liberdade de expressão não pode estar acima da dignidade humana.
Ministro Nelson Jobim:
Opta por indeferir o HC, baseando-se nos votos anteriores e no debate gerado pela problemática. Julga que o réu utilizou dos livros como instrumento para produzir e distribuir o anti-semitismo.
Ministra Ellen Gracie:
A ministra tomou a mesma linha de pensamento dos votos anteriores, indeferindo o Habeas Corpus, ao citar o Congresso da Unesco, onde todos são considerados iguais e existe uma só raça, a humana. Cita também o artigo 5º, inciso XLII da Constituição Federal, que embora esteja escrito a definição bruta de racismo (crime contra a raça), devemos abrir uma discussão sobre o que, de fato, é considerado uma raça.
De acordo com a Magistrada, “racismo é o preconceito contra a cultura histórico-social transmitida numa sociedade, que inclui padrões de comportamento artístico, social, ideológico e religioso”. No caso em questão, a ministra crê que o réu demonstrou que considera os judeus como um povo inferior, assim cometendo discriminação.
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