Súmula vinculante e a linguagem do direito
Por: Renata Uchoa • 9/11/2018 • Trabalho acadêmico • 3.601 Palavras (15 Páginas) • 167 Visualizações
Súmula vinculante e a linguagem do direito
Alexandre Janini
SÃO PAULO –
A presente abordagem sobre o tema sugerido será apresentada aos eleitores por partes, que se desenvolverão com ajuda e apoio de todos. É absolutamente despretensiosa e visa tão somente a fornecer aos interessados um estudo básico e, sobretudo, a estimular a reflexão e o desenvolvimento desse mesmo estudo, por intermédio da consulta de outras fontes mais aprofundadas.
Para todos nós, o dia 17 de novembro de 2004 certamente ficará na história do Judiciário brasileiro, em razão da aprovação o texto da PEC (Proposta de emenda constitucional), que teve como objetivo iniciar uma “reforma no Poder Judiciário brasileiro”.
Ainda falta muito a ser realizado nesse sentido, como, por exemplo, reformar os códigos de processo, instituir limitação de recursos e efetivar aplicabilidade da litigância de má-fé e do abuso do direito, oferecendo aos jurisdicionados, dessa forma, uma Justiça mais célere. Somente assim poderemos afirmar que ocorreu uma verdadeira reforma no Poder Judiciário brasileiro.
Discussões acerca da propalada reforma perduraram por longos 13 anos no Congresso. Por mais difícil que seja a compreensão dessa demora, ela se faz necessária: é a maturação natural das idéias para que se possa instituir qualquer tipo de mudança na cultura de um povo, para criar novas disciplinas de comportamento humano para o convívio social.
Desse início de reforma, a Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, instituiu, dentre outras coisas, a súmula vinculante, que vem disposta no novo artigo 103-A da Constituição Federal de 1988, que em rápidas palavras seria: “Um sistema que obriga todas instâncias a seguir uma decisão do Supremo Tribunal Federal, desde que tenha sido aprovada por 8 (oito) dos 11 (onze) Ministros que a compõe. Voltada principalmente para os juízes de primeira instância”.
“Artigo 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1° - A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e administração pública que acarrete grave insegurança e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
§ 2° - Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.
§ 3° - Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a sumula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”.
Podemos afirmar que a súmula vinculante instituída no Brasil segue ou seguia os mesmos modelos do sistema legal que a maioria dos Estados da Federação norte-americana possui, qual seja, o uso dos precedentes para que não haja mudança de opinião dos juizes. Dizemos seguia, porque o princípio do stare decisis está sofrendo modificações e sendo extinto em alguns Estados, porquanto já não podemos afirmar que o Brasil está seguindo esse modelo de tradição do common law inglês.
A cultura jurídica americana, conforme a melhor doutrina comparada, afirma que, embora o uso da doutrina do stare decisis tenha sido herdado da tradição inglesa do common law, os Estados Unidos, gradualmente, deixou e está deixando de seguir os precedentes ingleses e formaram um sistema jurídico baseado no direito casuístico, pois a mantença desse sistema estava apresentando mais desvantagem do que benefícios, conforme verificaremos na seqüência.
De qualquer forma, necessário se faz conhecermos um pouco mais sobre o princípio do stare decisis. Essa doutrina é conhecida como aplicação do precedente e estipula que, uma vez proferida decisão por um tribunal, os casos subseqüentes que apresentem fatos semelhantes deverão ser decididos de maneira consentânea com a decisão anterior. Tal regra é seguinda até ulterior modificação ou cancelamento; é, pois, uma questão política das Cortes em manterem o precedente sem interferir nos casos que se sucedem, de questões já decididas em casos anteriores.
A aplicação do princípio do stare decisis não se apresenta simples. Ao contrário, é um fenômeno complexo cuja aplicação reflete prudência e um enorme exercício de discrição judicial, ou seja, maior detalhamento nas fundamentações e motivações dos juizes. Destque-se que nada impende os mesmos de decidirem que determinado caso seja considerado não vinculante, pois diferente quanto aos fatos da anterior. Aqui adentraríamos num campo que vem sendo muito bem estudado, o problema das fontes do direito no giro lingüístico, a qual tem como timoneiro atualmente no país o professor Paulo de Barros Carvalho, titular da USP e PUC/SP.
A doutrina do uso do precedente no sistema legal norte-americano possui limites na sua aplicação, não se afigurando uma regra inflexível. Existem por lá inúmeros mecanismos mediante os quais impedem ou fazem com que os tribunais deixem de aplicar uma decisão anterior, como bem pondera o professor Toni M. Fine, da New York University School of Law. Vejamos as hipóteses:
i) quando o caso anteriormente decidido envolver uma questão de direito distinta;
ii) quando o escopo do caso anteriormente decidido for tão limitado que não se aplica ao caso em pauta;
iii) quando os fatos do caso anteriormente decidido forem distintos daqueles a que se refere o caso atual;
iv) quando rejeitarem a decisão anterior porque o princípio nela inserido: a) deve ser revogado; ou b) tal decisão reflete dicta, isto é pronunciamento e opiniões do juiz encontrado no bojo da motivação e decisão judicial (sentença ou acórdão) e que, pois não se constituem no seu dispositivo.
Na ausência de precedentes diretos abrangendo determinado sub judice, segue a liberdade do tribunal para decidir a questão com base nos princípios da razoabilidade/equidade e justiça. É de bom alvitre ressaltar que estamos cuidando do sistema legal norte-americano, para que não haja confusões.
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