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Voto Ministro Marco Aurélio - Caso Ellwanger

Por:   •  23/11/2019  •  Trabalho acadêmico  •  2.066 Palavras (9 Páginas)  •  336 Visualizações

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RESENHA

Habeas Corpus 82.424-2 Rio Grande do Sul

Voto Ministro Marco Aurélio

Trata-se de um pedido de Habeas Corpus, impetrado pelos advogados Werner Cantalício João Backer e Rejana Becker, em benefício de Siegfried Ellwanger, contra o acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que permaneceu com a condenação imposta ao paciente atribuída pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mantendo a negação ao afastamento de imprescritibilidade uma vez que fora condenado ao crime de racismo, pelo artigo 20 da Lei nº 7.716/89, com redação dada pela Lei nº 8.081/90.

Da denúncia consta a edição e distribuição de obras brasileiras e estrangeiras cujo conteúdo são mensagens antissemitas, incitando e induzindo a discriminação racial, ensejando pensamentos e sentimentos preconceituosos contra o povo de origem judaica.

Em primeira instância, o pedido do Ministério Público foi julgado improcedente, com sentença que prevaleceu a tese de liberdade de expressão.

Insatisfeito, o Ministério Público recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e este condenou o paciente à pena de reclusão de dois anos, com sursis por quatro anos e à destruição de todo material apreendido.

Remetido ao Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus não restou frutífero, vencido o ministro Edson Vidigal, que entendeu ser a prática condenável, não podendo ser a imprescritibilidade afastada, pois o racismo, para ele, não poderia ser abstraído. Ressaltou que não houve ilegalidade na condenação e, portanto, não havendo motivos para prover a ordem suscitada pelos advogados.

De acordo com os impetrantes, o paciente foi condenado pelo crime de discriminação, tipificado pela Lei nº 7.716/89 e não pelo racismo, configurado pelo artigo 5º, XLII, da Constituição Federal, este sim, imprescritível. Requerem que seja suspensa a condenação imposta ao paciente, alegando que os judeus não são uma raça, portanto, não podendo se falar em crime de racismo.

O julgamento iniciou-se em 12 de dezembro de 2002, no qual o relator ministro Moreira Alves deu procedência ao pedido dos impetrantes, afirmando que os judeus não formam efetivamente uma raça, mencionando no parecer do rabino Henry I. Sobel, feito em fevereiro de 1998. Este, por sua vez, alegou ser raça uma designação biológica, não sendo os judeus uma raça, e sim, um povo.

Com base nisso, entendeu o relator que, uma vez aplicada a legislação e condenado ao crime de discriminação, a prescrição já teria ocorrido, deferindo assim, a extinção da punibilidade do paciente.

Em 9 de abril de 2003, o julgamento fora retomado e os ministros Maurício Corrêa e Celso de Mello se posicionaram em desfavor ao pedido dos impetrantes, alegando que o conceito de raça não pode ser interpretado exclusivamente biológico, estendendo-se à Sociologia e à Antropologia.

O ministro Gilmar Mendes, em 26 de junho de 2003, deu andamento ao julgamento, reconhecendo que o entendimento quanto às diferentes raças humanas não mais subsiste. Assegurou que diante do conflito entre a liberdade de expressão e a dignidade da pessoa humana, é necessário que se faça ponderar partindo do principio da proporcionalidade, revelando os subprincípios que dele são gerados, tais como o da adequação, da proibição do excesso e da proporcionalidade em sentido estrito.

Neste momento, o ministro Marco Aurélio requereu ter a vista dos autos, porém, o ministro Carlos Britto manifestou querer revelar seu pronunciamento imediato e, na mesma sessão, transformou seu pedido de vista em mesa em regimental.

Mesmo perante uma duplicidade de pedido de vista, formulado por Marco Aurélio e Carlos Britto, os demais deram continuação no julgamento, e obtendo votos antecipados dos ministros Carlos Velloso, Nelson Jobim, Ellen Gracie e Cezar Peluso, que denegaram a ordem.

Em 27 de agosto de 2003, Carlos Britto votou deferindo a ordem, após leitura da obra que ensejou a condenação, fazendo reflexões a respeito do direito à liberdade de expressão, em que conclui ter o autor mera intenção de expor sua ideologia, o que não é defeso por lei.

Ellwanger ainda, segundo Britto, em nenhum momento de sua escrita falou de arianismo ou superioridade da raça alemã, tampouco sobre inferioridade dos judeus, embora ao citar certos fatos a respeito da Segunda Guerra Mundial revelar simpatia a Adolf Hitler e se posicionar do lado germânico.

Na sequência, o ministro Marco Aurélio reiterou seu pedido de vista, demonstrando seu interesse em refletir sobre o tema abordado na ação, entendendo ser de grande importância os assuntos constitucionais democráticos, tais como a liberdade de expressão e a liberdade de informação. Recebeu o processo para examiná-lo em 23 de agosto de 2003, e deu seu voto em 12 de setembro do mesmo ano.

Ele inicia por observar e condenar a censura, em suas diversas formas, como cita: “[...] direta ou indireta, prévia ou posterior, administrativa ou judicial”. Citou alguns feitos da história ao longo do tempo, como o “Licensing Act”, uma censura prévia imposta pela Inglaterra em 1695. Ainda lembra a Declaração dos Direitos de Virgínia, de 1776, o qual afirma que a liberdade de imprensa não pode ser restringida, a menos que por governos arbitrários.

Ademais, lembra da Constituição Americana de 1787, que prevê a não legislação que proíba ou restrinja direitos de liberdade, livre exercício de cultos religiosos, direito de reunião ou de pedidos diretos ao Governo para reparação de danos. Remete à França, que em 1789, com a Declaração dos Direitos do Homem, declarou-se favorável à liberdade de manifestação do pensamento.

Adverte a criação da Organização das Nações Unidas, em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, igualmente versando sobre a liberdade de opinião e expressão, o que inclui a transmissão de ideias por qualquer forma. Assim como em 1950, em Roma, que protegeu esse direito no Convênio Europeu. O Pacto de São José da Costa Rica, tornou um direito a liberdade de expressão e pensamento, significando-os como a “liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda índole, sem consideração de fronteiras”.

 Assevera o período de escravidão no Brasil, relembrando que Rui Barbosa, na época em que era Vice-Chefe do Governo Provisório e Ministro da Fazenda, determinou que os documentos referentes ao período escravocrata fossem destruídos, com a intenção de abrandar a história e evitar pedidos de ressarcimentos.

Condena o então ministro, porque tal atitude definharia a história brasileira, impedindo que as gerações futuras pudessem estudar a memória do País, não permitindo assim, que desenvolvessem consciência baseada nessas fontes.

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