O Poderoso Chefão e a Ciência Política
Por: Mariana A Tavares • 11/3/2019 • Ensaio • 1.893 Palavras (8 Páginas) • 179 Visualizações
“Se a economia do mundo do século XIX foi formada principalmente sob a influência da revolução industrial britânica, sua política e ideologia foram formadas fundamentalmente pela Revolução Francesa.” (HOBSBAWM P. 38) É incontestável a relevância da Revolução Francesa, e da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão - originada através dela -, para a História Mundial. A Revolução foi responsável por fomentar diversas agitações políticas que resultaram na crise dos antigos regimes, dando espaço a uma tendência política com viés mais liberal. O pensamento liberal, associado aos ideais iluministas, consistiu em um fator chave no desencadeamento de inquietações populares e na explosão de guerras de independência. Posto isso, é importante analisar como esse evento histórico foi capaz de influenciar movimentos não só no território europeu - como também em terras além-mar -, bem como as independências na América Latina.
Um dos primeiros reflexos da Revolução Francesa em territórios americanos foi a independência do Haiti, uma das mais importantes colônias francesas. A Revolução Haitiana, como também é chamada, teve seus primeiros passos com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Baseada principalmente nas ideias de Locke e Rousseau - pensadores liberais -, a Declaração assegurava a propriedade privada e afirmava que todos os homens eram iguais perante à lei. Dessa forma, os haitianos “interpretaram que eles também deveriam adotar os ideais revolucionários de igualdade, liberdade e soberania”. (MOREIRA, QUINTEROS, SILVA P. 29) No entanto, tal interpretação não foi bem vista entre os proprietários de terras e escravos da ilha, ainda chamada de São Domingos.
Por conseguinte, aproveitando-se da Revolução, cada setor da sociedade colonial haitiana defendia seus interesses: “para os brancos latifundiários e comerciantes, a conjuntura histórica significava a possibilidade de independência, mas sem mudar a ordem social escravista. Já para a população negra transformou-se em um grito de liberdade.” (MOREIRA, QUINTEROS, SILVA P. 30) Isso implica dizer que mesmo defendendo ideais liberais, os dois setores da sociedade haitiana não estavam do mesmo lado da história: enquanto um grupo lutava pelo Liberalismo consideravelmente mais voltado ao eixo econômico a fim de garantir mais lucros, o outro reclamava o direito inato de liberdade e igualdade promovidos pela Declaração.
É deveras impressionante o fato de os negros escravos e libertos terem conseguido um sucesso relativo na luta pela independência por serem excessivamente oprimidos dentro do sistema colonial. Contudo, faz-se mister ponderar que tal sucesso não se deu através de um evento isolado e imediato, e, sim, com a ajuda de fatores externos e progressivamente. Apesar de os proprietários brancos não concordarem com participação social e política dos negros, os revolucionários franceses concederam os benefícios das novas leis aos mulatos e negros. Ademais, o governo dos Estados Unidos apoiou os rebeldes com o fito de impedir a ação de Napoleão na América, embora os agricultores escravistas americanos do sul não apoiassem a atitude. Destarte, a Revolução Haitiana do mesmo modo acabou influenciando as emancipações latino-americanas. Segundo os autores, “o sul ajudou o grande líder criollo Simon Bolívar em sua última expedição ao norte da América do Sul. Em troca da promessa de que a escravidão seria abolida na América Latina.” (MOREIRA, QUINTEROS, SILVA P. 31)
Com efeito, a Independência do México apresentou-se como um exemplo claro de como a Revolução Francesa exerceu pressão sobre a América Latina. Tal pressão não se deu apenas por influência de ideias, mas também com eventos imediatamente subsequentes à Revolução, como a Era Napoleônica.
Em meados do século XVIII, tensões sociais surgiam dentro do território mexicano ameaçando a relativa estabilidade preexistente. A insuficiência de terras para o plantio e a grande concentração destas nas mãos da Igreja e da elite local somadas com às consequências das reformas políticas impostas por Carlos III caracterizaram-se como um estopim das lutas de independência. Tais reformas políticas foram responsáveis por tornar mais eficiente a exploração da Colônia pela Espanha, desagradando os dois principais setores da sociedade colonial: as camadas camponesas sofriam com o peso dos impostos; os criollos, brancos ricos nascidos na Colônia, desagradaram-se com as limitações de seu poder político e do livre comércio pela Coroa. É perceptível a influência iluminista e liberal nessas reivindicações, uma vez que a elite desejava uma maior autonomia para que assim expandisse seus lucros relacionando-se comercialmente com outros países, além do próprio desejo de chegar ao poder.
Outro ponto no qual também é observável a influência do pensamento iluminista, além da influência do próprio artigo 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, versa sobre a questão social na Colônia. Grande estudioso do Iluminismo, o padre Dolores Hidalgo protagonizou a luta a favor dos indígenas, camponeses e escravos, em adição à própria luta pela independência, evidenciando a premissa sobre a qual defendia de que todos os homens nascem e permanecem livre e iguais em direitos.
Entretanto, apesar desses dois setores terem estado sob influência da tendência liberal, não se pode afirmar que os dois grupos estiveram em harmonia. É preciso salientar que os criollos não defendiam um projeto político que incluísse profundas transformações sociais ou concordasse com a ascensão da classe inferior, uma vez que ela ainda desejava conservar o privilégio da concentração de terras e do uso de mão de obra escrava.
Outrossim, o movimento de independência mexicana também foi beneficiado por eventos provenientes da Revolução Francesa, como o Império Napoleônico. Após o golpe de Estado de 18 de Brumário, Napoleão Bonaparte foi progressivamente exercendo poder sobre territórios fora da França. O exército de Napoleão invadiu a Espanha em 1808 e depôs o rei Fernando VII, substituindo-o por seu irmão, José Bonaparte. Logo foram organizadas Juntas Governativas na América Hispânica em favor de Fernando VII, que gradativamente passaram a se posicionar a favor de uma maior autonomia colonial. Com a expulsão dos franceses da Espanha e sem o atendimento ao desejo de maior autonomia, mesmo a Colônia tendo apoiado a Coroa Espanhola, foram gerados descontentamento e mal-estar em grande parte da elite colonial, criando condições favoráveis para a organização dos movimentos de independência. Desse modo, é válido inferir que a maioria dos movimentos ocorridos no século XIX não consistiram em eventos isolados, mas que surgiram como um reflexo das atividades
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