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As mulheres muçulmanas precisam realmente de salvação?

Por:   •  13/7/2017  •  Tese  •  1.075 Palavras (5 Páginas)  •  876 Visualizações

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Muito se é levantado à cerca do que foi chamado de “salvação das mulheres mulçumanas”, diante do recente quadro de guerra. No entanto, podemos reparar em termos como esse, certo tom de superioridade. A grande preocupação com as mulheres mulçumanas vem sendo de adquirir conhecimento acerca da cultura delas; não para melhor compreender as subjetividades em questão, mas “como se sabendo algo a respeito de mulheres e do Islã ou o significado de um ritual religioso fosse ajudar a entender o trágico ataque ao World Trade Center em Nova York e ao Pentágono[...]” (Lila Abu-Lughod, 2012:453).

A pergunta em questão é por que indagar sobre a “cultura” da região e suas crenças religiosas e o tratamento que têm essas mulheres é mais importante e imediato do que estudar e entender a história de desenvolvimento dos regimes repressivos da região. Ao invés de conhecimentos históricos, solicitam dos especialistas conhecimentos culturais. Em vez de levantar questionamentos que melhor nos possa levar a explorar as relações interglobais e o contexto em que se desenvolveram, levantam questionamentos que servem apenas para nos dividir e dividir o mundo em esferas separadas pelos limiares da cultura.

A autora repara que o discurso usado para defender a “Guerra contra o Terrorismo”, angaria mulheres para justificar os ataques americanos:

“Por causa de nossos recentes ganhos militares em boa parte do Afeganistão, as mulheres não mais estão aprisionadas em suas casas. Elas podem ouvir música e ensinar suas filhas sem medo de punição. A luta contra o terrorismo é também uma luta pelos direitos e dignidade das mulheres.” disse Laura Bunch em um discurso que muito bem reflete como a condição das mulheres mulçumanas vem sendo utilizada em uma tentativa de justificar questões que vão muito além do que se é “apropriado” explicitar.

A autora repara como é significativo falar acerca do véu, ou da burca, pois isto é algo central nas preocupações contemporâneas a respeito das mulheres muçulmanas. É de conhecimento do senso comum que o fato destas mulheres serem forçadas a vestir burca, é o símbolo mais efetivo da opressão sofrida por elas sob o regime-terrorista-do-Talibã.

“Os liberais às vezes confessam sua surpresa em relação ao fato de que, apesar de o Afeganistão ter sido liberado do Talibã, as mulheres parecem não estar jogando fora as suas burcas. Alguém que trabalhou em regiões muçulmanas deve perguntar por que isso é tão surpreendente. Esperávamos que, uma vez “livres” do Talibã, elas iriam “retornar” a camisetas curtas e jeans, ou tirar a poeira de seus trajes Chanel?” (Lila Abu-Lughod, 2012:456).

Notamos pelo tom de ironia da autora, que nossas percepções estão repletas de etnocentrismo, e que precisamos ser mais sensíveis no que diz respeito às vestimentas dessas mulheres. É importante ressaltar que não foi o regime-terrorista-do-Talibã que inventou a burca. O uso da mesma vem de uma expressão cultural muito antiga em que, resumidamente, simboliza algumas qualidades que são consideras, dentro daquele contexto social, inerentes à mulher; “significa pertencimento a uma comunidade particular e participação em um modo de vida moral no qual as famílias são o centro da organização das comunidades e a casa é associada com a santidade da mulher.” (Lila Abu-Lughod, 2012:457).

Sendo assim, por que iríamos supor que elas subitamente jogariam fora a marca de sua respeitabilidade, simplesmente por terem sido liberadas do uso? A burca para estas mulheres certamente não é e nem foi símbolo de repressão. Ao contrario, por vezes é considerado símbolo de “liberdade”. Porém, nossa visão acerca da cultura do outro é tão complexada pelo etnocentrismo, que não havíamos nos dado “ao luxo” de considerar tal coisa.

“Como sabem perfeitamente bem os antropólogos, as pessoas vestem a forma de roupa apropriada para suas comunidades sociais e são guiadas por padrões sociais compartilhados, crenças religiosas e ideias morais.” (Lila Abu-Lughod, 2012:457). Como, adequadamente, lembra a autora. Temos de desconstruir nossa interpretação do véu como um sinal da falta de liberdade das mulheres, “o que significa a liberdade se aceitarmos a premissa fundamental de que os humanos são seres sociais, sempre criados em certos contextos sociais e históricos e pertencentes a comunidades particulares que dão forma a seus desejos e entendimentos do mundo?” (Lila Abu-Lughod, 2012:459). Logo, devemos atentar para não reduzir as diversas situações em que se encontram as mulheres muçulmanas para uma única peça de roupa.

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