O que o estudo das religiões significa?
Tese: O que o estudo das religiões significa?. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: sanphis • 6/11/2014 • Tese • 9.337 Palavras (38 Páginas) • 236 Visualizações
Working Papers
O QUE SIGNIFICA O ESTUDO DAS RELIGIÕES:
UMA CIÊNCIA MONOLÍTICA OU INTERDISCIPLINAR?
Steffen Dix
WP1-07 2007
Please address correspondance to
INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS- UNIVERSIDADE DE LISBOA
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Tel: (351) 217 804 700 - Fax: (351) 217 940 274URL: www.ics.ul.pt
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O que significa o estudo das religiões:
Uma ciência monolítica ou interdisciplinar?
Steffen Dix (Investigador Associado)
Instituto de Ciências Sociais
Universidade de Lisboa
ABSTRACT:
Despite the so-called decline of church attendance in northern and western Europe and the myth that relig-ion has become irrelevant, the world of today seems to be more religious than ever. Currently is possible to verify world widely a certain religious resurgence in politics, a strong rise of religious plurality and an in-creasing level of homemade religiousness. This situation compels to recognize that religion is a phenomenon which needs a continuous investigation. The present essay seeks to outline the historical expansion and the contemporary condition of religious studies as an independent scientific discipline. On the other hand, the main question of the essay will be this: Whether religious studies should be understood as a monolithic ex-amination or as an interdisciplinary approach on religious phenomena. Finally, the article suggests some possible ways in the methodical organisation of religious studies.
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O que significa o estudo das religiões:
Uma ciência monolítica ou interdisciplinar?
... no hablo ahora de las divinas, que tienen por blanco llevar y en-caminar las almas al cielo; que a un fin tan sin fin como éste ninguno otro se le puede igualar: hablo de las letras humanas...
Don Quijote
Introdução
Até aos últimos anos do século XX, existiram nas sociedades ocidentais várias teo-rias diferentes de secularização que previram um desaparecimento da religião nas socieda-des modernas. E mesmo hoje em dia existe, por vezes, uma convicção científica que remo-ve o lugar da religião simplesmente para a esfera privada do indivíduo. Desta maneira, a religião foi, e ainda é compreendida como um fenómeno anacrónico ou marginal que já não pode despertar muito interesse no quotidiano ou influenciar a vida pública numa sociedade moderna. Porém, especialmente nos tempos mais actuais podemos testemunhar nas sociedades modernas europeias um certo reaparecimento das religiões, ou pelo menos de alguns assuntos religiosos. Trata-se de um acontecimento que despertou um espanto genuíno ou até uma verdadeira surpresa para os partidários da secularização. Hoje, é possí-vel encontrar, sobretudo no espectro dos mass media, frequentemente alguns “especialistas” em questões religiosas que interpretam os importantes eventos religiosos pelo mundo fora. A religião “voltou” de facto para a esfera pública, e este ressurgimento provoca muitas vezes conclusões precipitadas e impacientes, tais como a discussão sobre um provável “re-encantamento do mundo”. Com base numa terminologia com poucas variantes, discute-se um “regresso das religiões” no século XXI1, e um observador atento é confrontado logo no
1 Este chamado “regresso das religiões” é um fenómeno problemático e polifacetado que não pode ser discu-tido neste pequeno ensaio. Porém, parece que a Europa continua a ser a famosa “exception that proves the rule” (Davie, 1999: 65) dentro de um mundo que se revela cada vez mais “de-secularizado” (Berger, 1999: 1-18).
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princípio com dois problemas cognitivos. Em primeiro, a discussão sobre o tal “regresso” pode ser mal entendida se é acompanhada por uma intuição a partir da qual já houve fases históricas nas quais algumas partes da humanidade viveram num mundo inteiramente desencantado ou numa sociedade plenamente secularizada. Esta hipótese pode ser com-preendida, pelo menos hoje em dia, como duvidosa (Krech, 2006: 97), tendo em conta a impossibilidade de encontrar uma sociedade onde a religião tenha desaparecido completa-mente. Na esfera humana, a religião em si nunca desapareceu, mas sim “regressou” forte-mente nos debates públicos e científicos. Em segundo, nas observações e opiniões dos tais “especialistas” em temas religiosos surge muitas vezes uma dificuldade semântica. Ou seja, a de saber qual a perspectiva da pessoa que fala sobre um assunto religioso ou sobre uma religião. Muitas vezes estamos confrontados com a convicção a partir da qual uma religião apenas pode ser entendida correctamente pelos crentes da mesma, ou seja encarada de uma perspectiva interior. Esta posição pode ser legítima como concepção teológica ou perspectiva confessional, mas tem curiosamente a potência virtual de impedir ou atrapalhar numa socie-dade plural a discussão pública sobre assuntos religiosos. Desta forma, torna-se problemá-tico que um crente tenha muitas vezes convicções empiricamente incompreensíveis para alguém que não partilha a mesma fé. Ou seja, estas convicções contêm elementos que não podem ser abrangidos cientificamente. Como não existe a possibilidade de discutir cientifi-camente por exemplo a existência de Deus ou da alma, poder-se-á falar aqui de um “agnos-ticismo metodológico” (Knoblauch, 1999: 14).
Este ensaio tenta apresentar uma perspectiva exterior marcada por uma observação comparativa e histórica dos fenómenos religiosos. O intuito principal é a demonstração de uma posição imparcial que possibilita a comparação sistemática de várias religiões nos seus contextos sociais e históricos. A base cognitiva desta forma de estudar cientificamente as religiões é o reconhecimento de que a cultura e a sociedade são factos públicos, o que signi-fica que uma religião nunca pode ser discutida ou analisada em público, independentemen-te das suas origens culturais.
Por outro lado, este reconhecimento não é um fenómeno autónomo, mas sim o resultado da história intelectual relativamente recente. A possibilidade de observar ou estu-dar a religião como um produto
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