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O Crime De Paulo

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Por:   •  13/5/2014  •  1.423 Palavras (6 Páginas)  •  244 Visualizações

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De Felipe Novaes

QUESTÃO 4 (OAB/RJ 2010.3 FGV) - COMENTADA

Caio, professor do curso de segurança no trânsito, motorista extremamente qualificado, guiava seu automóvel tendo Madalena, sua namorada, no banco do carona. Durante o trajeto, o casal começa a discutir asperamente, o que faz com que Caio empreenda altíssima velocidade ao automóvel. Muito assustada, Madalena pede insistentemente para Caio reduzir a marcha do veículo, pois àquela velocidade não seria possível controlar o automóvel. Caio, entretanto, respondeu aos pedidos dizendo ser perito em direção e refutando qualquer possibilidade de perder o controle do carro. Todavia, o automóvel atinge um buraco e, em razão da velocidade empreendida, acaba se desgovernando, vindo a atropelar três pessoas que estavam na calçada, vitimando-as fatalmente.

Realizada perícia de local, que constatou o excesso de velocidade, e ouvidos Caio e Madalena, que relataram à autoridade policial o diálogo travado entre o casal, Caio foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio na modalidade de dolo eventual, três vezes em concurso formal. Recebida a denúncia pelo magistrado da vara criminal vinculada ao Tribunal do Júri da localidade e colhida a prova, o Ministério Público pugnou pela pronúncia de Caio, nos exatos termos da inicial.

Na qualidade de advogado de Caio, chamado aos debates orais, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

a) Qual(is) argumento(s) poderia(m) ser deduzidos em favor de seu constituinte? (Valor: 0,4)

b) Qual pedido deveria ser realizado? (Valor: 0,3)

c) Caso Caio fosse pronunciado, qual recurso poderia ser interposto e a quem a peça de interposição deveria ser dirigida? (Valor: 0,3)

GABARITO OFICIAL:

a) Incompetência do juízo, uma vez que Caio praticou homicídio culposo, pois agiu com culpa consciente, na medida em que, embora tenha previsto o resultado, acreditou que o evento não fosse ocorrer em razão de sua perícia.

b) Desclassificação da imputação para homicídio culposo e declínio de competência, conforme previsão do artigo 419 do CPP.

c) Recurso em sentido estrito, conforme previsão do artigo 581, IV, do CPP. A peça de interposição deveria ser dirigida ao juiz de direito da vara criminal vinculada ao tribunal do júri, prolator da decisão atacada.

Comentários:

I. Aspectos penais:

1. Culpa inconsciente e culpa consciente:

1.1. Previsão legal:

Art. 18 do CP: Diz-se o crime: II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

1.2. Culpa inconsciente:

Existe culpa inconsciente quando o agente pratica uma conduta voluntária lícita (comissiva ou omissiva) sem a observância objetiva do devido cuidado (negligência imprudência ou imperícia), produzindo um resultado lesivo não querido e não assumido pelo sujeito ativo, o qual lhe era previsível.

Deste conceito, verificam-se os elementos para a caracterização da culpa inconsciente: a) conduta voluntária lícita;

b) inobservância de um dever objetivo de cuidado, atenção ou diligência;

c) resultado;

d) previsibilidade.

Nos dizeres de GUEIROS SOUZA e JAPIASSÚ: “(...) a culpa será inconsciente se o agente não tiver previsto o resultado que poderia e deveria ter previsto. Tendo em vista que previsível é o fato cuja possível superveniência não escapa à perspicácia comum, na culpa inconsciente, também chamada de culpa sem previsão. No caso, apesar da previsibilidade, não há a previsão, por descuido, desatenção ou simples desinteresse – é a imprevisão do previsível” (SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Curso de direito penal: parte geral – Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 199).

1.3. Culpa consciente:

O agente age acreditando que o possível resultado não será produzido por ter convicção de ser apto a atuar de certa forma sem a produção de um produto lesivo. Explicando a questão, GUEIROS SOUZA e JAPIASSÚ asseveram: “A culpa consciente ou culpa com previsão é aquela em que ocorre a efetiva previsão do resultado (sem aceitar o risco de produzi-lo). No caso, o autor, deixando de observar a diligência a que estava obrigado, prevê o resultado, que era previsível, mas confia convictamente que ele não ocorrerá – é a previsão do previsível, mas não tolerável. O agente crê, por confiança em si próprio ou por leviandade, que poderá evitar o previsível resultado.” (SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Ibid).

“Bizu” Fórmula de FRANK: há culpa consciente quando o agente sabendo que o resultado se produziria com certeza, não atuaria.

2. Dolo eventual:

O agente age com dolo eventual quando assume o risco de produzir um resultado lesivo, embora não queira que este venha a ocorrer. No dolo eventual, o sujeito ativo não quer produzir o resultado, mas pouco importa se este vier a acontecer.

“Bizu” Fórmula de FRANK: há dolo eventual quando o agente diz para si mesmo: “seja assim ou de outra forma, suceda isto ou aquilo, em qualquer forma eu atuo”.

3. Diferença entre culpa consciente e dolo eventual:

Na culpa consciente, o sujeito ativo tem a convicção de que o resultado não vai ocorrer. No dolo eventual, o agente não se importa com o resultado.

II. Aspectos processuais penais

1. Competência do tribunal do júri

1.1. Previsão legal:

Art. 5º, XXXVIII da CF: é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

Art. 74: § 1º, CPP: Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§ 1o e 2o, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.

1.2. Noção:

O tribunal do júri é competente para julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Se for enviado para julgamento crime que não seja de competência do tribunal do júri, dever-se-á remeter o caso ao tribunal competente (vara comum, justiça militar, justiça eleitoral, justiça federal ou juizado especial criminal).

2. Declínio de competência (art. 419 do CPP)

Art. 419 do CPP: Quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1o do art. 74 deste Código e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Parágrafo único. Remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

3. Recurso em sentido estrito

3.1. Previsão legal:

Art. 581 do CPP: Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

I - que não receber a denúncia ou a queixa;

II - que concluir pela incompetência do juízo;

III - que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição;

IV – que pronunciar o réu; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

V - que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança, indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante; (Redação dada pela Lei nº 7.780, de 22.6.1989)

VI - (Revogado pela Lei nº 11.689, de 2008)

VII - que julgar quebrada a fiança ou perdido o seu valor;

VIII - que decretar a prescrição ou julgar, por outro modo, extinta a punibilidade;

IX - que indeferir o pedido de reconhecimento da prescrição ou de outra causa extintiva da punibilidade;

X - que conceder ou negar a ordem de habeas corpus;

XI - que conceder, negar ou revogar a suspensão condicional da pena;

XII - que conceder, negar ou revogar livramento condicional;

XIII - que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte;

XIV - que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir;

XV - que denegar a apelação ou a julgar deserta;

XVI - que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial;

XVII - que decidir sobre a unificação de penas;

XVIII - que decidir o incidente de falsidade;

XIX - que decretar medida de segurança, depois de transitar a sentença em julgado;

XX - que impuser medida de segurança por transgressão de outra;

XXI - que mantiver ou substituir a medida de segurança, nos casos do art. 774;

XXII - que revogar a medida de segurança;

XXIII - que deixar de revogar a medida de segurança, nos casos em que a lei admita a revogação;

XXIV - que converter a multa em detenção ou em prisão simples.

3.2. Noção:

“É recurso cabível contra decisões interlocutórias quando se tratar de hipótese expressamente prevista em lei (arts. 581 a 592, CPP). Essa é a regra, mas há exceções, valendo o recurso em sentido estrito para impugnar decisões terminativas de mérito: a) contra declaração de extinção da punibilidade (art. 581, VIII, CPP); b) contra decisão que concede ou nega habeas corpus, considerando-se esta uma autêntica ação (art. 581, X, CPP).” (NUCCI, Gulherme de Souza Nucci. Prática Forense Penal, 4ª ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, p. 260).

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