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OS PROGRAMAS EDUCACIONAIS DO ESTADO BRASILEIRO PARA O CAMPO

Por:   •  23/11/2022  •  Trabalho acadêmico  •  8.107 Palavras (33 Páginas)  •  120 Visualizações

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AS NARRATIVAS DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO PÚBLICA: comentários críticos da sua trajetória na legislação educacional brasileira e suas aproximações com o campesinato

Curso: Licenciatura em Ciências Agrícolas

Componente Curricular: História da Educação

Texto 8

OS PROGRAMAS EDUCACIONAIS DO ESTADO BRASILEIRO PARA O CAMPO

Prof. Dr. Rogério Caliari

  1. A CONSTITUIÇÃO DE 1946

 A Constituição de 1946 trata da questão educacional em sete capítulos entre eles um que se dedica aos aspectos da obrigatoriedade de empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que trabalhem mais de cem pessoas, de serem obrigadas a manterem o ensino primário gratuito para os seus trabalhadores e os filhos destes (Art 168, inciso III). Confirma-se a importância dos setores industriais e comerciais para a economia brasileira e a necessidade da formação de mão de obra capacitada para conviver com as transformações do setor produtivo urbano-industrial quando o inciso III do Art. 168 define que estes setores ficariam obrigados a ministrar, em cooperação, aprendizagem aos seus trabalhadores menores, pela forma que a lei estabelecer, respeitados os direitos dos professores.

Este tratamento distinto não contemplou o setor agrícola na nova Constituição, uma vez que já havia sido objeto de uma legislação específica anterior através da Lei Orgânica do Ensino Agrícola estabelecida pelo Decreto-Lei nº 9.613, de 20 de agosto de 1946.

  1. A RETOMADA DOS IDEAIS DO “RURALISMO PEDAGÓGICO”

Pelo pensamento dos defensores do “Ruralismo Pedagógico” os problemas do Brasil poderiam ser sanados com a difusão da escola primária na tentativa de materializar a inclusão via educação por meio da alfabetização, extensão rural e fixação do camponês no seu local de origem. Os discursos reforçam a necessidade do bom desempenho das escolas, incluindo qualidade do ensino e formação do professor, diante dos desafios constantes para sua atuação na realidade camponesa. Deste modo, a educação, nas primeiras décadas do século XX, segundo um segmento da intelectualidade brasileira, recebe a incumbência de salvar a nação das mazelas dos séculos anteriores no que diz respeito ao analfabetismo e manutenção de uma ordem institucional de privilégios de uma educação elitizada.

O pensamento do grupo ruralista pode ser facilmente observado nas afirmações de Sousa (1950) ao defender a importância de todos compreenderem o real significado de um Brasil que existe e se revigora nos espaços rurais a partir das escolas no campo. Afirma

[...] que é no campo que está a base da prosperidade dos povos; que as cidades vivem e enriquecem à custa do labor dos que lavram a terra; que é preciso se instaure uma consciência agrícola, na alma de todos os brasileiros, sem o que nunca teremos celeiros fartos, nem indústria, nem comércio, nem povo forte e soberano [...] (SOUSA, 1950, 1097).

A defesa da escola rural percorre um trajeto de aproximação e resgate da vocação histórica do Brasil para as atividades agrícolas. Estas referências guiava o pensamento ruralista acompanhado da defesa da importância de se educar o camponês no seu próprio local de origem facilitando-lhes novas formas de acesso a um trabalho mais produtivo. Sousa (1953) defende a escola rural, afirmando que a mesma é uma exigência do Brasil decorrente de sua própria condição de país agrícola e acrescenta que esta vocação foi alterada deliberadamente pelo projeto urbano-industrial que veio refletir no modelo educacional brasileiro.

Ao sugerir alternativas para a situação de abandono que se encontra a educação do campo Sousa (1950) afirma ser necessário compreender que as escolas destinadas ao campesinato precisam associar “[...] as condições peculiares de uma região do modo de educar o povo que a habita, para tratá-la e explorá-la, convenientemente [...]” (SOUSA, 1950, 1098).  A escola é mais uma vez apontada como aquela que tem as condições indispensáveis para a resolução dos problemas que caracterizam o mundo rural no Brasil. Para os ruralistas é a escola no campo que vai gerar as condições para a ruptura deste estado de abandono que se encontra o camponês proporcionando, além das “técnicas elementares do ler, escrever e contar” [...] algo mais que lhe minorasse a miséria habitual em que vivia, desvendando-lhe horizontes novos de trabalho produtivo [...]” (SOUSA, 1950, 1100). Nesse sentido o “Ruralismo Pedagógico” defendia uma

[...] organização e instalação de uma escola rural típica, acomodada aos interesses e necessidade da região a que fôsse destinada, como o melhor meio de se dar consciência agrícola e sanitária às populações rurais, além de exata compreensão do valor da previdência e da economia, como condição de felicidade individual e coletiva [...] (SOUSA, 1950, 1097).

Para isso seria necessário que a escola se organizasse e cultivasse a prática de ser portadora da “[...] promessa de vida melhor, [...] que lhe ilumine o entendimento e lhe arme os braços para labores profícuos [...] onde quer que haja miséria e desconforto no seio da massa [...]” (SOUSA, 1950, 1101). A escola primária rural que os ruralistas programavam para o Brasil, segundo Sousa (1950), tem em vista muito

[...] mais que ensinar a ler e escrever; dá sentido de vida às imensas massas humanas que vivem como marginais, inteiramente indiferentes e alheias ao traçado de seu próprio destino. Ela equipa homens e mulheres a viver como gente, não apenas instrumentos inconscientes do próprio valor, para proveito de meia dúzia de aproveitadores. Capacitar o homem para viver bem é a melhor maneira de garantir a paz [...] (SOUSA, 1950, 1101).

O argumento utilizado é o de combater uma situação já descrita por Lobato (1918-2005) e que permanecia cultuada na sociedade e manifestada nos argumentos dos que defendiam uma nova educação para o camponês. O camponês é o que precisa ser libertado do atraso e da ignorância. Segundo a proposta ruralista, precisam de uma educação

[...] que visa à saúde, ao fortalecimento físico e ao adestramento intelectual do educando, dá a êste conhecimentos práticos de como tratar a terra, como valorizá-la, tirando dela o com que minorar a pobreza do lar e conforto da família [...] ao lado das técnicas rudimentares de leitura, escrita e calculo, ensina-se como plantar, produtivamente, como criar, economicamente, como ser aliado do vizinho, pela colaboração e cidadão prestante da Pátria [...] (SOUSA, 1950, 1104).

É possível estabelecer um paralelo entre a descrição do camponês que faz Lobato (1918-2005) e os argumentos de defesa utilizados por Sousa (1950) representando o pensamento ruralista em defesa de uma nova educação para a realidade deste camponês.

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