Resenha A outra face da Lua - Levi-Strauss
Por: xvegduplo • 12/8/2019 • Resenha • 1.690 Palavras (7 Páginas) • 378 Visualizações
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES – CCHLA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL – PPGAS
Componente Curricular: Teoria Antropológica Clássica
Docente: José Glebson Vieira
Discente: Suzanne Freire Pereira
Resenha
LÉVI-STRAUSS, Claude. A outra face da lua: escritos sobre o Japão. Prefácio Junzo Kawada; tradução Rosa Freire d’Aguiar – 1ª edição – São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
Publicado em 2012 pela Companhia das Letras, a obra póstuma “A Outra Face da Lua: Escritos sobre o Japão” de Claude Levi-Strauss compõe uma coletânea de conferências, notas, introduções e prefácios de livros e uma entrevista dada em Paris à tv japonesa NKH. O livro é baseado em escritos e contatos afetuosos que o antropólogo teve com a cultura japonesa durante a sua vida, suportados em cinco viagens realizadas ao país durante os anos 1977-88, por vezes em companhia de sua esposa Monique Levi-Stauss.
Em seu prefácio escrito pelo antropólogo japonês Junzo Kawada -também autor das fotografias presentes no livro e da entrevista final- vamos ao encontro de um Levi-Strauss inspirado desde a infância pela cultura japonesa ainda que até então nunca tivesse visitado o país, ao narrar sua admiração no prefácio da edição japonesa do livro Tristes Trópicos. O autor a todo momento tenta visualizar nesta cultura a balança equilibrada entre a tradição e a mudança, que seja: entender sua identidade pelas mais diversas nuances históricas, culturais e étnicas.
Em seu primeiro capítulo intitulado “Lugar da cultura japonesa no mundo” originado do texto da conferência de sessão inaugural do Centro Internacional de Pesquisa para os Estudos Japoneses proferida no ano 1988 em Kyoto, assume possuir um conhecimento superficial sobre o país, dado sua estadia durante as temporadas no Japão não excederem poucos meses. Ainda assim, tece olhares à sua cultura afirmando de antemão serem por natureza incomensuráveis, duvidando assim da possibilidade de situar esta cultura objetivamente em relação às outras. Dado a sensibilidade antropológica aos caracteres invariantes que se mantêm ou afirmam em vários planos culturais, afirma que na falta de conhecer uma cultura por dentro, sendo este lugar reservado aos nativos, o antropólogo pode oferecer uma visão de conjunto. Nesse sentido, tece olhares à originalidade japonesa através de seu papel no mundo de alternância de empréstimos e sínteses, sincretismos e originalidade étnica.
Ao pensar a arte japonesa, traz o exemplo do “Espiríto Jomon” e action painting em que a cerâmica Jomon é descrita por sua “originalidade absoluta” (p. 23) que poderia se pensar em uma art nouveau surgida há 5 ou 6 mil anos constituída por um traço invariante da estética japonesa. Ao entender nesta cultura sua aptidão por oscilar entre posições extremas ao se distanciar da cultura ocidental e preservar sua reverência ao pensamento animista, unindo “natureza e sobrenatureza, o mundo dos homens e dos animais e das plantas, e até a matéria e a vida”. (p. 25)
Seu distanciamento à cultura ocidental poderia ser descrito pelos estilos de vida e produções que se sucedem, em contraponto ao Japão em que coexistem. Suas diferenças maiores estariam na dupla recusa do sujeito e do discurso. Enquanto no Ocidente, o “eu” se constitui como uma evidência primeira de sujeito, utilizando a linguagem a serviço da razão, para o pensamento oriental a recusa do sujeito também se influencia na recusa pelo discurso que é visto como irremediavelmente inadequado ao real. Entendendo a natureza última do mundo transcendente às nossas faculdades de expressão e reflexão, em vez de uma causa, transforma o sujeito em resultado. Assim, a filosofia ocidental trataria o sujeito de forma centrífuga, onde tudo parte dele; enquanto a oriental seria centrípeta, estando no lugar último de reflexo a seus pertencimentos. Preservando assim sua singularidade e especificidade própria.
O segundo texto “A face oculta da Lua” consiste na sessão de encerramento do colóquio “Os estudos japoneses na França”, de 1979 em Paris. Narra suas experiências de viagem entre Tóquio a Osaka e Kyoto, passando pelas ilhas Oki, no mar do Japão. Neste capítulo o autor ao olhar sob o sentido mítico ligado ao trabalho, evoca uma perspectiva histórica sob seus fatos arcaicos e gêneros literários, para se pensar também a originalidade da música, artes gráficas e culinária. Estando nesses últimos elementos dois traços invariantes: uma higiene moral e mental voltada para a simplicidade, em que se excluem a mistura e exaltam elementos de base. Reforçando assim que apesar do estabelecimento de pontes entre a Europa e o conjunto Pacífico, construíram temporalmente histórias simétricas parecidas em tempo porém opostas na essência, ao afirmar que se eras passadas quiseram se igualar ao Ocidente, não foi a fins de identificação e sim, de encontrar a “maneira de melhor se defender contra ele”. (p.49)
A terceira parte do livro “A lebre branca de Inaba” o autor compele notas sobre a versão americana do conto, estabelecendo comparativos e diferenças entre o traçado histórico pelo qual o mito percorreu entre os continentes americano e asiático. A história entrecruza personagens entre suas diferentes versões desde um herói passante, a lebre de Inaba, o Pássaro-Trovão, a grua e o crocodilo, etc. Ao fim de concluir sua possível origem do sistema mitológico da Ásia Continental passando primeiro ao Japão, depois para a América.
No capítulo “Heródoto no mar da China”, publicado originalmente no livro “Poikilia: Études offertes à Jean-Pierre Vernant” (1987), Levi-Strauss tece observações a partir de uma temporada em Tóquio em 1983, onde pôde acompanhar dois pesquisadores japoneses em Okinawa e nas ilhas Ilheya, Izena e Kudaka. Atém-se ao caráter singular dos povoamentos, por sua característica das casas terem divisões generificadas entre homens a leste e das mulheres a oeste; a disposição dos jardins também chama sua atenção com sua passagem do leste reservada a ocasiões rituais. A mulheres detêm a vida religiosa das Ryuku, sendo um sistema fundado no laço irmão-irmã, em que ele exerce autoridade secular e ela a garantia de proteção espiritual graças ao contato com divindades, tendo herdado seus poderes e função de suas mães ou sogras. O exercício do culto pelo contato com deuses é realizado nas pequenas cabanas “ashage” onde as sacerdotisas possuem uma “autoridade isenta de arrogância” (p.65)
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