Uma UPP sozinha faz verão?
Por: juliodias75 • 6/1/2016 • Ensaio • 1.592 Palavras (7 Páginas) • 393 Visualizações
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE SEGURANÇA PÚBLICA
UMA UPP SOZINHA FAZ VERÃO?
Julio Cesar Dias
Reflexões sobre a política de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro.
Niterói
2014
Uma UPP sozinha faz verão?
A frase não é minha, foi retirada de uma entrevista à professora Jacqueline Muniz, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), realizada pela Globo News, quando do ataque à UPP de Manguinhos, em 21 de março de 2014, onde a mesma disse: “A impressão que dá é que a Polícia Militar é uma andorinha sozinha, tentando fazer o verão da proximidade, da pacificação”.
O projeto das Unidades de Polícia Pacificadora, até o momento, é o único a enfrentar o problema da segurança pública. Pode não ter sido o mais eficiente, mas é o que há de mais concreto. Ninguém quer mexer no vespeiro que é a segurança pública.
A UPP não é uma ideia inovadora, já houve anteriormente a implantação do GPAE (Grupamento de Policiamento de Áreas Especiais). O GPAE não deu certo, entre outras questões, mas principalmente pela questão do efetivo, do material humano. Todos os batalhões tinham que ceder homens para a formação dos GPAE's. Ou seja, se você é comandante de uma unidade e tem que se desfazer de um policial do seu efetivo, quem você mandaria? Um bom policial ou um policial problemático? E foi assim que o GPAE foi definhando, apinhado de policiais com fichas sujas. Na UPP, pelo menos essa questão foi pesada, colocando-se policiais recém formados em seu efetivo, sem os “vícios” dos mais antigos, com as fichas limpas e com formação em policiamento comunitário. A ideia de se colocar a Polícia Militar nas comunidades, como Polícia Comunitária, ao invés de apenas entrar na comunidade, combater e sair, seria interessante se a filosofia de Polícia Comunitária efetivamente tivesse sido implementada. Polícia Comunitária é complexo, requer muito mais do que policias recém formados, sem os “vícios” dos mais antigos. Requer gestão, parceria e mediação de conflitos.
Polícia Comunitária é uma filosofia organizacional, pertinentes a ações efetivas com a comunidade. A ideia é aproximar o policial com o morador, aproximar o profissional de segurança pública com a comunidade. É parceria entre polícia, morador, comércio, instituições religiosas, instituições de sociedade civil, todos buscando o bem da comunidade. O objetivo da polícia convencional é combater o crime e o criminoso e na polícia comunitária o objetivo é a busca da resolução dos problemas através da prevenção.
O problema é que em um ambiente muito conflituoso essa relação demora a se consolidar. Há muita resistência e desconfiança entre o morador e o policial. Essa desconfiança é histórica e não seria de um dia para o outro que se resolveria essa questão. Para promover polícia comunitária, a polícia tem que fazer a sua parte, e somente a sua, para que o foco seja efetivamente segurança pública. Polícia comunitária é uma ideia muito boa, deveria ser eficaz, mas não está funcionando. Isso seria somente por conta da polícia?
Além disso, Polícia Militar sozinha seria para um primeiro momento, para garantir segurança e tranquilidade para os outros órgãos públicos e privados atuarem no local. Chegou UPP, e aí? Onde estão investigação, saúde, saneamento básico, habitação, educação, justiça? Luz, água, gás, correios? Não estão! A polícia prende, não se investiga e o judiciário solta. Ninguém quer dividir esse fardo. Um Juiz ou um Delegado trabalhariam no meio de uma favela? Não há delegacias, tribunais, creches, postos de saúde, centrais de atendimento ao trabalhador, uma brigada do Corpo de Bombeiros, escolas públicas ou particulares, grandes redes de varejo, postos da CEDAE, LIGHT, bancos, ou seja, não há NADA!!! Uma UPP e só!
Aí temos uma mídia, que quase nunca tem interesse em se aprofundar no assunto, questionando: “ué, mas lá não tem UPP? Por que o problema da segurança pública não foi resolvido ainda?”. E dá pra resolver sozinho?
O que parece é que não há planejamento para o depois. Após a entrada da polícia, o que fazer? Se fosse um programa realmente sério em toda a sua plenitude, antes da entrada da PM já haveria uma comissão, um colegiado, para que todas as demandas fossem atendidas, com responsáveis por cada atividade, objetivos para o atingimento de metas e datas fixas para que essas metas sejam cumpridas. Um projeto de tamanha envergadura exige extremo profissionalismo, mas o que se vê é um festival de amadorismo e incompetência de todos os outros órgãos. E também da própria PM, mas esta é exigida além das suas possibilidades e responsabilidades, mas que nunca pode errar, pois é execrada por toda a mídia, sociedade e pelas mesmas autoridades que se omitem em resolver suas demandas.
O Estado jogou as UPP's nas comunidades e disse: “toma que o filho é teu! Dá teu jeito!”. E a Polícia Militar, por sua vez, até mesmo por ser militar, subserviente e cumpridora de ordens, não questiona tal comportamento estatal e nem chama a atenção dos outros órgãos para que cumpram com suas responsabilidades, quando o certo seria dizer, já com o “papo reto” dito nas comunidades: “vamos dividir essa “besteirinha” aí”, “vamos “chupar essa manga” juntos”! O resultado disso é um desgaste totalmente desnecessário à Corporação, que tem que dar resposta para tudo, como se tudo fosse culpa exclusivamente sua.
Nesse contexto, o Comandante da UPP acaba se transformando no “xerife”, tendo que cuidar de todas as demandas, além da sua própria, causando desgastes já que nem todos tem formação para isso. Em alguns casos, se apropriam de um poder que não possuem, transformando-se, na visão do morador, em verdadeiros ditadores, que não deixam ter baile funk, que adotam a “lei do silêncio” a partir das 22 horas ou que levam o morador para ser “sarqueado” na UPP. Muitas dessas situações são com a intenção de promover o bem estar para a maioria, mas que não fazem parte do rol de suas funções, sendo algumas, inclusive, ilegais.
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