Balbúrdia, Doutrinação ou Construção de Conhecimento Científico? Qual o Real Papel do Historiador e dos Documentos Perante a História?
Por: Raphael Avilla • 1/3/2020 • Trabalho acadêmico • 1.136 Palavras (5 Páginas) • 163 Visualizações
Balbúrdia, doutrinação ou construção de conhecimento científico? Qual o real papel do historiador e dos documentos perante a história?
Desde o princípio da humanidade, temos por hábito registrar nossos costumes, práticas e hábitos mesmo que não tenhamos consciência do impacto desses nossos atos para as futuras gerações. O homem primitivo a cerca de 40.000 anos a.C. ao buscar registrar nas paredes de suas cavernas seus hábitos de caça, cultivo, da natureza que os cercava, ritos e afins, inconscientemente deixavam uma documentação rica para historiadores, arqueólogos e artistas que buscavam compreender melhor os princípios de nossa humanidade. Da mesma forma, documentos governamentais, certidões de nascimento e batismo, receitas culinárias, fotografias, relatos orais entre diversos outros tipos de arquivos, não foram criados com a intenção de que fossem utilizados posteriormente para estudos sobre sua época. Desta forma, de que maneira o historiador deve se posicionar diante de um documento? Existe parcialidade? Quais são os meios de identificar o que pode ser relevante para sua pesquisa? Qual seu papel para a construção da história?
Apesar das mudanças na forma de observarmos os registros humanos deixados no tempo, a variação do entendimento do que pode ser considerado um documento ou do papel da história e como ela deve ser construída, é necessário ao historiador refletir acerca da frase feita há décadas por Marc Bloch ao afirmar que “Ao contrário do que parecem por vezes imaginar os principiantes, os documentos não surgem aqui ou acolá por artes mágicas.” (Bloch, [s.d.], p.65-6).
Ao remontarmos o século XIX com os positivistas com Auguste Comte, evidencia-se uma necessidade de tornar a história um estudo científico, com metodologia e onde a verdade residia de forma imutável nos documentos, impossibilitando assim uma avaliação crítica aos mesmos e mantendo presa a ideia que a única documentação que possuía valor seria a escrita, ignorando por completo todas as demais possibilidades de fontes. Entretanto, a partir da década de 1930 com a escola dos Annales com Marc Bloch e Lucien Febvre como seus fundadores, a visão sobre como buscar e o que considerar como fonte histórica muda de forma radical. O papel do historiador deixa de ser somente um coletor e organizador de registros e passa a ter fundamental importância, dado que a história passa a ser construída através dos questionamentos que o historiador infere ao arquivo. Ao retirar o poder da construção da história dos documentos que anteriormente eram considerados como a fonte da verdade e passar para a mão dos historiadores com a utilização de novos métodos e a necessidade de uma avaliação crítica acerca da documentação estudada, a ideia de fonte histórica, de documento, se modificam podendo ser considerado não somente os documentos oficiais, mas toda manifestação do ser humano na história, dado que o que irá conduzir a pesquisa são os questionamentos levantados pelo historiador. Dessa forma o historiador também se torna parcial, dado que a própria escolha de um determinado assunto de interesse do historiador já demonstra seu campo de interesse, contudo, a produção do conhecimento científico está acima de qualquer ideologia ou posicionamento pessoal do historiador, ou seja, o profissionalismo estará sempre acima de qualquer parcialidade perante a documentação histórica.
“Os Annales e os materialistas históricos abriram possibilidades para renovações no pensamento e na pesquisa histórica. A partir de então, o fato histórico deixou de ser entendido como dado de forma verídica e real pelo documento; ele precisaria ser construído pelo historiador a partir de uma conjunção de fatores presentes e passados.” (SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique, 2006: p.159)
Contudo, faz-se necessário valorizar a importância da busca de transformação da história em ciência realizada pelos positivistas. A construção de uma história científica reforça a necessidade do sistema metodológico para a construção de uma história baseada em conhecimento científico e não em senso comum. A partir do questionamento realizado pelo historiador ao documento, inicia-se uma busca em outras fontes que validem o conhecimento sugerido pela primeira fonte, cruzar, combinar e ajustar os dados, analisar os mais diversos vestígios, questionar os autores de tais fontes, suas motivações em criar determinados documentos, a compreensão do autor do documento em relação ao momento histórico que o cerca, a dimensão que as ações dos agentes da história geraram em suas épocas e no presente, enfim, buscar compreender que todo documento irá expor uma verdade, mas também uma série de outras questões implícitas que cabem ao historiador buscar compreender.
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