A Ficção Brasileira contemporânea
Por: brunomelophb • 7/12/2017 • Resenha • 2.276 Palavras (10 Páginas) • 654 Visualizações
SCHOLLHAMMER, K. E. Ficção brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2009.
A obra já nos leva a refletir o que seria o termo contemporâneo e seu literário, através da leitura de Roland Bathes sobre Considerações intempestivas de Nietzsche, que coloca o contemporâneo próximo ao intempestivo, definindo que o verdadeiro contemporâneo não é aquele que se identifica com seu tempo. Vemos que ele defende que o contemporâneo é aquele que, graças a uma diferença, uma defasagem ou um anacronismo, é capaz de captar seu tempo e enxerga-lo. Por esse entendimento, vemos que o contemporâneo então possui uma difusão com o tempo presente, possui um olhar diferente, e pode expressar-se e manifestar-se por um parecer diferente.
Então, contemporizar não significa ser presente. Existem as zonas marginais de onde o ser contemporâneo é capaz de atuar. O escritor desta face, precisa estar motivado por uma grande urgência em se relacionar com a realidade. O emitente se faz necessário a não confundir a realidade presente conturbada. A preocupação cronológica não é o que pauta o mapeamento realizado no livro, e sim a preocupação de verificar temas e opções estilísticas e formais que se veem presente nos escritos contemporâneos.
A preocupação não foi de colocar escritores de grande reputação no mercado literário. O objetivo principal era flagrar e enxergar as rupturas realizadas pelos escritores contemporâneos. Temos Heloísa Buarque de Hollanda, caracterizando a principal tendência da literatura, demonstrando como a mesma se apropriava do cenário urbano de grandes cidades, possibilitando a visão de assumir um franco compromisso com a realidade social, focando nas inúmeras misérias humanas, do crime e da violência, como vemos nos grandes romances nacionais, de modelação de Euclides da Cunha e João Guimarães Rosa, sem esquecer das narrativas de Lúcio Cardoso e Clarice Lispector.
Vemos que segundo Silviano Santiago, o escritor brasileiro enfrentou, depois do golpe militar de 64, uma escolha estilística fundamental. Ou o escritor brasileiro seguia a corrente latino-americana em direção a uma literatura mágico-realista ou retornava aos problemas estilísticos não resolvidos pelo realismo social, originador dos romances de 30. Ficou confirmado que a opção histórica escolhida novamente seria o realismo, mesmo pós-golpe, o cunho era evidentemente político. Sendo assim, verifica-se que a geração de 70 estava ligada a uma nova espécie de realismo urbano.
A preocupação de norteamento da literatura de 70 ficou responsável pela criação de uma revisão das posturas de engajamento e da literatura autobiográfica. Na literatura autobiográfica de 70, foi profundamente marcada por Pedro Nara. Outras tendências vistas seriam o romance-reportagem e o romance-ensaio, que realizava o entrecruzamento de crítica e criação. Então, com a finalização do período do golpe de 64, e o retorno da democracia, temos uma nova abertura política, que nos traz também uma escrita mais psicológica que configura uma subjetividade em crise, como por exemplo nas obras de Antonio Callado, Ignácio de Loyola Brandão e Caio Fernando Abreu.
Mas nada se compara a inovação literária de Alfredo Bose, batizada de brutalismo, que havia sido iniciada por Rubem Fonseca. Verificamos que o Fonseca criou um estilo próprio, enxuto, direto, comunicativo, voltado para o submundo carioca, que carregava uma linguagem coloquial, de um realismo cruel. Temos também Dalton Trevisan, que desnudava uma crueza humana até então inédita brasileira, constituindo elementos realistas da literatura urbana como a exploração da violência. Rubem Fonseca renovou a prosa brasileira com uma economia narrativa nunca antes vista, que marcaria as premissas, da reformulação do realismo, cujo sucesso de público e de crítica consolidou um novo cânone para a literatura brasileira.
No famoso pós-modernismo brasileiro, temos romances que combinam as qualidades de best sellers com as narrativas épicas clássicas. Vemos que mesmo representando um retorno aos temas tradicionais da fundação da nação, da história brasileira e do desenvolvimento de uma identidade cultural, os romances carregavam uma reescrita da memória nacional da perspectiva de uma historiografia metaficcional pós-moderna. A perda de determinação e de rumo dos personagens é uma característica que a prosa da década de 90 iria prolongar, em narrativas que oferecem o indivíduo como uma espécie de fantoche.
Com Sergio Sant’Anna temos um questionamento constante na construção da realidade. Em Bernardo Carvalho, vemos a criação de enredos que têm a complexidade das narrativas policiais, em que os detetives são personagens a procura de uma compreensão de sua identidade. Obcecados pela tarefa de elaborar respostas, os personagens de Bernardo Carvalho estão em constante movimento de investigação dos fatos e dos eventos que tentam traçar sua identidade e laços familiares.
Temos na geração de 90, uma trama publicitária bem elaborada, onde um grupo de escritores conquistaram sua identidade através de uma coletânea de contos, organizados por Nelson de Oliveira. Não é perceptível nenhuma nova escola literária, ou nenhuma tendência unificadora de uma totalidade. Vemos uma heterogeneidade e a falta de características em comum como principais características comuns entre eles. Sobre esta geração é elencado duas hipóteses: ou a nova tecnologia de computação e as novas formas de comunicação provocaram a necessidade de textos em prosa curtos, ou esta geração retornou ao exemplo da de 70, com um boom de contos.
Então, o traço que melhor caracteriza a literatura da última década é o convívio entre a continuação de elementos específicos que teriam emergido nas décadas anteriores, como a sobrevivência do realismo regionalista. Temos a definição de Mainardi, que classifica a literatura regionalista como uma das vacas sagradas da literatura brasileira e que precisa ser liquidada sem piedade; A contribuição deste teórico sem dúvida foi mais provocativa do que substancial. A ficção de 90, é marcado pela intensificação do hibridismo literário que gera formas narrativas análogas as dos meios audiovisuais e digitais.
É notório também, o recurso ao pastiche e aos clichês dos gêneros considerados menores, como os melodramas, as pornografias e os romances policiais. Voltando ao Rubem Fonseca, vemos que o mesmo não foi apenas um exemplo e um modelo, mas, em alguns casos, o mentor direto e o possibilitador de suas obras. Assim, vemos que a distância irônica entre a violência dos fatos e o tom cético do narrador, no relato econômico da ação, criando um efeito de humor que continua sendo a marca registrada de Fonseca, que cria uma posição estoica diante da barbárie, uma mistura de aceitação da realidade, na sua grotesca crueldade, e uma atitude de humor conformada com a existência humana.
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