O CORTIÇO” DE ALUÍSIO AZEVEDO
Por: davidwert • 17/2/2020 • Pesquisas Acadêmicas • 3.695 Palavras (15 Páginas) • 236 Visualizações
“ O CORTIÇO” DE ALUÍSIO AZEVEDO
A história se passa em Botafogo. João Romão, português, era empregado de um vendeiro que deixou a ele a venda e tudo o que nela havia, como pagamento de salários vencidos. Romão era ganancioso e tinha ânsias de enriquecer. Era tão avarento que dormia encima do balcão da venda e seu travesseiro era um saco de estopa cheio de palha.
Bertoleza, sua vizinha, era quitandeira, escrava de um velho cego que morava em Juiz de Fora e amigada com um português que trabalhava fazendo fretes na cidade. Ela fazia a comida de Romão. A quitanda de Bertoleza era muito movimentada. Ela tinha que enviar, mensalmente, dinheiro a seu dono e também conseguia guardar parte para sua alforria. O marido de Bertoleza morreu um dia, quando carregava com seu carrinho de mão, peso superior às suas forças.
João Romão e Bertoleza se aproximaram, tornando Romão, seu confidente a ponto dele guardar o dinheiro dela, dela contar tudo sobre sua vida e o dinheiro que havia guardado para a alforria e das pessoas que tinham algo a tratar com ela, ir procurar Romão ao invés da escrava. Ela aceitava os conselhos dele cegamente. Ele passou a cuidar de tudo que ela produzia e enviava a seu dono, mensalmente 20 mil réis.
Se amigaram e foram morar juntos. Romão comprou com as economias de Bertoleza um pequeno terreno ao lado esquerdo da sua venda e construiu uma casa pequena: a parte da frente era destinada à quitanda e a do fundo a um quarto para os dois.
Ele forjou a libertação da escrava, falsificando um documento que dizia que ela era uma pessoa livre. Bertoleza não percebe o engano e ficou muito agradecida a ele.
Mas ele ficou preocupado do cego ir atrás de Bertoleza porque ela parara de enviar o dinheiro que lhe era de direito. Providenciou que o homem ficasse sabendo que ela havia fugido para a Bahia depois da morte do português. Romão somente ficou sossegado ao receber a notícia da morte do velho.
Tudo o que João ganhava na venda e na quitanda (onde Bertoleza servia café e fazia almoço para os trabalhadores), ele guardava. Foi assim que conseguiu comprar
um terreno atrás de seu comércio e construiu três pequenas casas. Ele roubava material de construções vizinhas para construir as casas. Ele e Bertoleza, que o ajudava nessa façanha, roubavam tudo: tijolos, telhas, sacos de cal, ferramenta dos marceneiros, cavalos de pau e até as escadas dos pedreiros. Os roubos ocorriam à noite e como a polícia não passava ainda naquelas bandas, eles roubavam livremente. Ele também trabalhava como pedreiro na construção para economizar dinheiro. Com o tempo, comprou mais pedaços de terra no fundo de seu comércio e foi, aos poucos, construindo mais casas.
Romão roubava não só o material de construção, mas os trocos dos clientes, deixava de pagar suas dívidas, mas nunca deixava de cobrar os seus devedores. Apertava cada vez mais as despesas e ia comprando todo o terreno do fundo da venda até não ter mais o que comprar por ali.
Aconteceu que durante essas construções, um sobrado ao lado da venda de João, foi vendido para Miranda, um português negociante de fazendas. Ele e sua mulher brasileira, D. Estela e sua filha Zulmirinha, se mudaram do centro do Rio para Botafogo, porque D. Estela o traia. Miranda não se separava dela porque queria evitar escândalo doméstico, o que possivelmente afetaria suas negociações e também porque o dote que havia recebido ao se casar, o mantinha trabalhando e dando-lhe direito a ações da dívida pública e prédios, o que lhe permitia usufruir a seu bel prazer. Temia só de pensar em ficar novamente pobre e ter que retornar a Portugal em uma condição nada agradável para suas ambições. Resolveram então, dormirem em quartos separados. Odiavam-se e somente se mantinham juntos pelos interesses de Miranda e por uma questão de aparências. Não queriam que ninguém soubesse de seus problemas conjugais. O nascimento de Zulmira agravou a situação e os distanciou ainda mais. Os dois não gostavam da menina: Miranda por achar que não era o pai e Estela por saber que ele era o pai.
A casa de Miranda não tinha quintal grande e ele foi ter com Romão para que esse lhe vendesse uma parte do seu terreno que, por sinal, ficava atrás do sobrado do português. Romão se recusou e travou-se uma rivalidade entre os dois.
João passou a sonhar com um cortiço que se destacasse entre todos os que haviam em Botafogo. Passou a comparecer em leilões de materiais de construção,
comprava coisas de segunda mão e deixava tudo no quintal, guardado por um cachorro para evitar possíveis furtos.
Nem ele vendia parte do terreno para o Miranda fazer o quintal, nem Miranda vendia o quintal que lhe restava, pois João o queria comprar. Quando percebeu que nada adiantaria negociar com o português, Romão iniciou a construção do cortiço.
E sua avareza crescia. Tinha uma horta e separava para si somente aquilo que ninguém compraria, o restante vendia. Os ovos que suas galinhas produziam, vendia todos. Mesmo gostando de ovos, não ficava com nenhum. Comia o resto de comida dos trabalhadores, tudo para não gastar.
O comércio de Romão cresceu a tal ponto que ele passou a importar e exportar produtos, ampliando a venda, abolindo a quitanda e c r i a n d o armazéns para depósito. Não vendia somente o de comer, mas objetos de armarinho, roupas e acessórios, ferramentas e tecidos.
Começou a emprestar dinheiro para os trabalhadores e cobrava juros de 8% ao mês. Suas casas do cortiço alugavam-se rápido por causa da localização: próximas de onde os operários trabalhavam. O cortiço já contava com 95 casinhas. O pagamento das casas era mensal e as tinas para lavar as roupas, diário. A “Estalagem de São Romão” era muito disputada.
A inveja de Miranda por Romão cresceu a tão ponto que ele passou a desejar um título para mostrar ao outro português que era superior aele.
Chegou de Minas, aos cuidados de Miranda, o filho de um importante fazendeiro que era o melhor cliente que Miranda possuía. Chamava-se Henrique e tinha 15 anos. Mirando o hospedou em sua casa antiga, mas o menino reclamou dizendo que não estava bem acomodado, então o negociante o levou para sua residência em Botafogo. Henrique havia ido ao Rio e Janeiro (na época, a capital do Brasil), para tratar alguns assuntos referentes a seu ingresso na Academia de Medicina. Seu pai pagava mensalmente a Miranda, pela sua estada na casa. D. Estela cuidava do menino como se fosse seu filho, assim como cuidava de Valentim filho de uma escrava sua, a qual ela havia alforriado. Tratava Valentim como se fosse seu próprio filho e dispensava mais atenção à ele do que à Zulmira.
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