A Paranoia e Cultura do Medo na Pandemia
Por: Carlos Macedo • 29/4/2021 • Ensaio • 2.993 Palavras (12 Páginas) • 189 Visualizações
Paranoia e cultura do medo na pandemia: ameaça à liberdade e ao amadurecimento
Com o aparecimento da Covid-19, muito já se discute sobre como será o mundo pós-pandemia. Tais discussões vão de comparações do cenário atual a um estado de guerra a afirmações de que essa seria a pior crise pela qual a humanidade já haveria passado. Além disso, muitas pessoas acreditam na ocorrência de uma grande mudança de comportamento com o término da crise ou que o florescer de uma nova consciência estaria prestes a acontecer. Exageros e alarmismos como esses colaboram para a proliferação de um ambiente mais ansioso, gerando medos em relação ao futuro, o qual, agora mais do que nunca, se mostra incerto.
Vivemos em um mundo viciado no controle, ou seja, queremos ter controle de absolutamente tudo e, quando a contingência e a incerteza nos surpreendem com situações como a de uma pandemia, muitos se desesperam e se sentem impotentes diante de tal força.
Frank Furedi, sociólogo húngaro-britânico, é quem melhor nos fala a respeito da cultura do medo que permeia atualmente a nossa sociedade e suas implicações. As obras “How Fear Woks” e “Paranoid Parenting” serão o fio condutor deste breve ensaio, que tem por objetivo estabelecer uma relação entre a cultura do medo e sua influência em um possível comportamento paranoico dos pais em um cenário pós-pandemia. É sempre arriscado fazer predições de prováveis comportamentos que podem resultar de uma pandemia ou de uma tragédia, mas, baseado em um medo e em uma paranoia já existentes antes da pandemia em relação à criação dos filhos, o resultado seria a ocorrência de maior pressão e hipervigilância no cuidado para com os jovens.
A cultura do medo
Segundo Furedi (ANO ou em “Título”), o medo desempenha um papel importante para a compreensão da consciência do século XXI. No último século, vimos essa tendência ser descrita como o “século da ansiedade”, mas, nas últimas décadas, ela vem tomando contornos mais definidos conforme medos específicos vão sendo cultivados. Tal fato pode ser observado por meio da presença mais recorrente em nosso cotidiano de frases feitas, como “cultura do medo”, “políticas do medo”, “medo do futuro” e outras mais, as quais acabam por retratar (O QUE?). Além disso, tais chavões dão um testemunho da importância que o medo exerce em nossa cultura não somente em episódios de perigo excessivo, como epidemias, ataques terroristas e aquecimento global, mas, sobretudo, pela existência dos “medos silenciosos” que permeiam nosso cotidiano.
Em conversas diárias e nos noticiários, sempre vemos pessoas responsabilizando as outras por criarem uma cultura do medo, seja nas escolas ou nos escritórios, e uma demanda cada vez maior por safe spaces. Através do uso frequente ou do uso exagerado de tais expressões, podemos notar que a realidade é observada e interpretada pela lente do medo e que esse medo não é somente uma emoção ou resposta a uma ameaça, mas uma linguagem que sinaliza um mal-estar crescente em relação a nossa sociedade.
De acordo com Furedi (ANO ou em “Título”), cada cultura tem sua maneira distinta de interpretar e de encarar o medo. Na antiguidade, temiam-se deuses e os ancestrais; na era medieval, bruxas e forças sobrenaturais afligiam a população. Até pouco tempo atrás, o temor era com a ameaça de uma guerra nuclear, mas atualmente, encaramos o medo como uma resposta padrão para quase todas as experiências da vida. Assim, somos assombrados pelo medo do futuro, pelo medo de perder, pelo medo do outro, pelo medo de correr riscos, pelo medo da solidão, pelo medo de envelhecer e pelo medo de amadurecer.
Segundo Furedi (ANO ou em “Título”), existe uma divergência crescente entre a sensibilidade do medo, ou seja, o que realmente sentimos, e a experiência direta com a nossa rotina e os riscos que ela oferece. Essa discrepância entre o que sentimos e o perigo que realmente é oferecido serve como um indicador de que não estamos falando somente sobre uma resposta a uma experiência, mas, que, o que está em questão, é uma perspectiva cultural de como dar sentido a nossa vida.
Diante da variedade de elementos e espaços do cotidiano em que a cultura do medo opera, iremos isolar e tratar especificamente do medo na criação dos filhos, das consequências dessa sensibilidade no amadurecimento dos jovens e de como essa sensibilidade, que já era excessiva antes da pandemia, pode piorar caso os pais não reconheçam que o medo e a paranoia parental estão transformando seus filhos em reféns das suas ansiedades.
Vivemos em um mundo onde a ansiedade em relação à segurança dos filhos é sem precedentes. Nesse mundo, não é nenhuma novidade a existência de cenários nos quais pais superprotegem seus filhos; de escolas que se assemelham a uma indústria de autoestima e educam as crianças dentro de bolhas, evitando qualquer tipo de frustação; ou de crianças e adolescentes que têm a sua liberdade cada vez mais limitada, muitas vezes para evitar perigos que até pouco tempo atrás representavam pura e simples diversão, como, por exemplo, correr livremente em um parque.
É esse cenário que o autor Frank Furedi descreve brilhantemente em sua obra “Paranoid Parenting”. No desenvolvimento da obra, Furedi nos mostra como essa atitude paranoica exerce um peso em todos os envolvidos: dos pais, que vivem em estado de alerta, até às crianças, que sofrem com essa pressão, e às escolas e aos professores, que também vivem com esse sentimento de alerta e que se preocupam o tempo todo em evitar qualquer frustação dos pequenos.
Uma das maiores consequências dessa atitude paranoica de manter uma infância livre de riscos é retirar a oportunidade da criança de experimentar e explorar o desconhecido, de modo que são eliminados alguns riscos que valem a pena a criança correr por causa do efeito estimulante que eles proporcionam, que é de extrema importância para o desenvolvimento e para a autonomia. A prevenção de lesões desempenha um papel fundamental para manter as crianças seguras, mas pesquisas emergentes sugerem que a imposição de muitas restrições às brincadeiras de risco para crianças ao ar livre dificulta seu desenvolvimento. As tendências geracionais indicam que a diminuição do envolvimento das crianças nas brincadeiras ao ar livre é influenciada pelas preocupações dos pais e da sociedade.
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