AS NARRATIVAS DA VIOLÊNCIA CONTRA CAMPONESES PARAENSES: O SILENCIAMENTO E A CULTURA DO MEDO
Por: eli duarte • 1/4/2021 • Artigo • 6.194 Palavras (25 Páginas) • 236 Visualizações
AS NARRATIVAS DA VIOLÊNCIA CONTRA CAMPONESES PARAENSES: O SILENCIAMENTO E A CULTURA DO MEDO
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo analisar as narrativas de familiares e amigos dos camponeses, residentes no sudeste e sul do Pará, que foram vítimas das violências no campo na década de 1980, e cuja memória permaneceram submersas, devido à cultura do medo que faz parte do cotidiano da população rural desta região. Nossa intenção é realizar uma análise qualitativa das narrativas que constam no relatório Comissão Nacional da Verdade. Tomando como referência teórica os estudos de Rüsen e Pollak, entendemos que essas memórias trazem indícios das violências cometidas, pelos poderes públicos e privados, contra os camponeses, que viram nas investigações da Comissão Nacional da Verdade, iniciadas em 2012, uma forma de manifestarem-se e romperem o silêncio que imperava há mais de duas décadas.
Palavra Chaves: Território Paraense, Cultura do Medo, Comissão Nacional da Verdade.
RESUMEN
Este trabajo tiene como objetivo analizar las narrativas de familiares y amigos de los campesinos, residentes en el sureste y sur de Pará, quienes fueron víctimas de la violencia en el campo en la década de 1980, y cuya memoria quedó sumergida, debido a la cultura del miedo que forma parte del vida cotidiana de la población rural de esta región. Nuestra intención es realizar un análisis cualitativo de las narrativas contenidas en el informe de la Comisión Nacional de la Verdad. Tomando como referencia teórica los estudios de Rüsen y Pollak, entendemos que estos recuerdos traen evidencia de la violencia cometida, por poderes públicos y privados, contra los campesinos, quienes vieron en las investigaciones de la Comisión Nacional de la Verdad, iniciadas en 2012, una forma de manifestarse. y romper el silencio que prevaleció durante más de dos décadas.
Palabras clave: Para territorio, Cultura del Miedo, Comisión Nacional de la Verdad.
INTRODUÇÃO
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) foi instituída no Brasil, Governo da presidenta Dilma Rousseff, em 8 de novembro de 2011, sob pressão internacional e também pressões internas, com objetivo de investigar as violações de direitos, ocorridas entre 1946-1988. A sua criação foi um processo longo, mas acredita-se que teve um papel relevante na defesa dos direitos humanos no século XX, possibilitando restabelecer políticas de reparação de danos, como também da oportunidade para familiares homenagear seus mortos. No entanto, sabemos que a CNV, não tinha poder de juiz e nem executor de sentença, mas de investigação e apontamento destas violações, um grande avanço dentro de um processo democrático.
Os conflitos agrários no Brasil existem há muitos séculos, uma luta entre os latifundiários que querem o território para fins capitalista, grandes produções agrícolas com objetivos de exportação, e os pequenos camponeses, que habitam estes territórios a várias décadas e produzem para a sua sobrevivência e de seus familiares, além de contribuírem para o abastecimento da mesa dos brasileiros.
O relatório final da CNV indica o destaque do Pará como Estado com maior número de conflitos agrários e de assassinatos, sendo identificados pela Comissão Camponesa da Verdade - CCV, do Pará, 805 conflitos envolvendo 411 mil famílias e nove milhões de hectares de terras. Sendo que 556 camponeses foram assassinados nestes conflitos durante o período que foi instaurado o Estado de Segurança Nacional, entre os anos de 1964 a 1984 (CNV, 2014 p.183). Salientamos que a maioria dos conflitos existentes na região amazônica ocorrem pela disputa do uso do território, seja entre Estado e povo ou entre latifundiários e camponeses. Como afirma Haesbaert (2014, p. 5), o território pode ser compreendido a partir de uma “relação de poder”, envolvendo diferentes sujeitos que disputam a dominação desse espaço geográfico.
Partindo desse pensamento, demos ênfase nos fatos acontecido na gleba CIDAPAR localizado no município de Viseu-PA, como também moradores do município de Santa Maria - PA, e do município de Marabá-PA, e um caso acontecido na região conhecida como Bico do Papagaio, que enquadra cidade do Sul do Maranhão, Norte do Tocantins e Sudeste do Pará. Percebemos que os conflitos agrários no Estado do Pará envolvem diferentes sujeitos sociais, entre eles: (I) os camponeses que buscam o território como um espaço zonal em que possam produzir o seu sustento e de seus familiares, (II) os fazendeiros que disputam o território como espaço zonal e também como território econômico e de poder político, e (III) os agentes públicos que representam o poder estatal dentro dessas disputas.
Nas narrativas dos camponeses (as), compreendidos na perspectiva de Martins (1981), como os trabalhadores rurais, que estão registradas no relatório da Comissão Camponesa da Verdade (CCV,2014) no Estado do Pará, identificou-se 805 conflitos pela terra com envolvimento de 411 mil famílias lutando por 9 milhões de hectares de terras, resultando em 556 mortes de camponeses (as).
Os dados analisados qualitativamente, nos fazem compreender que essas memórias dos camponeses foram esquecidas ou silenciadas por mais de seis décadas, sendo esse silêncio quebrado apenas no ano de 2014. Para preservar a identidade dos depoentes colocamos letras e números de acordo com a forma com que foram analisadas. Tais procedimentos foram tomados com o intuito de garantir a fidedignidade dos dados e garantir uma análise segura respeitando todas as orientações do Comitê de Ética em Pesquisa.
As narrativas que selecionamos, que compõe parte do relatório final da CNV, e apresentam as memórias traumáticas, dos conflitos e das diversas práticas de violência, as quais são elementos estruturante da cultura do medo. Essas narrativas trazem os detalhes de como os conflitos agrários se iniciavam e como terminavam, durante a década de 1980. A memória traumática são imagens inconscientes sobre fenômenos traumatizantes do passado que quando ressurge no presente rememora detalhes dos fatos. Rüsen, (2009) considera estas memórias como responsiva, de modo que ela é convocada a partir da maneira intensa em que acontecem as experiências das pessoas em determinados eventos e como essas informações foram arquivadas na mente do indivíduo.
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