MULHER, DIREITO E SAÚDE
Artigo: MULHER, DIREITO E SAÚDE. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: Divane • 12/10/2013 • Artigo • 8.802 Palavras (36 Páginas) • 520 Visualizações
ARTIGO
MULHER, DIREITO E SAÚDE:
repensando o nexo coesivo*
Rosa Maria Godoy Serpa da Fonseca**
*Conferência proferida na Conferência Municipal sobre Saúde da Mulher "Mulher, direito e saúde" preparatório para
a IV Conferência Municipal de Saúde de Goiânia, 13/03/98
** Enfermeira. Professora Associada do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem
da Universidade de São Paulo. Conselheira do Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo. Vice-coordenadora
do NEMGE (Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero da Universidade de São Paulo).
RESUMO: Esse artigo é construído a partir de três elementos básicos: mulher, direito
e saúde, articulados entre si a partir de: 1) considerações acerca das condições objetivas
de constituição das mulheres enquanto sujeitos sociais na sociedade contemporânea;
2) direitos das mulheres como direitos humanos e 3) direito das mulheres à saúde no
contexto da implementação do PAISM (Programa de Atenção Integral à Saúde da
Mulher), como focalização do SUS (Sistema Único de Saúde).
KEY WORDS: gênero e saúde, direitos das mulheres, direito à saúde, PAISM/SUS
VIDA DE MULHER: O QUE É ISSO ?
Para compreender o que significa ser mulher e as especificidades da vida das
mulheres, há que se compreender como mulheres e homens se constituem como sujeitos
sociais, no contexto da sociedade contemporânea. Extensamente exploradas nos estudos
feministas, as relações sociais estabelecidas entre mulheres e homens, relações de poder,
parecem ter sua gênese na constituição das sociedades, tanto quanto na divisão sexual do
trabalho. Isso explicaria, entre outras coisas, a naturalização do trabalho doméstico e do
cuidado com as crianças (além de gerá-las) como pertencentes ao mundo feminino, bem
como, de outro lado a inserção social dos homens no espaço público.
A base de tal pensamento situa-se na visão idealista de família como espaço de
ausência de conflitos, tanto quanto na separação das esferas do público e do privado,
estabelecendo para homens e mulheres lugares distintos. Foi no contexto das lutas
feministas, principalmente as mais recentes, que emergiram as possibilidades de reflexão
sobre a dicotomização entre os mundos público e privado e a necessidade de compreender
a sua integração e articulação. Sob a bandeira de que "o pessoal é político", as feministas
têm envidado ¡números esforços na derrubada do mito da divisão entre o público e o privado
e, com isso, tornado suas questões passíveis de serem compreendidas como histórica e
socialmente construídas. Se, por um lado, o capitalismo consolidou o trabalho da mulher
entre quatro paredes, naturalizando funções como mãe e dona de casa, por outro, tem sido
esse o modo de produção no contexto do qual, na história, mais se tem lidado com as
questões das mulheres, procurando-se sua gênese e possibilidades de superação.
"Já vão longe nossas ilusões a respeito do racionalismo e da objetividade e, junto
com elas, foram-se também nossos tão acalentados sonhos de uma família que fosse o
refúgio contra a luta e a competição. Em nosso realismo recentemente conquistado, o pessoal
é político e, principalmente, a família é política. Fundada na hierarquia e na dominação, que
ela tem reproduzido através da história, a família - esse mais íntimo espaço das relações
pessoais - requer uma resposta política nessa era tão eminentemente politizada em que
wVemos."(FOX-GENOVESE, 1992)
Segundo MATOS (1994), "o processo de construção e de segmentação do público/
privado carrega na sua trajetória inter-relações desenvolvidas através de um discurso
legitimador que vem atrelado, desde a origem, a um ocultamento de toda uma tensão entre
os sexos... "Tal discurso, que legitima a falsa universalidade entre os limites do público e do
privado foram definidos e tornaram-se mais precisos na Inglaterra vitoriana do século XIX
que representa o lar e a família, em termos naturais e a esfera pública como instância
histórica. "Foi no contexto da herança vitoriana que se construiu o dualismo público/privado,
reafirmando o privado como espaço da muíhere representando-a como vítima de sua própria
natureza, ao destacar a maternidade como necessidade e o espaço privado como locus de
realização das potencialidades femininas" (MATOS, 1994)
Num trabalho clássico de análise da maternidade, Badinter desmistifica a
maternidade atribuindo-lhe a historicidade que lhe é inerente. Segundo a autora, o amor
materno também é construído socialmente como forma de controle e submissão (pacífica)
das mulheres às necessidades sociais do trabalho doméstico. É no contexto dos três
discursos
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