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Psicologia Medicalização da Educação

Por:   •  11/7/2021  •  Monografia  •  4.865 Palavras (20 Páginas)  •  96 Visualizações

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Medicalização da educação, robotização de infâncias e interferência na subjetividade de sujeitos

Felipe Mattana Viero[1]

“Nos mecanismos implantados pela biopolítica, vai se tratar, sobretudo, é claro, de previsões, de estimativas estatísticas, de medições globais; vai se tratar, igualmente, não de modificar tal fenômeno em especial, não tanto tal indivíduo, na medida em que é indivíduo, mas, essencialmente, de intervir no nível daquilo que são as determinações desses fenômenos gerais, desses fenômenos no que eles têm de global. Vai ser preciso modificar, baixar a morbidade; vai ser preciso encompridar a vida; vai ser preciso estimular a natalidade. E trata-se sobretudo de estabelecer mecanismos reguladores que, nessa população global com seu campo aleatório, vão poder fixar um equilíbrio, manter uma média, estabelecer uma espécie de homeostase, assegurar compensações; em suma, de instalar mecanismos de previdência em torno desse aleatório que é inerente a uma população de seres vivos, de otimizar, se vocês preferirem, um estado de vida: mecanismos, como vocês vêem, como os mecanismos disciplinares, destinados em suma a maximizar forças e a extraí-las, mas que passam por caminhos inteiramente diferentes” (FOUCAULT, 1999, p. 293-294).

A partir das considerações sinalizadas acima este artigo tem como objetivo realizar uma reflexão a partir de Michel Foucault (1999) e outros autores sobre a medicalização da vida, especialmente a medicalização no campo da educação, partindo dos altos números de uso de medicação, principalmente o metilfenidato, refletindo na forma como essa e outras substâncias interferem na subjetividade das crianças, no modo como se torna numa forma de mecanização dos corpos e interferência na subjetividade de cada sujeito. Foucault (2019) nos faz refletir sobre como se acredita que os regimes disciplinares, o investimento do corpo pelo poder em escolas, deve ser meticuloso, rígido e constante, assim como na existência de um “fantasma” que nos traria uma ideia de uma universalidade de vontades. Isso leva a pensar a forma como cada dia mais surgem explicações organicistas para o comportamento das crianças em sala de aula, e o aumento do uso de medicação controlada, seja pelo seu comportamento, seja por dificuldades escolares, reduzindo o sujeito a patologias. A partir disso, esta escrita pretende realizar uma discussão reflexiva a partir da medicalização de crianças em fase escolar, e como as mesmas são afetadas pelo uso de substâncias medicamentosas.

A psiquiatria, em meados dos séculos XVII e XIX atinge sua autonomia se revestindo de tamanho prestígio por ter conseguido se inscrever num lugar de uma medicina concebida como resposta aos riscos inerentes ao âmbito social (FOUCAULT, 2004, p. 09). O movimento higienista no século XIX tinha a tendência de associar as questões sociais às práticas psicológicas e psiquiátricas, apoiando em hipóteses biológicas para justificar as intervenções médicas na sociedade (COSTA, 2007).

Nesse contexto, no Brasil do século XIX, a medicina passa a ser influenciada pelos propósitos higienistas, no momento em que se insere no contexto escolar, levando consigo uma visão patologizante a qual surge como forma de mascarar todos os problemas que estariam relacionados ao fracasso escolar. Nesse cenário, dimensiona-se como uma das ferramentas da psiquiatria as técnicas psicométricas, as quais, neste momentos precisam dar explicações individuais para problemas de ordem social (CRUZ et al, 2016, p. 706).

Uma destas ferramentas é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), o qual foi publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), sendo esse manual uma ferramenta utilizada universalmente para se traçar diagnósticos psiquiátricos, além de ser usado por profissionais da área clínica, o DSM tem como proposito alcançar profissionais de diversas áreas, como jurídica, escolar e organizacional (RESENDE et al, 2015, p. 535)

Para se estar no meio social de forma satisfatória, por meio do trabalho e da família, se espera que os sujeitos estejam dotados de um pleno bem-estar, físico e mental, e a partir disso, observa-se que a saúde seria definida como uma ausência de psicopatologias, de sofrimentos de qualquer espécie (HANSEN, 2004). O saber médico-psiquiátrico parece não ver as crianças como seres em processo de desenvolvimento de subjetivação, as quais desejam, expressam seus conflitos de forma singular, conforme o meio ao qual está inserida, os quais influenciam na constituição da história de vida de cada sujeito (COLLARES. 2013). O trabalho da medicina se reduz a categorizar comportamentos e atitudes considerados inadequados, e a partir disso, determinar um diagnóstico e respectivamente uma forma de tratamento, na maioria das vezes utilizando a medicação (CRUZ et al, 2016, p. 711).

O conceito de medicalização está relacionado ao aumento do domínio da profissão médica para os demais campos de saber, especialmente aos ligados a questões espirituais, morais, legais e criminais. A medicalização é um processo extremamente complexo, que além de envolver inúmeras novas categorias diagnósticas que abrem caminho ao tratamento farmacológico, surge também como aliada ao processo de interferência das explicações biológicas no cotidiano das pessoas (AGUIAR, 2004).

Se sabe que, segundo Gaspari (2002), um sujeito não é um ser isolado, ele é um membro ativo de diversos grupos sociais, os quais começam na família, a qual é um grupo social natural, e um sistema que faz parte de diversos outros sistemas, que afetam a vida do sujeito. Além da família, essas relações incluem a escola, os colegas, professores, relações estas estabelecidas com base nas diversas demandas do cotidiano.

Medicalização da educação

“O conhecimento se abrirá simplesmente para a dimensão indefinida de um progresso cujo fim não se conhece e cujo benefício só será convertido, no curso da história, em acúmulo instituído de conhecimentos ou em benefícios psicológicos ou sócias que, no fim das contas, é tudo o que se consegue da verdade, quando foi tão difícil busca-la”. (FOUCAULT, 2006, p.24)

Refletir sobre a medicalização da educação é percorrer espaços sinuosos, onde habitam redes de instituições que se interpenetram, como a educação, a família e a medicina. Atualmente, a maioria das crianças entre sete e catorze anos passam a maioria de seu tempo na escola, tornando inevitável que essa grande vivência com os professores abra espaço para os mesmos observem em seus alunos comportamentos considerados inadequados, além das dificuldades de aprendizagem que não conseguem dar conta (CRUZ et al, 2016, p. 705).

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